Proveniente de uma família da alta burguesia, era filho do médico Carlos Ary dos Santos (
1905-
1957) e de Maria Bárbara de Miranda e Castro Pereira da Silva (
1899-
1950).
Estudou no
Colégio de São João de Brito, em
Lisboa, onde foi um dos primeiros alunos. Após a morte da mãe, vê publicados pela mão de vários familiares, alguns dos seus poemas. Tinha catorze anos e viria, mais tarde, a rejeitar esse livro. Ary dos Santos revelaria, verdadeiramente, as suas qualidades poéticas em
1954, com dezasseis anos de idade. Várias poesias suas integraram então a
Antologia do Prémio Almeida Garrett.
Pela mesma altura, Ary abandona a casa da família. Para seu sustento económico exerce as mais variadas actividades, que passariam pela venda de máquinas para pastilhas elásticas, até ao trabalho numa empresa de publicidade. Não cessa de escrever e, entretanto, dá-se a sua estreia literária efetiva, com a publicação de
A Liturgia do Sangue (
1963). Em
1969 adere ao
Partido Comunista Português, com qual participa activamente nas sessões de poesia do então intitulado
Canto Livre Perseguido.
Através da música chegará ao grande público, concorrendo, por mais que uma vez, ao
Festival RTP da Canção, sob pseudónimo, como exigia o regulamento. Classificar-se-ia em primeiro lugar com as canções
Desfolhada Portuguesa (
1969), com interpretação de
Simone de Oliveira,
Menina do Alto da Serra (
1971), interpretada por
Tonicha,
Tourada (
1973) e
Portugal no Coração (
1977), interpretações do conjunto
Os Amigos.
Após o
25 de Abril, torna-se um activo dinamizador cultural da esquerda, percorrendo o país de lés a lés. No
Verão Quente de
1975, juntamente com militantes da
UDP e de outras forças radicais, envolve-se no assalto à Embaixada de
Espanha, em
Lisboa.
Autor de mais de seiscentos poemas para canções, Ary dos Santos fez no meio muitos amigos. Gravou, ele próprio, textos ou poemas de e com muitos outros autores e intérpretes. Notabilizou-se também como declamador, tendo gravado um duplo álbum contendo
O Sermão de Santo António aos Peixes, do
Padre António Vieira. À data da sua morte tinha em preparação um livro de poemas intitulado
As Palavras das Cantigas, onde era seu propósito reunir os melhores poemas dos últimos quinze anos, e um outro intitulado
Estrada da Luz - Rua da Saudade, que pretendia ser uma autobiografia romanceada.
Depois de falecer, a
18 de Janeiro de
1984, o seu nome foi dado a um largo do
Bairro de Alfama, descerrando-se uma lápide evocativa na fachada da sua casa, na Rua da Saudade, onde viveu praticamente toda a sua vida. Ainda em
1984 foi lançada a obra
VIII Sonetos de Ary dos Santos, com um estudo sobre o autor de
Manuel Gusmão e planeamento gráfico de Rogério Ribeiro, no decorrer de uma sessão na
Sociedade Portuguesa de Autores, da qual o autor era membro. Em
1988,
Fernando Tordo editou o disco
O Menino Ary dos Santos, com os poemas escritos por Ary dos Santos na sua infância. Em
2009,
Mafalda Arnauth,
Susana Félix,
Viviane e
Luanda Cozetti dão voz ao álbum de tributo
Rua da Saudade - canções de Ary dos Santos.
Hoje, o poeta do povo é reconhecido por todos e todos conhecem José Carlos Ary dos Santos, pois a sua obra permanece na memória de todos e, estranhamente, muitos dos seus poemas continuam actualizados. Todos os grandes cantores o interpretaram e ainda hoje surgem boas vozes a cantá-lo na perfeição. Desde Fernando Tordo, Simone de Oliveira, Tonicha, Paulo de Carvalho, Carlos do Carmo, Amália Rodrigues, Maria Armanda, Teresa Silva Carvalho, Vasco Rafael, entre outros, até aos mais recentes como Susana Félix, Viviane, Mário Barradas, Vanessa Silva e Katia Guerreiro.
Menina do Alto da Serra - Tonicha
Menina de olhar sereno
Raiando pela manhã
De seio duro e pequeno
Num coletinho de lã
Menina cheirando a feno
Casada com hortelã
Menina cheirando a feno
Casado com hortelã
Menina que no caminho
Vais pisando formosura
Trazes nos olhos um ninho
Todo em penas de ternura
Menina de andar de linho
Com um ribeiro à cintura
Menina de andar de linho
Com um ribeiro à cintura
Menina de saia aos folhos
Quem na vê fica lavado
Água da sede dos olhos
Pão que não foi amassado
Menina do riso aos molhos
Minha seiva de pinheiro
Menina de saia aos folhos
Alfazema sem canteiro
Menina de corpo inteiro
Com tranças de madrugada
Que se levanta primeiro
Do que a terra alvoroçada
Menina de corpo inteiro
Com tranças de madrugada
Menina de corpo inteiro
Com tranças de madrugada
Menina de saia aos folhos
Quem na vê fica lavado
Água da sede dos olhos
Pão que não foi amassado
Menina de fato novo
Ave-maria da terra
Rosa-brava rosa povo
Brisa do alto da serra
Rosa-brava rosa povo
Brisa do alto da serra...