terça-feira, novembro 02, 2021

Teixeira de Pascoaes nasceu há 144 anos

   
Teixeira de Pascoaes, pseudónimo literário de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, (Amarante, 8 de novembro de 1877 - Gatão, Amarante, 14 de dezembro de 1952) foi um poeta e escritor português, principal representante do saudosismo.  
Todas as fontes bibliográficas indicam 2 de novembro de 1877 como a sua data de nascimento. Contudo, o assento de nascimento/baptismo refere indubitavelmente que ele nasceu às cinco horas da tarde de 8 de novembro de 1877, em Amarante. Segundo Luísa Borges, em O Lugar de Pascoais, Pascoais terá adoptado 2 de novembro, como data do seu aniversário, por razões puramente simbólicas, por ser o Dia dos Mortos, uma "porta" para o "Mais Além".

 

O Que Eu Sou

Nocturna e dúbia luz
Meu ser esboça e tudo quanto existe...
Sou, num alto de monte, negra cruz,
Onde bate o luar em noite triste...

Sou o espírito triste que murmura
Neste silencio lúgubre das Cousas...
Eu é que sou o Espectro, a Sombra escura
De falecidas formas mentirosas.

E tu, Sombra infantil do meu Amor,
És o Ser vivo, o Ser Espiritual,
A Presença radiosa...
Eu sou a Dor,
Sou a trágica Ausência glacial...

Pois tu vives, em mim, a vida nova,
E eu já não vivo em ti...
Mas quem morreu?
Foste tu que baixaste à fria cova?
Oh, não! Fui eu! Fui eu!

Horrível cataclismo e negra sorte!
Tu foste um mundo ideal que se desfez
E onde sonhei viver após a morte!
Vendo teus lindos olhos, quanta vez,
Dizia para mim: eis o lugar
Da minha espiritual, futura imagem...
E viverei à luz daquele olhar,
Divino sol de mística Paisagem.

Era minha ambição primordial
Legar-lhe a minha imagem de saudade;
Mas um vento cruel de temporal,
Vento de eternidade,
Arrebatou meu sonho! E fugitiva
Deste mundo se fez minha alegria;
Mais morta do que viva,
Partiu contigo, Amor, à luz do dia
Que doirou de tristeza o teu caixão...
Partiu contigo, ao pé de ti murmura;
É magoada voz na solidão,
Doce alvor de luar na noite escura...
E beija o teu sepulcro pequenino;
Sobre ele voa e erra,
Porque o teu Ser amado é já divino
E o teu sepulcro, abrindo-se na terra,
Penetrou-a de luz e santidade...
E para mim a terra é um grande templo
E, dentro dele, a Imagem da Saudade...
E rezo de joelhos, e contemplo
Meu triste coração, saudoso altar
Alumiado de sombra, escura luz...
Nele deitado estás como a sonhar,
Meu pequenino e místico Jesus...
Lágrimas dos meus olhos são as flores
Que a teus pés eu deponho...
Enfeitam tua Imagem minhas dores,
E alumia-te, ás noites, o meu sonho.

Todo me dou em sacrifício à tua
Imagem que eu adoro.
Sou branco incenso à triste luz da lua:
Eu sou, em névoa, as lágrimas que choro...

 

in Elegias (1912) - Teixeira de Pascoaes

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