terça-feira, setembro 21, 2010

Acabar de vez com o silêncio e a submissão

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«Of what is past, or passing, or to come.»

William Butler Yeats, Sailing to Byzantium, 1928


O editorial do jornal mexicano Diário, edição de Juárez, de 18-9-2010, após mais um homicídio de um jornalista nesta cidade de fronteira com os EUA, disputada pelos cartéis da droga, justifica destaque. Um excerto do editorial, que vale a pena ler na íntegra:

«O que querem de nós?
Da Redacção
El Diario | 18-09-2010 | 21:57

Senhores das diferentes organizações que disputam a praça da Ciudad Juárez: a perda de dois repórteres de esta casa editorial em menos de dois anos representa uma ruptura irreparável para todos os que aqui trabalham e, em particular, para as suas famílias.
Sabemos que é do vosso conhecimento que somos comunicadores, não adivinhos. Portanto, como trabalhadores da informação queremos que nos expliquem o que é que querem de nós, o que é que pretendem que publiquemos ou deixemos de publicar, para saber a que nos conformar.
Vós sois, nesta altura, as autoridades de facto nesta cidade, porque os poderes instituídos não têm podido fazer nada para impedir que os nossos companheiros continuem a cair, apesar do que reiteradamente lhes temos exigido.»
(Tradução minha)

Esta é uma declaração de derrota da sociedade perante o crime. Os media, representantes da sociedade civil, voltam-se para «as autoridades de facto», que são agora os cartéis da droga, juram-lhes obediência e pedem-lhes o que lhes digam o que fazer!... Podemos até concluir que há muita promiscuidade entre o os cartéis e o Estado mexicano; mas isso só piora o diagnóstico.

Noutra circunstância, mais branda (não matam!), e noutra longitude, mais a leste, verifica-se a mesma obediência perante o poder corrupto; e já não em nome da vida, mas do salário. Há os que sucubem, tentando ser livres e servir o povo com a voz e os dedos, e há os que se anicham no regaço do poder e abicham os salários correspondentes, rendendo a sua pena (a nossa outra!) pela paga. Um poder corrupto que, todavia, se agacha perante a marginalidade interna e o terror externo.

Aquilo que se chamou Ocidente - impropriamente, como se o mundo não tivesse hemisfério sul... -, perdeu a vontade de combater. Há-de descer ao suplício do inferno antes de ressurgir - quando ressurgir! - com carácter e força. A perda da vontade de combater, que não é exclusiva dos Estados, pois também afecta as comunidades e os indivíduos, é uma característica das sociedades ricas, que preferem o consumo ao investimento, o conforto ao risco e, no cúmulo da sua abundância, tornam-se escravas dos bárbaros que exploram o seu medo, as constrangem a obedecer à sua vontade e lhes extorquem dinheiro. A redenção moral só ocorrerá após esta rendição material. Quando a purificação da pobreza as revigorar e encontrarem, no fundo da alma, a razão de ser. De novo.

in Do Portugal Profundo - post de António Balbino Caldeira

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