Obra artística realizada na Escola Secundária Vitorino Nemésio
Biografia
Filho de Vitorino Gomes da Silva e Maria da Glória Mendes Pinheiro, na
infância a vida não lhe correu bem em termos de sucesso escolar, uma
vez que foi expulso do Liceu de Angra e reprovou no 5.º ano, facto que o
levou a sentir-se incompreendido pelos professores. Do período do
Liceu de Angra, apenas guardou boas recordações de
Manuel António Ferreira Deusdado, professor de
História, que o introduziu na vida das
Letras.
Com 16 anos de idade, Nemésio desembarcou pela primeira vez na cidade da
Horta para se apresentar a exames, como aluno externo do
Liceu Nacional da Horta. Acabou por concluir o Curso Geral dos Liceus, em
16 de julho de
1918, com a qualificação de
dez valores.
A sua estadia na Horta foi curta, de maio a agosto de 1918. A 13 de agosto o jornal
O Telégrafo dava notícia de que Nemésio, apesar de ser um
fedelho, um ano antes de chegar à Horta, havia enviado um exemplar de
Canto Matinal, o seu primeiro livro de poesia (publicado em
1916), ao director de
O Telégrafo,
Manuel Emídio.
Apesar da tenra idade, Nemésio chegou à Horta já imbuído de alguns ideais republicanos, pois em
Angra do Heroísmo já havia participado em reuniões literárias, republicanas e anarco-sindicalistas, tendo sido influenciado pelo seu amigo
Jaime Brasil, cinco anos mais velho (primeiro mentor intelectual que o marcou para sempre) e por outras pessoas tal como
Luís da Silva Ribeiro, advogado, e
Gervásio Lima, escritor e bibliotecário.
Em 1918, ao final da
Primeira Guerra Mundial,
a Horta possuía um intenso comércio marítimo e uma impressionante
animação nocturna, uma vez que se constituía em porto de escala
obrigatória, local de reabastecimento de frotas e de repouso da
marinhagem. Na Horta estavam instaladas as companhias dos Cabos
Telegráficos Submarinos, que convertiam a cidade num "nó de
comunicações" mundiais. Esse ambiente cosmopolita contribuiu,
decisivamente, para que ele viesse, mais tarde a escrever uma obra
mítica que dá pelo nome de
Mau Tempo no Canal, trabalhada desde
1939 e publicada em
1944, cuja acção decorre nas ilhas
Faial,
Pico,
São Jorge e
Terceira, sendo que o núcleo da intriga se desenvolve na
Horta.
Este romance evoca um período (1917-1919) que coincide em parte com a
sua permanência na ilha do Faial e nele aparecem pessoas tais como o
Dr.
José Machado de Serpa, senador da República e estudioso, o padre
Nunes da Rosa, contista e professor do Liceu da Horta, e
Osório Goulart, poeta.
Em
1919 iniciou o serviço militar, como voluntário na arma de
Infantaria, o que lhe proporcionou a primeira viagem para fora do arquipélago. Concluiu o liceu em
Coimbra (
1921) e inscreve-se na Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra.
Três anos mais tarde, Nemésio trocou esse curso pelo de Ciências
Histórico Filosóficas, da Faculdade de Letras de Coimbra, e, em
1925, matriculou-se no curso de Filologia Românica.
Na primeira viagem que faz à
Espanha, com o Orfeão Académico, em
1923, conheceu
Miguel Unamuno,
escritor e filósofo espanhol (1864-1936), intelectual republicano, e
teórico do humanismo revolucionário antifranquista, com quem trocará
correspondência anos mais tarde.
A
12 de fevereiro de
1926 desposou, em
Coimbra,
Gabriela Monjardino de Azevedo Gomes, com quem teve quatro filhos:
Georgina (novembro de 1926), Jorge (abril de 1929), Manuel (julho de
1930) e Ana Paula (dezembro de 1931).
Em
1930 transferiu-se para a
Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa
onde, no ano seguinte, concluiu o curso de Filologia Românica, com
elevadas classificações, começando desde logo a leccionar literatura
italiana. A partir de
1931
deu inicio à carreira académica na Faculdade de Letras da Universidade
de Lisboa, onde leccionou Literatura Italiana e, mais tarde,
Literatura Espanhola.
Em 1934 doutorou-se em Letras pela Universidade de Lisboa com a tese A Mocidade de Herculano até à Volta do Exílio.
A
12 de setembro de
1971,
atingido pelo limite legal de idade para exercício de funções
públicas, profere a sua última lição na Faculdade de Letras de Lisboa,
onde ensinara durante quase quatro décadas.
Foi autor e apresentador do programa televisivo
Se bem me lembro, que muito contribuiu para popularizar a sua figura e dirigiu ainda o jornal
O Dia entre
11 de dezembro de
1975 a
25 de outubro de
1976.
Faleceu a
20 de fevereiro de
1978, em
Lisboa, no Hospital da CUF, e foi sepultado em
Coimbra.
Pouco antes de morrer, pediu ao filho para ser sepultado no cemitério
de Santo António dos Olivais, em Coimbra. Mas pediu mais: que os sinos
tocassem o Aleluia em vez do dobre a finados. O seu pedido foi
respeitado.
A 30 de agosto de 1978 foi elevado a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, a título póstumo.
Obra
Vitorino Nemésio foi ficcionista, poeta, cronista, ensaísta, biógrafo,
historiador da literatura e da cultura, jornalista, investigador,
epistológrafo, filólogo e comunicador televisivo, para além de toda a
actividade de docência.
Levou a cabo, na sua obra, uma transformação das tendências da
Presença
(que de certa forma precedeu), que garantiu a eternidade dos seus
textos. Fortemente marcado pelas raízes insulares, a vida açoriana e as
recordações da sua infância percorrem a obra do escritor, numa espécie
de apelo, revelado pela ternura da sua inspiração popular, pela
presença das coisas simples e das gentes, e pela profunda humanidade
face à existência e ao sofrimento da vida humana.
Entre as suas principais obras contam-se:
Poesia
- O Bicho Harmonioso (1938)
- Eu, Comovido a Oeste (1940)
- Nem Toda a Noite a Vida (1953)
- O Verbo e a Morte (1959)
- Canto de Véspera (1966)
- Sapateia Açoriana, Andamento Holandês e Outros Poemas (1976)
- Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga (2003) - póstumo
Ficção
Ensaio e crítica
- Sob os Signos de Agora (1932)
- A Mocidade de Herculano (1934)
- Relações Francesas do Romantismo Português (1936)
- Ondas Médias (1945)
- Conhecimento de Poesia (1958)
Crónica
No primeiro ciclo a temática está relacionada com a insularidade, com a
saudade à ilha, à infância, à adolescência, ao pai e ao seu primeiro
amor proibido. Toda esta temática está bem visível em O Bicho Harmonioso e em Eu, Comovido a Oeste.
No segundo ciclo já se nota uma transmutação de temas, enveredando para
uma temática religiosa e metafísica. Coloca questões acerca da vida e
da morte, do ser (devir e permanência do ser), e da busca de sentido
para a existência. Por isso o poeta é identificado com a corrente
filosófica existencialista. A par desta poesia erudita o poeta cultiva
também uma poesia popular profundamente marcada por símbolos de açorianidade, pelo que muitas vezes é acusado de regionalismo literário na sua obra.