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sábado, outubro 14, 2023

Sebastião Alba morreu há vinte e três anos...

(imagem daqui)
     
Dinis Albano Carneiro Gonçalves, cujo pseudónimo é Sebastião Alba (Braga, 11 de março de 1940 - Braga, 14 de outubro de 2000 - 60 anos), foi um escritor naturalizado moçambicano. Pertenceu à jovem vaga de autores moçambicanos que vingaram na literatura lusófona.
Nasceu em Braga, onde viveu durante alguns anos. Radicou-se, juntamente com a sua família, em 1950, em terras moçambicanas e só voltou a Portugal em 1984, voltando novamente para a «Cidade dos Arcebispos», Braga. Mas foi em Moçambique que se formou em jornalismo, lecionou em várias escolas e contraiu matrimónio com uma moçambicana.
Publicou, em 1965, Poesias, inspirado na sua própria biografia. Um dos seus primeiros poemas foi Eu, a canção. Os seus três livros colocaram-no numa posição cimeira no ambiente cultural bracarense.
Faleceu com 60 anos, atropelado numa rodovia. Deixa um bilhete dirigido ao irmão: «Se um dia encontrarem o teu irmão Dinis, o espólio será fácil de verificar: dois sapatos, a roupa do corpo e alguns papéis que a polícia não entenderá».
      

 

um anjo erra (o amor confuso)
 
 
 
Um anjo erra
nos teus olhos diurnos

humedecido do véu
(ao fundo, a íris entardece)
seguiu de cor a revoada das pombas

místico
um arroubo ascende a prumo
do plano em que me fitas

cisnes desaguam
do teu olhar em fio
e vogam ao redor, pelo estuário da sala

ao sol-poente
os vitrais das janelas
ardem na catedral assim erguida

colocamos um sonho
em cada nicho

e no círculo formado pelas nossas bocas
subentende-se com verve
a língua.




Sebastião Alba

quarta-feira, outubro 04, 2023

A Guerra Civil Moçambicana acabou há 31 anos

Uma vítima de mina terrestre da Guerra Civil Moçambicana

A Guerra Civil Moçambicana foi um conflito civil que começou em 1977, dois anos após o fim da Guerra de Independência de Moçambique, e que foi semelhante à Guerra Civil Angolana, visto que ambas eram guerras secundárias dentro do contexto maior da Guerra Fria. O partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), e as forças armadas moçambicanas, eram violentamente contrários a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), que recebia financiamento da Rodésia e, mais tarde, da África do Sul. Durante o conflito, cerca de um milhão de pessoas morreram em combates e por conta de crises de fome, cinco milhões de civis foram deslocados e muitos sofreram amputações por minas terrestres, um legado da guerra que continua a assolar o país. O conflito terminou em 1992 com o Acordo Geral de Paz e as primeiras eleições multipartidárias do país foram realizadas em 1994. No entanto, passados mais de vinte anos de paz formal, Moçambique presenciou em 2013 o ressurgimento do conflito armado nas regiões central e norte do país, pondo em questão a aparente estabilidade democrática e o processo de reconciliação. Apesar das inúmeras negociações, um novo acordo de paz ainda não foi concluído.
  
Imediatamente a seguir à independência do Moçambique, alguns militares (ou ex-militares) portugueses e dissidentes da FRELIMO instalaram-se na Rodésia, que vivia uma situação de "independência unilateral" não reconhecida pela maior parte dos países do mundo. O regime de Ian Smith, já a braços com um movimento interno de resistência que aparentemente tinha algumas bases em Moçambique, aproveitou esses dissidentes para atacar essas bases.
De facto, a FRELIMO apoiava esses rebeldes rodesianos e, em 1976, o governo de Moçambique declarou oficialmente aplicar as sanções estabelecidas pela ONU contra o governo ilegal de Salisbúria e fechou as fronteiras com aquele país. A Rodésia dependia em grande parte do corredor da Beira, incluindo a linha de caminhos de ferro, a estrada e o oleoduto que ligavam o porto da Beira àquele país encravado. Embora, a Rodésia tivesse boas relações com o regime sul-africano do apartheid, este fecho das suas fontes de abastecimento foi um duro golpe para o regime rodesiano.
Pouco tempo depois, para além de intensificarem os ataques contra estradas, pontes e colunas de abastecimento dentro de Moçambique, os rodesianos ofereceram aos dissidentes moçambicanos espaço para formarem um movimento de resistência - a "REsistência NAcional MOçambicana" ou RENAMO - e criarem uma estação de rádio usada para propaganda antigovernamental.
Até 1980, data da independência do Zimbabwe, a RENAMO continuou os seus ataques a aldeias e infraestruturas sociais em Moçambique, semeando minas terrestres em várias estradas, principalmente nas regiões mais próximas das fronteiras com a Rodésia. Estas ações tiveram um enorme papel desestabilizador da economia, uma vez que não só obrigaram o governo a concentrar importantes recursos numa máquina de guerra, mas principalmente porque levaram ao êxodo de muitos milhares de pessoas do campo para as cidades e para os países vizinhos, diminuindo assim a produção agrícola.
Com a independência do Zimbabwe, a RENAMO foi obrigada a mudar a sua base de apoio para a África do Sul, o que conseguiu com muito sucesso, tendo tido amplo apoio das forças armadas sul-africanas. Para além disso, estas forças realizaram vários "raids" terrestres e aéreos contra Maputo, alegadamente para destruírem "bases" do ANC. No entanto, o governo de Moçambique, que já tinha secretamente encetado negociações com o governo sul-africano e com a própria RENAMO, assinou em 1983 um acordo de "boa vizinhança" com aquele governo, que ficou conhecido como o Acordo de Nkomati, segundo o qual o governo sul-africano se comprometia a abandonar o apoio militar à RENAMO, enquanto que o governo moçambicano se comprometia a deixar de apoiar os militantes do ANC que se encontravam em Moçambique.
Em 1986, a RENAMO tinha já estabelecido uma base central na Gorongosa e expandido as ações militares para todas as províncias de Moçambique, contando ainda com o apoio do Malawi, cujo governo tinha boas relações com o regime do apartheid. Nesta altura, a RENAMO tinha conseguido alcançar um dos seus objetivos estratégicos que consistiu em obrigar o governo a abandonar a sua política de "socialização do campo" através das aldeias comunais e machambas estatais.
Em vista dos problemas económicos que Moçambique atravessava, o governo assinou um acordo com o Banco Mundial e FMI em 1987, que o obrigaram a abandonar completamente a política "socialista". A guerra, porém, só terminou em 1992 com o Acordo Geral de Paz, assinado em Roma a 4 de outubro, pelo Presidente da República, Joaquim Chissano e pelo presidente da RENAMO, Afonso Dhlakama, depois de cerca de dois anos de conversações mediadas pela Comunidade de Santo Egídio, uma organização da igreja católica, com apoio do governo italiano.
Nos termos do Acordo, o governo de Moçambique solicitou o apoio da ONU para o desarmamento das tropas beligerantes. A ONUMOZ foi a força internacional que apoiou neste trabalho, que durou cerca de dois anos e que culminou com a formação dum exército unificado e com a organização das primeiras eleições gerais multipartidárias, em 1994.
      

sexta-feira, setembro 29, 2023

Samora Machel nasceu há noventa anos...

   
Samora Moisés Machel (Chilembene, Gaza, 29 de setembro de 1933 - Mbuzini, Montes Libombos, 19 de outubro de 1986) foi um militar moçambicano, líder revolucionário de inspiração socialista, que liderou a Guerra da Independência de Moçambique e se tornou o seu primeiro presidente após a sua independência, de 1975 a 1986.
Carinhosamente conhecido como "Pai da Nação", morreu quando o avião em que regressava ao Maputo se despenhou, em território sul-africano. Em 1975-1976 foi-lhe atribuído o Prémio Lenine da Paz.
 
(...)
  
Na frente externa, Samora sempre seguiu uma política de angariar amizades e apoio para Moçambique, não só entre os «amigos» tradicionais, os países do «bloco soviético» e os países vizinhos unidos numa frente de integração regional, a SADCC, mas até entre os seus «inimigos», sendo inclusivamente recebido (embora com frieza) por Ronald Reagan e tendo assinado um acordo de boa-vizinhança com Pieter Botha, presidente da África do Sul nos últimos anos do apartheid (o Acordo de Nkomati). Apesar disso, Samora não conseguiu suster a guerra que, iniciada logo a seguir à independência pelos vizinhos regimes racistas (a África do Sul e a Rodésia de Ian Smith), se tornou uma verdadeira guerra civil dirigida por um movimento de resistência armada (a RENAMO). A guerra civil durou 16 anos, provocou cerca de um milhão de mortos e cinco milhões de deslocados e destruiu grande parte das infraestruturas do país.
A partida da comunidade portuguesa, o insucesso da política de socialização e a guerra levaram a um colapso económico, e Samora, nos últimos anos, teve de abrandar a política de orientação comunista, permitindo aos «quadros» acesso a bens que estavam vedados ao comum dos cidadãos, encetando conversações com a RENAMO e, finalmente, organizando acordos com o Banco Mundial e o FMI, no sentido de estancar a guerra e relançar a economia.
     
     
Samora Machel não conseguiu, no entanto, ver realizados os seus propósitos, uma vez que, em 19 de outubro de 1986, quando se encontrava de regresso de uma reunião internacional em Lusaka, o Tupolev 134 cedido pela União Soviética em que seguia, junto com muitos dos seus colaboradores, se despenhou em Mbuzini, nos montes Libombos (território sul-africano, perto da fronteira com Moçambique). O acidente foi atribuído a erros do piloto russo, mas ficou provado que este tinha seguido um rádio-farol, cuja origem não foi determinada. Este facto levou a especulações sobre uma possível cumplicidade do governo sul-africano, que nunca se conseguiu provar.
Em 2010, o jornalista português José Milhazes, que vivia em Moscovo desde 1977 e trabalha atualmente para o diário português Público e como correspondente da cadeia portuguesa de televisão SIC, publicou o livro «Samora Machel: Atentado ou Acidente?», no qual sustenta que a queda do avião nada teve a ver com um atentado ou uma falha mecânica, mas sim com diversos erros da tripulação russa: em lugar de executar corretamente as operações de voo, os membros da tripulação, incluindo o piloto, estavam entretidos com futilidades, como a partilha de bebidas alcoólicas e outras, que não era possível obter em Moçambique e que eles traziam da Zâmbia. Segundo Milhazes, tanto os soviéticos como os moçambicanos teriam interesse em divulgar a tese de um atentado perpetrado pelo governo racista da África do Sul: a URSS quereria salvaguardar a sua reputação (qualidade mecânica do aparelho e profissionalismo da tripulação), ao passo que o governo de Moçambique quereria criar um herói.
No entanto, em 2007, Jacinto Veloso, um dos mais fieis aliados de Machel no seio da Frelimo, tinha já publicado as suas Memórias em Voo Rasante, nas quais sustenta que a morte do presidente de Moçambique se deveu a uma conspiração entre os serviços secretos sul-africanos e os soviéticos, que, uns e outros, teriam razões para o eliminar.
Segundo Veloso, o embaixador soviético pediu certa vez uma audiência ao Presidente para lhe comunicar a apreensão da URSS face ao aparente «deslizamento» de Moçambique para o Ocidente, ao que Machel teria respondido «Vai à merda!», ordenando em seguida ao intérprete que traduzisse e abandonando a sala. Convencidos de que Machel se afastara irrevogavelmente da sua órbita, os soviéticos não teriam hesitado em sacrificar o piloto e toda a equipagem do seu próprio avião.
A viúva de Samora, Graça Machel (Simbine de seu nome de solteira), com quem ele se casara em 1977 sendo ela Ministra da Educação, casou-se em 1998 com Nelson Mandela.
      
      
     

segunda-feira, setembro 25, 2023

A guerra começou em Moçambique há 59 anos, diz a FRELIMO...

          
A Guerra da Independência de Moçambique, também conhecida como Luta Armada de Libertação Nacional, foi um conflito armado entre as forças da guerrilha da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) e as Forças Armadas de Portugal. Oficialmente, a guerra teve início a 25 de setembro de 1964, com um ataque ao posto administrativo de Chai no então distrito (atualmente província) de Cabo Delgado, e terminou com um cessar-fogo a 8 de setembro de 1974, resultando numa independência negociada em 1975.
Ao longo dos seus quatro séculos de presença em território africano, a primeira vez que Portugal teve que enfrentar guerras de independência, e forças de guerrilha, foi em 1961, na Guerra de Independência de Angola. Em Moçambique, o conflito começou em 1964, resultado da frustração e agitação entre os cidadãos moçambicanos, contra a forma de administração estrangeira, que consideravam ser exploratória e de maus tratos, e que só defendia os interesses económicos portugueses na região. Muitos moçambicanos ressentiam-se das políticas portuguesas em relação aos nativos, que eram discriminatórias, tradicionais e que limitavam o acesso à educação, ministrada pelos portugueses, e ao emprego qualificado. Influenciados pelos movimentos de autodeterminação africanos do pós-guerra, muitos moçambicanos tornaram-se, progressivamente, nacionalistas e, de forma crescente, frustrados pelo contínuo servilismo da sua nação às regras exteriores. Por outro lado, aqueles moçambicanos mais cultos, e integrados no sistema social português implementado em Moçambique, em particular os que viviam nos centros urbanos, reagiram negativamente à vontade, cada vez maior, de independência. Os portugueses estabelecidos no território, que incluíam a maior parte das autoridades, responderam com um incremento da presença militar e com um aumento de projetos de desenvolvimento.
Um exílio em massa de políticos da intelligentsia de Moçambique para países vizinhos providenciou-lhes um ambiente ideal no qual radicais moçambicanos podiam planear ações, e criar agitação política, no seu país de origem. A criação da organização de guerrilha moçambicana FRELIMO e o apoio da União Soviética, China e Cuba, por meio do fornecimento de armamento e de instrutores, levaram ao surgimento da violência que continuaria por mais uma década.
Do ponto de vista militar, o contingente militar português foi sempre superior durante todo o conflito contra as forças de guerrilha. Embora em desvantagem, as forças da FRELIMO saíram vitoriosas, após a Revolução dos Cravos em Lisboa, a 25 de abril de 1974, que acabou com o regime ditatorial em Portugal. Moçambique acabaria por obter a sua independência em 25 de junho de 1975, após mais de 400 anos de presença portuguesa nesta região de África. De acordo com alguns historiadores da Revolução, o golpe de Estado militar em Portugal foi, em parte, causado pelos protestos face ao comportamento das tropas portuguesas em relação à população moçambicana. No entanto, o crescente aumento da influência comunista sobre os militares portugueses revoltosos que lideraram o golpe militar em Lisboa, e, por outro lado, a pressão internacional sobre a condução da Guerra Colonial Portuguesa em geral, foram as principais causas para o resultado final.
     
(...)
    
A primeira vítima do conflito terá sido o padre holandês Daniel Boormans, da Missão Católica de Nangololo, em 24 de agosto de 1964 que, alegadamente, foi confundido com o chefe do posto. A FRELIMO, que tinha acabado de entrar em Moçambique vinda da Tanzânia, rapidamente atribuiu este incidente às forças da Manu e da Udenamo, e um mês depois, a 25 de setembro, lançou os primeiros ataques na região de Mueda, marcando, oficialmente, o início do conflito. Nesta data, Alberto Joaquim Chipande, à frente de um grupo de 12 homens, atacou um posto administrativo na localidade de Chai, matando o chefe do posto e outras seis pessoas, segundo a sua versão. No entanto, segundo outra versão, de tropas portuguesas, ninguém teria sido abatido; apenas as paredes do posto administrativo teriam sido atingidas.
Historicamente, Chipande é considerado como o primeiro a disparar o tiro que deu início ao conflito, embora haja vozes discordantes, mesmo no seio da FRELIMO. Eduardo Nihia, membro do Conselho de Estado e antigo combatente, reclamou igualmente a autoria desse disparo, referindo mesmo que também houve disparos noutras frentes, embora sem sucesso. Chipande reagiu a estas declarações afirmando a sua abertura a novas versões sobre o que realmente acontecera.
         

terça-feira, agosto 22, 2023

Ruy Guerra comemora hoje noventa e dois anos

Ruy Guerra e e a ex-esposa, Cláudia Ohana (daqui)
    
Ruy Alexandre Guerra Coelho Pereira (Lourenço Marques, atual Maputo, 22 de agosto de 1931) é um realizador de cinema, poeta, dramaturgo e professor nascido em Moçambique, então território português. Vive no Brasil desde 1958.
   
Biografia
Estudou no Institut des hautes études cinématographiques (IDHEC) de Paris a partir de 1952. Até 1958, atuou como assistente de direção, antes de se instalar no Brasil, onde dirigiu seu primeiro filme, Os Cafajestes (1962).
Ingressando nas fileiras do Cinema Novo, em 1964 realizou seu melhor filme, Os Fuzis, ao qual se seguiram obras notáveis como Tendres chasseurs (1969) e Os Deuses e os Mortos (1970).
A situação política brasileira durante a ditadura militar impôs-lhe uma pausa que terminaria em 1976 com A Queda. Em 1980 regressou a Moçambique, onde rodou Mueda, Memória e Massacre, a primeiro longa-metragem desse país. Ainda em Moçambique, realizou diversos curtas-metragens e contribuiu para a criação do Instituto Nacional do Cinema. Viveu e trabalhou também em Cuba em alguns períodos.
Em 1982, rodou no México, Erêndira, baseado em A Incrível e Triste História da Cândida Erêndira e Sua Avó Desalmada, de Gabriel García Márquez. Posteriormente dirigiu: o musical Ópera do Malandro (1985), baseado em peça de Chico Buarque; Kuarup (1989), baseado no livro Quarup, de Antônio Callado; e o telefilme Fábula de la bella palomera, também baseado em Gabriel García Márquez.
O seu primeiro casamento foi com a cantora Nara Leão, nos anos 60, com quem não teve filhos e rapidamente se divorciaram. Mais tarde casou com a atriz Leila Dini, com quem teve uma filha, Janaína Diniz Guerra, nascida em 1971. Alguns anos após a morte de Leila, casou-se com a atriz Cláudia Ohana, com quem teve uma filha, Dandara Guerra, em 1983, e de quem se divorciou.
Ruy Guerra tem também um importante trabalho como letrista de canções compostas em parceria com Chico Buarque, Milton Nascimento,Carlos Lira, Edu Lobo, Francis Hime e Sergio Ricardo.
        

 


Cala a boca, Bárbara


Ele sabe dos caminhos
Dessa minha terra
No meu corpo se escondeu
Minhas matas percorreu
Os meus rios
Os meus braços
Ele é o meu guerreiro
Nos colchões de terra
Nas bandeiras, bons lençóis
Nas trincheiras, quantos ais, ai
Cala a boca
Olha o fogo
Cala a boca
Olha a relva
Cala a boca, Bárbara
Cala a boca, Bárbara



Peça Calabar - Chico Buarque e Ruy Guerra

quinta-feira, agosto 10, 2023

Poema adequado à data...

 

(imagem daqui)

 

ARDE UM FULGOR EXTINTO

Arde um fulgor extinto
no longe da tarde agoniada.
Não me pesaria tanto
a caminhada se, em lugar do dia,
no seu extremo achasse a noite.

Exacta e concisa é a claridade.
Não mente à luz o que a noite
ilude. Terrível destino
o de quem é nocturno à luz solar.

Não vos ponha em cuidado,
porém, este meu penar:

são palavras e não sangram.

 

Rui Knopfli

Rui Knopfli nasceu há noventa e um anos

(imagem daqui)
     
Rui Manuel Correia Knopfli (Inhambane, Moçambique, 10 de agosto de 1932 - Lisboa, 25 de dezembro de 1997) foi um poeta, jornalista e crítico literário e de cinema.
Fez os seus estudos na África do Sul e iniciou uma carreira muito activa na então cidade de Lourenço Marques (actual Maputo).
Publicou a sua obra muitas vezes marcada pela vivência tropical africana em Moçambique. Integrou o grupo de intelectuais locais. Conviveu com muitos dos artistas, críticos literários e outros da capital moçambicana, como Eugénio Lisboa, Carlos Adrião Rodrigues, Craveirinha, António Quadros (pintor), etc. Como fotógrafo publicou um livro sobre a Ilha de Moçambique (A Ilha de Próspero, 1972). Com António Quadros (pintor) fundou Os Cadernos de Caliban. Deixou Moçambique em 1975. A nacionalidade portuguesa não impediu que a sua alma fosse assumidamente africana. Mas a sua desilusão pelos acontecimentos políticos estão expressos na sua poesia publicada após a saída da sua terra. Tem colaboração dispersa por vários jornais e revistas e publicou alguns livros. Desempenhou funções de adido cultural na Embaixada Portuguesa em Londres.
      
  
    
Velho Colono
    
Sentado no banco cinzento
entre as alamedas sombreadas do parque.
Ali sentado só, àquela hora da tardinha,
ele e o tempo. O passado certamente,
que o futuro causa arrepios de inquietação.
Pois se tem o ar de ser já tão curto,
o futuro. Sós, ele e o passado,
os dois ali sentados no banco de cimento.

Há pássaros chilreando no arvoredo,
certamente. E, nas sombras mais densas
e frescas, namorados que se beijam
e se acariciam febrilmente. E crianças
rolando na relva e rindo tontamente.

Em redor há todo o mundo e a vida.
Ali está ele, ele e o passado,
sentados os dois no banco de frio cimento.
Ele a sombra e a névoa do olhar.
Ele, a bronquite e o latejar cansado
das artérias. Em volta os beijos húmidos,
as frescas gargalhadas, tintas de Outono
próximo na folhagem e o tempo.

O tempo que cada qual, a seu modo,
vai aproveitando.

 

Rui Knopfli

domingo, julho 09, 2023

Poesia de aniversariante de hoje...

 

 

 

A mulherinha

 

A mulherinha estava a pedir pega-me

naquele olhar de corna mansa, e então

fiz das tripas menores um coração

embrulhei-o em luxúria e num béguin

impetuoso e urgente, qual salame

perverso a mugir trinca-me glutão

abalei a voar no avião

rotativo daquele olhar. Eu chame-me

cão gravata se não valeu a pena!

Ó licor da vingança, ó bruta cena!

Tinha, enfim, sob a espora, sob a mão

soba espúrio, soba ex-puro a esposa

grata do chefe, e sob a esposa a musa

ingrata dum tinteiro da nação.

 

João Pedro Grabato Dias aka António Quadros (pintor)

António Quadros (pintor) nasceu há noventa anos...

 

Auto-retrato

António Augusto de Melo Lucena e Quadros (Viseu, 9 de julho de 1933 - Santiago de Besteiros, 2 de julho de 1994), também referido pelos heterónimos João Pedro Grabato Dias, Frey Ioannes Garabatus e Mutimati Barnabé João, foi um pintor e poeta português. Viveu em Moçambique, entre 1964 e 1984. 

 

Percurso

Diplomou-se em pintura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto. Entre 1958 e 1959 esteve em Paris (Ecole des Beax-Arts de Paris), como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, onde fez os cursos de gravura e pintura a fresco.

Participou em diversas exposições coletivas, podendo destacar-se: I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 1957); Art Portugais: Peinture et Sculpture du Naturalisme à nos Jours (Paris, 1968). Foi galardoado com o Prémio Marques de Oliveira e o Prémio Armando Basto (S.N.I.).

Parte para Moçambique em 1964. Em 1968 revela-se como poeta ao obter um prémio para "40 Sonetos de Amor e Circunstância e Uma Canção Desesperada" assinado por João Pedro Grabato Dias, negando durante vários anos ser o seu autor.

Nesse período colaborou com grupos de teatro em Lourenço Marques, como o TALM (Teatro Amador de Lourenço Marques), em que foi autor do cenário da peça "Jardim Zoológico" de Eduardo Albee, encenada e interpretada por Mário Barradas, e o TEUM (Teatro dos Estudantes da Universidade de Moçambique), sendo autor dos cenários e o guarda roupa de "O Velho da Horta" e "Quem tem Farelos?" de Gil Vicente, ambas encenadas por Matos Godinho.

Colaborou no Núcleo de Arte de Lourenço Marques, como professor, onde contactou, entre outros, com Malangatana Valente. Ganhou o 1º Prémio no concurso da Sociedade de Estudos de Moçambique que, na cerimónia oficial, não foi entregue, dado que o Secretário Provincial de Educação considerou a obra indecorosa.

Em 1971, lançou as odes O Morto e A Arca e ainda as Laurentinas. Grabato Dias e Rui Knopfli, criam nesse ano a revista Caliban.

Em 1972, por ocasião dos 400 anos da morte de Camões, lançou o poema épico Quybyrycas, assinadas por Frey Ioannes Garabatus, com prefácio de Jorge de Sena, onde glosava e parodiava "Os Lusíadas".

Depois do 25 de abril, inventou o livrinho Eu, o povo, supostamente deixado por Mutimati Barnabé João, guerrilheiro moçambicano morto em combate, não assumindo inicialmente a sua autoria. Escreveu o novo livro de poemas didático O Povo e nós, já de autoria de João Pedro Grabato Dias.

Publicou um livro de divulgação da biotecnologia, para aplicação nas zonas rurais moçambicanas.

Publicou o poema pseudobibliográfico "Facto/Fado", considerado pelo crítico literário Eugénio Lisboa um dos melhores livros em português.

Em Moçambique, foi ainda o co-autor do monumento aos heróis, na Praça dos Heróis Moçambicanos, em Maputo.

No regresso a Portugal e a Santiago de Besteiros, em 1984, dedicou-se ao ensino, à escrita e pintura.

Publicou em 1992 Sete Contos para um Carnaval.

Foi cantado por cantores como José Afonso e Amélia Muge.

Como pintor, atividade principal da sua criação, tem extensa e rica obra, de extrema beleza, realizada em Portugal e Moçambique. Dedicou-se ainda a outras artes plásticas, como cerâmica, pintura em cerâmica, esculturas metálicas, cartazes, ilustração de livros e desenhos criados por computador.

1998 - Grã-Cruz da Ordem do Infante D.Henrique, atribuída, a título póstumo, pelo Presidente Jorge Sampaio, pela obra plástica e literária, particularmente pela autoria de As Quybyrycas.

 

in Wikipédia

 

A menina e o lagarto (1956, Centro de Arte Moderna - FCG)
 
Raparigas (1950-1958, Museu Nacional Soares dos Reis)

Sem título (gravura) (1958)
 
Cinzeiro serviço "Verde Negro" (1959, Museu Nacional do Azulejo)

quarta-feira, julho 05, 2023

Mia Couto nasceu há 68 anos

   

Mia Couto, pseudónimo de António Emílio Leite Couto (Beira, 5 de julho de 1955), é um escritor e biólogo moçambicano.

Dentre os muitos prémios literários com os quais foi galardoado está o Prémio Neustadt, tido como o Nobel Americano. Mia Couto e João Cabral de Melo Neto são os únicos escritores de língua portuguesa que receberam esta honraria.
   

sexta-feira, junho 30, 2023

Poema atual de Reinaldo Ferreira, na data da sua morte...


(imagem daqui)

  

Deixai os doidos governar entre comparsas
Deixai os doidos governar entre comparsas! Deixai-os declamar dos seus balcões Sobre as praças desertas! Deixai as frases odiosas que eles disserem, Como morcegos à luz do Sol, Atónitas baterem de parede em parede, Até morrerem no ar Que as não ouviu Nem percutiu À distância da multidão que partiu! Deixai-os gritar pelos salões vazios, Eles, os portentosos mais que os mares, Eles, os caudalosos mais que os rios, O medo de estar sós Entre os milhares De esgares Reflectidos nos colossais Cristais Hílares Que a sua grandeza lhes sonhou!
 

Reinaldo Ferreira

 

NOTA: este poema fez-me lembrar os discursos de alguns políticos, há poucos dias, em Pedrogão Grande...


domingo, junho 25, 2023

Moçambique tornou-se independente há 48 anos

  

Moçambique, oficialmente designado como República de Moçambique, é um país localizado no sudeste do continente Africano, banhado pelo oceano Índico a leste e que faz fronteira com a Tanzânia ao norte; Maláui e Zâmbia a noroeste; Zimbábue a oeste e Essuatíni e África do Sul a sudoeste. A capital e maior cidade do país é Maputo, anteriormente chamada de Lourenço Marques, durante o domínio português.

Entre o primeiro e o século V, povos bantos migraram de regiões do norte e oeste para essa região. Portos comerciais suaílis e, mais tarde, árabes, existiram no litoral moçambicano até a chegada dos europeus. A área foi reconhecida por Vasco da Gama em 1498 e em 1505 foi anexada pelo Império Português. Depois de mais de quatro séculos de domínio português, Moçambique tornou-se independente em 25 de junho de 1975, transformando-se na República Popular de Moçambique pouco tempo depois. Após apenas dois anos de independência, o país mergulhou em uma guerra civil intensa e prolongada que durou de 1977 a 1992. Em 1994, o país realizou as suas primeiras eleições multipartidárias e manteve-se como uma república presidencial relativamente estável desde então. 

 

  

segunda-feira, junho 12, 2023

Roberto Ivens nasceu há 173 anos...

   
Roberto Ivens (Ponta Delgada 12 de julho de 1850 - Dafundo, Oeiras 28 de janeiro de 1898), filho de pai inglês e de mãe açoriana, foi um oficial da Armada, português, administrador colonial e explorador do continente africano.
    
(...)
     
Concluiu o curso de Marinha em 1870, com apenas 20 anos, com as mais elevadas classificações. Frequentou, em 1871, a Escola Prática de Artilharia Naval, partindo em setembro desse ano para a Índia, pelo Canal do Suez, integrado na guarnição da corveta Estefânia, onde é feito guarda-marinha.
A partir de 1872 inicia contactos regulares com Angola. A 10 de outubro de 1874, completa os três anos de embarque nas colónias. Regressando a Portugal, em janeiro de 1875 faz exame para segundo tenente fora da barra de Lisboa. Em abril de 1875, segue na corveta Duque da Terceira para São Tomé e Príncipe e daqui para os portos da América da Sul. Regressando em abril de 1876, parte no mesmo mês, no Índia, para Filadélfia, com produtos portugueses para a Exposição Universal daquela cidade.
Após o regresso da grande viagem de exploração, Roberto Ivens, por motivos de saúde, abandona o mar, passando a prestar colaboração cartográfica na Sociedade de Geografia de Lisboa e na execução de trabalhos relacionados com África, sobretudo Angola, no Ministério da Marinha e Ultramar.
Foi nomeado, por Decreto de 8 de maio de 1890, oficial às ordens da Casa Militar de El-Rei D. Carlos. Em 1891 colabora na constituição de um instituto ultramarino do qual viria a ser vogal da direção. Por Decreto de 20 de dezembro 1892, foi colocado no quadro da Comissão de Cartografia, como vogal permanente. Por Decreto de 27 de abril de 1893, foi transferido para o cargo de ajudante-de-campo do rei.
Em 1895 foi feito Oficial da Ordem Militar de Avis e por Decreto de 17 de outubro nomeado secretário da Comissão de Cartografia, cargo que manterá até ao ano seguinte. O topo da sua carreira na Marinha foi alcançado a 7 de dezembro de 1895, com a promoção a capitão-de-fragata.
      
Explorações em África
Ao regressar a Lisboa, soube do plano governamental de exploração científica no interior africano, destinado a explorar os territórios entre as províncias de Angola e Moçambique e, especialmente, a efetuar um reconhecimento geográfico das bacias hidrográficas do Zaire e do Zambeze. Foi, de imediato, oferecer-se para nela tomar parte. Como, porém, a decisão demorasse, pediu para ir servir na estação naval de Angola. Aproveitou esta estadia para fazer vários reconhecimentos, principalmente no rio Zaire, levantando uma planta do rio entre Borud e Nóqui.
Por Decreto de 11 de maio de 1877 foi nomeado para dirigir a expedição aos territórios compreendidos entre as províncias de Angola e Moçambique e estudar as relações entre as bacias hidrográficas do Zaire e do Zambeze. Na mesma data foi promovido a primeiro tenente.
De 1877 a 1880, ocupou-se com Hermenegildo Capelo e, em parte, com Serpa Pinto, na exploração científica de Benguela às Terras de Iaca. No regresso, é feito Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada e é nomeado a 19 de agosto de 1880 vogal da Comissão Central de Geografia. Por Decreto de 19 de janeiro de 1882, foram-lhe concedidas honras de oficial às ordens e a 28 de julho foi nomeado para proceder à organização da carta geográfica de Angola.
Em 19 de abril de 1883, é nomeado vogal da comissão encarregada de elaborar e publicar uma coleção de cartas das possessões ultramarinas portuguesas. Por portaria de 28 de novembro do mesmo ano foi encarregado de proceder a reconhecimentos e explorações necessários para se reunirem os elementos e informações indispensáveis a fim de se reconstruir a carta geográfica de Angola.
Face às mais que previsíveis decisões da Conferência de Berlim era preciso demonstrar a presença portuguesa no interior da África austral, como forma de sustentar as reivindicações constantes do mapa cor-de-rosa entretanto produzido. Para realizar tão grande façanha, são nomeados Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens.
Feitos os preparativos, a grande viagem inicia-se em Porto Pinda, no sul de Angola, em Março de 1884. Após uma incursão de Roberto Ivens pelo rio Curoca, a comitiva reúne-se, de novo, desta vez em Moçamedes, para a partida definitiva, a 29 de abril daquele ano.
Foram 14 meses de inferno no interior africano, durante os quais, a fome, o frio, a natureza agreste, os animais selvagens, a mosca tsé-tsé, puseram em permanente risco a vida dos exploradores e comitiva. As constantes deserções e a doença e morte de carregadores aumentavam o perigo e a incerteza. Só de uma vez, andaram perdidos 42 dias, por terrenos pantanosos, sob condições meteorológicas difíceis, sem caminhos e sem gente por perto. Foram dados como mortos ou perdidos, pois durante quase um ano não houve notícias deles.
Ao longo de toda a viagem, Roberto Ivens escreve, desenha, faz croquis, levanta cartas; Hermenegildo Capelo recolhe espécimes de plantas, rochas e animais.
A 21 de junho 1885, a expedição chega finalmente a Quelimane, em Moçambique, cumpridos todos os objetivos definidos pelo governo.
Na viagem foram percorridas 4500 milhas geográficas (mais de 8.300 km), 1.500 das quais por regiões ignotas, tendo-se feito numerosas determinações geográficas e observações magnéticas e meteorológicas.
Estas expedições, para além de terem permitido fazer várias determinações geográficas, colheitas de fósseis, minerais e de várias coleções de história natural, tinham como objetivo essencial afirmar a presença portuguesa nos territórios explorados e reivindicar os respetivos direitos de soberania, já que os mesmos se incluíam no famoso mapa cor-de-rosa que delimitava as pretensões portuguesas na África meridional.
    
Roberto Ivens (de pé) com Hermenegildo Capelo em Iaca
      
Honra e glória
Finda a viagem de exploração, Roberto Ivens e Hermenegildo Capelo foram recebidos como heróis em Lisboa, a 16 de setembro de 1885. O próprio rei D. Luís dirigiu-se ao cais para os receber em pessoa e os condecorar à chegada. O rio Tejo regurgitava de embarcações. Nunca se havia visto tamanho cortejo fluvial. Acompanhados pelo rei foram conduzidos ao Arsenal da Marinha para as boas vindas, com Lisboa a vestir-se das suas melhores galas para os receber. Foram oito dias de festas constantes, com colchas nas varandas, iluminação, fogos de artifício, receções, almoços, jantares e discursos sobre a heroica viagem.
Mais tarde, o Porto não quis ficar atrás, excedendo-se em manifestações de regozijo e receções. E no estrangeiro, Madrid esmerou-se em festas, conferências, receções e condecorações; em Paris é-lhes conferida a Grande Medalha de Honra.
Em Ponta Delgada, por iniciativa de Ernesto do Canto sucederam-se as manifestações em honra do herói. O dia 6 de dezembro de 1885 foi o escolhido para as solenidades. As ruas da cidade encheram-se de gente de todas as condições sociais. Cada profissão, cada instituição se incorporou no cortejo cívico com os seus pendões. Não faltaram as bandas de música e os discursos. Expressamente para esse dia foi composto o número único do jornal Ivens e Capelo e foi executado um Hino a Roberto Ivens, com letra de Manuel José Duarte e música de Quintiliano Furtado.
Roberto Ivens faleceu no Dafundo, Oeiras, em 28 de janeiro de 1898, deixando viúva e três filhos que, por decreto de D. Carlos, continuariam a receber o subsídio que havia sido atribuído ao pai. O enterro, a 29 de janeiro, foi uma grande manifestação de pesar nacional. A urna, de mogno, estava coberta com a bandeira nacional. O segundo tenente Ivens Ferraz conduzia o bicórnio e a espada do falecido, envolta em crepe. Sobre a urna, três coroas de flores. No largo do Cemitério de Carnaxide prestou as honras fúnebres uma força de 160 praças do corpo de marinheiros, com a respetiva charanga, e junto do jazigo, o Ministro da Marinha proferiu o elogio fúnebre.
     

terça-feira, junho 06, 2023

Malangatana nasceu há 87 anos...

   
Malangatana Valente Ngwenya (Matalana, distrito de Marracuene, Moçambique, 6 de junho de 1936 - Matosinhos, Portugal, 5 de janeiro de 2011) foi um artista plástico e poeta moçambicano, conhecido internacionalmente pelo seu primeiro nome "Malangatana", tendo produzido trabalhos em vários suportes e meios, desde desenho, pintura, escultura, cerâmica, murais, poesia e música.
 
Vista do mercado através da prisão, 1967
   

domingo, maio 28, 2023

José Craveirinha nasceu há 101 anos...


  
José João Craveirinha (Lourenço Marques, 28 de maio de 1922 - Maputo, 6 de fevereiro de 2003) é considerado o poeta maior de Moçambique. Em 1991, tornou-se o primeiro autor africano galardoado com o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa.
Utilizou os seguintes pseudónimos: Mário Vieira, J.C., J. Cravo, José Cravo, Jesuíno Cravo e Abílio Cossa. Foi presidente da Associação Africana na década de 50.
Esteve preso, entre 1965 e 1969, por fazer parte de uma célula da 4.ª Região Político-Militar da Frelimo.
Foi o primeiro presidente da Mesa da Assembleia Geral da Associação dos Escritores Moçambicanos, entre 1982 e 1987. Em sua homenagem, a Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO), em parceria com a HCB (Hidroeléctrica de Cahora Bassa), instituiu em 2003, o Prémio José Craveirinha de Literatura.
  


Quero Ser Tambor
 
Tambor está velho de gritar

Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
corpo e alma só tambor
só tambor gritando na noite quente dos trópicos.
  
Nem flor nascida no mato do desespero
Nem rio correndo para o mar do desespero
Nem zagaia temperada no lume vivo do desespero
Nem mesmo poesia forjada na dor rubra do desespero.
 
Nem nada!
 
Só tambor velho de gritar na lua cheia da minha terra
Só tambor de pele curtida ao sol da minha terra
Só tambor cavado nos troncos duros da minha terra.
 
Eu
Só tambor rebentando o silêncio amargo da Mafalala
Só tambor velho de sentar no batuque da minha terra
Só tambor perdido na escuridão da noite perdida.
  
Oh velho Deus dos homens
eu quero ser tambor
e nem rio
e nem flor
e nem zagaia por enquanto
e nem mesmo poesia.
Só tambor ecoando como a canção da força e da vida
Só tambor noite e dia
dia e noite só tambor
até à consumação da grande festa do batuque!
Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
só tambor!

 

José Craveirinha

segunda-feira, março 20, 2023

Poema de aniversariante de hoje...

(imagem daqui)

 

Feliz do que é levado a enterrar
     
     
Feliz do que é levado a enterrar, 
Tão indiferente como quem nasceu! 
Feliz do que não soube desejar, 
Feliz, bem mais feliz do que sou eu! 
 
Feliz do que não riu para não chorar, 
Feliz do que não teve e não perdeu! 
Feliz do que não sofre se ficar, 
Feliz do que partiu e não sofreu! 
 
Feliz do que acha bela e vasta a terra! 
Feliz do que acredita a fome, a guerra, 
Terrores imaginários de crianças! 
 
Feliz do que não ouve o mundo aos gritos, 
Feliz! Felizes todos e benditos 
Os que Deus fez iguais às pombas mansas 
   
 
 
in Poemas (1960) - Reinaldo Ferreira

O poeta Reinaldo Ferreira nasceu há 101 anos...

(imagem daqui)
   
Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira (Barcelona, 20 de março de 1922 - Lourenço Marques - atualmente Maputo, 30 de junho de 1959) foi um poeta português que realizou toda a sua obra em Moçambique.
Filho do célebre Repórter X, Reinaldo Ferreira chega a Lourenço Marques em 1941, finaliza o 7º ano do liceu e ingressa como aspirante no Quadro Administrativo da Colónia, tendo subido até Chefe de Posto.
Os primeiros poemas começam a ser publicados nos jornais locais ou em revistas de artes e letras. Adapta para a rádio peças de teatro e, mais tarde, colabora no teatro de revista. Foi o autor da letra de diversas canções ligeiras, entre as quais Kanimambo, Uma Casa Portuguesa e Piripiri.
Em 1959 é-lhe detetado cancro do pulmão e morre em junho desse ano. Não editou nenhum livro em vida.
A coletânea dos seus poemas surgiu em 1960.
António José Saraiva e Óscar Lopes compararam-no ao poeta Fernando Pessoa, realçando «o mesmo sentir pensado, a mesma disponibilidade imensamente cética e fingidora de crenças, recordações ou afetos, o mesmo gosto amargo de assumir todas as formas de negatividade ou avesso lógico».
    
    
   
Receita para fazer um herói

Tome-se um homem,
Feito de nada, como nós,
E em tamanho natural.
Embeba-se-lhe a carne,
Lentamente,
Duma certeza aguda, irracional,
Intensa como o ódio ou como a fome.
Depois, perto do fim,
Agite-se um pendão
E toque-se um clarim.

Serve-se morto.

 

Reinaldo Ferreira