Cerca de seis anos de trabalho de uma equipa internacional envolvendo 34 instituições de vários países, (incluindo os biólogos portugueses Rui Faria e Olga Fernando na Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona), liderada pelo geneticista Devin Locke, da Escola de Medicina da Universidade de Washington (São Luís, Missouri, EUA), determinou a sequência de três mil milhões de moléculas que compõem as longas cadeias de DNA (ácido desoxirribonucleico) nos 48 cromossomas que compõem o genoma do Orangotango (género Pongo). A sua sequenciação genómica foi agora publicada na revista Nature.
Depois do genoma da nossa espécie (Homo sapiens) em 2003, do chimpanzé (Pan troglodytes) em 2005, este é o terceiro primata a ter o genoma mapeado.
Actualmente já só existem duas espécies de orangotango. A espécie Pongo abelii vive nas florestas de Samatra (Indonésia), enquanto que a Pongo pygmaeus tem como habitat as florestas de Bornéu (Malásia). Ambas estão ameaçadas de extinção devido à acção da mesma espécie que agora a sequenciou: a humana.
O genoma de um exemplar fêmea da espécie Pongo abelii, de nome Susie, vivendo em cativeiro no Jardim Zoológico de Glayds Porter, Texas (EUA), serviu a base à sequenciação. Sobre ele foram anotados as divergências da sequência genómica de outros cinco orangotangos de Sumatra e cinco orangotangos de Bornéu, que também foram sequenciados, embora em menor detalhe, assim como as diferenças com os genomas humano e do chimpanzé.
Os cientistas encontraram uma semelhança de 97% entre o genoma humano e o do orangotango, uma diferença na posição de 120 milhões de moléculas. Recorde-se que a diferença entre o nosso genoma e o do chimpanzé é de apenas 1% (cerca de 40 milhões de bases).
O estudo agora publicado redefine também o momento de separação entre as duas espécies de orangotangos ainda existentes. Estudos anteriores apontavam para que as duas espécies se tinham originado há cerca de um milhão de anos. Esta distância foi agora encurtada para 400 mil anos pelo presente estudo.
Curiosamente, num outro artigo publicado no dia seguinte, mas on-line, na revista Genome Research, Mikkel Schierup e Thomas Mailund da Universidade Dinamarquesa de Aarhus (também co-autores do artigo na Nature), comparam a estrutura dos genomas dos três primatas e mostram que apesar de mais distanciados, 0,5% do nosso genoma e do orangotango são muito mais semelhantes entre si do que com o do chimpanzé, nosso primata evolutivamente mais próximo de nós. Isto significa que mantivemos genes comuns ao orangotango que foram suprimidos na evolução do chimpanzé. Muito estudo funcional e proteómico terão ainda de ser feito para descodificar estas semelhanças e diferenças.
As expectativas aumentam sobre o que é que nos trará a sequenciação em curso de mais dois primatas: o gorila (género Gorilla) e o bonobo (Pan paniscus).
De volta ao orangotango, é curiosa a singularidade do genoma desta espécie em vias de extinção ter sido acabado de sequenciar em 2010 (o manuscrito foi submetido a 11 de Março de 2010 e aceite em 19 de Novembro para publicação), ano internacionalmente dedicado à Biodiversidade, e publicado agora no início do Ano Internacional da Floresta. É que o nome orangotango resulta da junção de duas palavras da língua malaia que significam “pessoa da floresta”.
Felizmente o estudo agora publicado mostra uma grande variabilidade genética entre as populações de orangotangos, o que significa uma maior capacidade adaptação a mudanças ambientais o que por si só é um bom indicador para a sobrevivência destas espécies ameaçadas.