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sábado, março 08, 2014

Ruy Cinatti nasceu há 99 anos

(imagem daqui)
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.

Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.


Memória Amada

...........Para Alain Fournier

Vinham de longe em bandos. Acorriam
Jubilosos. Fantasias
De parques pluviosos
E, descendo,
Os patos bravos lançados
Entre juncos, salgueiros e veados.
Tarde,
Muito tarde, uns olhos tais
Haviam de aparecer, sobressaltados
Entre enigmas e um floco de cabelos
Osculado pelo vento. Alegorias...
Do agora ou nunca e do momento
Definido. Trégua impensada,
Insuspeita, no perfume alado
Da página dobrada e abandonada
Dum livro interrompido. Sinto a dor fina,
Finamente atravessada e suave,
- Quase saudade.


in O Livro do Nómada Meu Amigo (1958) - Ruy Cinatti

quinta-feira, março 08, 2012

O poeta, agrónomo e antropólogo Ruy Cinatti nasceu há 97 anos

(imagem daqui)

Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).


Quando o amor morrer dentro de ti


Quando o amor morrer dentro de ti,
Caminha para o alto onde haja espaço,
E com o silêncio outrora pressentido
Molda em duas colunas os teus braços.
Relembra a confusão dos pensamentos,
E neles ateia o fogo adormecido
Que uma vez, sonho de amor, teu peito ferido
Espalhou generoso aos quatro ventos.
Aos que passarem dá-lhes o abrigo
E o nocturno calor que se debruça
Sobre as faces brilhantes de soluços.
E se ninguém vier, ergue o sudário
Que mil saudosas lágrimas velaram;
Desfralda na tua alma o inventário
Do templo onde a vida ora de bruços
A Deus e aos sonhos que gelaram.




in Obra Poética - Ruy Cinatti

sexta-feira, março 02, 2012

O poeta Luis de Montalvor morreu há 55 anos

(imagem daqui)

Poeta, ensaísta e editor português, de nome verdadeiro Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, nascido a 31 de janeiro de 1891, em S. Vicente, Cabo Verde, e falecido a 2 de março de 1947, em Lisboa. Como editor e colaborador de Orpheu, em 1915 - onde publica, no número 1, Introdução, editorial que sublinha o carácter elitista do projeto estético que une o grupo de Orpheu, e, no número 2, o poema "Narciso" -, o seu nome inscreve-se no primeiro modernismo, no que esse movimento representou de continuidade e redescoberta do simbolismo-decadentismo. É nesse sentido que, ao fundar, no ano seguinte, Centauro, publica, a título programático relativamente à publicação, a "Tentativa de um ensaio sobre a Decadência", onde apela para uma recuperação do simbolismo, cuja breve explicação baseia numa teoria dos símbolos, bebida em Maeterlinck, movimento literário enaltecido por conter uma "teoria de libertação", "um fundo espiritual poético e misterioso, mais adiante identificado como "flor da arte decadente": ser-se decadente "É ser-se, enfim, andrógino e equívoco de qualquer maneira. É ser-se, enfim, todos, sem ser o que todos são, [...] Só são decadentes os que receberam o mandato de Deus e da Beleza [...]". É, aliás, nas páginas de Centauro, e na sequência desta reflexão, que publica os poemas inéditos de Camilo Pessanha (posteriormente recolhidos em Clepsidra, 1920), como expressão mais pura do simbolismo português. Vindo ainda a colaborar em Presença, Exílio, Athena, Contemporânea, Sudoeste, Cadernos de Poesia e Seara Nova, Luís de Montalvor desenvolveu simultaneamente uma atividade editorial de especial relevância cultural, se considerarmos o impacto que a leitura dos modernistas teve para as gerações poéticas dos anos 40 e 50, ao encetar, na editorial e livraria Ática, fundada pelo próprio em 1942, a publicação e divulgação das obras completas de Fernando Pessoa e de Mário de Sá-Carneiro. A sua poesia, esparsamente publicada, foi coligida postumamente, em 1960, e revela, sobretudo a partir da sua aproximação ao grupo de "Orpheu", uma íntima conexão com uma estética decadentista-simbolista. Numa abordagem mais modernista, publicou Noite de Satan e A Caminho, e, em colaboração com Diogo de Macedo, A Arte Indígena Portuguesa (1935).
ENTARDECER

Sol-posto ungindo o mar: incensos de ouro!

Recolhe funda a tarde em sonho e mágoa.
Surdina fluida: anda o silêncio a orar –
E há crepúsculos de asas e, na água,
O céu é mármore extático a cismar!

E nas faces marmóreas dos rochedos
Esboçam-se perfis,
- Cintilações,
Penumbra de segredos!

Ó painéis de nuvens sobre a terra,
Ogivas delirantes
Na água refractando…
Encheis de sombra o mar de espumas rasas,
Iniciando
A hora pânica das asas!

E, à meia luz da tarde,
Na areia requeimada,
São vultos sonolentos
As proas dos navios…

Ó tristeza dos balões
Iluminando,
Na água prateada,
Os pegos e baixios…

Dormentes constelações
Que, em fundos lacustres
E musgosos,
Pondes reverberações
Em nossos olhos ansiosos.

Ó tardes de aquático esplendor,
Descendo em meu olhar!

Num sonho de regresso,
Numa ânsia de voltar,
Em mim todo me esqueço
E fico-me a cismar.

A tarde é toda um sonho moribundo.
É já olor da cor que amorteceu.
O céu vive no mar: sono profundo.
A asa do rumor no ar adormeceu!


Luís de Montalvor

terça-feira, janeiro 31, 2012

O poeta Luis de Montalvor nasceu há 121 anos

(imagem daqui)

Poeta, ensaísta e editor português, de nome verdadeiro Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, nascido a 31 de janeiro de 1891, em S. Vicente, Cabo Verde, e falecido a 2 de março de 1947, em Lisboa. Como editor e colaborador de Orpheu, em 1915 - onde publica, no número 1, Introdução, editorial que sublinha o carácter elitista do projeto estético que une o grupo de Orpheu, e, no número 2, o poema "Narciso" -, o seu nome inscreve-se no primeiro modernismo, no que esse movimento representou de continuidade e redescoberta do simbolismo-decadentismo. É nesse sentido que, ao fundar, no ano seguinte, Centauro, publica, a título programático relativamente à publicação, a "Tentativa de um ensaio sobre a Decadência", onde apela para uma recuperação do simbolismo, cuja breve explicação baseia numa teoria dos símbolos, bebida em Maeterlinck, movimento literário enaltecido por conter uma "teoria de libertação", "um fundo espiritual poético e misterioso, mais adiante identificado como "flor da arte decadente": ser-se decadente "É ser-se, enfim, andrógino e equívoco de qualquer maneira. É ser-se, enfim, todos, sem ser o que todos são, [...] Só são decadentes os que receberam o mandato de Deus e da Beleza [...]". É, aliás, nas páginas de Centauro, e na sequência desta reflexão, que publica os poemas inéditos de Camilo Pessanha (posteriormente recolhidos em Clepsidra, 1920), como expressão mais pura do simbolismo português. Vindo ainda a colaborar em Presença, Exílio, Athena, Contemporânea, Sudoeste, Cadernos de Poesia e Seara Nova, Luís de Montalvor desenvolveu simultaneamente uma atividade editorial de especial relevância cultural, se considerarmos o impacto que a leitura dos modernistas teve para as gerações poéticas dos anos 40 e 50, ao encetar, na editorial e livraria Ática, fundada pelo próprio em 1942, a publicação e divulgação das obras completas de Fernando Pessoa e de Mário de Sá-Carneiro. A sua poesia, esparsamente publicada, foi coligida postumamente, em 1960, e revela, sobretudo a partir da sua aproximação ao grupo de "Orpheu", uma íntima conexão com uma estética decadentista-simbolista. Numa abordagem mais modernista, publicou Noite de Satan e A Caminho, e, em colaboração com Diogo de Macedo, A Arte Indígena Portuguesa (1935).
TARDE

Ardente, morna, a tarde que calcina,
como em quadrante a sombra que descora,
morre − baixo relevo que domina −
como um sol que sobre saibros se demora.

Inunda a terra a vaga de ouro: fina
chuva de sonho. Paira, ao longe, e chora
o olhar errado ao sol que já declina
sobre as palmeiras que o deserto implora.

A um zodíaco de fogo a tarde abrasa,
em terra de varão que o olhar esmalta.
− Estagnante plaino de ouro e rosas − vaza

nele a sombra, sem dor, que em nós começa
e galga, sobe, monta e vive e exalta.
E a noite, a grande noite, recomeça!


Luís de Montalvor