sábado, novembro 16, 2024
Paul Hindemith nasceu há 129 anos
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Marcadores: Alemanha, modernismo, música, Paul Hindemith, Sonata for Oboe and Piano
quinta-feira, novembro 14, 2024
Amadeo de Souza-Cardoso nasceu há 137 anos
Estuda no Liceu Nacional de Amarante e mais tarde em Coimbra. Em 1905 ingressa no curso preparatório de desenho na Academia Real de Belas-Artes, em Lisboa; e em novembro do ano seguinte (no dia em que celebra o seu 19º aniversário), parte para Paris, instalando-se no bairro de Montparnasse, famoso ponto de encontro de intelectuais e artistas, onde irá viver todos os anos de permanência nessa cidade (1907 – 1914). Ao longo desses oito anos regressará, no entanto, diversas vezes a Portugal, para estadias mais ou menos breves.
Estabelece contacto com outros artistas portugueses a residir em Paris, entre os quais Francisco Smith, Eduardo Viana e Emmerico Nunes. Frequenta os ateliês de Godefroy e Freynet com o intuito de preparar a admissão ao curso de arquitetura, projeto que abraça, em parte para responder às expectativas familiares, mas que acaba por abandonar. Publica caricaturas em periódicos portugueses como O Primeiro de Janeiro (1907) e a Ilustração Popular (1908 – 1909).
O início da sua atividade como pintor data provavelmente de 1907. No ano seguinte conhece Lucie Meynardi Pecetto, com quem viria a casar-se sete anos mais tarde. Em 1909 frequenta as aulas do pintor Anglada-Camarasa na Académie Vitti e mais tarde as Academias Livres.
No dia 5 de março de 1911 Modigliani e Amadeo inauguram uma exposição no ateliê do pintor português, perto do Quai d'Orsay, cujo livro de honra é assinado por Picasso, Apollinaire, Max Jacob e Derain; e no mês seguinte Amadeo participa pela primeira vez numa grande mostra internacional, o XXVII Salon des Independents, exposição determinante e que dá grande visibilidade ao cubismo. Nesse mesmo ano conhece Sonia e Robert Delaunay e, através deles, Apollinaire, Picabia, Chagall, Boccioni, Klee, Franz Marc e Auguste Macke.
Em 1912 publica o álbum XX Dessins, onde reúne desenhos desse ano e do anterior que terão grande divulgação na imprensa francesa e portuguesa; participa no X Salon d’Automne (Grand Palais), encerrando o seu curto ciclo expositivo em Paris. É um dos artistas representados no famoso Armory Show (International Exhibition of Modern Art), Nova Iorque, 1913, exposição que marca a grande viragem modernista no meio artístico norte-americano: atento ao panorama artístico alemão, expõe também em Berlim, no Erster Deutscher Herbstsalon (Primeiro Salão de Outono Alemão), organizado pela Galeria Der Sturm, em conjunto com artistas maioritariamente associados à "novíssima pintura", dos futuristas italianos ao grupo do Blaue Reiter e ao casal Delaunay. Em 1914 tem trabalhos expostos em Londres e nos Estados Unidos da América (Exhibition of Painting and Sculpture in the "Modern Spirit", Milwaukee Art Society). O seu espírito instável fá-lo passar por "momentos torturantes de ansiedade".
Durante uma viagem a Barcelona toma conhecimento do início da 1ª Guerra Mundial (1914-1918). Regressa a Portugal e, a 26 de setembro, casa-se com Lucie Pecetto, fixando residência na Casa do Ribeiro, em Manhufe, que o seu pai mandara construir. No ano seguinte reencontra Sonia e Robert Delaunay, que entretanto haviam fixado residência em Vila do Conde. Amadeo ocupa o seu tempo entre a pintura, a caça, os passeios a cavalo, mas o seu isolamento começa a tornar-se difícil de suportar e faz planos para regressar a Paris. 1916 fica marcado por várias tentativas falhadas de participação em exposições internacionais; nesse mesmo ano publica o álbum 12 Reproductions e realiza exposições individuais no Porto (Salão de Festas do Jardim Passos Manuel) e em Lisboa (Liga Naval, Palácio do Calhariz). O acolhimento crítico, "num país pouco acostumado a exposições deste género, em que o modelo dos salons ainda vigorava, foi sobretudo marcado pela surpresa"; a articulação da montagem, "as obras exibidas e a internacionalização do artista português causaram espanto generalizado". Durante a estadia em Lisboa convive com Almada Negreiros e com membros do grupo Orpheu.
Em 1917 envolve-se em projetos editoriais com Almada Negreiros, publica dois trabalhos na revista Portugal Futurista (Farol; Cabeça Negra), mas acima de tudo trabalha intensamente, aprofundando o seu universo pictórico, que expande em novas direções. Anseia no entanto pelo regresso a Paris, o que não viria a acontecer. No ano seguinte contrai uma doença de pele que lhe afeta o rosto e as mãos e o impede de trabalhar. Abandona Manhufe e refugia-se em Espinho, na tentativa vã de escapar à epidemia de gripe espanhola que se espalha rapidamente e à qual viria a sucumbir, em 25 de outubro desse mesmo ano.
De personalidade algo paradoxal, Amadeo era "convictamente monárquico" e poderá ter pertencido – este facto não é mencionado nas publicações mais importantes sobre Amadeo –, a um movimento conhecido por Grupo do Tavares, que incluiria, entre outros, Eduardo Viana, Almada Negreiros e Santa Rita.
Em 1910 Amadeo estuda com Anglada Camarasa, "pintor espanhol de colorido vibrante mas também de algum simbolismo estilizado", que impulsiona esse momento de crescimento; no ano seguinte a sua obra começa a revelar verdadeiros sinais de maturidade, num "estilo precioso e mundano […], algo decorativo no seu grafismo estilizado e no seu colorido espetacular, onde se revela a influência […] do orientalismo luxuoso dos Ballets Russes de Diaghilev", esse "verdadeiro fenómeno pluridisciplinar que, com as suas danças exóticas e exuberantes […] transfigurou a paisagem mental de todos os artistas".
Marcado por uma multiplicidade de referências – da longa tradição erudita da arte Europeia à intensidade hierática da arte primitiva Africana; da linearidade sofisticada das gravuras e aguarelas japonesas às ruturas formais e concetuais do cubismo e do futurismo –, para Amadeo, neste momento de consolidação de ideias é igualmente determinante a amizade e conivência de artistas como Modigliani ou Brancusi. É neste quadro de referências que surgem pinturas como Saut du Lapin (Salto do Coelho) ou Os galgos, 1911, e o álbum de 20 desenhos que irá publicar no ano seguinte, com o seu pendor marcadamente decorativo "em que assomam ainda ecos do Jugenstil muniquense", e onde procura afirmar a sua identidade, gráfica e pessoal, revendo-se em memórias ou fantasias e projetando a "construção de alguns cenários mais adequados à sua mitologia pessoal. […] Amadeo é um cavaleiro veloz, um caçador com galgos e falcões, que atravessa a galope as suas montanhas em Manhufe […] até chegar a sua casa, que se perspetiva como um castelo no cimo de uma hierarquia de colinas" (ver, por exemplo, Les Faucons, 1912).
Paralelamente, vemo-lo trabalhar a paisagem em obras onde o sentido predominantemente linear cede o lugar a um outro tipo de plasticidade, numa reaproximação à sensibilidade impressionista que evolui rapidamente para obras totalmente abstratas: "Entre um jogo geométrico de relevos (de lembranças cézanianas) e um ritmo colorido de massas de arvoredo, Amadeo avança para soluções de progressiva indiferenciação, como se essas massas densas perdessem a sua referência à realidade, para se transformarem em exclusivas soluções formais". Irá radicalizar a sua abordagem, aproximando-se de forma mais explícita da decomposição cubista (como na famosa Cozinha da Casa de Manhufe, 1913), que noutras pinturas será tratada através de um cromatismo aberto mais próximo de Delaunay (veja-se, por exemplo, Título desconhecido – Les Cavaliers, c. 1913); e tematicamente oscila entre caminhos diversos, com as alusões figurativas – à figura humana, à natureza-morta ou à paisagem –, a alternar com obras estritamente abstratas como, por exemplo, Sem título, 1913.
Em 1914 expõe trabalhos em Londres e Berlim, o que indicia um desejo de encontrar novas vias de internacionalização. A participação no 1º Salão de Outono (Herbstsalon) organizado pela Galeria Der Sturm, é particularmente significativa da sua ligação ao polo de difusão berlinense. "O dramatismo e a intensa espiritualidade que forma a personalidade do artista, não podem ser excluídos do seu envolvimento com o movimento expressionista e com as sensibilidades estéticas que com ele se cruzaram […]. Coincidindo sensivelmente com a cronologia da sua passagem expositiva pela Alemanha, Amadeo desenvolveu várias séries de trabalhos […] de intenso diálogo com os conteúdos, formais e teóricos, dos expressionismos do seu tempo" (é o que acontece de forma explícita com um conjunto de cabeças, ou máscaras, datado de 1914, que remete, também, para as explorações pioneiras de Picasso em torno das máscaras africanas). E será esta, afinal, uma das principais linhas unificadoras da sua obra plurifacetada. Mesmo quando os caminhos formais apontam noutras direções, "a sua alma de expressionista, esquiva a classificações e a modelos rígidos, individualista, inquieta e dissonante […] sustenta o desenvolvimento do seu trabalho", atravessando todas as fases, desde as primeiras paisagens até ao seu modo final.
O diálogo com as vanguardas do início do Século XX será o grande motor por detrás da obra de Amadeo, mas há fatores determinantes de outra de outra ordem e que se prendem com um universo temático marcado por referentes pessoais. Numa carta dirigida à sua mãe, em 1908, o pintor lamentava a ausência de "um forte meio da arte" na sua terra natal, mas queixava-se igualmente da "atmosfera parda" ou o "sol anémico" de Paris, que contrapunha ao seu "Portugal prodigioso, país supremo para artistas". Segundo Helena Freitas, "o alimento espiritual de Amadeo é também a iconografia da sua terra e das suas tipologias". Na sua pintura encontramos alusões a essa luz diferente; ao sol, às montanhas, às azenhas e moinhos; aos alvos das barracas de feira; às canções, bonecos e figuras populares… (veja-se, por exemplo, Canção Popular - a Russa e o Figaro, c. 1916).
Os últimos trabalhos de Amadeo, datáveis de 1917, "são o núcleo mais consistente e poderoso da sua afirmação como artista". Nestas obras reforçam-se as associações inesperadas, alógicas, "ao mesmo tempo que se adensam e complexificam os processos técnicos, na espessura e materialidade das tintas misturadas com areias e outros agregantes, nas colagens, nos trompe-l’oeils e suas simulações". Partindo de um princípio gerador baseado na fragmentação cubista, irá integrar na pintura elementos iconográficos típicos desse movimento (dos instrumentos musicais à palavra escrita), fragmentos apropriados da vida real (madeira, espelhos, ganchos de cabelo, etc.), representações de partes do corpo ou de produtos contemporâneos produzidos industrialmente (como uma máquina registadora), e formas totalmente abstratas… Essa diversidade aparentemente incongruente é gerida de forma magistral, "num jogo combinatório poderoso e de uma energia plástica rara" que coloca essas obras a par das pinturas mais notáveis suas contemporâneas.
Embora a "notoriedade do seu percurso expositivo e […] integração no contexto internacional dos diálogos de vanguarda" o coloquem no centro da revolução que atravessou o mundo das artes nas primeiras décadas do século XX, a origem de Amadeo num país pequeno e periférico, a sua morte prematura e inconstância estilística, "camaleónica", criaram sérias dificuldades ao seu reconhecimento. Mesmo em Portugal, depois da sua morte, ocorreu um longo hiato até que a sua obra merecesse a devida atenção; e apenas em 1983, com a inauguração do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, se tornou finalmente possível um acesso real e permanente a obras de referência como Título desconhecido (Entrada), ou Título desconhecido (Coty), 1917.
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sábado, novembro 09, 2024
Poema de aniversariante de hoje...
Tão velho estou como árvore no inverno,
vulcão sufocado, pássaro sonolento.
Tão velho estou, de pálpebras baixas,
acostumado apenas ao som das músicas,
à forma das letras.
Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético
dos provisórios dias do mundo:
Mas há um sol eterno, eterno e brando
e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir.
Desculpai-me esta face, que se fez resignada:
já não é a minha, mas a do tempo,
com seus muitos episódios.
Desculpai-me não ser bem eu:
mas um fantasma de tudo.
Recebereis em mim muitos mil anos, é certo,
com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras.
Desculpai-me viver ainda:
que os destroços, mesmo os da maior glória,
são na verdade só destroços, destroços.
in Poemas (1958) - Cecília Meireles
Postado por Fernando Martins às 12:30 0 bocas
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Hojeé dia de celebrar a poesia de Cecília Meireles...
Fio
No fio da respiração,
rola a minha vida monótona,
rola o peso do meu coração.
Tu não vês o jogo perdendo-se
como as palavras de uma canção.
Passas longe, entre nuvens rápidas,
com tantas estrelas na mão...
— Para que serve o fio trêmulo
em que rola o meu coração?
Cecília Meireles
Postado por Pedro Luna às 06:00 0 bocas
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A gripe espanhola levou Guillaume Apollinaire há 106 anos...
Dans le crépuscule fané
Où plusieurs amours se bousculent
Ton souvenir gît enchaîné
Loin de nos ombres qui reculent
Ô mains qu'enchaîne la mémoire
Et brûlantes comme un bûcher
Où le dernier des phénix noire
Perfection vient se jucher
La chaîne s'use maille à maille
Ton souvenir riant de nous
S'enfuir l'entends-tu qui nous raille
Et je retombe à tes genoux
Le soir tombe et dans le jardin
Elles racontent des histoires
À la nuit qui non sans dédain
Répand leurs chevelures noires
Petits enfants petits enfants
Vos ailes se sont envolées
Mais rose toi qui te défends
Perds tes odeurs inégalées
Car voici l'heure du larcin
De plumes de fleurs et de tresses
Cueillez le jet d'eau du bassin
Dont les roses sont les maîtresses
Ô ma jeunesse abandonnée
Comme une guirlande fanée
Voici que s'en vient la saison
Et des dédains et du soupçon
Le paysage est fait de toiles
Il coule un faux fleuve de sang
Et sous l'arbre fleuri d'étoiles
Un clown est l'unique passant
Un froid rayon poudroie et joue
Sur les décors et sur ta joue
Un coup de revolver un cri
Dans l'ombre un portrait a souri
La vitre du cadre est brisée
Un air qu'on ne peut définir
Hésite entre son et pensée
Entre avenir et souvenir
Ô ma jeunesse abandonnée
Comme une guirlande fanée
Voici que s'en vient la saison
Des regrets et de la raison
Postado por Fernando Martins às 01:06 0 bocas
Marcadores: cubismo, França, gripe espanhola, Guillaume Apollinaire, modernismo, poesia, Simbolismo, Surrealismo
A poetisa Cecília Meireles morreu há sessenta anos...
Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão ,
Quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e não guardo o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Cecília Meireles
Postado por Fernando Martins às 00:06 0 bocas
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sexta-feira, novembro 01, 2024
Ezra Pound morreu há 52 anos...
A Virginal
Ezra Pound
Postado por Fernando Martins às 00:52 0 bocas
Marcadores: Ezra Pound, modernismo, poesia
quinta-feira, outubro 31, 2024
Santa-Rita Pintor nasceu há 135 anos...
Guilherme Augusto Cau da Costa de Santa Rita ou Guilherme de Santa-Rita (mais tarde passaria a chamar-se apenas Santa-Rita Pintor; Lisboa, 31 de outubro de 1889 – Lisboa, 29 de abril de 1918) foi um pintor português.
Figura mítica da primeira geração de pintores modernistas portugueses, a sua obra permanece em grande parte envolta em mistério. Nunca expôs em Portugal, mas esteve vários anos em Paris garantindo, com Amadeo de Souza-Cardoso, a primeira ligação efetiva às vanguardas históricas do início do século XX; e foi o mais ativo impulsionador do breve movimento futurista português. Morreu prematuramente, antes mesmo de completar 29 anos de idade, vitimado por tuberculose pulmonar, deixando ordem expressa para que todos os seus trabalhos fossem queimados; da sua obra da maturidade resta uma única pintura e um conjunto de reproduções rudimentares, a preto e branco, nas revistas Orpheu (1915) e Portugal Futurista (1917).
Filho de Guilherme Augusto de Santa Rita (1858–1905) e de Palmira Cau da Costa. Teve dois irmãos: Augusto de Santa Rita (1888–1956), escritor modernista, e Mário de Santa Rita (1890–1909), poeta.
Formado pela Academia Real de Belas-Artes, parte para Paris como bolseiro do Estado em abril de 1910. Monárquico convicto, perde a bolsa dois anos mais tarde devido a um conflito com o embaixador republicano João Chagas. Em Paris priva com Mário de Sá-Carneiro (que se inspirará nele para um personagem de A confissão de Lúcio, 1914); contacta com círculos artísticos de vanguarda, nomeadamente com Marinetti, assistindo às suas conferências na Galerie Bernheim-Jeune. O impacto de Marinetti e do seu manifesto futurista é reforçado, em 1912, pela visita à exposição dos pintores futuristas italianos nessa mesma galeria, levando-o a aderir ao movimento. Nesse mesmo ano terá exposto, no Salon de Indépendents parisiense, o quadro O Ruído num Quarto sem Móveis, cujo título, por si só, "dava o mote futurista dos seus interesses".
De personalidade paradoxal, Santa-Rita era, segundo Sá-Carneiro, "um tipo fantástico", "ultramonárquico", "intolerável", "insuportavelmente vaidoso". Regressa a Portugal em 1914, ano de eclosão da 1ª Guerra Mundial. Sensível à glorificação da máquina de Marinetti, à sua apologia de uma arte totalmente nova e diferente, em rutura com o passado retrógrado, à sua agressividade e desejo de chocar as mentes conservadoras, Santa-Rita será, a par de Mário de Sá-Carneiro, um dos principais introdutores das ideias futuristas em Portugal, tornando-se no dinamizador do embrionário movimento futurista português. Em 1916 afirmaria: "Futurista declarado em Portugal há um, que sou eu".
Um dos seus objetivos após o regresso era editar os manifestos de Marinetti, de quem se dizia mandatado para o efeito (um desejo nunca realizado); mas pretendia acima de tudo fazer a sua obra e impor-se socialmente. Em 14 de junho de 1915 participa talvez num evento de que ele, Almada Negreiros, José Pacheko e Ruy Coelho eram os promotores. Nesse «grande congresso de artistas e escritores» – de que não existem notícias na imprensa e que poderá nunca ter ocorrido –, a nova geração levantava-se em protesto «contra a modorra a que os velhos a obrigam». Ainda nesse ano participa no segundo número da Revista Orpheu, onde são reproduzidos quatro trabalhos seus. Tenta pouco depois ser ele próprio a liderar os futuros números da publicação, sendo travado por Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. Começa a preparar uma revista alternativa que pudesse controlar; em 1917 realiza esse objetivo com a publicação do primeiro e único número de Portugal Futurista. Apreendida pela polícia à porta da tipografia (devido à alegada obscenidade de alguns artigos), a revista foi o efeito tardio da "tumultuosa" apresentação do futurismo, em abril desse mesmo ano no Teatro da República, sessão que ele próprio encenou e onde contou com a colaboração ativa de Almada Negreiros, o grande protagonista do evento. Perante uma assistência não muito numerosa, composta por curiosos dos cafés «intelectuais» da Baixa e alguns estudantes, Santa-Rita participaria a partir de uma frisa (camarote quase ao nível da plateia), animando e ordenando o espetáculo, onde foram lidos textos de Almada (Ultimatum Futurista às Gerações Portuguesas do Século XX), de Valentine de Saint-Point e de Marinetti.
Dirigida oficialmente por Carlos Filipe Porfírio e tendo como editor nominal S. Ferreira, Portugal Futurista era, na realidade, obra de Santa-Rita; era ele quem orquestrava todo o processo nos bastidores. Uma fotografia sua de grande formato abria a publicação e um texto de Bettencourt Rebelo sagrava-o como "o artista que o génio da época produziu" e o "grande iniciador do movimento futurista português"; a ilustrar o texto, quatro reproduções de obras suas, entre as quais um trabalho mais antigo, Orpheu nos Infernos. "De qualquer modo, os três outros quadros reproduzidos avantajam-se às duas obras expressionistas […] de Amadeo, decerto propositadamente mal escolhidas, para evitar concorrência…".
Cabeça, circa 1910
Estojo scientífico de uma
cabeça + aparelho ocular + sobreposição dynamica visual + reflexos de
ambiente x luz (SENSIBILIDADE MECHANICA), 1914, colagem. Publicado no
nº2 da revista Orpheu, 1915
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Marcadores: futurismo, modernismo, Orpheu, pintura, Portugal Futurista, Santa-Rita Pintor
quarta-feira, outubro 30, 2024
Ezra Pound nasceu há 138 anos
Ezra Weston Loomis Pound (Hailey, 30 de outubro de 1885 - Veneza, 1 de novembro de 1972) foi um poeta, músico e crítico literário americano que, juntamente com T. S. Eliot, foi uma das maiores figuras do movimento modernista da poesia do início do século XX no seu país. Ele foi o motor de diversos movimentos modernistas, nomeadamente do Imagismo (o seu líder e principal representante) e do Vorticismo.
A Pact
I make a pact with you, Walt Whitman -
I have detested you long enough.
I come to you as a grown child
Who has had a pig-headed father;
I am old enough now to make friends.
It was you that broke the new wood,
Now is a time for carving.
We have one sap and one root -
Let there be commerce between us.
Ezra Pound
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segunda-feira, outubro 28, 2024
Francis Bacon nasceu há 115 anos
Vida e obra
Este artista irlandês de nascimento, tratou com uma extraordinária complacência alguns temas que continuam a chocar a nossa vida em grupo. As fantasias masoquistas, a pedofilia, o desmembramento de corpos, a violência masculina ligada à tensão homoerótica, as práticas de dissecação forense, a atração pela representação do corpo (um especial fascínio pelos fluidos naturais, sangue, bílis, urina, esperma, etc.) e, no geral, com tudo o que está diretamente ligado à transgressão seja relacionada com o sexo, a religião (são paradigmáticos os seus retratos do Papa Inocêncio X que efetuou a partir da obra de Diego Velázquez) ou qualquer tabu, foram as peças com as quais Bacon construiu a sua visão "modernista" do mundo.
Nasceu em 28 de outubro de 1909, em Dublin e sofria de asma. Esta debilidade irritava o seu pai, um homem rude e violento, que o costumava chicotear para o "fazer homem". Devido a isto Bacon criou um comportamento de oposição a seu pai. Uma infância difícil, que sempre o influenciou na sua arte e lhe inspirou um certo desdém por essa Irlanda da sua infância, tal como Oscar Wilde e James Joyce.
A sua primeira exposição individual na Lefevre Gallery, em 1945, provocou um choque e não foi bem recebida. Toda a gente estava farta de guerra e de horrores, só se falava da "construção da paz" e as imagens de entranhas dos quadros de Bacon, com os seus tons sanguíneos, provocaram mais repulsa do que admiração.
Como homem do seu tempo, Bacon transmitiu a ideia de que o ser humano, ao conquistar e fazer uso da sua própria liberdade, também liberta a besta que existe dentro de si. Pouca diferença faz dos animais irracionais, tanto na vida - ao levar a cabo as funções essenciais da existência como o sexo ou a defecação - como na solidão da morte; representando o homem como um pedaço de carne.
A sua obra esteve em exposição, em Serralves, em 2003.
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domingo, outubro 27, 2024
Carlos Queirós Ribeiro morreu há 75 anos...
José Carlos de Queirós Nunes Ribeiro, ou simplesmente Carlos Queirós (Lisboa, Santos-o-Velho, 5 de abril de 1907 – Paris, 27 de outubro/28 de outubro de 1949), foi um poeta português.
Sempre que leio nos jornais:
«De casa de seus pais desapar’ceu...»
Embora sejam outros os sinais,
Suponho sempre que sou eu.
Eu, verdadeiramente jovem,
Que por caminhos meus e naturais,
Do meu veleiro, que ora os outros movem,
Pudesse ser o próprio arrais.
Eu, que tentasse errado norte;
Vencido, embora, por contrário vento,
Mas desprezasse, consciente e forte,
O porto do arrependimento.
Eu, que pudesse, enfim, ser eu!
- Livre o instinto, em vez de coagido.
«De casa de seus pais desapar’ceu...»
Eu, o feliz desaparecido!
in Desaparecido (1935) - Carlos Queirós
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