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quinta-feira, setembro 27, 2012

Há 55 anos o Vulcão dos Capelinhos teve a sua última erupção

Vista do Vulcão dos Capelinhos, do Cais Comprido - o farol marca o antigo limite da terra firme antes da erupção (clicar para aumentar)

O Vulcão dos Capelinhos, também referido na literatura vulcanológica como Mistério dos Capelinhos, localiza-se na Ponta dos Capelinhos, freguesia do Capelo, na Ilha do Faial, nos Açores. Constitui-se em uma das maiores atrações turísticas do Atlântico, nomeadamente dos Açores, pela singularidade de sua beleza paisagística, de génese muito recente e quase virgem.
Geologicamente insere-se no complexo vulcânico do Capelo, constituído por cerca de 20 cones de escórias e respectivos derrames lávicos, ao longo de um alinhamento vulcano-tectónico de orientação geral WNW-ESE. O nome Capelinhos deveu-se à existência de dois ilhéus chamados de "Ilhéus dos Capelinhos".
O vulcão manteve-se em actividade por 13 meses, entre 27 de setembro de 1957 e 24 de outubro de 1958. A erupção dos Capelinhos, provavelmente terá sido uma sobreposição de duas erupções distintas, uma começada a 27 de setembro de 1957, e a segunda, a 14 de maio de 1958. A partir de 25 de outubro, o vulcão entrou em fase de repouso. Do ponto de vista vulcanológico, deverá ser considerado um vulcão potencialmente activo.

Um marco na vulcanologia
O vulcão dos Capelinhos é reconhecidamente um marco na vulcanologia mundial. "Foi uma erupção submarina devidamente observada, documentada e estudada, desde do início até ao fim. Apareceu em condições privilegiadas, junto de uma ilha habitada, com estrada, farol e telefones privativos." - comenta o vulcanólogo Doutor Victor Hugo Forjaz. Com 16 anos, acompanhado de seu pai, Dr. António Lacerda Forjaz, presidente em exercício da Junta Geral do Distrito da Horta, assistiu ao início da erupção. Este tornou-se afectivamente no "seu vulcão".
Foi o Eng. Frederico Machado, Director das Obras Públicas, auxiliado pelo Eng. João do Nascimento, e o topógrafo António Denis, o pioneiro na sua investigação científica. O Director do Observatório de Angra, Tenente-coronel José Agostinho, sobrevoou a erupção. O Observatório Príncipe Alberto do Mónaco, chefiado por Bernardo Almada, emitiu diversos boletins sismológicos de grande valor.

Vulcão dos Capelinhos, Centro Interpretativo do Vulcão (museu subterrâneo do vulcão)
    
Próximo situava-se o Museu Geológico do Vulcão, inaugurado a 24 de março de 1964, que documentava toda a sua atividade eruptiva e cujo acervo passou para o novo Centro Interpretativo do Vulcão. A área em torno do vulcão, classificada como paisagem protegida de elevado interesse geológico e biológico, integra a Rede Natura 2000. O Farol dos Capelinhos foi transformado num miradouro, e junto/por baixo deste, funciona o Centro Interpretativo do Vulcão, que foi inaugurado em maio de 2008.
Em resultado da erupção, entre os meses de maio a outubro de 1958, a área total da ilha (de 171,42 km²) aumentou em cerca de 2,50 km² (para 173,02 km²). Actualmente, essa área foi reduzida para cerca de metade (aproximadamente 172,42 km²) devido à natureza pouco consolidada das rochas e à acção erosiva das ondas. A escalada do vulcão apresenta alguns riscos, devendo por isso ser efectuada nos trilhos indicados e sob orientação de um guia credenciado. Convém mencionar que o respiradouro do Vulcão, situado no seu Cabeço Norte, liberta vapor de água e gases tóxicos com temperaturas na ordem dos 180 a 200 °C.

Erupção capeliniana
A designação erupção vulcânica tipo capeliniana, que por direito natural era sua, não foi prontamente patenteada pelo Eng. Frederico Machado. Em 1963, no Sul da Islândia, surgiu uma erupção idêntica - o Vulcão Surtsey. Os vulcanólogos ingleses rapidamente adoptaram terminologia surtseyana, quando na verdade deveria ter sido capeliniana.


Emigração faialense
A crise sísmica associada à erupção vulcânica e a queda de cinzas e materiais de projecção originaram a destruição generalizada das habitações, campos agrícolas e pastagens nas freguesias do Capelo e da Praia do Norte. Não houve perdas humanas a registar. Beneficiando da solidariedade demonstrada pelos EUA, milhares de sinistrados faialenses - e não poucos açorianos de outras proveniências - aproveitaram a quota especial de emigração concedida (por persistente diligência do congressista estadual Joseph Perry Júnior e dos Senadores federais John O. Pastore, de Rhode Island, e John F. Kennedy, de Massachusetts, que pouco depois seria eleito Presidente dos EUA) e procuraram refazer as suas vidas naquele país. Foi a 2 de setembro de 1958, aprovado o "Azorean Refugee Act" autorizando a concessão de 1.500 vistos. A quebra demográfica na ordem de cerca de 50%, contribuiu para uma melhoria de vida na população residente, a nível de mais oportunidades de trabalho e melhoria dos salários.


Crise sísmica e erupção

Primeira fase eruptiva
De 16 a 27 de setembro de 1957, registou-se uma crise sísmica na ilha com mais de 200 sismos, de intensidade não superior a grau V da Escala de Mercalli. No dia 23 de setembro de 1957, a água do mar começou a fervilhar. Três dias depois, a actividade aumentou intensamente havendo emissão de jatos negros de cinzas vulcânicas com cerca de 1 000 metros de altura (atingindo a altitude máxima de 1 400 metros) e uma nuvem de vapor de água que subia por vezes a mais de 4 000 metros.
A 27 de setembro, teve início pelas 06.45 horas uma erupção submarina, a 300 metros da Ponta dos Capelinhos (ou seja, a 100 metros dos Ilhéus dos Capelinhos). A partir de 13 de outubro, a emissão de gases e as explosões de piroclastos, ainda que violentas, passaram a ser menos frequentes. Estas foram rapidamente sucedidas por explosões violentas, atirando bombas de lava e grandes quantidade de cinzas para o ar, enquanto que, por baixo, correntes de lava escorriam para o mar. A erupção continuou intensa até 29 de outubro, com constantes chuvas de cinzas sobre o Faial que destruíram culturas agrícolas e forçaram a evacuação das populações das zonas mais próximas do vulcão.
A erupção evoluiu formando primeiro uma pequena ilha a 10 de outubro, chamada de "Ilha Nova" (ou "Ilha dos Capelinhos", e ainda, "Ilha do Espírito Santo"), com 600 metros de diâmetro e 30 metros de altura, ficando com a cratera aberta ao oceano. Dada a temperatura, a emissão de materiais revelou um tom acinzentado. A ilha atingiria por fim os 800 metros de diâmetro e 99 metros de altura. Esta primeira pequena ilha afundou-se na cratera, no dia 29 de outubro.
Munido da sua câmara de filmar, Carlos Tudela e Vasco Hogan Teves, repórteres da RTP, desembarcaram a 23 de outubro na ilha recém-nascida, na vertente do vulcão activo. Acompanhado do jornalista Urbano Carrasco, do Diário Popular, arriscaram as suas vidas num pequeno barco a remos (movido por Carlos Raulino Peixoto) para colocar a bandeira nacional na "Ilha Nova".

Segunda fase eruptiva
A 4 de novembro de 1957, a erupção vulcânica recomeça e rapidamente se formou uma nova ilha. Com a formação de um istmo, no dia 12 de novembro, a ilha ligou-se à ilha do Faial. A actividade eruptiva aumentou progressivamente, atingindo o seu máximo na primeira quinzena de dezembro, surgindo um segundo cone vulcânico. A 16 de dezembro, depois de uma noite de chuvas torrenciais e abundante queda de cinzas, cessou a actividade explosiva e começou a efusão de lava incandescente, a que se juntaram, três dias depois, as explosões com jactos de cinzas e muitos blocos de pedra. Precisamente no dia 29 de dezembro, a actividade eruptiva conheceu uma nova e breve pausa.

Terceira fase eruptiva
De janeiro a abril de 1958, reapareceram jatos pontiagudos de cinzas, geralmente acompanhados de fumos brancos ou acastanhados. Em março, os Ilhéus dos Capelinhos já haviam desaparecido definitivamente sob manto das cinzas e areias, tendo estas formado dois areais de apreciável dimensão, chegando a atingir vários metros de espessura junto ao farol e nas áreas adjacentes, o que levou ao soterramento de casas e à ruína dos telhados de muitas habitações próximas, ainda hoje visíveis.
No início de 1958, John Scofield, repórter da revista National Geographic, e o famoso fotógrafo Robert F. Sisson, passaram um mês a documentar as várias fases da erupção.
Depois da violenta crise sísmica na noite de 12 para 13 de maio, em que houve mais de 450 sismos, a erupção dos Capelinhos sofreu reajustamentos profundos no edifício vulcânico e na estrutura tectónica. A partir de 14 de maio, a actividade passou ao tipo estromboliano, com fortes ruídos, acompanhados de ondas infra-sónicas que fizeram estremecer portas e janelas em toda a ilha e, por vezes, nas ilhas próximas, e com a projecção de fragmentos de lava incandescente que iam a mais de 500 metros de altura. Também nesse dia, surgiram fumarolas no fundo da Caldeira (vulcão central da ilha), que emitiam vapor de água com cheiro a enxofre e com lama em ebulição.
A erupção constituiu "um espectáculo grandioso", um misto de belo e horrendo que jamais será esquecido por quem o presenciou. É legado transmitido para as gerações seguintes. A erupção prosseguiu por mais uns meses, consistindo em explosões moderadas do tipo estromboliano com várias correntes de lava, a última das quais a 21 de outubro, sendo observado no dia 24 de outubro, pela última vez a emissão de fragmentos incandescentes.

domingo, janeiro 01, 2012

2012 - the end is near... (parte II)

Do nosso amigo, o Professor Doutor Victor Hugo Forjaz, publicamos o seguinte post, colocado inicialmente no blog De Rerum Natura:


"REQUIEM" PELO MEDO DESLIZANTE


Uma das não-notícias do ano foi a anunciada catástrofe vulcânica do El Hierro. Crónica do vulcanólogo Victor Hugo Forjaz a propósito dos recentes fenómenos vulcânicos que têm ocorrido na ilha de El Hierro, nas Canárias:

1 - O vulcão submarino da Restinga, nos mares da ilha de El Hierro, tem sido noticia em todo o mundo (menos em terras açorianas, julgo eu…)! Aliás dos Açores deslocou-se apenas a vulcanóloga Prof.ª Doutora Zilda França. A permanência da nossa Colega nas Canárias foi extremamente representativa e útil. As autoridades locais cientificas e políticas acolheram-na com muito respeito e amizade. Os colegas, de diversas origens, foram cooperantes e incansáveis. Por esse motivo temos mantido relatos diários internéticos junto de milhares (sim - milhares) de peritos e de curiosos assim constituindo um fórum entusiasmante.

2 - Entretando, com o passar das semanas manteve-se o "comportamento" inusual do novo vulcão do tipo serretiano (ora se afastava ora se aproximava,ora se desenvolvia sem tremor vulcânico,ora emitia largos volumes de produtos vulcânicos, finíssimos, em silêncio sísmico, ora emitia ténues vapores ora se assinalava por borbulhantes cachões de espuma e de vapores pestilentos. Registaram-se milhares de micro a macroeventos sísmicos. Entretanto surgiram os profetas da desgraça. É sempre assim- no Faial,em Maio de 1958, durante os Capelinhos, também foi assim: segundo um jornalista lisboeta, a ilha teria a forma de cálice pelo que as sismotremuras diárias iriam fracturar o pé do cálice e depois…. pum, ficávamos todos afogados (e eu com 17 anos!). Muitos fugiram para o Pico e S. Jorge. Regressaram no fim do mês, com a chegada de Tazieff, tido como um "deus" da vulcanologia (que ajudou o Governador Freitas Pimentel e o Eng.º Frederico Machado a consolidarem a calma e a sensatez). No caso de El Hierro os profetas da desgraça brotaram outra "previsão",ou seja, papaguearam os medos do cientista inglês Simon Day, vaticinaram que os milhares de tremores telúricos, uns vulcânicos outros tectónicos, teriam abalado a ilha,"enfraquecendo-a" de tal modo que uma grande fatia de El Hierro iria deslizar para o oceano, abruptamente, assim gerando uma gigantesca vaga (um tsunami). O vagalhão iria arrasar imensas extensões costeiras, na África, no Brasil, nos EUA, na Europa… Enfim, um cataclismo inesquecível! Os promotores repetiam o já anunciado para a ilha de La Palma por Simon Day. Adios tapas e tasquitas!

3 - Mega-abatimentos ou colapsos em estruturas vulcânicas são desde há muito conhecidos: na vertente sul da montanha do Pico, no segmento sul do vulcão das Furnas (em estudo), em diversas ilhas das Canárias (sendo os de La Palma aparatosamente divulgados por Simom Day; Tenerife…) Réunion, Cabo Verde, Hawaii, Japão, etc. Pouco se sabe sobre o mecanismo desses colapsos, ou seja, se foram bruscos, se foram lentos e do tipo "creep", se foram excitados por terramotos, se foram accionados por excesso de água, se existiram condicionantes topográficas, se resultaram de incoesões gravíticas, etc. A realidade é que nenhum desses megacolapsos com megatsunamis ocorreram em tempos históricos. Não se duvida da respectiva existência mas as causas e as consequências variam de região para região. Essa é a verdade - os megatsunamis transoceânicos, ligados a colapsos de territórios vulcânicos, não se encontram bem sustentabilizados, quer documentalmente quer sedimentologicamente. Ou seja, num determinado continente não se conhecem, sem dúvidas, depósitos transportados por megatsunamis gerados em geografia oposta. Assim os terríveis deslizamentos das Canárias, com repercussões nos Açores, devem ser tomados como suposições para datas de impossível adivinhanço.

29 DEZ 2011 V-H Forjaz