Rafael Sanzio, Autorretrato
Urbino era então capital do ducado do mesmo nome e seu pai, Giovanni Santi, pintor de poucos méritos mas homem culto e bem relacionado na corte do duque Federico da Montefeltro. Transmitiu ao filho, de precoce talento, o amor pela pintura e as primeiras lições do ofício. O duque, personificação do ideal renascentista do príncipe culto, encorajara todas as formas artísticas e transformara Urbino em centro cultural, a que foram atraídos homens como
Donato Bramante,
Piero della Francesca e
Leone Battista Alberti.
Rafael era filho de
Giovanni Santi,
poeta (escreveu uma
Crónica famosa, em rima) e também pintor da corte de
Mântua. Aquando do nascimento de Rafael, ele dirigia um famoso estúdio em Urbino. Giovanni ensinou o seu filho a pintar e o introduziu na corte humanista de Urbino, que, no final do
século XV, havia se tornado um dos mais ativos centros culturais da Itália, sob a regência de
Federico da Montefeltro, falecido sete meses antes do nascimento de Rafael. Lá, Rafael pode conhecer os trabalhos de
Paolo Uccello,
Luca Signorelli, e
Melozzo de Forlì. Precoce, aos dezassete anos (em
1500) Rafael já era considerado um mestre.
De acordo com
Giorgio Vasari, Rafael foi levado pelo pai aos onze anos para ser aprendiz de
Pietro Perugino, em
Perúgia, mas esta informação é discutida por autoridades no assunto. É de consenso geral que Rafael estava na
Úmbria a partir de
1492,
ano do falecimento de seu pai
. Com Perugino, Rafael aprendeu a técnica do
afresco ou pintura mural.
Em sua primeira obra de realce,
O casamento da Virgem (
1504), a influência de Perugino evidencia-se na perspectiva e na relação proporcional entre as figuras, de um doce lirismo, e a arquitetura. A disposição das figuras é, no entanto, mais informal e animada que a do mestre.
Sob a influência sobretudo da obra de Da Vinci, absorveu a estética renascentista e executou diversas
Madonas, entre as quais a
Madona Esterházy e
A Bela Jardineira. Fez uso das grandes inovações introduzidas na pintura do
Renascimento, e de Leonardo da Vinci, a partir de
1480: o
chiaroscuro (claro-escuro), contraste de luz e sombra que empregou com moderação, e o
sfumato (esfumado), sombreado levemente esbatido, em vez de traços, para delinear as formas.
Em Florença, Rafael tornou-se amigo de vários pintores locais, destacando-se
Fra Bartolomeo, um proponente do idealismo renascentista. A influência de Fra Bartolomeo levou-o a abandonar o estilo suave e gracioso de Perugino e abraçar a grandiosidade e formas mais poderosas. Entretanto, a maior influência sobre a obra de Rafael durante seu período florentino veio de Leonardo da Vinci e suas composições, figuras e gestuais, bem como suas técnicas inovadoras antes citadas
.
Na segunda metade de
1508, o
Papa Júlio II, encorajado por
Donato Bramante, amigo e parente distante de Rafael e arquiteto do
Vaticano, contratou os serviços do pintor. Aos 25 anos, Rafael ainda estava forjando seu estilo. Contudo logo conquistou a fama e os favores do papa. Ele começou a ser chamado de o Príncipe dos Pintores. Nos 12 anos seguintes, Rafael nunca deixou Roma que passou a ser a sua segunda nação. Trabalhou principalmente para Júlio II e seu sucessor,
Leão X (filho de
Lorenzo de Medici). Ao final do ano de 1508, ele começou a decoração dos apartamentos de Júlio no Vaticano, os quais, na visão do papa, eram destinados a glorificar o poder da
Igreja Romana através da justificação do
Humanismo e do
Neoplatonismo. Uma série de obras-primas, como a
Disputa (ou
Discussão do Santíssimo Sacramento) e a
Escola de Atenas, pintados na
Stanza della Segnatura, tornou-o o artista mais procurado da cidade.
Nos doze anos em que permaneceu nessa cidade incumbiu-se de numerosos projetos de envergadura, nos quais deu mostras de uma imaginação variada e fértil. Dos
afrescos do
Vaticano, os mais importantes são a "Disputa" (ou "Discussão do Santíssimo Sacramento") e a "Escola de Atenas", ambos pintados na
Stanza della Segnatura. O primeiro, que mostra uma visão celestial de Deus, os seus profetas e apóstolos, a encimar um conjunto de representantes da igreja, equipara a vitória do catolicismo à afirmação da verdade. Já a "Escola de Atenas" é uma alegoria complexa do conhecimento filosófico profano. Mostra um grupo de filósofos de várias épocas históricas ao redor de
Aristóteles e
Platão, ilustrando a continuidade histórica do pensamento platónico.
Após a morte de Júlio II, em
1513, a decoração dos aposentos pontifícios prosseguiu sob o novo papa,
Leão X, até
1517. Apesar da grandiosidade do empreendimento, cujas últimas partes foram deixadas principalmente por conta de seus discípulos, Rafael, que então se tornara o pintor da moda, assumiu ao mesmo tempo numerosas outras tarefas: criou retratos, altares, cartões para tapeçarias - os chamados
Cartões de Rafael, cenários teatrais e projetos arquitetónicos de construções profanas e igrejas como a de
Sant'Eligio degli Orefici. Tal era o seu prestígio que, segundo o biógrafo
Giorgio Vasari, Leão X chegou a pensar em fazê-lo cardeal.
Rafael continuou o trabalho nos quartos até
1513, sob o governo de Leão X, mas deixou as últimas seções quase que inteiramente sob cuidado de seus pupilos. Nesse meio tempo, ele realizou outras tarefas como decorações sacras e seculares para vários prédios, retratos, altares, design para pratos e até trabalhos cenográficos.
Alguns de seus trabalhos mais famosos desse período nasceram da amizade com que mantinha com um rico banqueiro de Siena, Agostino Chigi, que lhe encomendou o
afresco de
Galateia para sua
Villa Farnesina e as
Sibilas na igreja de Santa Maria della Pace, juntamente com o projeto e a decoração da Capela de Chigi na igreja de Santa Maria del Popolo, em 1513.
Em
1514, com a morte de Bramante, Rafael foi nomeado para suceder-lhe como arquiteto do Vaticano e assumiu as obras em curso na
Basílica de São Pedro, onde substituiu a planta em
cruz grega, ou radial, por outra mais simples, em
cruz latina, ou longitudinal. Sucedeu também a Bramante na decoração das
loggias (galerias) do Vaticano, aí realizando composições de lírica simplicidade que pareciam contrabalançar a aterradora grandeza da
capela Sistina pintada por
Miguel Ângelo.
Competente
pesquisador interessado na
antiguidade clássica, Rafael foi designado, em
1515, para supervisionar a preservação de preciosas inscrições latinas em
mármore. Dois anos depois, foi nomeado encarregado geral de todas as antiguidades romanas, pelo que executou um mapa arqueológico da cidade. Fez um exame detalhado da estrutura e dos elementos arquitetónicos do
Panteão, como ninguém havia feito até aquele momento. A sua última obra, a "Transfiguração", encomendada em
1517, desvia-se da serenidade típica de seu estilo para prefigurar coordenadas do novo mundo turbulento - o da expressão barroca.
Em consequência da profundidade filosófica de muitos de seus trabalhos, a reputação de humanista e pensador neoplatónico de Rafael implantou-se em Roma. Entre seus amigos havia respeitados homens, como Castiglione e Pietro Aretino, além de muitos artistas. Em
1519, ele projetou os cenários para a comédia
I suppositi, de Ludovico Ariosto. Coberto de honrarias, Rafael morreu em Roma em
6 de abril de
1520.