Guerra civil e deposição de D. Sancho II
Como segundo filho, Afonso não deveria herdar o trono destinado a Sancho e por isso viveu em
França, onde se casou com
Matilde II de Bolonha em
1235, tornando-se assim conde
jure uxoris de
Bolonha, onde servia como um dirigente militar, combatendo em nome do Rei
Luís IX, rei de França e seu primo.
Todavia, em
1246, os conflitos entre
Sancho II e a
Igreja tornaram-se insustentáveis e o
Papa Inocêncio IV, nesse mesmo ano, despacha a Bula
Inter alia desiderabilia, que prepara a deposição
de facto do monarca.
O papado, através de duas
Breves, ainda aconselha Afonso, Conde de Bolonha, a partir para a
Terra Santa em
Cruzada e também que passe a estar na Hispânia, fazendo aí guerra ao Islão. Mas a 24 de julho, a Bula
Grandi non immerito depõe oficialmente Sancho II do governo do reino, e Afonso torna-se regente.
Os fidalgos levantam-se contra Sancho, e Afonso cede a todas as
pretensões do clero no "Juramento de Paris", uma assembleia de prelados e
nobres portugueses, jurando que guardaria todos os privilégios, foros
e costumes dos municípios, cavaleiros, peões, religiosos e clérigos
seculares do reino. Abdicou imediatamente das suas terras francesas e
marchou sobre Portugal, chegando a Lisboa nos últimos dias do ano,
onde se fez coroar rei em
1248 após o exílio e morte de
Sancho II em
Toledo.
Até à morte de D. Sancho e a sua consequente coroação, D. Afonso apenas usou os títulos de Visitador, Curador e Defensor do Reino.
Para aceder ao trono, Afonso abdicou de
Bolonha e repudiou Matilde, para casar com
Beatriz de Castela.
Decidido a não cometer os mesmos erros do irmão, o novo rei prestou
especial atenção à classe média de mercadores e pequenos proprietários,
ouvindo as suas queixas. Por este procedimento, Afonso III ficou
conhecido também como o pai do "Estado Português", distribuindo
alcaides pelos castelos e juízes pelas diferentes vilas e terras. O
objetivo era a implantação de um poder legal com o qual todos os
habitantes do Reino português mantivessem uma relação de igualdade.
Em
1254, na cidade de
Leiria, convocou a primeira reunião das
Cortes,
a assembleia geral do reino, com representantes de todos os espectros
da sociedade. Afonso preparou legislação que restringia a
possibilidade das classes altas cometerem abusos sobre a população
menos favorecida e concedeu inúmeros privilégios à Igreja. Recordado
como excelente administrador, Afonso III organizou a administração
pública, fundou várias
vilas e concedeu o privilégio de
cidade através do édito de várias cartas de
foral.
Foram por sua ordem feitas as
Inquirições Gerais, iniciadas em
1258, como forma do rei controlar, não só o grande poder da
Nobreza, mas também para saber se lhe estavam a ser usurpados bens que, por direito, pertenciam à Coroa.
Moedas cunhadas com a efígie de El-Rei D. Afonso III de Portugal
Reconquista
Com o trono seguro e a situação interna pacificada, Afonso voltou a sua atenção para os propósitos da
Reconquista do Sul da
Península Ibérica às comunidades muçulmanas. Durante o seu reinado, a cidade de
Faro foi tomada com sucesso em
1249 e o
Algarve incorporado no reino de Portugal.
Após esta campanha de sucesso, Afonso teve de enfrentar um conflito diplomático com
Castela, que considerava que o Algarve lhe pertencia. Seguiu-se um período de guerra entre os dois países, até que, em
1267, foi assinado um tratado em
Badajoz que determina a fronteira no
Guadiana desde a confluência do
Caia até à foz, a fronteira luso-castelhana.
Segundas núpcias
Em
1253, o rei desposou
D. Beatriz, popularmente conhecida por D. Brites, filha de
D. Afonso X de Castela,
O Sábio. Desde logo isto constituiu polémica pois D. Afonso era já casado com Matilde II de Bolonha.
O
Papa Alexandre IV
respondeu a uma queixa de D. Matilde, ordenando ao rei D. Afonso que
abandone D. Beatriz em respeito ao seu matrimónio com D. Matilde. O
rei não obedeceu, mas procurou ganhar tempo neste assunto delicado, e o
problema ficou resolvido com a morte de D. Matilde, em
1258. O
infante,
D. Dinis, o futuro Rei, nascido durante a situação irregular dos pais, foi então legitimado, em
1263.
O casamento funcionou como uma aliança que pôs termo à luta entre
Portugal e
Castela pelo Reino do
Algarve. Também resultou em mais riqueza para Portugal quando D. Beatriz, já após a morte do rei, recebe do seu pai,
Afonso X, uma bela região a Este do
Rio Guadiana, onde se incluíam as vilas de
Moura,
Serpa,
Noudar,
Mourão e
Niebla. Tamanha dádiva deveu-se ao apoio que D. Brites lhe prestou durante o seu exílio, na cidade de
Sevilha.
Excomunhão do rei e do reino
No final da sua vida, viu-se envolvido em conflitos com a Igreja, tendo sido
excomungado em
1268 pelo arcebispo de
Braga e pelos bispos de
Coimbra e
Porto, para além do próprio
Papa Clemente IV, à semelhança dos reis que o precederam. O
clero
havia aprovado um libelo contendo quarenta e três queixas contra o
monarca, entre as quais se achavam o impedimento aos bispos de cobrarem
os dízimos, utilização dos fundos destinados à construção dos templos,
obrigação dos clérigos a trabalhar nas obras das muralhas das vilas,
prisão e execução de clérigos sem autorização dos bispos, ameaças de
morte ao arcebispo e aos bispos e, ainda, a nomeação de
judeus
para cargos de grande importância. A agravar ainda mais as coisas,
este rei favoreceu monetariamente ordens religiosas mendicantes, como
franciscanos e dominicanos, sendo acusado pelo clero de apoiar
espiritualidades estrangeiradas. O grande conflito com o clero também se
deve ao facto do rei ter legislado no sentido de equilibrar o poder
municipal em prejuízo do poder do clero e da nobreza.
O rei, que era muito querido pelos portugueses por decisões como a da abolição da
anúduva
(imposto do trabalho braçal gratuito, que obrigava as gentes a
trabalhar na construção e reparação de castelos e palácios, muros,
fossos e outras obras militares), recebeu apoio das cortes de
Santarém em janeiro de
1274,
onde foi nomeada uma comissão para fazer um inquérito às acusações
que os bispos faziam ao rei. A comissão, composta maioritariamente por
adeptos do rei, absolveu-o. O
Papa Gregório X,
porém, não aceitou a resolução tomada nas cortes de Santarém e mandou
que se excomungasse o rei e fosse lançado interdito sobre o reino em
1277.
Próximo da morte, em
1279,
D. Afonso III jurou obediência à Igreja e a restituição de tudo o que
lhe tinha tirado. Face a esta atitude do rei, o abade de
Alcobaça levantou-lhe a excomunhão e o rei foi sepultado no
Mosteiro de Alcobaça.