Contexto histórico
O
golpe de estado de
25 de abril de 1974, conhecido por a
Revolução dos Cravos, teve como objectivo principal a solução política da guerra colonial, e em segundo plano a implantação em
Portugal de um regime
democrático.
A definição desse regime não foi consensual entre as diversas facções
partidárias e movimentos sociais e políticos que surgiram então. Com a
adesão espontânea de grande parte da população das principais cidades do
País, o Golpe de Estado transformou-se em processo revolucionário
(PREC). Na noite de 25 de Abril de 1974 o MFA deu a conhecer à população
portuguesa o seu programa político e militar, o qual comportava
diversas medidas de carácter político, jurídico, social e económico. O
Programa do MFA não apontava para qualquer tipo específico de regime
democrático mas, em contrapartida, no seu ponto 6 apontava para uma
reorganização e social do País de tipo socialista (ou no mínimo
socializante), anti-monopolista e favorável às classes e camadas sociais
mais desfavorecidas. Foi sobretudo a favor ou contra estas provisões do
Programa do MFA que a luta política, social, ideológica, económica e
militar - a luta de classes - se iria desencadear. E ainda permanece
entre nós... ao nível de historiadores, politólogos, especialistas de
relações internacionais, políticos profissionais.
As forças mais identificadas com o modelo económico e social dito de
'economia de mercado', ou de 'livre iniciativa', ou 'capitalista' na
acepção científica, como o PS, o PPD, o CDS, o PPM e as facções
militares suas aliadas (spinolistas, Direita Militar mais
conservadora,
meloantunistas/moderados mais ou menos aliados à ala direita do PS,
soarista) iriam tudo fazer para inviabilizar a implementação do ponto 6
a) e b) do Programa do MFA. Aliar-se-iam inclusive a potências
estrangeiras e às respectivas agências de espionagem (EUA, RU/GB, RFA).
Antecedentes
O Partido Socialista ganha as
eleições de 1975
para a Assembleia Constituinte, as primeiras eleições livres dos
últimos 50 anos e com uma participação eleitoral excepcional e sem
incidentes de maior, dando a este 38% e 116 eleitos, o Partido Popular
Democrata - PPD obtém 26,5% e 81 eleitos, o Partido Comunista Português
obtém 12,5% e 30 eleitos, o CDS - Centro Democrático Social obtêm 7,6% e
e 16 eleitos, MDP/CDE - Movimento Democrático Português - Comissão
Democrática Eleitoral obtêm 4,14% e 5 eleitos, UDP União Democrática
Popular obtém 0,79% e 1 eleito e a
Associação para a Defesa dos Interesses de Macau (ADIM; representava os interesses de
Macau e estava conotada com o
CDS) obtém 0,3% e 1 eleito.
Uma manifestação de trabalhadores da construção civil, realizada a
11 de novembro cerca a Assembleia Constituinte, impedindo a saída dos deputados constituintes e do Primeiro-Ministro do
Palácio de S. Bento, após 36 horas e no dia 13 de novembro o almirante
Pinheiro de Azevedo é obrigado a ceder às reivindicações dos operários que exigiam aumentos salariais.
Em 16 de novembro é realizada uma manifestação de trabalhadores da cintura industrial de
Lisboa e das
Unidades Colectivas de Produção alentejanas no
Terreiro do Paço, em Lisboa, de apoio ao "
Poder Popular", nesse dia vários dirigentes e deputados do PS, PPD e CDS estão no
Porto, correndo rumores que a Assembleia Constituinte pode vir a ser transferida para aquela cidade.
O
VI Governo Provisório,
no dia 20 de novembro, auto-suspende-se enquanto não lhe forem dadas
garantias para poder governar, nesse dia é realizada uma manifestação em
frente ao
Palácio de Belém a favor do "
Poder Popular",
Costa Gomes fala com os manifestantes, afirmando ser indispensável evitar uma guerra civil.
No dia 21 de novembro, o
Conselho da Revolução destitui o general
Otelo Saraiva de Carvalho do comando da
Região Militar de Lisboa e substitui-o pelo capitão
Vasco Lourenço ligado à linha moderada, dois dias depois é realizado em Lisboa um comício do PS, em apoio ao VI Governo Provisório, na
Alameda D. Afonso Henriques, o mesmo conta com milhares de pessoas. No dia seguinte, em
24 de novembro, os populares de
Rio Maior e os agricultores associados da
CAP (
Confederação dos Agricultores de Portugal), na altura conotados com a direita
tradicional e
patriótica, cortam as estradas de acesso a
Lisboa, separando o
Norte de Portugal e o Sul.
O Golpe
No dia 25 de novembro:
- na sequência de uma decisão do General Morais da Silva, Chefe do Estado Maior das Forças Armadas, que dias antes tinha mandado passar à disponibilidade cerca de 1000 camaradas de armas de Tancos, pára-quedistas da Base Escola de Tancos
ocupam o Comando da Região Aérea de Monsanto, Escola Militar da Força
Aérea e mais cinco bases aéreas e detêm o tenente-coronel Aníbal Pinho Freire e exigem a demissão de Morais da Silva;
- este actos são considerados pelos militares ligados ao Grupo dos Nove
como o indício de que poderia estar em preparação um golpe de estado
vindo de sectores mais radicais, da esquerda. Esses militares apoiados
pelos partidos políticos moderados como PS e o PPD e depois do Presidente da República, General Francisco da Costa Gomes
ter obtido por parte do PCP a confirmação de que não convocaria os seus
militantes e apoiantes para qualquer acção de rua, decidem então
intervir militarmente para controlar o país;
- o Regimento de Artilharia de Lisboa (RALIS), conotado com a Esquerda Militar, toma posições no aeroporto de Lisboa, portagem de Lisboa A1 e Depósito de Material de Guerra de Beirolas;
- forças da Escola Prática de Administração Militar ocupam a RTP e a PM controla a Emissora Nacional,
as duas Unidades militares eram conotados respectivamente com a
esquerda revolucionária e com a referida Esquerda Militar
('gonçalvistas') e com a Esquerda Militar Radical ('otelistas').
- O Regimento de Comandos da Amadora, conotada com os moderados, com a Direita Militar ('spinolistas' e outros sectores conservadores e ultra-conservadores militares, e identificados com os partidos da Direita política
parlamentar, a Igreja e sectores da Extrema-Direita) e com o Centro
Militar ('melo-antunistas' ou 'moderados', identificados com o PS e o
'grupo do Florida'), cerca o Emissor de Monsanto, ocupado pelos para-quedistas, e a emissão da RTP é transferida para o Porto;
- Mário Soares, Jorge Campinos e Mário Sottomayor Cardia,
da Comissão Permanente do PS, no seguimento de um plano
contra-revolucionário previamente estabelecido, saem clandestinamente de
Lisboa, na tarde do dia 25, e seguem para o Porto, onde se apresentam
ao moderado Pires Veloso, no Quartel da Região Militar Norte, através do General piloto-aviador José Lemos Ferreira, que teria oferecido resistência ao seu comandante, o brigadeiro graduado Eurico de Deus Corvacho;
- O Presidente da República decreta o estado de sitio na área da Região Militar de Lisboa, e teve um papel determinante na contenção dos extremos;
- o Tenente-Coronel António Ramalho Eanes,
adjunto de Vasco Lourenço e futuro presidente da republica, ilude
pressões dos militares da extrema-direita que o incitam a mandar
bombardear unidades;
- Vasco Lourenço dá voz de prisão a Diniz de Almeida, Campos Andrada, Cuco Rosa e Mário Tomé, todos militares conotados forças políticas de esquerda revolucionária, sendo o último inclusivamente filiado na UDP;
diversos oficiais ditos 'moderados' estavam então conotados com o PS
(com o qual conspiraram na preparação do plano e das operações que
desembocaram no '25 de Novembro de 1975') e o PPD;
- o "Grupo dos Nove", vanguarda de todas as forças políticas e
militares do Centro e da Direita (parlamentar e extra-parlamentar) e os
seus aliados controlam a situação.
- Jaime Neves com uma sua força dos Comandos da Amadora, ligados aos moderados, atacam o Regimento da Polícia Militar da Ajuda, unidade militar tida como próxima das forças políticas de esquerda revolucionária, após a rendição o resultado são 3 mortos;
- prisões dos militares revoltosos;
- forças das Regiões Militares do Norte e Centro deslocam-se para Lisboa;
- Melo Antunes declara na RTP que o PCP: "é indispensável à democracia", afastando as veleidades da direita saudosista, que tendo um plano de tomada de poder, se colou ao "Grupo dos Nove".
- os Generais Carlos Fabião
e Otelo Saraiva de Carvalho são destituídos, respectivamente, dos
cargos de Chefe de Estado Maior do Exército e de Comandante do COPCON;
- Ramalho Eanes é nomeado Chefe de Estado Maior do Exército em substituição de Carlos Fabião e graduado em General. O COPCON é integrado no Estado Maior Geral das Forças Armadas.
- por decisão do Conselho de Ministros a Rádio Renascença é devolvida à Igreja Católica;
- são enviadas para a prisão de Custóias algumas dezenas de militares detidos na sequência dos acontecimentos do 25 de novembro;
- Costa Gomes, Presidente da República, decreta o estado de sítio parcial na região abrangida pela Região Militar de Lisboa.
Acalmia
A 28 de novembro, o VI Governo Provisório retoma as suas funções e é
suspensa a publicação dos jornais estatizados; no dia seguinte, em
conferência de imprensa,
Sá Carneiro acusa o PCP de ser responsável pela insubordinação militar verificada e o
PS tem idêntica atitude.
É levantado o estado de sítio em Lisboa a
1 de dezembro e, no dia seguinte, na Assembleia Constituinte, o
PS, PPD e
CDS acusam o PCP de estar envolvido nos acontecimentos de 25 de novembro.
Em conferência de imprensa, a
4 de dezembro,
Mário Soares acusa o PCP de ter participado activamente no 25 de
novembro, utilizando a extrema-esquerda como ponta-de-lança e critica o
PPD por "
anti-comunismo retrógrado" ao pretender o afastamento do
PCP, como condição da sua permanência no Governo, nesse mesmo dia o PS, a
par do PPD e CDS defendem a revisão do "
Pacto MFA-Partidos".
O PCP realiza, em 7 de dezembro, um comício no
Campo Pequeno,
Álvaro Cunhal reconhece a derrota sofrida pela esquerda revolucionária, e apela à "
unidade das forças interessadas na salvaguarda das liberdades, da democracia e da revolução".
A
1 de janeiro de
1976 a
GNR
intervém, junto à prisão de Custóias, para dispersar a manifestação de
solidariedade com os militares presos após o 25 de novembro, de que
resultam quatro mortos e seis feridos.
Otelo Saraiva de Carvalho é preso, em
19 de janeiro,
após a divulgação do Relatório Preliminar dos
acontecimentos de 25 de novembro, porque, alegadamente, estaria implicado
no possível golpe militar de esquerda.
É realizada uma grande manifestação popular, no dia
20 de fevereiro, em Lisboa, pela libertação dos militares presos em consequência dos acontecimentos de 25 de novembro.
No dia
3 de março de
1976, Otelo Saraiva de Carvalho, é libertado e passa ao regime de residência fixa.