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sexta-feira, maio 05, 2023

João de Lemos nasceu há 204 anos

  
João de Lemos Seixas Castelo Branco, (Peso da Régua, 6 de maio de 1819 - Maiorca, Figueira da Foz, 16 de janeiro de 1890), foi um jornalista, poeta e dramaturgo português.

O «trovador» João de Lemos, como era conhecido desde o tempo de Coimbra, onde se formou em direito, pela publicação do jornal poético O Trovador, interessantíssimo repositório das produções poéticas dum grupo de moços estudantes. Além dele, alma e diretor dessa publicação, faziam parte do Trovador Luís da Costa Pereira, António Xavier Rodrigues Cordeiro, Luís Augusto Palmeirim, José Freire de Serpa, Augusto Lima e Couto Monteiro.

Ultra romântico e estrénuo miguelista, adepto furibundo do ancien-regime e da Monarquia absoluta que sempre ansiou, com todo o ardor que ressuscitasse, nasceu muito prosaicamente no Peso da Régua, em 1819, às vésperas, portanto, da Revolução de 1820. Mas toda a sua vida dedicou-a ele ao seu ideal político, tendo usufruído de grande prestígio dentro da corte dos talassas da época.

Colaborou em diversas outras publicações periódicas, de que são exemplo o jornal humorístico A Comédia Portuguesa começado a publicar em 1888, a Revista Universal Lisbonense (1841-1859) e a Revista Contemporânea de Portugal e Brasil (1859-1865).

 

in Wikipédia

 

A lua de Londres

É noite. O astro saudoso
Rompe a custo um plúmbeo céu,
Tolda-lhe o rosto formoso
Alvacento, húmido véu,
Traz perdida a cor de prata,
Nas águas não se retrata,
Não beija no campo a flor,
Não traz cortejo de estrelas,
Não fala de amor às belas,
Não fala aos homens de amor.

Meiga Lua! Os teus segredos
Onde os deixaste ficar?
Deixaste-os nos arvoredos
Das praias de além do mar?
Foi na terra tua amada,
Nessa terra tão banhada
Por teu límpido clarão?
Foi na terra dos verdores,
Na pátria dos meus amores,
Pátria do meu coração!

Oh! que foi!... Deixaste o brilho
Nos montes de Portugal,
Lá onde nasce o tomilho,
Onde há fontes de cristal;
Lá onde viceja a rosa,
Onde a leve mariposa
Se espaneja à luz do sol;
Lá onde Deus concedera
Que em noite de Primavera
Se escutasse o rouxinol.

Tu vens, ó Lua, tu deixas
Talvez há pouco o país
Onde do bosque as madeixas
Já têm um flóreo matiz;
Amaste do ar a doçura,
Do azul e formosura,
Das águas o suspirar.
Como hás-de agora entre gelos
Dardejar teus raios belos,
Fumo e névoa aqui amar?

Quem viu as margens do Lima,
Do Mondego os salgueirais;
Quem andou por Tejo acima,
Por cima dos seus cristais;
Quem foi ao meu pátrio Douro
Sobre fina areia de ouro
Raios de prata esparzir
Não pode amar outra terra
Nem sob o céu de Inglaterra
Doces sorrisos sorrir.

Das cidades a princesa
Tens aqui; mas Deus igual
Não quis dar-lhe essa lindeza
Do teu e meu Portugal.
Aqui, a indústria e as artes;
Além, de todas as partes,
A natureza sem véu;
Aqui, ouro e pedrarias,
Ruas mil, mil arcarias;
Além... a terra e o céu!

Vastas serras de tijolo,
Estátuas, praças sem fim
Retalham, cobrem o solo,
Mas não me encantam a mim.
Na minha pátria, uma aldeia,
Por noites de lua cheia,
É tão bela e tão feliz!...
Amo as casinhas da serra
Co'a Lua da minha terra,
Nas terras do meu país.

Eu e tu, casta deidade,
Padecemos igual dor;
Temos a mesma saudade,
Sentimos o mesmo amor.
Em Portugal, o teu rosto
De riso e luz é composto;
Aqui, triste e sem clarão.
Eu, lá, sinto-me contente;
Aqui, lembrança pungente
Faz-me negro o coração.

Eia, pois, ó astro amigo,
Voltemos aos puros céus.
Leva-me, ó Lua, contigo,
Preso num raio dos teus.
Voltemos ambos, voltemos,
Que nem eu nem tu podemos
Aqui ser quais Deus nos fez,
Terás brilho, eu terei vida,
Eu já livre e tu despida
Das nuvens do céu inglês.

  
  
João de Lemos

 

quarta-feira, março 22, 2023

Guimarães Passos nasceu há 156 anos

(imagem daqui)
  
Sebastião Cícero dos Guimarães Passos (Maceió, 22 de março de 1867 - Paris, 9 de setembro de 1909) foi um poeta brasileiro.


   
  
NIHIL


Sem aos outros mentir, vivi meus dias
desditosos por dias bons tomando,
das pessoas alegres me afastando
e rindo às outras mais do que eu sombrias.

Enganava-me assim, não me enganando;
fiz dos passados males alegrias
do meu presente e das melancolias
sempre gozos futuros fui tirando.

Sem ser amado, fui feliz amante;
imaginei-me bom, culpado sendo;
e se chorava, ria ao mesmo instante.

E tanto tempo fui assim vivendo,
de enganar-me tornei-me tão constante,
que hoje nem creio no que estou dizendo.
 
 
 
Guimarães Passos 

quarta-feira, março 08, 2023

O poeta e pedagogo João de Deus nasceu há 193 anos

  
João de Deus de Nogueira Ramos (São Bartolomeu de Messines, 8 de março de 1830 - Lisboa, 11 de janeiro de 1896), mais conhecido por João de Deus, foi um eminente poeta lírico e pedagogo, considerado à época o primeiro do seu tempo, e o proponente de um método de ensino da leitura, assente numa Cartilha Maternal por ele escrita, que teve grande aceitação popular, sendo ainda utilizado. Gozou de extraordinária popularidade, foi quase um culto, sendo ainda em vida objeto das mais variadas homenagens. Foi considerado o poeta do amor e encontra-se sepultado no Panteão Nacional da Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa.
    
      

 
A VIDA

Foi-se-me pouco a pouco amortecendo
a luz que nesta vida me guiava,
olhos fitos na qual até contava
ir os degraus do túmulo descendo.

Em se ela anuviando, em a não vendo,
já se me a luz de tudo anuviava;
despontava ela apenas, despontava
logo em minha alma a luz que ia perdendo.

Alma gémea da minha, e ingénua e pura
como os anjos do céu (se o não sonharam...)
quis mostrar-me que o bem bem pouco dura!

Não sei se me voou, se ma levaram;
nem saiba eu nunca a minha desventura
contar aos que inda em vida não choraram ...

......................................................

A vida é o dia de hoje,
a vida é ai que mal soa,
a vida é sombra que foge,
a vida é nuvem que voa;
a vida é sonho tão leve
que se desfaz como a neve
e como o fumo se esvai:
A vida dura um momento,
mais leve que o pensamento,
a vida leva-a o vento,
a vida é folha que cai!

A vida é flor na corrente,
a vida é sopro suave,
a vida é estrela cadente,
voa mais leve que a ave:
Nuvem que o vento nos ares,
onda que o vento nos mares
uma após outra lançou,
a vida – pena caída
da asa de ave ferida -
de vale em vale impelida,
a vida o vento a levou!

 
 
in
Campo de Flores (1893) - João de Deus

Poesia cantada adequado à data...

 

LÁGRIMA CELESTE

 

Lágrima celeste,

pérola do mar,

tu que me fizeste

para me encantar!

 

Ah! se tu não fosses

lágrima do céu,

lágrimas tão doces

não chorava eu.

 

Se eu nunca te visse,

bonina do vale,

talvez não sentisse

nunca amor igual.

 

Pomba debandada,

que é dos filhos teus?

Luz da madrugada,

luz dos olhos meus!

 

Meu suspiro eterno,

meu eterno amor,

de um olhar mais terno

que o abrir da flor.

 

Quando o néctar chora

que se lhe introduz

ao romper da aurora

e ao raiar da luz!

 

Esta voz te enleve,

este adeus lá soe,

o Senhor to leve

e Deus te abençoe.

 

O Senhor te diga

se te adoro ou não,

minha doce amiga

do meu coração!

 

Se de ti me esqueço

ou já me esqueci,

ou se mais lhe peço

do que ver-te a ti!

 

A ti, que amo tanto

como a flor a luz,

como a ave o canto,

e o Cordeiro a Cruz;

 

A campa o cipreste,

a rola o seu par,

lágrima celeste,

pérola do mar.

 

Lágrima celeste,

pérola do mar,

tu que me fizeste

para me encantar?

 


in Campo de Flores (1868) - João de Deus

 

sexta-feira, março 03, 2023

Bulhão Pato nasceu há 195 anos

Retrato de Bulhão Pato, por Columbano Bordalo Pinheiro
     
Raimundo António de Bulhão Pato (Bilbau, 3 de março de 1828 - Monte da Caparica, 24 de agosto de 1912), conhecido como Bulhão Pato, foi um poeta, ensaísta e memorialista português, sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa. As suas Memórias, escritas em tom íntimo e nostálgico, são interessantes pelas informações biográficas e históricas que fornecem, retratando o ambiente intelectual português da última metade do século XIX.
   
Biografia
Filho de Francisco de Bulhão Pato, poeta e fidalgo português, e da espanhola María de la Piedad Brandy, o poeta nasceu em Bilbau, no País Basco, e passou os seus primeiros anos no distrito de Deusto, na época dos dois primeiros cercos de Bilbau (em 1835 e 1836), durante a Primeira Guerra Carlista. Em 1837, depois de sofrer grandes transtornos, a sua família decide retirar-se para Portugal.
Em 1845, o jovem Raimundo António matricula-se na Escola Politécnica, mas não completaria o curso. Ganhou a vida como 2º oficial da 1ª repartição da Direcção-Geral do Comércio e Indústria. Bon vivant, era apreciador de caçadas, viagens, da gastronomia e dos saraus literários, na companhia de intelectuais, como Alexandre Herculano, Almeida Garrett, Andrade Corvo, Latino Coelho, Mendes Leal, Rebelo da Silva e Gomes de Amorim. Com outras personalidades importantes da sociedade portuguesa da época, forneceu receitas para a obra O cozinheiro dos cozinheiros, editada em 1870 por Paul Plantier.
Aderiu à literatura ultrarromântica então em voga, acrescentando elementos folclóricos e descrições de cenas e tipos populares, em linguagem viva e coloquial. O poema narrativo Paquita, sucessivamente reeditado de 1866 a 1894 e que o tornou célebre, parece já prenunciar um certo realismo, enquanto a sua poesia satírica reflete uma certa preocupação social.
Em 1850, publica o seu primeiro livro, Poesias de Raimundo António de Bulhão Pato; em 1862 aparece o segundo, Versos de Bulhão Pato, e, em 1866, o poema Paquita. Publicaram-se depois, em 1867 as Canções da Tarde; em 1870 as Flôres agrestes; em 1871 as Paizagens, em prosa; em 1873 os Canticos e satyras; em 1881 o Mercador de Veneza; em 1879 Hamlet, traduções das tragédias de William Shakespeare e do Ruy Blas de Victor Hugo. Em 1881 seguindo-se outras publicações: Satyras, Canções e Idyllios; o Livro do Monte, em 1896.
Para o teatro, escreveu apenas uma comédia em um acto, Amor virgem n'uma peccadora, encenada no Teatro D. Maria II em 1858 e publicada nesse mesmo ano.
Foi colaborador em diferentes jornais: Pamphletos (1858), a Semana, Revista Peninsular, Revista Contemporanea e Revista Universal, entre outros.
Pelo seu ultrarromantismo, influenciado por Lamartine e Byron, e os seus dotes culinários, Bulhão Pato acreditou ter servido de inspiração a Eça de Queirós na composição do personagem - algo caricatural - do poeta "Tomás de Alencar", que aparece em Os Maias (1888). Ao se crer retratado no romance - o que Eça negou, numa deliciosa carta ao jornalista Carlos Lobo d'Ávila -, Bulhão Pato parece ter ficado furioso e, em resposta, escreveu as sátiras "O Grande Maia" (1888) e "Lázaro Cônsul" (1889).
   
  
  
   
Amêijoas à Bulhão Pato é um prato típico da culinária portuguesa, de origem da região de Estremadura. Alega-se que o nome deste petisco é um tributo ao poeta português Raimundo António de Bulhão Pato após este ter mencionado um cozinheiro nos seus escritos.
É um prato muito comum em marisqueiras e cervejarias, a par com a salada de polvo, salada de ovas e camarão. O prato é confecionado com amêijoas, azeite, alho, coentros, sal, pimenta e limão (para temperar antes de servir). Algumas receitas podem adicionar uma pequena porção de vinho branco.
As Amêijoas à Bulhão Pato foram um dos candidatos finalistas às 7 Maravilhas da Gastronomia portuguesa.
  
 
Improviso 


Porque lânguida essa frente
Descai, quando a tarde expira?
Porque nesse olhar dormente
Tua alma ingénua suspira?

Porquê? ai! porquê? responde;
Que se amor do ceu procura,
Ei-lo; em meu peito se esconde;
Vive, é teu, tens a ventura!

Verás como então brilhante,
Seduz, toma vida, inspira,
Esse teu belo semblante,
Que apenas hoje se admira!
 
 
Bulhão Pato

sexta-feira, fevereiro 17, 2023

Gustavo Adolfo Bécquer nasceu há 187 anos

   
Gustavo Adolfo Claudio Domínguez Bastida (Sevilla, 17 de febrero de 1836 - Madrid, 22 de diciembre de 1870), más conocido como Gustavo Adolfo Bécquer, fue un poeta y narrador español, perteneciente al movimiento del Romanticismo. Por ser un romántico tardío, ha sido asociado igualmente con el movimiento posromántico. Aunque en vida ya alcanzó cierta fama, solo después de su muerte y tras la publicación del conjunto de sus escritos alcanzó el prestigio que hoy se le reconoce.
Su obra más célebre son las Rimas y Leyendas. Los poemas e historias incluidos en esta colección son esenciales para el estudio de la literatura hispana, sobre la que ejercieron posteriormente una gran influencia.
  

 

Porque son, niña, tus ojos

 

Porque son, niña, tus ojos
verdes como el mar te quejas:
verdes los tienen las náyades,
verdes los tuvo Minerva
y verdes son las pupilas
de las hurís del profeta.

El verde es gala y ornato
del bosque en la primavera.
Entre sus siete colores
brillante el iris lo ostenta.
Las esmeraldas son verdes,
verde el color del que espera
y las ondas del Océano
y el laurel de los poetas.

Es tu mejilla temprana
rosa de escarcha cubierta,
en que el carmín de los pétalos
se ve al través de las perlas.
Y sin embargo,
sé que te quejas
porque tus ojos
crees que la afean:
pues no lo creas,
que parecen tus pupilas,
húmedas, verdes e inquietas,
tempranas hojas de almendro
que al soplo del aire tiemblan.

Es tu boca de rubíes
purpúrea granada abierta.
que en el estío convida a
apagar la sed en ella.
Y sin embargo,
sé que te quejas
porque tus ojos
crees que la afean:
pues no lo creas,
que parecen, si enojada
tus pupilas centellean,
las olas del mar que rompen
en las cantábricas peñas.

Es tu frente que corona
crespo el oro en ancha trenza,
nevada cumbre en que el día
su postrera luz refleja.
Y sin embargo,
sé que te quejas
porque tus ojos
crees que la afean:
pues no lo eras,
que, entre las rubias pestañas,
junto a las sienes, semejan
broches de esmeralda y oro
que un blanco armiño sujetan.

 

Gustavo Adolfo Bécquer 

sábado, janeiro 28, 2023

António Feliciano de Castilho nasceu há 223 anos

  
António Feliciano de Castilho, 1.º Visconde de Castilho, (Lisboa, 28 de janeiro de 1800 - Lisboa, 18 de junho de 1875) foi um escritor romântico português, polemista e pedagogo, inventor do Método Castilho de leitura. Em consequência de sarampo perdeu a visão quase completamente aos 6 anos de idade. Licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra. Viveu alguns anos em Ponta Delgada, Açores, onde exerceu uma grande influência entre a intelectualidade local. Contra ele se rebelou Antero de Quental (entre outros jovens estudantes coimbrões) na célebre polémica do Bom-Senso e Bom-Gosto, vulgarmente chamada de Questão Coimbrã, que opôs os jovens representantes do realismo e do naturalismo aos vetustos defensores do ultra-romantismo.
   
     
 
OS TREZE ANOS
(Cantilena)


Já tenho treze anos,
que os fiz por Janeiro:
Madrinha, casai-me
com Pedro Gaiteiro.

Já sou mulherzinha,
já trago sombreiro,
já bailo ao Domingo
com as mais no terreiro.

Já não sou Anita,
como era primeiro;
sou a Senhora Ana,
que mora no outeiro.

Nos serões já canto,
nas feiras já feiro,
já não me dá beijos
qualquer passageiro.

Quando levo as patas,
e as deito ao ribeiro,
olho tudo à roda,
de cima do outeiro.

E só se não vejo
ninguém pelo arneiro,
me banho co’as patas
Ao pé do salgueiro.

Miro-me nas águas,
rostinho trigueiro,
que mata de amores
a muito vaqueiro.

Miro-me, olhos pretos
e um riso fagueiro,
que diz a cantiga
que são cativeiro.

Em tudo, madrinha,
já por derradeiro
me vejo mui outra
da que era primeiro.

O meu gibão largo,
de arminho e cordeiro,
já o dei à neta
do Brás cabaneiro,

dizendo-lhe: «Toma
gibão, domingueiro,
de ilhoses de prata,
de arminho e cordeiro.

A mim já me aperta,
e a ti te é laceiro;
tu brincas co’as outras
e eu danço em terreiro».

Já sou mulherzinha,
já trago sombreiro,
já tenho treze anos,
que os fiz por Janeiro.

Já não sou Anita,
sou a Ana do outeiro;
Madrinha, casai-me
com Pedro Gaiteiro.

Não quero o sargento,
que é muito guerreiro,
de barbas mui feras
e olhar sobranceiro.

O mineiro é velho,
não quero o mineiro:
Mais valem treze anos
que todo o dinheiro.

Tão-pouco me agrado
do pobre moleiro,
que vive na azenha
como um prisioneiro.

Marido pretendo
de humor galhofeiro,
que viva por festas,
que brilhe em terreiro.

Que em ele assomando
co’o tamborileiro,
logo se alvorote
o lugar inteiro.

Que todos acorram
por vê-lo primeiro,
e todas perguntem
se ainda é solteiro.

E eu sempre com ele,
romeira e romeiro,
vivendo de bodas,
bailando ao pandeiro.

Ai, vida de gostos!
Ai, céu verdadeiro!
Ai, Páscoa florida,
que dura ano inteiro!

Da parte, madrinha,
de Deus vos requeiro:
Casai-me hoje mesmo
com Pedro Gaiteiro.

 

António Feliciano de Castilho

segunda-feira, janeiro 16, 2023

O poeta João de Lemos morreu há 133 anos


João de Lemos Seixas Castelo Branco, (Peso da Régua, 6 de maio de 1819 - Maiorca, Figueira da Foz, 16 de janeiro de 1890), foi um jornalista, poeta e dramaturgo português.

O «trovador» João de Lemos, como era conhecido desde o tempo de Coimbra, onde se formou em direito, pela publicação do jornal poético O Trovador, interessantíssimo repositório das produções poéticas dum grupo de moços estudantes. Além dele, alma e director dessa publicação, faziam parte do Trovador Luís da Costa Pereira, António Xavier Rodrigues Cordeiro, Luís Augusto Palmeirim, José Freire de Serpa, Augusto Lima e Couto Monteiro.

Ultra romântico e intrépido miguelista, adepto furibundo do ancien-regime e da monarquia absoluta que sempre ansiou, com todo o ardor que ressuscitasse, nasceu muito prosaicamente no Peso da Régua, em 1819, às vésperas, portanto, da Revolução de 1820. Mas toda a sua vida dedicou-a ele ao seu ideal político, tendo usufruído de grande prestígio dentro da corte dos talassas da época.

Colaborou em diversas outras publicações periódicas, de que são exemplo o jornal humorístico A Comédia Portuguesa começado a publicar em 1888, a Revista Universal Lisbonense (1841-1859) e a Revista Contemporânea de Portugal e Brasil (1859-1865).

 

in Wikipédia

  

A lua de Londres

É noite. O astro saudoso
Rompe a custo um plúmbeo céu,
Tolda-lhe o rosto formoso
Alvacento, húmido véu,
Traz perdida a cor de prata,
Nas águas não se retrata,
Não beija no campo a flor,
Não traz cortejo de estrelas,
Não fala de amor às belas,
Não fala aos homens de amor.

Meiga Lua! Os teus segredos
Onde os deixaste ficar?
Deixaste-os nos arvoredos
Das praias de além do mar?
Foi na terra tua amada,
Nessa terra tão banhada
Por teu límpido clarão?
Foi na terra dos verdores,
Na pátria dos meus amores,
Pátria do meu coração!

Oh! que foi!... Deixaste o brilho
Nos montes de Portugal,
Lá onde nasce o tomilho,
Onde há fontes de cristal;
Lá onde viceja a rosa,
Onde a leve mariposa
Se espaneja à luz do sol;
Lá onde Deus concedera
Que em noite de Primavera
Se escutasse o rouxinol.

Tu vens, ó Lua, tu deixas
Talvez há pouco o país
Onde do bosque as madeixas
Já têm um flóreo matiz;
Amaste do ar a doçura,
Do azul e formosura,
Das águas o suspirar.
Como hás-de agora entre gelos
Dardejar teus raios belos,
Fumo e névoa aqui amar?

Quem viu as margens do Lima,
Do Mondego os salgueirais;
Quem andou por Tejo acima,
Por cima dos seus cristais;
Quem foi ao meu pátrio Douro
Sobre fina areia de ouro
Raios de prata esparzir
Não pode amar outra terra
Nem sob o céu de Inglaterra
Doces sorrisos sorrir.

Das cidades a princesa
Tens aqui; mas Deus igual
Não quis dar-lhe essa lindeza
Do teu e meu Portugal.
Aqui, a indústria e as artes;
Além, de todas as partes,
A natureza sem véu;
Aqui, ouro e pedrarias,
Ruas mil, mil arcarias;
Além... a terra e o céu!

Vastas serras de tijolo,
Estátuas, praças sem fim
Retalham, cobrem o solo,
Mas não me encantam a mim.
Na minha pátria, uma aldeia,
Por noites de lua cheia,
É tão bela e tão feliz!...
Amo as casinhas da serra
Co'a Lua da minha terra,
Nas terras do meu país.

Eu e tu, casta deidade,
Padecemos igual dor;
Temos a mesma saudade,
Sentimos o mesmo amor.
Em Portugal, o teu rosto
De riso e luz é composto;
Aqui, triste e sem clarão.
Eu, lá, sinto-me contente;
Aqui, lembrança pungente
Faz-me negro o coração.

Eia, pois, ó astro amigo,
Voltemos aos puros céus.
Leva-me, ó Lua, contigo,
Preso num raio dos teus.
Voltemos ambos, voltemos,
Que nem eu nem tu podemos
Aqui ser quais Deus nos fez,
Terás brilho, eu terei vida,
Eu já livre e tu despida
Das nuvens do céu inglês.

  
  
João de Lemos

quarta-feira, janeiro 11, 2023

O grande poeta e pedagogo João de Deus morreu há 127 anos

  
João de Deus de Nogueira Ramos (São Bartolomeu de Messines, 8 de março de 1830 - Lisboa, 11 de janeiro de 1896), mais conhecido por João de Deus, foi um eminente poeta lírico e pedagogo, considerado à época o primeiro do seu tempo, e o proponente de um método de ensino da leitura, assente numa Cartilha Maternal por ele escrita, que teve grande aceitação popular, sendo ainda utilizado. Gozou de extraordinária popularidade, foi quase um culto, sendo ainda em vida objeto das mais variadas homenagens. Foi considerado o poeta do amor e encontra-se sepultado no Panteão Nacional da Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa.

 


 

LÁGRIMA CELESTE
 
 
Lágrima celeste,
pérola do mar,
tu que me fizeste
para me encantar!
 
Ah! se tu não fosses
lágrima do céu,
lágrimas tão doces
não chorava eu.
 
Se eu nunca te visse,
bonina do vale,
talvez não sentisse
nunca amor igual.
 
Pomba debandada,
que é dos filhos teus?
Luz da madrugada,
luz dos olhos meus!
 
Meu suspiro eterno,
meu eterno amor,
de um olhar mais terno
que o abrir da flor.

Quando o néctar chora
que se lhe introduz
ao romper da aurora
e ao raiar da luz!
 
Esta voz te enleve,
este adeus lá soe,
o Senhor to leve
e Deus te abençoe.
 
O Senhor te diga
se te adoro ou não,
minha doce amiga
do meu coração!
 
Se de ti me esqueço
ou já me esqueci,
ou se mais lhe peço
do que ver-te a ti!
 
A ti, que amo tanto
como a flor a luz,
como a ave o canto,
e o Cordeiro a Cruz;
 
A campa o cipreste,
a rola o seu par,
lágrima celeste,
pérola do mar.
 
Lágrima celeste,
pérola do mar,
tu que me fizeste
para me encantar?
 
 
in
Campo de Flores (1893) - João de Deus

domingo, novembro 27, 2022

Soares de Passos nasceu há 196 anos

  
António Augusto Soares de Passos (Porto, 27 de novembro de 1826 – Porto, 8 de fevereiro de 1860) foi um poeta, expoente máximo do Ultra-Romantismo em Portugal.
 
Biografia
Nascido no seio da média burguesia comerciante portuense, viveu largas temporadas da infância com o pai ausente, fugido às perseguições que lhe moveram durante as guerras civis pelas suas ideias liberais, o que terá marcado o temperamento algo soturno do jovem António Augusto. Tendo aprendido francês e inglês durante a juventude, ingressou na Universidade de Coimbra, em 1849, para cursar Direito.  
  
Obra

Em Coimbra conviveu com outros estudantes do Porto, como Alexandre Braga, Silva Ferraz e Aires de Gouveia, com quem fundou, em 1851, a revista Novo Trovador. Em 1854, já formado, regressou ao Porto e, depois de uma passagem pelo Tribunal da Relação do Porto, decide dedicar-se exclusivamente à literatura, colaborando ativamente nos jornais de poesia O Bardo (1852-1854) e A Grinalda (1855-1869) e preparando a edição em volume das suas Poesias (1856).

Para a sua celebridade contribuiu não apenas a sua imagem de misantropo e a frequência dos salões portuenses, como também o bom acolhimento dos críticos, nomeadamente de Alexandre Herculano que, em carta, considerou Soares de Passos como "o primeiro poeta lírico português deste século" (referindo-se ao século XIX).

A sua qualidade pode ser creditada ao facto de ter escrito com autenticidade, pois os sentimentos derramados em seu texto são os que realmente viveu, já que foi pessoa extremamente sofrida, por vezes dominada por uma doença que, reza a lenda, deixou-o preso por anos em seu quarto. Isso explica a proeza de ter trabalhado muito bem com clichês que nas mãos dos outros poetas são extremamente ridículos. Melhor exemplo disso é "O Noivado no Sepulcro".

Os seus poemas são fruto de uma angústia da sensação da proximidade da morte precoce mesclada ao desgosto pela situação em que se encontrava seu país. O incrível é que sabe alternar esses aspectos soturnos a momentos de extrema confiança na mudança das condições sociais. Essas oposições dramáticas talvez sejam a causa da visão trágica com que o poeta enxerga o mundo. Quando parte para a religião, enfoca a tragédia de Deus castigando todos; quando enfoca a História, mostra uma sucessão de episódios lastimosos; quando olha o cotidiano, enxerga somente a desgraça.

Sendo um poeta muito divulgado no seu tempo, morreu precocemente, aos trinta e três anos, vítima da tuberculose, deixando um único livro – Poesias – onde confluem todas as tendências do imaginário poético seu contemporâneo. Foi sepultado no Cemitério da Lapa, no Porto. 

O portal de entrada do Cemitério da Lapa, no Porto, onde o poeta Soares de Passos foi sepultado, exibe a seguinte inscrição, precisamente da autoria do escritor ultra-romântico:

Eis ossos carcomidos, cinzas frias,

Em que paraõ da vida os breves dias,

Mortal se quanto vês te naõ abala

Ouve a tremenda voz que assim te falla,

" - Lembra-te homem que és pó, e que d'est arte

- Em pó ou cêdo ou tarde has-de tornar-te."

 

   
in Wikipédia

  
  
O Noivado do Sepulcro

Vai alta a lua! na mansão da morte
Já meia-noite com vagar soou;
Que paz tranquila; dos vaivéns da sorte
Só tem descanso quem ali baixou.

Que paz tranquila!... mas eis longe, ao longe
Funérea campa com fragor rangeu;
Branco fantasma semelhante a um monge,
D'entre os sepulcros a cabeça ergueu.

Ergueu-se, ergueu-se!... na amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.

Ergueu-se, ergueu-se!... com sombrio espanto
Olhou em roda... não achou ninguém...
Por entre as campas, arrastando o manto,
Com lentos passos caminhou além.

Chegando perto duma cruz alçada,
Que entre ciprestes alvejava ao fim,
Parou, sentou-se e com a voz magoada
Os ecos tristes acordou assim:

"Mulher formosa, que adorei na vida,
"E que na tumba não cessei d'amar,
"Por que atraiçoas, desleal, mentida,
"O amor eterno que te ouvi jurar?

"Amor! engano que na campa finda,
"Que a morte despe da ilusão falaz:
"Quem d'entre os vivos se lembrara ainda
"Do pobre morto que na terra jaz?

"Abandonado neste chão repousa
"Há já três dias, e não vens aqui...
"Ai, quão pesada me tem sido a lousa
"Sobre este peito que bateu por ti!

"Ai, quão pesada me tem sido!" e em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na mão,
E entre soluços arrancou do seio
Fundo suspiro de cruel paixão.

"Talvez que rindo dos protestos nossos,
"Gozes com outro d'infernal prazer;
"E o olvido cobrirá meus ossos
"Na fria terra sem vingança ter!

- "Oh nunca, nunca!" de saudade infinda,
Responde um eco suspirando além...
- "Oh nunca, nunca!" repetiu ainda
Formosa virgem que em seus braços tem.

Cobrem-lhe as formas divinas, airosas,
Longas roupagens de nevada cor;
Singela c'roa de virgínias rosas
Lhe cerca a fronte dum mortal palor.

"Não, não perdeste meu amor jurado:
"Vês este peito? reina a morte aqui...
"É já sem forças, ai de mim, gelado,
"Mas inda pulsa com amor por ti.

"Feliz que pude acompanhar-te ao fundo
"Da sepultura, sucumbindo à dor:
"Deixei a vida... que importava o mundo,
"O mundo em trevas sem a luz do amor?

"Saudosa ao longe vês no céu a lua?
- "Oh vejo sim... recordação fatal!
- "Foi à luz dela que jurei ser tua
"Durante a vida, e na mansão final.

"Oh vem! se nunca te cingi ao peito,
"Hoje o sepulcro nos reúne enfim...
"Quero o repouso de teu frio leito,
"Quero-te unido para sempre a mim!"

E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério
Foi celebrado, d'infeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,
Já desse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada a lousa por ignota mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro unido,
Foram achados num sepulcro só. 
     
 
Soares de Passos

terça-feira, agosto 16, 2022

António Nobre, o célebre Anto, nasceu há 155 anos...

    
António Pereira Nobre (Porto, 16 de agosto de 1867 - Foz do Douro, 18 de março de 1900), mais conhecido como António Nobre, foi um poeta português cuja obra se insere nas correntes ultra-romântica, simbolista, decadentista e saudosista (interessada na ressurgência dos valores pátrios) da geração finissecular do século XIX português. A sua principal obra, (Paris, 1892), é marcada pela lamentação e nostalgia, imbuída de subjetivismo, mas simultaneamente suavizada pela presença de um fio de auto-ironia e com a rotura com a estrutura formal do género poético em que se insere, traduzida na utilização do discurso coloquial e na diversificação estrófica e rítmica dos poemas. Apesar da sua produção poética mostrar uma clara influência de Almeida Garrett e de Júlio Dinis, ela insere-se decididamente nos cânones do simbolismo francês. A sua principal contribuição para o simbolismo lusófono foi a introdução da alternância entre o vocabulário refinado dos simbolistas e um outro mais coloquial, reflexo da sua infância, junto do povo nortenho. Faleceu, com apenas 32 anos de idade, após uma prolongada luta contra a tuberculose pulmonar.
  
Capa de , de António Nobre, publicado em 1892
      
    
  
Vaidade, Tudo Vaidade!
  
Vaidade, meu amor, tudo vaidade!
Ouve: quando eu, um dia, for alguém,
Tuas amigas ter-te-ão amizade,
(Se isso é amizade) mais do que, hoje, têm.
  
Vaidade é o luxo, a glória, a caridade,
Tudo vaidade! E, se pensares bem,
Verás, perdoa-me esta crueldade,
Que é uma vaidade o amor de tua mãe...
  
Vaidade! Um dia, foi-se-me a Fortuna
E eu vi-me só no mar com minha escuna,
E ninguém me valeu na tempestade!
  
Hoje, já voltam com seu ar composto,
Mas eu, vê lá! eu volto-lhes o rosto...
E isto em mim não será uma vaidade?
  
  
in Só (1892) - António Nobre

segunda-feira, junho 06, 2022

António Gomes Leal nasceu há 174 anos

Gomes Leal, caricaturado por Rafael Bordalo Pinheiro
      
António Duarte Gomes Leal (Lisboa, 6 de junho de 1848 - Lisboa, 29 de janeiro de 1921) foi um poeta e crítico literário português.
Nasceu na praça do Rossio, freguesia da Pena, em Lisboa, filho natural de João António Gomes Leal (m. 1876), funcionário da Alfândega, e de Henriqueta Fernandina Monteiro Alves Cabral Leal.
Frequentou o Curso Superior de Letras, mas não o concluiu, empregando-se como escrevente de um notário de Lisboa. Durante a sua juventude assumiu pose de poeta boémio e janota, mas, com a morte da sua mãe, em 1910, caiu na pobreza e reconverteu-se ao catolicismo. Vivia da caridade alheia, chegando a passar fome e a dormir ao relento, em bancos de jardim, como um vagabundo, tendo uma vez sido brutalmente agredido pela canalha da rua. No final da vida, Teixeira de Pascoaes e outros escritores lançaram um apelo público para que o Estado lhe atribuísse uma pensão, o que foi conseguido, apesar de diminuta.
Foi um dos fundadores do jornal "O Espectro de Juvenal" (1872) e do jornal "O Século" (1881), tendo colaborado também na Gazeta de Portugal, Revolução de Setembro e Diário de notícias. Tem ainda colaboração na revista ilustrada Nova Silva (1907) e outras publicações periódicas, nomeadamente: O berro (1896), Branco e Negro (1896-1898), Brasil-Portugal (1899-1914), A corja (1898), A galeria republicana (1882-1883), A imprensa (1885-1891), Jornal de domingo (1881-1888) A leitura (1894-1896), A mulher (1879), As quadras do povo (1909), Ribaltas e gambiarras (1881), O Thalassa (1913-1915) e o Xuão (1908-1910). A sua obra insere-se nas correntes ultra-romântica, parnasiana, simbolista e decadentista.
       
    
        
Carta ao Mar
 
Deixa escrever-te, verde mar antigo,
Largo Oceano, velho deus limoso,
Coração sempre lírico, choroso,
E terno visionário, meu amigo!

Das bandas do poente lamentoso
Quando o vermelho sol vai ter contigo,
- Nada é mais grande, nobre e doloroso,
Do que tu, - vasto e húmido jazigo!

Nada é mais triste, trágico e profundo!
Ninguém te vence ou te venceu no mundo!...
Mas tambem, quem te pode consolar?!

Tu és Força, Arte, Amor, por excelência! -
E, contudo, ouve-o aqui, em confidência;
- A Música é mais triste inda que o Mar!


 

in Claridades do Sul (1875) - António Gomes Leal

quinta-feira, maio 05, 2022

O poeta ultra-romântico João de Lemos nasceu há 203 anos

  
João de Lemos Seixas Castelo Branco, (Peso da Régua, 6 de maio de 1819 - Maiorca, Figueira da Foz, 16 de janeiro de 1890), foi um jornalista, poeta e dramaturgo português.

O «trovador» João de Lemos, como era conhecido desde o tempo de Coimbra, onde se formou em direito, pela publicação do jornal poético O Trovador, interessantíssimo repositório das produções poéticas dum grupo de moços estudantes. Além dele, alma e director dessa publicação, faziam parte do Trovador Luís da Costa Pereira, António Xavier Rodrigues Cordeiro, Luís Augusto Palmeirim, José Freire de Serpa, Augusto Lima e Couto Monteiro.

Ultra romântico e estrénuo miguelista, adepto furibundo do ancien-regime e da Monarquia absoluta que sempre ansiou, com todo o ardor que ressuscitasse, nasceu muito prosaicamente no Peso da Régua, em 1819, às vésperas, portanto, da Revolução de 1820. Mas toda a sua vida dedicou-a ele ao seu ideal político, tendo usufruído de grande prestígio dentro da corte dos talassas da época.

Colaborou em diversas outras publicações periódicas, de que são exemplo o jornal humorístico A Comédia Portuguesa começado a publicar em 1888, a Revista Universal Lisbonense (1841-1859) e a Revista Contemporânea de Portugal e Brasil (1859-1865).

 

in Wikipédia

 
NÃO TE ENTENDO CORAÇÃO

Mas se não amo, nem posso,
Que pode então isto ser?
Coração, se já morreste,
Porque te sinto bater?
Ai, desconfio que vives
Sem tu nem eu o saber.

Porque a olho quando a vejo?
Porque a vejo sem a olhar?
Porque longe dos meus olhos
Me andam os seus a lembrar?
Porque levo tantas horas
Nela somente a pensar?

Porque tímido lhe falo,
E dantes não era assim?
Porque mal a voz lhe escuto
Não sei o que sinto em mim?
Porque nunca um não me acode
Em tudo que ela diz sim?

Porque estremeço contente
Quando ela me estende a mão,
E se aos outros faz o mesmo
Porque é que não gosto e não?
Deveras que não me entendo,
Nem te entendo, coração.

Ou me enganas, ou te engano;
Se isto amor não pode ser,
Não atino, não conheço
Que outro nome possa ter;
Ai, coração, que vivemos
Sem tu nem eu o saber.

 

João de Lemos

terça-feira, março 22, 2022

O poeta Guimarães Passos nasceu há 155 anos

(imagem daqui)
  
Sebastião Cícero dos Guimarães Passos (Maceió, 22 de março de 1867 - Paris, 9 de setembro de 1909) foi um poeta brasileiro.
Compareceu às reuniões de instalação da Academia Brasileira de Letras, onde fundou a cadeira 26, que tem como patrono Laurindo Rabelo.
Era filho do major Tito Alexandre Ferreira Passos e de Rita Vieira Guimarães Passos. O seu avô, José Alexandre dos Passos, fora advogado e professor, dedicado também ao estudo de questões vernáculas. Guimarães Passos fez seus estudos primários e os preparatórios em Alagoas. Aos 19 anos foi para o Rio de Janeiro, onde se juntou aos jovens boémios da época. Era a idade de ouro da boémia dos cafés, e não poderia haver melhor ambiente para o espírito do poeta. Entrou para a redação dos jornais, fazendo parte do grupo de Paula Ney, Olavo Bilac, Coelho Neto, José do Patrocínio, Luís Murat e Artur Azevedo. Colaborou com a Gazeta da Tarde, a Gazeta de Notícias e A Semana. Nas suas colunas ia publicando cronicas e versos. Nos vários lugares em que trabalhou, escrevia também sob pseudónimos: Filadelfo, Gill, Floreal, Puff, Tim e Fortúnio.
Foi também arquivista da Secretaria da Mordomia da Casa Imperial. Com a proclamação da República, e extinta essa repartição, Guimarães Passos perdeu o lugar e passou a viver unicamente de seus trabalhos jornalísticos. Com a declaração da revolta de 6 de setembro de 1893, aderiu ao movimento. Fez parte do governo revolucionário instalado no Paraná, e lutou contra Floriano Peixoto. Vencida a revolta, conseguiu fugir. Exilou-se em Buenos Aires durante 18 meses. Lá colaborou nos jornais La Nación e La Prensa e fez conferências sobre temas literários relacionados ao Brasil.
Em 1896, de volta do exílio, foi um dos primeiros poetas chamados para formar a Academia Brasileira de Letras. Escolheu para seu patrono outro boémio, o poeta Laurindo Rabelo. Encontrou, no Rio de Janeiro, a sua geração inteiramente transformada. Alguns dos antigos companheiros encontravam-se agora em postos bem remunerados, eram reconhecidos, enquanto ele permanecia como o último boémio. Ficou doente de tuberculose e, não conseguindo melhoras no Brasil, partiu para a ilha da Madeira e, daí, para Paris, onde veio a falecer, em 1909. Só em 1921 a Academia Brasileira conseguiu fazer trasladar os restos mortais para o Brasil. Para aqui vieram acompanhados dos de Raimundo Correia, falecido em Paris em 1911.
Poeta parnasiano, lírico e, às vezes, um pouco pessimista, Guimarães Passos foi também humorista na sua colaboração para O Filhote, reunida depois no livro Pimentões, que publicou de parceria com Olavo Bilac. Ao tratar de Versos de um simples, José Veríssimo viu nele o "poeta delicado, de emoção ligeira e superficial, risonho, de inspiração comum, mas de estro fácil, como o seu verso, natural e espontâneo, poeta despretensioso, poeta no sentido popular da palavra".


   
  
NIHIL


Sem aos outros mentir, vivi meus dias
desditosos por dias bons tomando,
das pessoas alegres me afastando
e rindo às outras mais do que eu sombrias.

Enganava-me assim, não me enganando;
fiz dos passados males alegrias
do meu presente e das melancolias
sempre gozos futuros fui tirando.

Sem ser amado, fui feliz amante;
imaginei-me bom, culpado sendo;
e se chorava, ria ao mesmo instante.

E tanto tempo fui assim vivendo,
de enganar-me tornei-me tão constante,
que hoje nem creio no que estou dizendo.
 
 
 
Guimarães Passos 

terça-feira, março 08, 2022

João de Deus, poeta e pedagogo, nasceu há 192 anos

  
João de Deus de Nogueira Ramos (São Bartolomeu de Messines, 8 de março de 1830 - Lisboa, 11 de janeiro de 1896), mais conhecido por João de Deus, foi um eminente poeta lírico e pedagogo, considerado à época o primeiro do seu tempo, e o proponente de um método de ensino da leitura, assente numa Cartilha Maternal por ele escrita, que teve grande aceitação popular, sendo ainda utilizado. Gozou de extraordinária popularidade, foi quase um culto, sendo ainda em vida objecto das mais variadas homenagens. Foi considerado o poeta do amor e encontra-se sepultado no Panteão Nacional da Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa.
    

LÁGRIMA CELESTE
 
 
Lágrima celeste,
pérola do mar,
tu que me fizeste
para me encantar!
 
Ah! se tu não fosses
lágrima do céu,
lágrimas tão doces
não chorava eu.
 
Se eu nunca te visse,
bonina do vale,
talvez não sentisse
nunca amor igual.
 
Pomba debandada,
que é dos filhos teus?
Luz da madrugada,
luz dos olhos meus!
 
Meu suspiro eterno,
meu eterno amor,
de um olhar mais terno
que o abrir da flor.

Quando o néctar chora
que se lhe introduz
ao romper da aurora
e ao raiar da luz!
 
Esta voz te enleve,
este adeus lá soe,
o Senhor to leve
e Deus te abençoe.
 
O Senhor te diga
se te adoro ou não,
minha doce amiga
do meu coração!
 
Se de ti me esqueço
ou já me esqueci,
ou se mais lhe peço
do que ver-te a ti!
 
A ti, que amo tanto
como a flor a luz,
como a ave o canto,
e o Cordeiro a Cruz;
 
A campa o cipreste,
a rola o seu par,
lágrima celeste,
pérola do mar.
 
Lágrima celeste,
pérola do mar,
tu que me fizeste
para me encantar?
 
 
in
Campo de Flores (1893) - João de Deus