Canaris nasceu no início de
1887, na vila de
Aplerbeck, localizada na
Vestfália, perto de
Dortmund. O seus pais foram Karl Canaris, um industrial abastado, e Auguste Popp. Enquanto jovem, Canaris recebeu uma educação cuidada, que lhe permitiu dominar com fluência quatro línguas, incluindo
inglês e
castelhano. Em
1905, aos dezassete anos, alistou-se na Marinha Imperial Alemã, inspirado pela figura de
Constantine Kanaris, um almirante e político
grego que se distinguiu na luta pela independência do seu país. A sua família acreditava estar, de alguma forma, relacionada com o almirante e somente em
1938 é que Canaris descobriu que a sua ascendência era de origem
italiana.
No início da
Primeira Guerra Mundial, Canaris foi destacado para o SMS
Dresden como
Segundo Piloto. O navio participou, logo em Dezembro de
1914, na
batalha das Ilhas Falkland e graças ao heroísmo do Almirante Graf Spee, em liderar um combate perdido contra à
Royal Navy britânica, o Dresden, que estava bem atrás em relação aos demais navios da frota, consegue fugir em direção ao pacífico e refugiar-se por algum tempo nas costas chilenas. Em março de
1915 a sua tripulação foi capturada mas Canaris consegue fugir e regressar em agosto, com a ajuda do seu domínio do castelhano e de comerciantes alemães.
De volta ao serviço activo, Canaris foi destacado para
Espanha, onde desempenhou funções de coordenação de espionagem e intercepção de mensagens inimigas. Mais tarde adquiriu um comando de
submarino e destacou-se pela sua eficácia, sendo responsável pelo naufrágio de 18 navios britânicos. No final da guerra, Canaris encontrava-se já na lista negra do
MI6.
Canaris permaneceu na Marinha depois do final da Primeira Grande Guerra, atingindo o grau de Capitão em
1931. Durante este período aprofundou o seu interesse na área da informação e contra-informação e envolveu-se na política alemã, embora nunca se tenha alistado no
Partido Nazi. Em
1935, já depois da subida ao poder de
Adolf Hitler, Canaris foi promovido à liderança da
Abwehr e ao posto de contra-almirante. A sua primeira tarefa foi organizar uma rede de espiões em
Espanha, no prelúdio da
guerra civil. O seu trabalho foi bem sucedido e as informações recolhidas pelos seus homens influenciaram Hitler a aliar-se a
Franco.
A sua carreira militar e política progrediu ao mesmo tempo que a situação política se deteriorava na
Europa. Em
1938, Canaris começou a desiludir-se com a ideologia nazi e a agressividade latente de Hitler para com o resto do continente, assim como muitos outros oficiais da
Wehrmacht que mais tarde integraram a
resistência alemã. Para este núcleo, Hitler era visto como um lunático perigoso para a grandiosidade e estatuto da Alemanha e os membros do Partido Nazi eram desprezados pelas tácticas de repressão criminosa. Canaris passou logo à acção e esteve envolvidos na organização de dois planos para assassinar Hitler, em
1938 e em
1939, nunca concretizados. Um dos seus aliados nesta fase foi o futuro marechal
Paul von Kleist, que visitou
Londres em segredo para conversações com membros do
MI6. A ideia dos dissidentes, liderados por Canaris, era que, se Hitler invadisse a
Áustria, o
Reino Unido iria declarar guerra à Alemanha. No entanto, concretizado o
Anschluss, o primeiro-ministro britânico
Neville Chamberlain decidiu-se por mais uma tentativa diplomática para apaziguar o expansionismo nazi. O resultado foi o
acordo de Munique. A guerra foi adiada e Hitler ficou com uma auto-confiança renovada para prosseguir com os seus planos.
Canaris ficou extremamente desiludido com a postura passiva dos britânicos, mas, face aos sucessos políticos de Hitler, decidiu-se por uma atitude discreta. Os contactos com o MI6, no entanto, continuaram. De inimigo número um, Canaris passara a aliado da causa anti-nazi.
No início da
Segunda Guerra Mundial, Canaris deslocou-se à frente leste, na
Polónia, na qualidade de chefe dos serviços de informação militar. Durante a visita testemunhou muitos crimes de guerra cometidas pela
SS sobre as populações locais, nomeadamente contra a
comunidade judaica. As suas funções requeriam que tomasse notas e elaborasse um relatório para Hitler sobre o andamento da guerra. Canaris cumpriu a obrigação, mas ficou revoltado contra as atrocidades a que assistiu. O relatório foi entregue ao Führer porém uma segunda via foi enviada para
Londres, o que demonstra o continuar da relação secreta entre Canaris e os serviços secretos britânicos, mesmo depois do início das hostilidades entre ambos os países.
Ao longo dos anos seguintes, Canaris manteve uma vida dupla, mostrando-se como um líder dedicado à causa de Hitler por um lado, enquanto que por outro conspirava a sua queda com os britânicos e outros dissidentes da Wehrmacht. De acordo com a sua função de líder da Abwehr, Canaris recolheu informações importantes para o desenrolar da guerra, através da sua rede de espiões e, por diversas vezes, através dos seus contactos britânicos. Uma das informações que recolheu via MI6 foi o plano detalhado das disposições defensivas russas, nos meses que antecederam a
Operação Barbarossa. O dossier foi bem recebido por Hitler mas provocou a suspeita de
Heinrich Himmler (líder da SS -
Schutzstaffel) e
Reinhard Heydrich (líder do
Sicherheitsdienst), quanto à verdadeira origem das informações. Canaris passou a estar sob suspeita, principalmente devido às suas viagens frequentes ao Sul de
Espanha, onde provavelmente se encontrava com agentes britânicos de
Gibraltar. Em
1942, a relação institucional de Canaris e Heydrich (seu antigo protegido na Kriegsmarine) detriorou-se devido a um incidente na
República Checa, relacionado com a captura de Paul Thümmel, um agente britânico, pela
Gestapo. Canaris interferiu com a prisão, e execução certa do homem, alegando que, na realidade, Thümmel era um agente duplo ao serviço da Abwehr. A sua explicação passou, mas as suspeitas de Heydrich acumularam-se até à sua própria morte, num atentado realizado em Junho de
1942. É possível que o assassinato de Heydrich tenha sido organizado pelo MI6, de modo a proteger a posição de Canaris.