Mistério do Sistema Solar: o que é que se passa com Quíron?
Impressão de artista de atividade cometária no centauro Quíron
Em primeiro lugar, o que é Quíron? Originalmente descoberto em
1977 e classificado como um asteroide, o corpo menor Quíron foi o
primeiro membro identificado de uma nova classe de objetos no nosso
Sistema Solar, agora conhecida como centauros.
Os centauros são objetos em órbitas de curta duração que residem entre a cintura de asteroides e a cintura de Kuiper, uma região em forma de donut de corpos gelados que se estende muito para além da órbita de Neptuno.
Tal como Quíron, os centauros escaparam da cintura de Kuiper e estão a
ser espalhados pelos planetas gigantes, tal como uma bola que bate nos
“bumpers” de uma máquina de pinball.
A maior parte dos centauros vai “saltar” durante cerca de 10 milhões de anos, antes de ser expulsa do Sistema Solar, sendo que apenas alguns sobreviverão para se tornarem cometas de curto período.
Nos últimos 50 anos, Quíron continuou a destacar-se
dos restantes centauros. Sendo um dos maiores centauros em termos de
tamanho, este corpo do Sistema Solar é conhecido por se comportar como
um cometa, com períodos de atividade que criam uma atmosfera difusa e
poeirenta.
Estudos mais recentes encontraram até evidências de um possível anel duplo gelado em torno do planetoide.
Personagem complexo, Quíron tem intrigado os astrónomos há quase meio século. No entanto, foram os acontecimentos mais recentes dos centauros que suscitaram maior intriga.
O mistério
Ao analisar dados do ATLAS (Asteroid Terrestrial-impact Last Alert
System) em 2021, astrónomos da Queen’s University de Belfast, Irlanda do
Norte, notaram que Quíron estava inesperadamente muito mais brilhante no céu noturno quando comparado com os 5 anos anteriores de observações.
O ATLAS é uma rede de quatro pequenos telescópios robóticos no
Hawaii, na África do Sul e no Chile, que trabalham em conjunto para
analisar todo o céu noturno numa busca diária de asteroides
potencialmente perigosos para a Terra.
Algo tinha acontecido e agora Quíron estava a refletir muito mais luz solar. Mas como?
Qualquer que fosse a causa, a mudança tinha ocorrido quando Quíron esteve atrás do Sol e, assim sendo, quando não foi visível da Terra durante mais de cinco meses.
Matthew Dobson, estudante de doutoramento da Escola
de Matemática e Física da Queen’s University de Belfast, liderou uma
equipa para tentar resolver o caso. Os resultados estão resumidos num
novo artigo científico, publicado na revista The Planetary Science Journal, que explora várias hipóteses.
“O objetivo deste estudo era descobrir o que causou a mudança no brilho
de Quíron. Terão sido os anéis, uma atividade cometária súbita, uma
nova parte exposta do objeto virada para a Terra?”, explica Dobson.
“Combinámos dados históricos e examinámos observações de
levantamentos em curso que tinham estudado Quíron para testar estas
teorias. Também usámos o telescópio do Observatório Gemini, um dos
maiores telescópios do mundo, para descobrir o máximo que pudemos”,
acrescenta.
Os resultados
O artigo científico revela que Quíron registou um aumento ou sofreu um surto de atividade cometária.
Os investigadores da Queen’s University de Belfast exploraram Quíron
com o telescópio do Observatório Gemini para procurar uma cabeleira
difusa, um sinal comum de um cometa.
Sem cabeleira à vista, determinaram que pode ser que a cabeleira
esteja presa a Quíron pela sua fraca gravidade, ou que esteja tão longe
que é demasiado ténue para ver à volta do objeto, mesmo com o enorme
telescópio Gemini. No entanto, o aumento de luz da poeira extra à volta
de Quíron permanece visível.
Examinar este estranho acontecimento num pequeno corpo do Sistema
Solar, e explorar os processos ativos que ocorrem em tempo real, ajuda
os astrónomos a melhor compreender os processos cometários ativos nos
centauros, uma fase crucial na evolução de alguns dos cometas de curto
período do nosso Sistema Solar.
“A maior parte das pesquisas de atividade procuram a assinatura reveladora de uma cabeleira difusa em torno do objeto”, explica Meg Schwamb,
co-autora do artigo, também da Escola de Matemática e Física da Queen’s
University de Belfast, num comentário sobre o impacto destes
resultados.
“Este trabalho examinou a tendência de brilho a longo prazo
do objeto com o passar do tempo, e pensamos que esta técnica será
crucialmente importante à medida que a próxima geração de levantamentos
de descoberta e monitorização do Sistema Solar, tais como o LSST (Legacy
Survey of Space and Time), entram em funcionamento nos próximos anos”,
acrescenta Schwamb.
“A técnica utilizada com os extensos dados do ATLAS permitiu a deteção do início da atividade de Quíron, que foi posteriormente corroborada por observações do JWST por uma equipa independente que revelou uma conspícua cabeleira em forma de leque”, nota Charles Schambeau, investigador dada Universidade da Flórida Central e líder das observações Gemini.
Consequentemente, diz o investigador, o método de Dobson para
identificar atividade, mesmo quando as abordagens tradicionais sugeriam
inatividade, pode ser alargado com confiança ao estudo de outros objetos
no futuro.
in ZAP