quinta-feira, outubro 21, 2010

Poema para depois de uma aula de música do filhote

(imagem daqui)

Moto Contínuo

Por onde passo sem cantar, já canto
Com a voz que hei-de ter.
O meu silêncio é sempre
O avesso de um verso
Ainda condenado
Ao purgatório do indefinido...
Só quando ali estiver purificado
Poderá ser ouvido.

Ouvido por alheias criaturas.
Eu,
Vítima, algoz e tronco de tortura,
Ouço o trovão
Antes da trovoada...
E arrasto, portanto,
A cruz futura do futuro canto,
Mesmo quando parece muda a caminhada.


in Diário VIII (1959) - Miguel Torga

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