Desde a execução, telegramas soviéticos descodificados parecem
confirmar que Julius agiu como mensageiro e recrutador para os
soviéticos, mas as dúvidas em relação ao nível de envolvimento de Ethel
no trama persistem. A decisão de executar o casal foi e ainda é
controversa. Os outros espiões capturados pelo
FBI
não foram executados. O irmão de Ethel, David Greenglass, que forneceu
documentos a Julius, cumpriu 10 dos 15 anos de sua pena. Harry Gold, o
mensageiro de
Klaus Fuchs,
que forneceu informações muito mais detalhadas aos soviéticos sobre a
bomba atómica, cumpriu 15 anos. Morton Sobell, julgado juntamente com
os Rosenbergs, cumpriu 17 anos e 9 meses. Em 2008 ele admitiu que era
espião e confirmou que Julius participou ativamente em "uma
conspiração para entregar aos soviéticos informações militares e
industriais confidenciais".
Os Rosenberg
Julius Rosenberg nasceu em
12 de maio de
1918 numa família de imigrantes judeus na cidade Nova Iorque. Informações dos censos de
1920
indicam que a sua família morou no endereço 205 East 113th Street
quando Julius tinha cerca de 2 anos de idade, mas mudaram-se para o
Lower East Side quando ele tinha 11 anos.
Os seus pais trabalhavam em lojas do Lower East Side, enquanto Julius
frequentava a Escola Seward Park. Julius acabou tornando-se o líder da
Liga Jovem Comunista onde, em 1936, conheceu Ethel Greenglass, com quem
se casaria três anos depois. Ele formou-se em
engenharia elétrica no
City College de Nova Iorque, em 1939, e, no ano seguinte, passou a trabalhar para o
Exército como técnico de radar.
Ethel Greenglass nasceu em
28 de setembro de
1915
também numa família de judeus de Nova Iorque. Ela era aspirante a
atriz e cantora, mas acabou tornando-se secretária numa companhia de
navegação. Ela começou a envolver-se em disputas sindicais e ligou-se à
Liga Jovem Comunista, onde conheceu Julius. Os Rosenbergs tiveram
dois filhos, Robert e Michael, que foram adotados pelo professor e
compositor
Abel Meeropol e a sua mulher Anne após a execução dos seus pais.
De acordo com o ex-agente da
NKVD Alexander Feklisov, Julius Rosenberg foi originalmente recrutado pelo
KGB no
Dia do Trabalhador de 1942 pelo ex-espião da NKVD Semyon Semyonov. Julius foi apresentado a Semenov por Bernard Schuster, um alto oficial do
Partido Comunista dos Estados Unidos da América e contacto oficial de Earl Browder, secretário-geral do partido, no NKVD. Após Semenov ser chamado de volta a
Moscovo em 1944, os seus trabalhos foram continuados por seu aprendiz, Feklisov.
De acordo com Feklisov, Julius forneceu milhares de documentos
confidenciais da Companhia Emerson Electric, assim como um fusível de
proximidade (ou fusível VT), o mesmo utilizado para abater o avião de
Francis Gary Powers
em 1960. Sob a direção de Feklisov, Julius teria recrutado
indivíduos cooperantes da KGB, entre eles, Joel Barr, Alfred Sarant,
William Perl e Morton Sobell.
Ainda de acordo com o relato de Feklisov, Julius era suprido por Pearl com milhares de documentos do
Comité Consultivo Nacional para Aeronáutica,
incluindo uma série completa dos desenhos do P-80 Shooting Star.
Feklisov afirma que descobriu, através de Julius, que o irmão de Ethel,
David Greenglass, estava trabalhando no ultra-secreto
Projeto Manhattan no
Laboratório Nacional de Los Alamos e utilizou Julius para recruta-lo.
Durante a
Segunda Guerra Mundial, os governos da União Soviética e dos Estados Unidos fizeram parte das
Forças Aliadas contra a
Alemanha Nazi. Mesmo assim, o governo americano suspeitava das intenções de
Josef Stalin
e, dessa forma, os americanos não compartilharam informações
estratégicas com os soviéticos, especialmente no que diz respeito ao
Projeto Manhattan. Porém, os soviéticos estavam conscientes do projeto,
devido à espionagem que exerciam no governo e fizeram várias
tentativas de infiltração em suas operações na
Universidade de Berkeley.
Alguns participantes do projeto, alguns deles de alto escalão,
ofereceram voluntariamente informações secretas aos agentes soviéticos,
muitos porque tinham afinidades com o
comunismo (ou ao papel da União Soviética na guerra) e achavam que os EUA não deveriam exercer
monopólio sob as armas atómicas.
Após a guerra, o governo dos EUA continuou a proteger os seus segredos
nucleares, mas a União Soviética já era capaz de produzir suas próprias
armas atómicas em 1949. O Ocidente ficou chocado com a rapidez com
que os soviéticos foram capazes de fazer seu primeiro teste nuclear,
intitulado de "Joe 1". Em janeiro de 1950 foi descoberto que um
refugiado alemão, físico teórico trabalhando para os
britânicos
no Projeto Manhattan, Klaus Fuchs, havia passado importantes
documentos aos soviéticos durante a guerra. Através da confissão de
Fuchs, agentes dos serviços secretos dos USA e da Grã-Bretanha foram
capazes de desvendar que o seu informador, cujo nome de código era
Raymond, era Harry Gold, que foi preso em
23 de maio
de 1950. Harry Gold confessou ter obtido dados de um ex-maquinista em
Los Alamos. Não sabia o nome dele, mas sua esposa se chamava Ruth.
Assim os investigadores chegaram ao Sargento David Greenglass, que
confessou ter passado informações secretas à União Soviética. Apesar de
ter inicialmente negado qualquer envolvimento da irmã Ethel no caso,
ele afirmou que o marido dela, Julius, a convenceu a recrutar o irmão
durante uma visita a Gold em
Albuquerque,
Novo México em
1944 e que ele também havia passado informações confidenciais aos soviéticos.
O outro conspirador acusado, Morton Sobell, estava de férias na
Cidade do México quando os Rosenbergs foram presos. No seu livro
On Doing Time (1974), ele narra como tentou fugir para a
Europa sem um
passaporte, mas foi sequestrado por membros da polícia secreta mexicana e levado até a
fronteira com os EUA, onde foi preso. Oficialmente, o governo norte-americano afirmou que ele havia sido "deportado", mas em
1956
o governo mexicano afirmou que ele nunca havia sido deportado. Ele
foi julgado juntamente com os Rosenbergs sob a acusação de conspiração
para cometer espionagem.
O julgamento
O julgamento dos Rosenbergs começou em
6 de março de
1951. O juiz foi Irving Kaufman, que impôs a
pena de morte
ao casal, afirmando que o que eles haviam cometido era "pior que
assassinato". O advogado dos Rosenbergs foi Emanuel Hirsch Bloch. A
principal testemunha da acusação foi David Greenglass, que afirmou que a
irmã havia digitado notas contendo segredos nucleares dos EUA, no
apartamento do casal, em setembro de 1945. Ele também afirmou que um
rascunho que havia feito da secção transversal de uma bomba atómica de
implosão (como a "Fat Man" lançada em
Nagasaki) também havia sido entregue a Julius na mesma ocasião.
Desde o início o julgamento atraiu grande atenção dos
media, assim como o julgamento de
Alger Hiss.
Além da defesa dos Rosenberg durante o julgamento, não houve nenhuma
expressão pública de dúvida em relação à culpa deles nos
media (incluindo
media de esquerda e comunistas). A primeira rutura com a unanimidade dos
media no
caso só iria ocorrer em agosto de 1951, quando foi publicada uma
série de reportagens sobre o julgamento no jornal de esquerda
The National Guardian. Somente após a publicação dos artigos é que um comité de defesa foi formado.
Entretanto, entre o julgamento e a execução houve uma série de protestos e acusações de
anti-semitismo. Por exemplo, o vencedor do
Prémio Nobel Jean-Paul Sartre chamou o caso de "um linchamento legalizado que mancha de sangue toda uma nação". Outros, incluindo não-comunistas como
Albert Einstein e o químico e cientista atómico vencedor do Nobel,
Harold Urey, além de artistas comunistas como
Nelson Algren,
Dashiell Hammett,
Jean Cocteau,
Diego Rivera e
Frida Kahlo, protestaram contra a posição do governo dos EUA no caso, que alguns viram como a versão americana do
caso Dreyfus. Em maio de 1951,
Pablo Picasso escreveu para o jornal francês
L'Humanité: "as horas contam, os minutos contam. Não deixem este crime contra a humanidade ocorrer". O
Papa Pio XII condenou a execução. O cineasta
Fritz Lang e o dramaturgo
Bertolt Brecht também fizeram declarações contra a morte do casal.
Apesar das anotações alegadamente digitadas por Ethel conterem pouca
informação relevante para o projeto atómico soviético, isto foi prova
suficiente para o júri condenar o casal na acusação de conspiração para
cometer espionagem. Foi sugerido que Ethel foi indiciada juntamente
com o marido para que a promotoria pudesse usá-la para fazer pressão
para que Julius revelasse os nomes de outros envolvidos no caso. Se
este foi o caso, obviamente não funcionou. No banco das testemunhas,
Julius utilizou o direito da
Quinta Emenda da
Constituição dos EUA
de não incriminar a si mesmo toda vez que era indagado sobre o seu
envolvimento no Partido Comunista ou sobre os seus membros. Ethel fez o
mesmo. Nenhum dos dois conseguiu atrair a simpatia do júri.
Os Rosenbergs foram condenados pelo júri em
29 de março de 1951 e, em 5 de abril, sentenciados à morte pelo juiz Irving Kaufman. A condenação do casal serviu como
leitmotiv para as investigações de "atividades anti-americanas" do senador
Joseph McCarthy.
Embora a dedicação dos dois à causa comunista estivesse bem
documentada, os Rosenbergs negaram participação nas acusações de
espionagem, mesmo minutos antes de serem levados à
cadeira elétrica.
Os Rosenbergs foram os únicos civis americanos executados durante a
Guerra Fria
por espionagem. Na sua argumentação impondo a pena de morte ao casal, o
juiz Kaufman responsabilizou os dois não só pela espionagem mas
também pelas mortes da
Guerra da Coreia.
O caso dos Rosenbergs estava no centro de uma controvérsia sobre o
comunismo nos Estados Unidos. Os seus apoiantes defendiam que a
condenação era um exemplo escandaloso das perseguições típicas da
histeria do momento (
Macartismo), ligando o caso com o das caças às bruxas na
Idade Medieval e em
Salém (uma comparação que serviu de inspiração para a aclamada peça
As Bruxas de Salem de
Arthur Miller).
Após a publicação da série de reportagens no
National Guardian e
a formação do Comité Nacional pela Justiça no Caso Rosenberg, alguns
americanos passaram a acreditar que ambos os Rosenberg eram inocentes
ou que receberam uma pena demasiado dura, dando início a uma campanha
popular para tentar evitar a execução do casal. O Papa Pio XII apelou
diretamente ao presidente
Dwight D. Eisenhower para poupar a vida dos dois, mas Eisenhower recusou-se, em
11 de fevereiro de
1953 e todos os outros recursos foram negados. Em
12 de setembro de
2008,
o co-réu Morton Sobell admitiu que ele e Julius eram culpados da
acusação de espionagem para a União Soviética. Ele afirmou, entretanto,
que apesar de saber as atividades do marido, Ethel não participou
ativamente.
Execução
Os Rosenbergs foram executados ao pôr-do-sol de
19 de junho de
1953, na prisão de
Sing Sing, em Nova Iorque. Os seus túmulos encontram-se no cemitério Wellwood, em Pinelawn, Nova Iorque.
A execução foi adiada da sua data original, de
18 de junho, porque no dia
17 de junho o juiz do
Suprema Tribunal
William O. Douglas havia garantido uma adiamento da pena. Tal
adiamento deveu-se a um recurso de Fyke Farmer, um advogado do
Tennessee cujos esforços para salvar os Rosenbergs da morte já haviam sido desprezados pelo advogado do casal.
A 18 de junho O Supremo Tribunal reuniu em sessão especial para julgar o
recurso de Douglas, ao invés de deixar a execução paralisada por meses
até que a matéria fizesse o seu percurso normal. O Supremo não se
havia decidido sobre a paralisação de Douglas até o
meio-dia de
19 de junho. Assim sendo, a execução foi marcada para o começo da noite do mesmo dia, após o início do
Shabat. Numa jogada desesperada por garantir a vida do casal, o advogado
Emanuel Hirsch Bloch, reclamou que isto era uma ofensa à tradição
judaica deles, então a execução foi marcada para antes do pôr-do-sol.
Testemunhas oculares (conforme depoimentos dados ao documentário de
1982 The Atomic Cafe)
descreveram as circunstâncias das mortes dos Rosenbergs; enquanto
Julius morreu após a primeira série de choques elétricos, a sua esposa
não. Após o curso tradicional da sessão de eletrocussão, os enfermeiros
retiraram as cintas e outros equipamentos de Ethel para que os
médicos determinassem se ela já havia morrido. Os médicos determinaram
que ela ainda estava viva, pois o seu coração ainda batia. Então
foram aplicadas três séries de eletrocussão, o que acabou por resultar
numa cena terrível, em que uma grande quantidade de fumo saiu da
cabeça dela.