O meu país sabe as amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.
(imagem daqui)
Poema da sombra mínima
De um mesmo corpo o Sol projecta sombras
de diferentes tamanhos e contornos.
Quando atinge o seu zénite, o mais alto,
aquele seu mais alto que é possível,
quase não tenho sombra,
quase a busco,
quase não a descubro de acanhada.
Glória ao Sol na alturas!
Ó alegria da sombra mínima!
Eu canto, eu rio, eu sonho, eu estendo os braços,
eu com os dedos afago.
Falam-me as pedras, sorriem-me as paredes
e à beira dos meus passos se desenham
os novelos de luz, os véus, as plumas,
aqueles rolos breves e translúcidos
com que sobem ao céu, nas telas quinhentistas,
os bem-aventurados.
Ó alegria da sombra mínima!
Já não me cansa o que lá vai no tempo.
Já não me cansa o que há-de vir depois.
A sombra existe sempre
mas quando o Sol me banha do seu alto,
ó alegria das alegrias!,
eu canto, eu rio, eu sonho,eu estendo os braços,
eu com os dedos afago.
in Novos Poemas Póstumos (1990) - António Gedeão
3 comentários:
1) O grande filósofo francês JEAN-PAUL SARTRE nasceu em 21-06-1905.
2) O genial escritor brasileiro MACHADO DE ASSIS nasceu em 21-06-1839.
Houve distração em "As amoras". O poema é de Eugénio de Andrade.
Saudações,
Obrigado pela correção e pela indicação de datas...
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