Algo muito estranho está a acontecer com os sismos que abalam a Terra
Eventos sísmicos devastadores estão a ocorrer longe das
linhas de falha entre placas tectónicas - e não há uma forma fácil de
prever quando vão acontecer ou que locais vão atingir.
Os terramotos que periodicamente atingem o planeta, tradicionalmente
associados aos limites das placas tectónicas, estão a acontecer de forma
cada vez mais imprevisível, e afastados da zonas limites das placas tectónicas, como seria expectável.
A imprevisibilidade do local de ocorrência e do potencial de
destruição, numa era em que é suposto a ciência ter uma maior
compreensão da origem dos eventos sísmicos e maior capacidade de
antecipação, é desconcertante, explica a BBC Science Focus.
Éric Calais, professor da École Normale Supérieure, em Paris, e Jean François Ritz, investigador do Laboratório de Geociências do CNRS, em Montpellier, estão na linha da frente dos esforços para entender os sismos intraplaca, que ocorrem no interior das placas tectónicas.
Este fenómeno é bastante menos compreendido e
significativamente mais difícil de prever em comparação com os seus
homólogos interplaca, que ocorrem nos limites das placas tectónicas.
Os terramotos intraplaca, embora raros, representam uma ameaça significativa devido à sua natureza imprevisível e ao potencial de danos substanciais em regiões tradicionalmente consideradas geologicamente estáveis.
Ocorrências históricas, como o devastador terramoto de Bhuj em 2001 na Índia, que matou cerca de 20.000 pessoas, e o terramoto de Charleston em 1886
nos EUA, sublinham o potencial de perda massiva de vidas e danos
materiais, mesmo em áreas não habitualmente associadas a atividade
sísmica.
Estes sismos, que ocorrem devido à acumulação e libertação súbita de tensão ao longo de falhas geológicas no interior da placa, podem ter uma origem remota em eventos aparentemente inofensivos, como ruturas causadas por uma pressão equivalente a um aperto de mão.
Ao contrário dos sismos nas fronteiras das placas, onde a acumulação
de tensão é monitorizada e de certa forma previsível, as falhas
intraplaca são frequentemente desconhecidas até que ocorram ruturas, tornando virtualmente impossível prever quando ou onde o próximo evento vai ocorrer.
Os mecanismos que desencadeiam estes sismos podem
variar - de processos naturais como a fusão de glaciares e erosão de
cadeias montanhosas, até atividades humanas como a mineração.
Em estudos recentes, Calais e Ritz focaram-se em compreender os gatilhos por trás dos terramotos intraplaca, como o terramoto de Le Teil em 2019
em França, que os investigadores acreditam ter sido induzido pelo
derretimento de uma calote polar e eventualmente agravado por atividade
humana nas pedreiras locais.
Um sismo intraplaca atingiu a cidade norte-americana de Charleston em 1886, matando 60 pessoas
Segundo os dois investigadores, as alterações climáticas e a
atividade humana em pontos chave do sistema de placas tectónicas pode
aumentar a frequência dos terramotos intraplaca - com um impacto cada vez maior nas populações, especialmente à medida que a urbanização aumenta em áreas de risco.
Cidades como Basileia, na Suíça, e Charleston, nos EUA, agora com populações significativamente maiores, que vivem em construções mais vulneráveis em comparação com as que existiam na altura em que alguns sismo históricos ocorreram, têm um potencial aumentado de desastre.
Assim, sublinham os investigadores, à medida que o planeta continua a
aquecer, compreender a ligação entre as mudanças climáticas e a
atividade sísmica torna-se cada vez mais crucial para proteger as futuras gerações da fúria repentina de um qualquer evento sísmico num local inesperado.
in ZAP