Tornou-se conhecida mundialmente como a
Rainha do Fado e, por consequência, devido ao simbolismo que este género musical tem na
cultura portuguesa, foi considerada por muitos como uma das suas melhores embaixadoras no mundo. Aparecia em vários programas de televisão pelo mundo fora, onde não só cantava fados e outras músicas de tradição popular portuguesa, como ainda canções contemporâneas (iniciando o chamado fado-canção) e mesmo alguma música de origem estrangeira (francesa, americana, espanhola, italiana, brasileira). Marcante contribuição sua para a história do Fado, foi a novidade que introduziu de cantar poemas de grandes autores portugueses consagrados, depois de musicados. Teve ainda ao serviço da sua voz a pena de alguns dos maiores poetas e letristas seus contemporâneos, como
David Mourão Ferreira,
Pedro Homem de Mello,
Ary dos Santos,
Manuel Alegre,
Alexandre O’Neill e outros.
Filha de Albertino de Jesus Rodrigues (
Castelo Branco,
Castelo Branco, 6 de Agosto de 1888 - 13 de Maio de 1962), um músico sapateiro que, para sustentar os quatro filhos e a mulher (
Fundão,
Fundão, 3 de Fevereiro de 1913), Lucinda da Piedade Rebordão (Fundão,
São Martinho, 2 de Maio de 1892 - Lisboa,
Graça, 23 de Novembro de 1986), tentou a sua sorte em
Lisboa. Amália nasceu a
1 de julho de
1920, porém apenas foi registada dias depois, tendo no seu assento de nascimento como nascida às cinco horas de
23 de julho de
1920, na rua Martim Vaz, na freguesia lisboeta da
Pena. Amália pretendia, no entanto, que o aniversário fosse celebrado a
1 de julho ("no tempo das cerejas"), e dizia:
Talvez por ser essa a altura do mês em que havia dinheiro para me comprarem os presentes. Catorze meses depois, o pai, não tendo arranjado trabalho, volta com a família para o
Fundão. Amália fica com os avós na capital.
A sua faceta de cantora cedo se revela. Amália era muito tímida, mas começa a cantar para o avô e os vizinhos, que lhe pediam. Na infância e juventude, cantarolava
tangos de
Carlos Gardel e canções populares que ouvia e lhe pediam para cantar.
Aos 9 anos, a avó,
analfabeta, manda Amália para a
escola, que tanto gostava de frequentar. Contudo, aos 12 anos tem que interromper a sua escolaridade como era frequente em casas pobres. Escolhe então o ofício de bordadeira, mas depressa muda para ir embrulhar bolos.
Aos 14 anos decide ir viver com os pais, que entretanto regressam a
Lisboa. Mas a vida não é tão boa como em casa dos avós. Amália tinha que ajudar a mãe e aguentar o irmão mais velho, autoritário. Trabalha como bordadeira, engomadeira e tarefeira.
Aos 15 anos vai vender fruta para a zona do Cais da Rocha, e torna-se notada devido ao especialíssimo timbre de voz. Integra a Marcha Popular de
Alcântara (nas festividades de
Santo António de Lisboa) de
1936. O ensaiador da Marcha insiste para que Amália se inscreva numa prova de descoberta de talentos, chamada
Concurso da Primavera, em que se disputava o título de
Rainha do Fado. Amália acabaria por não participar, pois todas as outras concorrentes se recusavam a competir com ela.
Conhece nessa altura o seu futuro marido, Francisco da Cruz (c. 1915 - ?), um
guitarrista amador, com o qual casará em
1940. Um assistente recomenda-a para a casa de fados mais famosa de então, o
Retiro da Severa, mas Amália acaba por recusar esse convite, e depois adiar a resposta, e só em
1939 irá cantar nessa casa.
Em
1943 divorcia-se a seu pedido. Torna-se então independente. Neste mesmo ano actua pela primeira vez fora de
Portugal, a convite do embaixador
Pedro Teotónio Pereira, canta em
Madrid.
Em
1944 consegue um papel proeminente, ao lado de
Hermínia Silva, na opereta
Rosa Cantadeira, onde interpreta o
Fado do Ciúme, de
Frederico Valério. Em setembro, chega ao
Rio de Janeiro acompanhada pelo maestro Fernando de Freitas para actuar no
Casino Copacabana. Aos 24 anos, Amália tem já um espectáculo concebido em exclusivo para ela. A recepção é de tal forma entusiástica que o seu contrato inicial de 4 semanas se prolongará por 4 meses. É convidada a repetir a turné, acompanhada por bailarinos e músicos.
Amália é apoiada por artistas inovadores como
Almada Negreiros e
António Ferro. Esse que a convida pela primeira vez a cantar em
Paris, no
Chez Carrère, e a
Londres, no
Ritz, em festas do departamento de Turismo que o próprio organiza.
A internacionalização de Amália aumenta com a participação, em
1950, nos espectáculos do
Plano Marshall, o plano de apoio dos
Estados Unidos à
Europa do pós-guerra, em que participam os mais importantes artistas de cada país. O êxito repete-se por
Trieste,
Berna,
Paris e
Dublin (onde canta a canção
Coimbra, que, atentamente escutada pela cantora francesa
Yvette Giraud, é popularizada por ela em todo o mundo como
Avril au Portugal).
Em
Roma, Amália actua no
Teatro Argentina, sendo a única artista ligeira num espectáculo em que figuram os mais famosos cantores de
música clássica.
Em setembro de 1952 a sua estreia em Nova Iorque fez-se no palco do La Vie en Rose, onde ficou 14 semanas em cartaz. Ainda nos
Estados Unidos, em 1953 canta pela primeira vez na televisão (na
NBC), no programa do Eddie Fisher patrocinado pela
Coca-Cola, que
teve que beber e de que não gostara nada. Grava discos de fado e de flamenco. Convidam-na para ficar, mas não fica por que não quer.
Nos EUA editou o seu primeiro
LP (as gravações anteriores eram em discos de 78 rotações).
Amalia Rodrigues Sings Fado From Portugal and Flamenco From Spain, lançado em 1954 pela Angel Records, assinala a sua estreia no formato do long-play, a 33 rotações, criado apenas seis anos antes e, na época, ainda longe de conhecer a expressão de mercado que depois viria a conquistar. O álbum, que seria editado em 1957 em Inglaterra e, um ano depois, em França, nunca teve prensagem portuguesa.
Amália dá ao
fado um fulgor novo. Canta o repertório tradicional de uma forma diferente, sincretizando o que é
rural e
urbano.
A 26 de abril de
1961, casa-se no
Rio de Janeiro com o seu segundo marido, o engenheiro luso-brasileiro César Henrique de Moura de Seabra Rangel (
Anadia,
Avelãs do Caminho, c. 1920 -
Odemira,
Zambujeira do Mar, 11 de junho de 1997), filho de Augusto César de Seabra Rangel (Anadia, Avelãs de Caminho, Casa dos Rangel, 16 de abril de 1885 - Anadia, Avelãs do Caminho, Casa dos Rangel, 28 de outubro de 1929), sobrinho-neto do 1.º
Barão de Mogofores, e de sua mulher Teresa de Seabra de Moura, com quem fica até à morte deste, em
1997.
Em
1966, volta aos
Estados Unidos, actuando no
Lincoln Center, em Nova Iorque, com o maestro Andre Kostelanetz frente a uma orquestra, num programa essencialmente feito de canções do folclore português, numa das noites e num outro, feito de fados (também com orquestra), na seguinte. O mesmo espectáculo foi encenado, dias depois, no
Hollywood Bowl. Voltaria ao
Lincoln Center em 1968.
Ainda em 1966, o seu amigo
Alain Oulman é preso pela
PIDE. Amália dá todo o seu apoio ao amigo e tudo faz para que seja libertado e posto na fronteira.
Em 1974 grava o álbum
Encontro - Amália e Don Byas com o saxofonista
Don Byas.
Ao mesmo tempo, atravessa dissabores financeiros que a obrigam a desfazer-se de algum do seu património.
Em
1997 é editado pela
Valentim de Carvalho o álbum
Segredo com gravações inéditas realizadas entre
1965 e
1975. É ainda publicado o livro (Versos) com os seus poemas. É-lhe feita uma homenagem nacional na Exposição Mundial de Lisboa (
Expo 98).
Em abril de
1999, Amália desloca-se pela última vez a
Paris, sendo condecorada na Cinemateca Francesa, por os muitos espectáculos que deu naquela cidade e, dever-se a ela o facto da França começar a apreciar o
Fado. Já ligeiramente debilitada, agradeceu aos franceses o facto de se ter começado a projectar no mundo, pois era a partir de França que os seus discos começaram a espalhar-se.
A
6 de outubro de
1999, Amália Rodrigues morre, em sua casa, repentinamente, ao início da manhã, com 79 anos, poucas horas depois de regressar da sua casa de férias no
litoral alentejano. Imediatamente, o então
primeiro-ministro,
António Guterres, decreta
Luto Nacional por três dias. No seu funeral centenas de milhares de
lisboetas e portugueses descem à rua para lhe prestar uma última homenagem. Foi sepultada no
Cemitério dos Prazeres, em Lisboa. Dois anos depois, em
julho de
2001, o seu corpo foi trasladado para o
Panteão Nacional, em
Lisboa (após pressão dos seus admiradores e uma modificação da lei que exigia um mínimo de quatro anos antes da trasladação), onde repousam as personalidades consideradas expoentes máximos da
nacionalidade.