sábado, janeiro 01, 2011

Só é pena a parte do retardador...

Um fim de ciclo ao retardador para José Sócrates

José Sócrates ocupa o poder há seis anos sucessivos

Em surdina, os deputados do PS falam em "fim de festa". No partido, vão-se lendo os sinais de fim de ciclo. Na bancada parlamentar, há divergências assumidas. Seja por causa da lei do financiamento partidário, seja pelo Orçamento. Ainda mais, estão lá dois protagonistas principais e potenciais candidatos à sucessão: Francisco Assis e António José Seguro. Mário Soares, líder histórico do partido, reclama aquilo que o primeiro-ministro, José Sócrates, nem quer ouvir falar: a remodelação.

Há ministros fora de tom, como aconteceu com Luís Amado, dos Negócios Estrangeiros, ao defender uma "grande coligação governamental", logo recusada por Sócrates. O próprio chefe do Governo "desafinou" do seu ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, como aconteceu com os cortes salariais na função pública ou as ordens à Caixa Geral de Depósitos por causa dos dividendos da PT.

Mas o círculo restrito de Sócrates, dizem fontes do PS, nem quer ouvir falar no assunto. A palavra de ordem continua a ser resistir. E se alguma crise se precipitar em 2011, há dirigentes nacionais a acreditar que Sócrates quer ir de novo a eleições. O problema é se o FMI entrar fronteiras dentro. Aí, o CDS-PP foi o primeiro a dizer que o executivo deveria ser substituído.

Dois sociólogos, André Freire e Manuel Meirinho Martins, ajudam a explicar o fenómeno. André Freire, professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), detecta sinais desse fim de ciclo: as sondagens com o PSD muito à frente do PS, a degradação da situação política. "No fundo, e por causa da crise, o PS está a governar com um programa que já não é o seu", afirmou ao PÚBLICO.

Já Manuel Meirinho Martins, professor de Ciência Política no ISCSP, olha a situação política e compara-a com outros momentos vividos por António Guterres (2001) e Santana Lopes (2004) para concluir que este é "um fim de ciclo arrastado".

E aponta os quatro sinais evidentes de que o ciclo socrático está a caminho do fim. Por um lado, "a incapacidade de o Governo lidar com os problemas da crise" económica, a par da "instabilidade ao nível da elite governativa". "Nota-se uma falta de coesão, como foi visível recentemente com o caso do Governo dos Açores [com a lei para contornar os cortes salariais na função pública] e com as divisões na bancada parlamentar", disse.

Depois, nota-se o "desgaste no apoio social ao Governo" e a "emergência de uma alternativa de Governo, com a transferência de expectativas para o PSD".

André Freire, investigador do Instituto de Ciências Sociais, tem uma leitura diferente quanto às sondagens. "A alternativa, o PSD, apesar de estar à frente nas sondagens, também não gera grande entusiasmo", afirma o sociólogo, lembrando estudos de opinião sobre o projecto de revisão constitucional apresentado pelo partido de Passos Coelho.

Ponto de ebulição

As presidenciais de 23 de Janeiro e a posse do Presidente da República, em Março, ajudarão a uma clarificação. Até porque, seja quem for o eleito, o chefe de Estado ganhará de novo "armas" para resolver qualquer impasse: o poder de dissolução da Assembleia e convocação de eleições. André Freire é cauteloso e admite que "pode ter algum efeito", Meirinho acredita que, se Cavaco Silva for reeleito, sendo "um institucionalista puro, não irá tomar uma iniciativa" que leve à queda do Governo. O caso será diferente se houver pressão social, a entrada do FMI no país ou uma qualquer iniciativa dos partidos na Assembleia: "Aí, acredito que sim."

A questão central é mesmo saber qual será o "ponto de ebulição"? Uma moção de censura? A entrada do FMI? Uma crise no próximo Orçamento do Estado? Ou a conflitualidade social nas ruas, como aconteceu na Grécia?
 
Tanto Manuel Meirinho como André Freire admitem que a entrada do FMI seria um factor perturbador para a situação política, embora os dois admitam a complexidade de juntar uma crise política à económica. E Freire recorda o quanto difícil seria encontrar uma solução de governação à esquerda, dado que PCP e BE, como "partidos de protesto", têm aversão a entendimentos de governação.A política portuguesa fica, assim, num nó, um "paradoxo", que Meirinho define como "uma espécie de prisão colectiva, um equilíbrio periclitante": "Por um lado, o partido que é alternativa precisa de tempo para se consolidar e até lhe dá jeito que o Governo venha a desgastar-se mais. Por outro, sabe-se que há um custo para quem criar uma crise."

E o próprio PS, em vésperas de mais um congresso, no início do ano, como assinalou André Freire, também não dá sinais de alternativas a Sócrates. "Apesar das vozes dissonantes, que fazem reparos e são pouco consequentes, não são conhecidas as alternativas a este poder. Aproxima-se um novo congresso e o líder não deverá ter adversário, o que é um sinal de fraqueza do próprio PS".

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