José Sobral de Almada Negreiros (Trindade, São Tomé e Príncipe, 7 de abril de 1893 - Lisboa, 15 de junho de 1970) foi um artista multidisciplinar português que se dedicou fundamentalmente às artes plásticas (desenho, pintura, etc.) e à escrita (romance, poesia, ensaio, dramaturgia), ocupando uma posição central na primeira geração de modernistas portugueses.
Almada Negreiros é uma figura ímpar no panorama artístico português do
século XX. Essencialmente autodidata (não frequentou qualquer escola de
ensino artístico), a sua precocidade levou-o a dedicar-se desde muito
jovem ao desenho de humor. Mas a notoriedade que adquiriu no início de
carreira prende-se acima de tudo com a escrita, interventiva ou
literária. Almada teve um papel particularmente ativo na primeira
vanguarda modernista, com importante contribuição para a dinâmica do
grupo ligado à Revista Orpheu,
sendo a sua ação determinante para que essa publicação não se
restringisse à área das letras. Aguerrido, polémico, assumiu um papel
central na dinâmica do futurismo em Portugal: "Se à introversão de Fernando Pessoa
se deve o heroísmo da realização solitária da grande obra que hoje se
reconhece, ao ativismo de Almada deve-se a vibração espetacular do
«futurismo» português e doutras oportunas intervenções públicas, em que
era preciso dar a cara".
Mas a intervenção pública de Almada e a sua obra não marcaram apenas o
primeiro quartel do século XX. Ao contrário de companheiros próximos
como Amadeo de Souza-Cardoso e Santa-Rita,
ambos mortos em 1918, a sua ação prolongou-se ao longo de várias
décadas, sobrepondo-se à da segunda e terceira geração de modernistas. A
contundência das suas intervenções iniciais iria depois abrandar,
cedendo o lugar a uma atitude mais lírica e construtiva que abriu
caminho para a sua obra plástica e literária da maturidade. Eduardo Lourenço escreve: "Estranho
arco de vida e arte o que une Almada «Futurista e tudo», Narciso do
Egipto da provocante juventude, ao mago hermético certo de ter
encontrado nos anos 40, «a chave» de si e do mundo no «número imanente
do universo»".
Almada é também um caso particular no modo como se posicionou em termos
de carreira artística. Esteve em Paris, como quase todos os candidatos
a artista então faziam, mas fê-lo desfasado dos companheiros de
geração e por um período curto, sem verdadeiramente se entrosar com o
meio artístico parisiense. E se Paris foi para ele pouco mais do que um
ponto de passagem, a sua segunda permanência no estrangeiro revelou-se
ainda mais atípica. Residiu em Madrid durante vários anos e o seu
regresso ficou associado à decisão de se centrar definitiva e
exclusivamente em Portugal.
Ao longo da vida empenhou-se numa enorme diversidade de áreas e meios
de expressão – desenho e pintura, ensaio, romance, poesia, dramaturgia…
até o bailado –, que Fernando de Azevedo classifica de "fulgurante dispersão".
Sem se fixar num domínio único e preciso, o que emerge é sobretudo a
imagem do artista total, inclassificável, onde o todo supera a soma das
partes. Também neste aspeto Almada se diferencia dos seus pares mais
notáveis, Amadeo de Souza-Cardoso e Fernando Pessoa, cuja concentração
num território único, exclusivo, foi condição necessária à realização
das obras máximas que nos deixaram como legado.
Personalidade incontornável, a inserção de Almada Negreiros na vida e na cultura nacionais é extremamente complexa; segundo José Augusto França, dele fica sobretudo a imagem de "português sem mestre" e, também, tragicamente, "sem discípulos".
Em 1952 expõe individualmente na Galeria de Março
(exposição inaugural dessa galeria) e participa na Exposição de Arte
Moderna (Lisboa). Dois anos mais tarde pinta a primeira versão de Retrato de Fernando Pessoa para o restaurante Irmãos Unidos. Em 1957 participa na I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian,
sendo galardoado com um prémio extra concurso. Ainda dentro da
colaboração com Pardal Monteiro, entre 1957 e 1961 realiza grandes
painéis decorativos para as fachadas de vários edifícios da Cidade Universitária de Lisboa (Faculdade de Direito; Faculdade de Letras; Reitoria). Em 1960 dá uma série de entrevistas, publicadas no Diário de Notícias, onde de algum modo encerra o seu "itinerário espiritual" e retoma a questão da reconstrução do Painéis de São Vicente de Fora; em 1963 expõe na Sociedade Nacional de Belas Artes,
em Lisboa, e nesse mesmo ano é alvo de homenagem por ocasião do seu
septuagésimo aniversário, sendo publicada a primeira monografia sobre a
sua obra, da autoria de José Augusto França. Encomendas e atividades diversas preenchem os anos finais, entre as quais se destacam as tapeçarias para a Exposição de Lausana, para o Tribunal de Contas e para o Hotel Ritz, Lisboa; uma série de gravuras em vidro acrílico (1963) e cenários para o «Auto da Alma», de Gil Vicente, no Teatro Nacional de São Carlos, a sua última participação no teatro. É condecorado com o grau de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada a 13 de julho de 1967. Em 1968-1969 realiza o painel Começar, para o átrio do edifício sede da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. Em julho de 1969 faz a sua derradeira intervenção pública, participando no programa televisivo Zip-Zip.
Morre em Lisboa, a 15 de junho de 1970, no mesmo quarto em que faleceu Fernando Pessoa, no Hospital de São Luís dos Franceses, no Bairro Alto.
Começar, 1968-69
in Wikipédia
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