À Lua
Lua passada de moda,
Velha roda
Da fortuna dos poetas!
Dessa fortuna inconstante
Que tem o quarto minguante
No caixilho das selectas.
A vida já te não olha,
A terra já te não quer!
Desce luz a cada folha,
Mas é do sol, se ta der...
Musa fria!
Solidão de menopausa...
Poesia
Com rima e com melodia,
Mas sem causa!
Que importa o charco a brilhar,
Se é mentira?
Se a razão há-de acordar
O menestrel a sonhar
E a corda tonta da lira?
Velha lua...
Prostituta podre e nua
À porta de um bordel...
Muda as rugas da face,
Mas a velhice renasce
Do musgo da tua pele!
Bem sei que na fase nova
Podes ter um namorado...
Uma ilusão que te prova
Como a um fruto da renova
De um pomar que foi podado...
Remendos de mocidade.
Lume que acende e não dura.
Não regressa a virgindade
A quem, corrupto, a procura.
Mas tens ainda maneira
De te salvar, velha amiga:
É morrer numa fogueira
De ironia verdadeira
Que algum Poeta te diga...
in Odes (1946) - Miguel Torga
quarta-feira, julho 22, 2009
A Lua de Torga
Postado por Fernando Martins às 01:02
Marcadores: Lua, Miguel Torga, poesia
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