Guilherme Augusto Cau da Costa de Santa Rita ou Guilherme de Santa-Rita (mais tarde passaria a chamar-se apenas Santa-Rita Pintor; Lisboa, 31 de outubro de 1889 – Lisboa, 29 de abril de 1918) foi um pintor português.
Figura mítica da primeira geração de pintores modernistas portugueses, a sua obra permanece em grande parte envolta em mistério. Nunca expôs em Portugal, mas esteve vários anos em Paris garantindo, com Amadeo de Souza-Cardoso,
a primeira ligação efetiva às vanguardas históricas do início do século
XX; e foi o mais ativo impulsionador do breve movimento futurista português. Morreu prematuramente, antes mesmo de completar 29 anos de idade, vitimado por tuberculose pulmonar,
deixando ordem expressa para que todos os seus trabalhos fossem
queimados; da sua obra da maturidade resta uma única pintura e um
conjunto de reproduções rudimentares, a preto e branco, nas revistas Orpheu (1915) e Portugal Futurista (1917).
Filho de Guilherme Augusto de Santa Rita (1858–1905) e de Palmira Cau
da Costa. Teve dois irmãos: Augusto de Santa Rita (1888–1956), escritor
modernista, e Mário de Santa Rita (1890–1909), poeta.
Formado pela Academia Real de Belas-Artes, parte para Paris como bolseiro do Estado em abril de 1910. Monárquico convicto, perde a bolsa dois anos mais tarde devido a um conflito com o embaixador republicano João Chagas. Em Paris priva com Mário de Sá-Carneiro (que se inspirará nele para um personagem de A confissão de Lúcio, 1914); contacta com círculos artísticos de vanguarda, nomeadamente com Marinetti, assistindo às suas conferências na Galerie Bernheim-Jeune. O impacto de Marinetti e do seu manifesto futurista
é reforçado, em 1912, pela visita à exposição dos pintores futuristas
italianos nessa mesma galeria, levando-o a aderir ao movimento. Nesse mesmo ano terá exposto, no Salon de Indépendents parisiense, o quadro O Ruído num Quarto sem Móveis, cujo título, por si só, "dava o mote futurista dos seus interesses".
De personalidade paradoxal, Santa-Rita era, segundo Sá-Carneiro, "um tipo fantástico", "ultramonárquico", "intolerável", "insuportavelmente vaidoso". Regressa a Portugal em 1914, ano de eclosão da 1ª Guerra Mundial.
Sensível à glorificação da máquina de Marinetti, à sua apologia de uma
arte totalmente nova e diferente, em rutura com o passado retrógrado, à
sua agressividade e desejo de chocar as mentes conservadoras,
Santa-Rita será, a par de Mário de Sá-Carneiro, um dos principais
introdutores das ideias futuristas em Portugal, tornando-se no
dinamizador do embrionário movimento futurista português. Em 1916
afirmaria: "Futurista declarado em Portugal há um, que sou eu".
Um dos seus objetivos após o regresso era editar os manifestos de
Marinetti, de quem se dizia mandatado para o efeito (um desejo nunca
realizado); mas pretendia acima de tudo fazer a sua obra e impor-se
socialmente. Em 14 de junho de 1915 participa talvez num evento de que
ele, Almada Negreiros, José Pacheko e Ruy Coelho
eram os promotores. Nesse «grande congresso de artistas e escritores» –
de que não existem notícias na imprensa e que poderá nunca ter ocorrido
–, a nova geração levantava-se em protesto «contra a modorra a que os
velhos a obrigam». Ainda nesse ano participa no segundo número da Revista Orpheu,
onde são reproduzidos quatro trabalhos seus. Tenta pouco depois ser ele
próprio a liderar os futuros números da publicação, sendo travado por
Fernando Pessoa
e Mário de Sá-Carneiro. Começa a preparar uma revista alternativa que
pudesse controlar; em 1917 realiza esse objetivo com a publicação do
primeiro e único número de Portugal Futurista.
Apreendida pela polícia à porta da tipografia (devido à alegada
obscenidade de alguns artigos), a revista foi o efeito tardio da "tumultuosa" apresentação do futurismo, em abril desse mesmo ano no Teatro da República,
sessão que ele próprio encenou e onde contou com a colaboração ativa de
Almada Negreiros, o grande protagonista do evento. Perante uma
assistência não muito numerosa, composta por curiosos dos cafés
«intelectuais» da Baixa e alguns estudantes, Santa-Rita participaria a
partir de uma frisa (camarote quase ao nível da plateia), animando e
ordenando o espetáculo, onde foram lidos textos de Almada (Ultimatum Futurista às Gerações Portuguesas do Século XX), de Valentine de Saint-Point e de Marinetti.
Dirigida oficialmente por Carlos Filipe Porfírio e tendo como editor nominal S. Ferreira, Portugal Futurista
era, na realidade, obra de Santa-Rita; era ele quem orquestrava todo o
processo nos bastidores. Uma fotografia sua de grande formato abria a
publicação e um texto de Bettencourt Rebelo sagrava-o como "o artista que o génio da época produziu" e o "grande iniciador do movimento futurista português"; a ilustrar o texto, quatro reproduções de obras suas, entre as quais um trabalho mais antigo, Orpheu nos Infernos. "De qualquer modo, os três outros quadros reproduzidos avantajam-se às duas obras expressionistas […] de Amadeo, decerto propositadamente mal escolhidas, para evitar concorrência…".
Sem nunca ter exposto em Portugal, com uma obra praticamente
desconhecida do público, Santa-Rita morre no ano seguinte vítima de
tuberculose, deixando ordens expressas à família para que todos os
trabalhos de sua autoria fossem destruídos. Desaparecido Sá-Carneiro,
que se suicidou em Paris em 1916, a morte de Santa-Rita irá ditar o
termo desse "
parêntese histórico" que foi o futurismo português.
Cabeça, circa 1910
Estojo scientífico de uma
cabeça + aparelho ocular + sobreposição dynamica visual + reflexos de
ambiente x luz (SENSIBILIDADE MECHANICA), 1914, colagem. Publicado no
nº2 da revista Orpheu, 1915