(imagem daqui)
Ruy Guilherme Paranatinga Barata (Santarém, Pará, 25 de junho de 1920 - São Paulo, 23 de abril de 1990) foi um poeta, político, advogado, professor e compositor brasileiro.
Filho único de Maria José (Dona Noca) Paranatinga Barata e do advogado Alarico de Barros Barata, recebeu o nome Rui em virtude da admiração paterna por Rui Barbosa. O apelido indígena Paranatinga vem do lado materno, que significa rio (paraná) branco (tinga).
Foi alfabetizado pelo pai. Aos dez anos vem para Belém para continuar
os estudos. Primeiro, no internato do Colégio Moderno; depois, no
Colégio Nossa Senhora de Nazaré, dirigido pelos Irmãos Maristas.
Faz o pré-jurídico no Colégio Estadual Paes de Carvalho, onde tem como
professor o intelectual Francisco Paulo do Nascimento Mendes, de quem
se torna amigo para a vida inteira, e se inicia na poesia escrevendo na
revista Terra Imatura. Em 1938, entra para a Faculdade de Direito do Pará.
No meio dos estudos jurídicos sente aumentar a paixão pela poesia. Mergulha fundo nos poemas de Maiakovski, Garcia Lorca, T.S. Elliot, Mallarmé, Rilke, Pablo Neruda, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Murilo Mendes, Jorge de Lima, entre outros. Abre-se ao pensamento de esquerda através da leitura do Manifesto Comunista de Marx e Engels.
Em 1941,
casa-se com Norma Soares Barata, de quem teve sete filhos: Maria Diva,
Rui Antônio, Paulo André (parceiro constante em várias canções, entre
elas, as mais famosas, Foi assim e Pauapixuna), Maria Helena, Maria de Nazaré, Maria Inez e Cristóvão Jaques.
Em 1943, forma-se em Direito e, como orador da turma, em plena ditadura do Estado Novo,
faz um discurso em que pede a volta do país ao Estado de Direito e
defende teses avançadas no campo da justiça social. Nessa fase, prefere
trocar o exercício da advocacia pela presença na redação do jornal
Folha do Norte, de Paulo Maranhão.
Passa a frequentar a roda de papo do Central Café, no centro de Belém,
liderada pelo professor Francisco Paulo do Nascimento Mendes, onde
convive e integra a mais brilhante geração de intelectuais paraenses
republicanos, que gravitou em torno de Chico Mendes. Entre eles, Mário
Faustino, Paulo Plínio Abreu, Benedito Nunes, Haroldo Maranhão, Waldemar Henrique, Machado Coelho, Nunes Pereira, Cauby Cruz, Napoleão Figueiredo e Raimundo Moura.
Ainda em 1943, publica o seu primeiro livro de poemas, Anjo dos Abismos, pela José Olympio Editora, com o decisivo apoio do romancista paraense Dalcídio Jurandir.
Nessa época, o pai de Ruy, Alarico Barata, exercia forte liderança
política na região do baixo amazonas contra a violência do chamado baratismo, liderado pelo caudilho Joaquim Magalhães de Cardoso Barata.
Por causa dessa luta contra o autoritarismo de Magalhães Barata, Rui Guilherme Paranatinga Barata entra na política partidária e, aos 26 anos, em 1946, é eleito deputado para a Assembleia Constituinte do Pará, pelo Partido Social Progressista (PSP). Embalado pelo clima de explosão democrática que sucedeu a vitória dos aliados contra o nazi-fascismo na Europa,
nenhum tema relevante aos direitos humanos escapou da perceção do
jovem deputado naquela legislatura. A luta pela paz num mundo
traumatizado pela morte de milhões de seres humanos nos campos de
batalha, o horror da ameaça atómica que exterminara as populações de Hiroshima e Nagasaki, o respeito à autodeterminação dos povos, o Estado de Direito no Brasil, a defesa da soberania da Amazónia e a luta contra a pobreza foram temas caros a Ruy Barata.
Foi reeleito em 1950. Em 1951, publica os poemas de A Linha Imaginária (Edições Norte, Belém). A partir daí e depois, como deputado federal (1957 a 1959), se afirma como a voz progressista no Pará
em defesa do monopólio estatal do petróleo, das grandes causas
nacionais e da paz mundial, nos momentos cruciais da chamada guerra
fria.
Em 1959, saúda a revolução cubana com o poema Me trae una Cuba Libre/Porque Cuba libre está. Nesse mesmo ano, entra para a militância clandestina do Partido Comunista Brasileiro, o Partidão.
A filiação ao PCB tem reflexo na própria criação poética, que opta por
evidenciar, nessa fase, um tom político. Sua poesia busca o caminho
das palavras acessíveis à compreensão popular. Denuncia claramente a
miséria e a injustiça social.
Nessa época, provavelmente, dá início à construção de O Nativo de Câncer,
poema inacabado com força épica a contar a história de uma cultura em
face da invasão de culturas estranhas, um impressionante inventário das
coisas e do homem amazónico, incluindo aí o inventário do próprio
poeta, um nativo de câncer. O primeiro canto do poema foi publicado em
fevereiro de 1960 no jornal Folha do Norte.
Em 1964, com o golpe militar, foi preso, demitido de seu cartório (então 4º Ofício do Cível e Comércio da Comarca de Belém) e aposentado compulsivamente do cargo de professor da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Pará,
com menos de 10% de seus proventos. Para sobreviver passa a exercer a
advocacia no escritório do seu pai, Alarico Barata, e escreve artigos e
reportagens com pseudónimos, como Valério Ventura, para os jornais
Folha do Norte e Flash.
A partir de 1967,
Ruy Barata, que tinha, desde a juventude, uma estreita ligação com a
música, passa a compor em parceria com seu filho, o então jovem músico e
instrumentista Paulo André Barata.
Ruy mostra-se um exímio letrista para as melodias do filho. Compõem
dezenas de músicas, de cunho rural e urbano, que se tornaram sucessos
nacionais e internacionais.
Em 1978, lança mais um capítulo do estudo sobre a Cabanagem,
a revolução paraense de 1835, cuja publicação iniciara no ano anterior
pela revista do Instituto Professor Sousa Marques (Rio de Janeiro): O
Cacau de Sua Majestade, O Arroz do Marquês, A Subversão do Cacau e do
Algodão, A Economia Paraense às Vésperas da Tormenta.
Em 1979, com a promulgação da Lei da Amnistia, Ruy Barata é reintegrado ao quadro de professores da Universidade Federal do Pará, e volta a ensinar Literatura Brasileira. Em 1984, é publicada a primeira edição do livro Paranatinga, um estudo biográfico do poeta escrito por Alfredo Oliveira.
Ruy Barata morreu em 23 de abril de 1990, durante uma cirurgia, em São Paulo, para onde viajara a fim de coletar dados sobre a passagem de Mário de Andrade pela Amazónia.
Pouco depois de sua morte foi lançada a segunda edição, revista e ampliada, do livro Paranatinga. A sua estátua está nos jardins do Parque da Residência, antiga casa dos governadores do Pará,
que hoje abriga a Secretaria de Cultura do Estado e empresta o seu
nome a uma avenida, ainda em construção, que vai ladear as águas da
baía do Guajará em Belém.
Em 2000, foi lançado o livro Antilogia, uma coletânea de poemas
organizada e revisada pelo próprio Rui entre janeiro e fevereiro de
1990, pouco antes de sua morte, cuja edição reúne quatorze poemas e uma
das correspondências que lhe foram enviadas pelo poeta Mário Faustino.
O trabalho de Ruy Barata continua a inspirar músicas, poesias, vídeos,
cinema, trabalhos escolares, teses, documentários, dança, artes
plásticas e dezenas de outras manifestações culturais em todo o Pará,
para reverenciar a memória do poeta que disse em uma canção: Tudo que eu amei estava aqui".
A poesia não se faz com ideias, mas com palavras
- Ruy Barata
in Wikipédia
Ode
Os dedos contam as ondas,
os minutos talvez,
jamais o anelo.
Podes marcar a face disfarçada,
a barba,
os bens,
todos os sonhos,
mas escravos do real só te aceitamos
na tua farda de pêlos,
sangue
e ossos.
Quando recriarás a trança libertária,
o horizonte do mito,
o Deus negado,
a tela do perene e do intocável?
Quando libertarás a página e o relógio,
o ser distante que revel condenas
às arestas da ruga e aos frutos sazonados?
Quando
(deste olhar em diagonal ao espelho e à morte)
farás ruir ao peso de teu gládio
e ao sulco de teu grito
as taças do não ser,
o veneno da aurora,
as portas do visível,
e do invisível?
Ó jamais seremos sós perante a Fonte,
jamais seremos nós e a ti mostramos
o sorriso de "clown" que se reparte
em contorções de esperma,
tédio,
e ódio.
Jamais conservaremos o perfume e a liturgia,
e a hora que se esvai não justifica
este desabrochar em cálice e corola.
Não ser
..................(embora seja no retrato),
não ter
..................(para ao flagelo condenar-se),
não sentir o chamar do céu porque beleza
e memória de ausências povoada.
Estamos sós,
bem sei,
e como é noite
arrancas o teu mundo no arbitrário,
e a poesia morde o que não é.
Quem te susteve o braço suicida:
a ode ou o catecismo?
Quem te ligou à sorte deste povo:
o sonho ou a promissória?
Quem te fez espalmar a mão como inocente
e a cabeça baixar como culpado?
Ó tempo,
ó dimensão do exílio e da orfandade,
e se não digo eterno,
quase eterno,
deixai toda esperança
"voi che entratte".
in A linha imaginária (1951) - Ruy Barata
Os dedos contam as ondas,
os minutos talvez,
jamais o anelo.
Podes marcar a face disfarçada,
a barba,
os bens,
todos os sonhos,
mas escravos do real só te aceitamos
na tua farda de pêlos,
sangue
e ossos.
Quando recriarás a trança libertária,
o horizonte do mito,
o Deus negado,
a tela do perene e do intocável?
Quando libertarás a página e o relógio,
o ser distante que revel condenas
às arestas da ruga e aos frutos sazonados?
Quando
(deste olhar em diagonal ao espelho e à morte)
farás ruir ao peso de teu gládio
e ao sulco de teu grito
as taças do não ser,
o veneno da aurora,
as portas do visível,
e do invisível?
Ó jamais seremos sós perante a Fonte,
jamais seremos nós e a ti mostramos
o sorriso de "clown" que se reparte
em contorções de esperma,
tédio,
e ódio.
Jamais conservaremos o perfume e a liturgia,
e a hora que se esvai não justifica
este desabrochar em cálice e corola.
Não ser
..................(embora seja no retrato),
não ter
..................(para ao flagelo condenar-se),
não sentir o chamar do céu porque beleza
e memória de ausências povoada.
Estamos sós,
bem sei,
e como é noite
arrancas o teu mundo no arbitrário,
e a poesia morde o que não é.
Quem te susteve o braço suicida:
a ode ou o catecismo?
Quem te ligou à sorte deste povo:
o sonho ou a promissória?
Quem te fez espalmar a mão como inocente
e a cabeça baixar como culpado?
Ó tempo,
ó dimensão do exílio e da orfandade,
e se não digo eterno,
quase eterno,
deixai toda esperança
"voi che entratte".
in A linha imaginária (1951) - Ruy Barata
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