José Sobral de Almada Negreiros (
Trindade,
7 de abril de
1893 -
Lisboa,
15 de junho de
1970) foi um artista multidisciplinar,
pintor,
escritor,
poeta,
ensaísta,
dramaturgo e
romancista português ligado ao grupo
modernista. Foi um dos principais colaboradores da
Revista Orpheu, bem como da
revista Portugal Futurista. Em 1935, ano em que morreu
Fernando Pessoa, lançou a sua própria revista,
Sudoeste: cadernos de Almada Negreiros.
Depois da morte da mãe, em 1896, foi viver em
Portugal; nesta altura, em 1900, o pai é nomeado encarregado do Pavilhão das Colónias na
Exposição Universal de Paris, deixando os filhos José e António ao cuidado dos
jesuítas no Colégio de Campolide.
Em
1911, após a extinção do
Colégio de Campolide dos Jesuítas e uma breve passagem pelo
Liceu de Coimbra, José entra para a
Escola Internacional de Lisboa. Nesta escola, consegue um espaço onde irá desenvolver o seu trabalho, publicando, ainda nesse ano, o seu primeiro desenho na
revista A Sátira. Publica também o jornal manuscrito
A Paródia, onde é o único redactor e ilustrador.
Júlio Dantas,
médico, poeta,
jornalista e
dramaturgo,
é a maior figura da intelectualidade da época e afirma que a revista é
feita por gente sem juízo. Irónico, mordaz, provocador mesmo, Almada
responde com o
Manifesto Anti-Dantas, onde escreve: "
…uma
geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração
que nunca o foi. É um coio d’indigentes, d’indignos e de cegos, e só
pode parir abaixo de zero! Abaixo a geração! Morra o Dantas, morra! Pim!".
O manifesto teve algum impacto no meio artístico; é tempo de mudar as
mentalidades e a sociedade, e Almada fá-lo como poucos, atacando a
cultura
burguesa instituída e os seus representantes ao mais alto nível.
Em
1917, escreve a novela
A Engomadeira.
Em
1919, vai viver para
Paris, onde exerce diversas actividades e escreve a
Histoire du Portugal par coeur. Em Paris, fica apenas cerca de um ano e, quando regressa, vai colaborar com
António Ferro, tendo inclusivamente desenhado a capa do livro deste,
Arte de Bem Morrer. Faz também as capas da revista Presença, números 47 e 54.
Em
1927, volta a deixar Portugal, desta vez para
Espanha, onde, além de colaborar com diversas revistas, escreve
El Uno, Tragédia de la Unidad, obra dedicada à pintora
Sarah Afonso, com quem viria a casar em
1934, já após o seu regresso a Portugal.
Em Portugal, vigora já o
Estado Novo, e Almada, apoiante das ideias
nacionalistas por influência do
futurismo italiano, começa a ser solicitado para colaborar com as grandes obras do Estado. O
Secretariado da Propaganda Nacional – SPN, encomenda-lhe o cartaz de apelo ao voto na nova constituição; o mesmo SPN irá organizar mais tarde a exposição
Almada – Trinta Anos de Desenho, convidando-o para se apresentar na exposição
Artistas Portugueses, no
Rio de Janeiro, em
1942.
Segundo refere
Fernando Dacosta na sua obra
Máscaras de Salazar (Lisboa, 2002), Almada Negreiros venerava o ditador
António de Oliveira Salazar,
Presidente do Conselho. Num espectáculo a que este assistiu no Teatro
de S. Carlos, em Lisboa, Almada fez questão de o cumprimentar em pessoa.
Salazar,
que não simpatizava particularmente com ele, limitou-se a perguntar, em
tom enfadado: «É o Sr. Almada?», e Almada Negreiros respondia,
subservientemente: «Sou sim, Senhor Presidente. Muita honra, Senhor
Presidente.»
Para a apreciação da controversa figura de Almada Negreiros, é útil
recordar o seu seguinte escrito, igualmente citado por Fernando Dacosta:
«
Portugal é um país de pretos [...]. Portugal, uma resultante de
todas as raças do mundo, nunca conseguiu a vantagem de um cruzamento
útil porque as raças belas isolaram-se por completo. É preciso criar a
adoração dos músculos, é preciso educar a mulher portuguesa na sua
verdadeira missão de fêmea para fazer homens. Fazei a Apoteose dos
Vencedores, seja qual for o sentido, basta que sejam vencedores. Ajudai a
morrer os vencidos. Portugal não tem ódios, ora uma raça sem ódios é
uma raça desvirilizada.» Note-se que o autor destas afirmações – que, sem exagero, podemos considerar evocadoras do ideário
nazi – tinha sangue negro (por parte da mãe).
O SPN viria ainda a atribuir a Almada Negreiros o Prémio Columbano pela sua tela intitulada Mulher.
A partir daqui, Almada dedica-se principalmente ao desenho e à pintura: pinta os
vitrais da
Igreja de Nossa Senhora de Fátima,
que o público, agarrado às tradições, não aprecia; pinta o conhecido
retrato de Fernando Pessoa, os painéis das gares marítimas de
Alcântara e da Rocha Conde de Óbidos, pelas quais recebe o
Prémio Domingos Sequeira; pinta o Edifício da Águas Livres e frescos na Escola
Patrício Prazeres; pinta as fachadas dos edifícios da
Cidade Universitária e faz tapeçarias para o Tribunal de Contas e para o Palácio da Justiça de
Aveiro, entre muitos outros.
Tendo colaborado tanto com o Estado Novo que a muita gente causou estranheza, Almada não deixaria de escrever: "As
construções do Estado multiplicam-se, porém, as paredes estão nuas como
os seus muros, como um livro aberto sem nenhuma história para o povo
ver e fixar".
Em
1954, pinta o célebre retrato de Fernando Pessoa.
Pinta também o seu célebre quadro
As mulheres amam-se que apresenta duas mulheres a acariciarem-se e que tem como fundo um bonito campo em S. Tomé.
Tem colaboração dispersa em vários títulos de publicações periódicas, designadamente
Atlântida: mensário artístico literário e social para Portugal e Brazil (1915-1920),
A Bomba (1912),
Contemporânea (1915-1926),
O domingo ilustrado : noticias & actualidades graficas, teatros, sports & aventuras, consultorios & utilidades (1925-1927),
Ilustração (1926-1939),
Ilustração Portuguesa (1903-1923),
O riso d'a vitória : quinzenário humorístico (1919-1920),
A Sátira: revista humorística de caricaturas (1911), ou a revista
Sudoeste: cadernos de Almada Negreiros (1935).
Almada Negreiros morre em
15 de junho de
1970, de paragem cardíaca, no mesmo quarto do Hospital de São Luís dos Franceses em que também tinha morrido
Fernando Pessoa.
“Auto-retrato com Boné”, óleo sobre tela de Almada-Negreiros, circa 1927