Enquanto presidente da República, exerceu o cargo de forma ditatorial, suspendendo e alterando por decreto normas essenciais da
Constituição Portuguesa de 1911, razão pela qual ficou conhecido como o
Presidente-Rei.
Sidónio Pais nasceu em Caminha, filho de Sidónio Alberto Pais,
notário
e secretário judicial, e de Rita da Silva Cardoso Pais, ambos naturais
de Caminha. Casou-se em Amarante em 1895 com Maria dos Prazeres Martins
Bessa , com quem teve cinco filhos.
Bernardo da Costa Sassetti Pais reconhecido pianista português, é seu bisneto.
Durante este período pertenceu por um curto espaço de tempo à
Maçonaria na
Loja Estrela de Alva, de Coimbra, com o nome simbólico de
irmão Carlyle, não sendo, no entanto, um membro muito activo.
Membro destacado da Assembleia Constituinte, foi nomeado
Ministro do Fomento do Governo presidido por
João Chagas, assumindo as funções a
24 de agosto de
1911. Nessas funções, em que permaneceu até
3 de novembro de
1911,
representou o Governo nas manifestações que assinalaram o primeiro
aniversário da implantação da República, na cidade do Porto.
Numa fase em que as tensões internacionais que levaram à
Primeira Guerra Mundial já se sentiam, foi nomeado para o cargo de
ministro plenipotenciário de Portugal (embaixador) em
Berlim, iniciando funções a
17 de agosto de
1912.
Permaneceu naquele importante posto diplomático durante o período
crítico que levou à deflagração da guerra, mantendo um difícil
equilíbrio entre as pressões do Governo português, com posições
progressivamente pró-belicistas e anglófilas, as tentativas de dirimir
pela via diplomática os conflitos fronteiriços nas zonas de contacto
entre as colónias portuguesas e alemãs em África e o seu crescente
posicionamento germanófilo. Apesar dessas dificuldades, desempenhou o
cargo até
9 de março de
1916, data em que a
Alemanha declarou guerra a Portugal na sequência do aprisionamento dos seus navios que se encontravam em portos sob controlo português.
Regressado a Portugal, foi naturalmente engrossar a fileira daqueles que se opunham à participação de Portugal na
Grande Guerra, catalizando o crescente descontentamento causado pelo esforço de guerra e pelos maus resultados obtidos pelo
Corpo Expedicionário Português na frente de batalha.
Afirmou-se então como o principal líder da contestação ao Governo do Partido Democrático Republicano e de 5 a 8 de dezembro de 1917
liderou uma insurreição protagonizada por uma Junta Militar
Revolucionária, da qual era Presidente. O golpe de estado acabou
vitorioso, após três dias de duros confrontos, nos quais o papel dos
grupos civis foi determinante para a vitória dos revoltosos.
Na madrugada do dia 8 de Dezembro fora exonerado o Governo da
União Sagrada liderado por
Afonso Costa,
transferindo-se o poder para a Junta Revolucionária presidida por
Sidónio Pais. Então, em vez de iniciar a habitual consulta para formação
de novo governo, os revoltosos assumem o poder, destituindo
Bernardino Machado do cargo de Presidente da República e forçando o seu exílio. Nesse processo, a
11 de dezembro de
1917, Sidónio Pais tomou posse como Presidente do Ministério, acumulando as pastas de
Ministro da Guerra e de
Ministro dos Negócios Estrangeiros e, já em profunda ruptura com a Constituição de 1911, que ajudara a redigir, a
27 de dezembro do mesmo ano, assumiu as funções de
Presidente da República, até nova eleição.
Durante o golpe e na fase inicial do seu governo, Sidónio Pais contou
com o apoio de vários grupos de trabalhadores, em troca da libertação de
camaradas encarcerados, e com a
expectativa benévola da
União Operária Nacional, parecendo posicionar-se como mais uma tentativa de consolidação no poder da esquerda republicana.
Inicia então a emissão de um conjunto de decretos ditatoriais, sobre
os quais nem consulta o Congresso da República, que suspendem partes
importantes da Constituição, dando ao regime um cunho marcadamente
presidencialista, fazendo do Presidente da República simultaneamente
Chefe de Estado e líder do Governo, o qual, significativamente, deixa de
ser constituído por
Ministros para integrar apenas
Secretários de Estado. Nesta nova arquitectura do sistema político, que os seus apoiantes designavam por
República Nova, o Presidente da República era colocado numa posição de poder que não tinha paralelo na história portuguesa desde o fim do
absolutismo monárquico. Daí o epíteto de
Presidente-Rei que lhe foi aposto. Nos seu objectivos e em muitas das suas formas, a
República Nova foi precursora do
Estado Novo de
António de Oliveira Salazar.
Numa tentativa de apaziguamento das relações com a
Igreja Católica Romana, em guerra aberta com o regime republicano desde 1911, a
23 de fevereiro de
1918
Sidónio Pais alterou a Lei de Separação entre as Igrejas e o Estado,
suscitando de imediato feroz reacção dos republicanos históricos e da
Maçonaria, mas colhendo o apoio generalizado dos católicos, dos
republicanos moderados e da população rural, então a vasta maioria dos
portugueses. Com essa decisão também conseguiu o reatamento das relações
diplomáticas com o
Vaticano, através do envio de
monsenhor Benedetto Aloisi Masella (que mais tarde seria núncio apostólico no Brasil, cardeal e
camerlengo), que assumiu as funções de encarregado de negócios da
Santa Sé em Lisboa a
25 de julho de
1918.
Noutro movimento inconstitucional, a
11 de março de
1918
por decreto estabeleceu o sufrágio directo e universal para a eleição
do Presidente da República, subtraindo-se à necessidade de legitimação
no Congresso e enveredando por uma via claramente
plebiscitária.
Fazendo uso da sua popularidade junto dos católicos, a
28 de abril de
1918
foi eleito, por sufrágio directo dos cidadãos eleitores, obtendo
470 831 votos, uma votação sem precedentes. Foi proclamado Presidente da
República a
9 de maio
do mesmo ano, sem sequer se dar ao trabalho de consultar o Congresso e
passando a gozar de uma legitimidade democrática directa, que usou sem
rebuços para esmagar qualquer tentativa de oposição.
Os decretos de Fevereiro e Março de 1918, que pela sua profunda contradição com a constituição vigente foram denominados de
Constituição de 1918, alteram profundamente a
Constituição Portuguesa de 1911 e conferiram ao regime uma clara
feição presidencialista,
reformulando a lei eleitoral, as leis estabelecidas sobre a separação
do Estado e da Igreja e a própria distribuição de poder entre os órgãos
de soberania do Estado.
Entretanto, em Abril de
1918 as forças do
Corpo Expedicionário Português são chacinadas na
Batalha de La Lys,
sem que o Governo português consiga os necessários reforços nem a
manutenção de um regular aprovisionamento das tropas. A situação atingiu
um extremo tal que, após o
armistício
que marcou o final da guerra, o Estado português não foi capaz de
trazer de imediato as suas forças de volta ao país. A contestação social
no país aumentou ao ponto de se viver uma permanente situação de
sublevação.
Esta situação foi o fim do estado de graça: sucederam-se as greves,
as contestações e os movimentos conspirativos. A partir do Verão de 1918
as tentativas de pôr fim ao regime sidonista vão escalando em gravidade
e violência, o que levou o Presidente a decretar o
estado de sítio a
13 de outubro
daquele ano. Com aquele acto, e a dureza da repressão sobre os
opositores, conseguiu recuperar momentaneamente o controlo da situação
política, mas o seu regime estava claramente ferido de morte.
Com o aproximar do fim do ano a situação política não melhora, apesar da assinatura do
Armistício da Grande Guerra, em
11 de novembro, acontecimento acompanhado de uma mensagem afectuosa do rei
Jorge V de Inglaterra
tentando minorar a clara ligação entre Sidónio Pais e as posições
germanófilas que anteriormente assumira, e que agora apareciam
derrotadas.
O assassinato de Sidónio Pais foi um momento traumático para a
Primeira República, marcando o seu destino: a partir daí qualquer
simulacro de estabilidade desapareceu, instalando-se uma crise
permanente que apenas terminou quase 8 anos depois com a
Revolução Nacional de
28 de maio de
1926 que pôs termo ao regime.
Os funerais de Sidónio Pais foram momentosos, reunindo muitas dezenas
de milhar de pessoas, num percurso longo e tumultuoso, interrompido por
múltiplos e violentos incidentes. Com este fim, digno de um verdadeiro Presidente Rei,
Sidónio Pais entrou no imaginário português, em particular dos sectores
católicos mais conservadores, como um misto de salvador e de mártir,
mantendo-se durante décadas como uma figura fraturante no sistema
político.
A imagem de mártir levou ao surgimento de um culto popular, semelhante ao que existe em torno da figura de
Sousa Martins, que fez de Sidónio Pais um
santo, com honras de promessas e
ex-votos, que ainda hoje se mantém, sendo comum a deposição de flores e outros elementos votivos junto ao seu túmulo.