(imagem daqui)
José Joaquim Cesário Verde (Lisboa, 25 de fevereiro de 1855 - Lumiar, 19 de julho de 1886) foi um poeta português, sendo considerado um dos precursores da poesia que seria feita em Portugal no século XX.
Filho do lavrador e comerciante José Anastácio Verde e de Maria da
Piedade dos Santos Verde, Cesário matriculou-se no Curso Superior de
Letras em 1873,
mas apenas o frequentou alguns meses. Ali conheceu Silva Pinto, que
ficou seu amigo para o resto da vida. Dividia-se entre a produção de
poesias (publicadas em jornais) e as atividades de comerciante herdadas
do pai.
Em 1877
começou a ter sintomas de tuberculose, doença que já lhe tirara o irmão e
a irmã. Estas mortes inspiraram contudo um de seus principais poemas, Nós (1884).
Tenta curar-se da tuberculose, mas sem sucesso, vem a falecer no dia 19 de julho de 1886. No ano seguinte Silva Pinto organiza O Livro de Cesário Verde, compilação da sua poesia publicada em 1901.
No seu estilo delicado, Cesário empregou técnicas impressionistas, com
extrema sensibilidade ao retratar a Cidade e o Campo, que são os seus
cenários prediletos. Evitou o lirismo tradicional, expressando-se de
uma forma mais natural.
in Wikipédia
Responso
I
Num castelo deserto e solitário,
Toda de preto, às horas silenciosas,
Envolve-se nas pregas dum sudário
E chora como as grandes criminosas.
Pudesse eu ser o lenço de Bruxelas
Em que ela esconde as lágrimas singelas.
II
É loura como as doces escocesas,
Duma beleza ideal, quase indecisa;
Circunda-se de luto e de tristezas
E excede a melancólica Artemisa.
Fosse eu os seus vestidos afogados
E havia de escutar-lhe os seu pecados.
III
Alta noite, os planetas argentados
Deslizam um olhar macio e vago
Nos seus olhos de pranto marejados
E nas águas mansíssimas do lago.
Pudesse eu ser a Lua, a Lua terna,
E faria que a noite fosse eterna.
IV
E os abutres e os corvos fazem giros
De roda das ameias e dos pegos,
E nas salas ressoam uns suspiros
Dolentes como as súplicas dos cegos.
Fosse eu aquelas aves de pilhagem
E cercara-lhe a fronte, em homenagem.
V
E ela vaga nas praias rumorosas,
Triste como as rainhas destronadas,
A contemplar as gôndolas airosas,
Que passam, a giorno iluminadas.
Pudesse eu ser o rude gondoleiro
E ali é que fizera o meu cruzeiro.
VI
De dia, entre os veludos e entre as sedas,
Murmurando palavras aflitivas,
Vagueia nas umbrosas alamedas
E acarinha, de leve, as sensitivas.
Fosse eu aquelas árvores frondosas,
E prendera-lhe as roupas vaporosas.
VII
Ou domina, a rezar, no pavimento
Da capela onde outrora se ouviu missa,
A música dulcíssima do vento
E o sussurro do mar, que se espreguiça.
Pudesse eu ser o mar e os meus desejos
Eram ir borrifar-lhe os pés, com beijos.
VIII
E às horas do crepúsculo saudosas,
Nos parques com tapetes cultivados,
Quando ela passa curvam-se amorosas
As estátuas dos seus antepassados.
Fosse eu também granito e a minha vida
Era vê-la a chorar arrependida.
IX
No palácio isolado como um monge,
Erram as velhas almas dos precitos,
E nas noites de inverno ouvem-se ao longe
Os lamentos dos náufragos aflitos.
Pudesse eu ter também uma procela
E as lentas agonias ao pé dela!
X
E às lajes, no silêncio dos mosteiros,
Ela conta o seu drama negregado,
E o vasto carmesim dos reposteiros
Ondula como um mar ensanguentado.
Fossem aquelas mil tapeçarias
Nossas mortalhas quentes e sombrias.
XI
E assim passa, chorando, as noites belas,
Sonhando uns tristes sonhos doloridos,
E a refletir nas góticas janelas
As estrelas dos céus desconhecidos.
Pudesse eu ir sonhar também contigo
E ter as mesmas pedras no jazigo!
...............................
XII
Mergulha-se em angústias lacrimosas
Nos ermos dum castelo abandonado,
E as próximas florestas tenebrosas
Repercutem um choro amargurado.
Uníssemos, nós dois, as nossas covas,
Ó doce castelã das minhas trovas!
I
Num castelo deserto e solitário,
Toda de preto, às horas silenciosas,
Envolve-se nas pregas dum sudário
E chora como as grandes criminosas.
Pudesse eu ser o lenço de Bruxelas
Em que ela esconde as lágrimas singelas.
II
É loura como as doces escocesas,
Duma beleza ideal, quase indecisa;
Circunda-se de luto e de tristezas
E excede a melancólica Artemisa.
Fosse eu os seus vestidos afogados
E havia de escutar-lhe os seu pecados.
III
Alta noite, os planetas argentados
Deslizam um olhar macio e vago
Nos seus olhos de pranto marejados
E nas águas mansíssimas do lago.
Pudesse eu ser a Lua, a Lua terna,
E faria que a noite fosse eterna.
IV
E os abutres e os corvos fazem giros
De roda das ameias e dos pegos,
E nas salas ressoam uns suspiros
Dolentes como as súplicas dos cegos.
Fosse eu aquelas aves de pilhagem
E cercara-lhe a fronte, em homenagem.
V
E ela vaga nas praias rumorosas,
Triste como as rainhas destronadas,
A contemplar as gôndolas airosas,
Que passam, a giorno iluminadas.
Pudesse eu ser o rude gondoleiro
E ali é que fizera o meu cruzeiro.
VI
De dia, entre os veludos e entre as sedas,
Murmurando palavras aflitivas,
Vagueia nas umbrosas alamedas
E acarinha, de leve, as sensitivas.
Fosse eu aquelas árvores frondosas,
E prendera-lhe as roupas vaporosas.
VII
Ou domina, a rezar, no pavimento
Da capela onde outrora se ouviu missa,
A música dulcíssima do vento
E o sussurro do mar, que se espreguiça.
Pudesse eu ser o mar e os meus desejos
Eram ir borrifar-lhe os pés, com beijos.
VIII
E às horas do crepúsculo saudosas,
Nos parques com tapetes cultivados,
Quando ela passa curvam-se amorosas
As estátuas dos seus antepassados.
Fosse eu também granito e a minha vida
Era vê-la a chorar arrependida.
IX
No palácio isolado como um monge,
Erram as velhas almas dos precitos,
E nas noites de inverno ouvem-se ao longe
Os lamentos dos náufragos aflitos.
Pudesse eu ter também uma procela
E as lentas agonias ao pé dela!
X
E às lajes, no silêncio dos mosteiros,
Ela conta o seu drama negregado,
E o vasto carmesim dos reposteiros
Ondula como um mar ensanguentado.
Fossem aquelas mil tapeçarias
Nossas mortalhas quentes e sombrias.
XI
E assim passa, chorando, as noites belas,
Sonhando uns tristes sonhos doloridos,
E a refletir nas góticas janelas
As estrelas dos céus desconhecidos.
Pudesse eu ir sonhar também contigo
E ter as mesmas pedras no jazigo!
...............................
XII
Mergulha-se em angústias lacrimosas
Nos ermos dum castelo abandonado,
E as próximas florestas tenebrosas
Repercutem um choro amargurado.
Uníssemos, nós dois, as nossas covas,
Ó doce castelã das minhas trovas!
in O Livro de Cesário Verde (1901) - Cesário Verde
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