Manoel Cândido Pinto de Oliveira (
Porto,
11 de dezembro de
1908) é um
cineasta português e, segundo se diz, o mais velho realizador do mundo em actividade. É o autor de trinta e duas longas-metragens.
Biografia
Manoel de Oliveira nasceu na freguesia de
Cedofeita na cidade do
Porto, no seio de uma família da alta
burguesia nortenha, com origens na pequena
fidalguia. É filho de Francisco José de Oliveira (
Mosteiro,
Vieira do Minho, 1865 - ?), industrial e primeiro fabricante de lâmpadas em
Portugal, e de sua mulher, Cândida Ferreira Pinto (
Santo Ildefonso, Porto, 13 de abril de 1875 - Porto, 2 de julho de 1947). Os seus pais casaram-se na freguesia de
Lordelo do Ouro, na cidade do Porto.
Família
Oliveira casou com Maria Isabel Brandão de Meneses de Almeida Carvalhais (nascida em
1918), no
Porto, a
4 de dezembro de
1940. Do casamento resultaram quatro filhos:
Manuel Casimiro Brandão Carvalhais de Oliveira (nascido em 1941), José Manuel Brandão Carvalhais de Oliveira (nascido em 1944), Isabel Maria Brandão Carvalhais de Oliveira (nascida em 1947), Adelaide Maria Brandão Carvalhais de Oliveira (nascida em 1948). Tem também vários netos e bisnetos. Um dos netos é o conhecido actor
Ricardo Trêpa (filho de Adelaide).
Carreira
Aos vinte anos vai para a escola de actores fundada no
Porto por
Rino Lupo, o cineasta
italiano ali radicado, um dos pioneiros do cinema português de
ficção.
Berlim: sinfonia de uma cidade, documentário vanguardista de
Walther Ruttmann, influencia-o profundamente. Tem então a ideia de rodar uma curta-metragem sobre a faina no
Rio Douro, o seu primeiro filme.
Douro, Faina Fluvial (
1931), estreado em Lisboa, suscita a admiração da crítica estrangeira e o desagrado da nacional. Seria o primeiro documentário de muitos que abordariam, de um ponto de vista
etnográfico, o tema da vida marítima da costa de
Portugal, tal como
Nazaré, Praia de Pescadores (1929) de
Leitão de Barros (meio ficção meio documentário),
Almadraba Atuneira (1961) de
António Campos) ou
Avieiros (1976) de
Ricardo Costa.
Mantendo o gosto pela representação, participa como actor no segundo filme sonoro português,
A Canção de Lisboa (
1933), de
Cottinelli Telmo. Diria mais tarde não se identificar com aquele estilo de cinema popular. Em
1942 aventura-se na ficção com a adaptação ao cinema do conto
Os Meninos Milionários, de
João Rodrigues de Freitas, e filma
Aniki-Bobó (
1942), retrato de infância no ambiente cru e pobre da Ribeira do Porto. O filme é um fracasso comercial mas, com o tempo, dará que falar. Oliveira decide, talvez por isso, abandonar outros projectos, envolvendo-se em negócios da família. Só voltará ao cinema catorze anos depois com
O Pintor e a Cidade (
1956), em que filma a cores. A fim de adquirir os conhecimentos necessários para tal experiência, faz uma curta formação nos estúdios da
Agfa-Gevaert AG na
Alemanha de Leste.
Em
1963 faz
O Acto da Primavera (segunda
docuficção portuguesa), filmando uma peça de teatro popular e iniciando nova fase do seu percurso. Com este filme, praticamente ao mesmo tempo que
António Campos, envolve-se na prática da
antropologia visual no cinema. Essa prática seria amplamente explorada por cineastas como
João César Monteiro, na ficção, como
António Reis,
Ricardo Costa e
Pedro Costa, no documentário.
O Acto da Primavera e
A Caça são obras marcantes na carreira de Manoel de Oliveira. O segundo filme, uma
curta-metragem de ficção, é interrompido para conseguir fazer bem o primeiro, incursão no
documentário, trabalhado com técnicas de encenação. Certo atrevimento vale-lhe a supressão de uma cena por parte da censura. Mais ainda: por causa de alguns diálogos inconvenientes fica dez dias nos calabouços da
PIDE, onde conhece
Urbano Tavares Rodrigues.
A obra cinematográfica de Manoel de Oliveira, até então interrompida por pausas e por projectos gorados, só a partir da
O Passado e o Presente (
1971) prosseguirá, sem quebras nem sobressaltos, por uns trinta anos, até para lá do final do século. A teatralidade imanente de
O Acto da Primavera, contaminando esta sua segunda longa-metragem de ficção, afirmar-se-ia como estilo pessoal, como forma de expressão que Oliveira achou por bem explorar nos seus filmes seguintes, apoiado por reflexões teóricas de amigos e firmes convicções de conhecidos comentadores. A
tetralogia dos amores frustrados seria por excelência o "campus" de toda essa longa experimentação. O palco seria o
plateau, o espaço cénico onde o
filme falado, em «indizíveis» tiradas, se tornaria a alma do espectáculo: o
puro cinema submetido ao teatro, sua referência, sua origem, seu fundamento, tal como Oliveira o vê. Eram assim ditos os amores, ditos eram os seus motivos, e ditos ficaram os argumentos do invicto «Mestre» e de quem nisso viu toda a sua originalidade. Amores ditos e escritos, com muito palavreado, com muito peso: sem nenhuma emoção mas sempre com muito sentimento.
Em 1982 Manoel de Oliveira faz um documentário
auto-biográfico de confissões e memórias. O cenário é a casa onde viveu desde 1940. O filme só será exibido depois da sua morte. Insiste em dizer que só faz filmes pelo gozo de os fazer, indiferente às críticas mais negativas. Leva entretanto uma vida retirada, longe das luzes da ribalta.
Os seus actores preferidos, com quem mantém uma colaboração regular, são
Luís Miguel Cintra,
Leonor Silveira,
Diogo Dória,
Rogério Samora,
Miguel Guilherme,
Isabel Ruth e, mais recentemente, o seu neto,
Ricardo Trêpa. Não lhe são de modo algum indiferentes actores estrangeiros como
Catherine Deneuve,
Marcello Mastroianni,
John Malkovich,
Michel Piccoli,
Irene Papas,
Chiara Mastroianni,
Lima Duarte ou
Marisa Paredes.
Em
2008 completou cem anos de vida. Dotado de uma resistência e saúde física e mental notáveis, é frequentemente enaltecido, nas referências que lhe são feitas, como «o mais velho realizador do mundo em actividade».
O teatro e o cinema
A obra de Manoel de Oliveira é marcada por duas tendências opostas presentes em toda a sua filmografia. Em todos os filmes que realizou antes de 1964, curtas e longas-metragens, incluindo
Aniki-Bobó (1942) e
A Caça (1964) predomina um estilo cinematográfico puro, sem diálogos ou monólogos palavrosos.
O Acto da Primavera (1963) é o primeiro filme de Oliveira em que o teatro filmado se torna uma opção e um estilo.
O Passado e o Presente (1972) será o segundo. Contradizendo-se na prática, é a propósito deste filme que ele se explica em teoria: enquanto
arte cénica, o
teatro é bem mais
nobre e muitíssimo mais antigo que o
cinema e é por isso que este se deve submeter à
palavra.
A esta dualidade de Manoel de Oliveira não é estranha a sua educação religiosa. É
católico por crença e convicção, mas de
ortodoxo nada tem. A dúvida quanto ao corpo da
fé, quanto a certos princípios da sua
igreja, assola-o com frequência e isso tem reflexos profundos na sua obra. Essa dúvida é reproduzida no frequente filosofar de muitas das personagens dos seus filmes, em particular nos filmes mais falados, com incarnação de figuras do
Evangelho e do ideário
cristão, com inúmeras referências bíblicas.
Por muitos anos o teatro filmado, salvo raras excepções, será na obra de Manoel de Oliveira opção dominante, que se extrema com
O Sapato de Cetim (1985). Na passagem da década de oitenta para noventa essa tendência atenua-se. Monólogos e diálogos são cantados em
Os Canibais (1988), o teatro converte-se em
ópera, a
palavra deixa de ser crua para ser cantada. Pouco depois, o teatro surge em doses equilibradas com o cinema em
A Divina Comédia (1991). Gradualmente e a partir de então o estilo cinematográfico volta a predominar na cinematografia de Oliveira com filmes mais leves e de menor duração. É de admitir a hipótese de tal se dever, por força das circunstâncias, à necessidade de fazer filmes num formato que não afaste o público, talvez também pela nostalgia dos primeiros filmes que fez.
Filmografia
Longas-metragens
Curtas e médias metragens
Outros filmes
- 1937 - Os Últimos Temporais: Cheias do Tejo (documentário)
- 1958 - O Coração (documentário, 1958)
- 1964 - Villa Verdinho: Uma Aldeia Transmontana (documentário)
- 1987 - Mon Cas (1987)
- 1987 - A Propósito da Bandeira Nacional (1987)
- 2002 - Momento (2002)
- 2005 - Do Visível ao Invisível (2005)
- 2006 - O Improvável não é Impossível (2006)
- 2011 - O Conquistador conquistado (2011), curta-metragem inspirado pela escolha de Guimarães como Capital Europeia da Cultura.
Outras actividades
- Como actor
- Como supervisor
- 1966 - A Propósito da Inauguração de Uma Estátua - Porto 1100 Anos, de Artur Moura, Albino Baganha e António Lopes Fernandes.
- 1970 - Sever do Vouga… Uma Experiência, de Paulo Rocha
Prémios e galardões
- Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (9 de junho de 1980).
- Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (29 de dezembro de 1988).
- É professor honorário da Academia de Cinema de Skopje.
- Prémio Europa David Mourão-Ferreira 2006 (categoria Mito), entregue pelo Centro Studi Lusofoni - Cátedra David Mourão Ferreira da Universidade de Bari e do Camões, Instituto da Cooperação e da Língua.
- Recebeu em 2008 o Prémio Mundial do Humanismo.
- Em 2008 Manoel de Oliveira recebeu o Doutoramento honoris causa pela Universidade do Algarve.
- Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (13 de dezembro de 2008).
- Em 2009 recebeu, nos XIV Globos de Ouro, transmitido na SIC no dia 18 de maio de 2009, um prémio de prestigio e de homenagem pelo trabalho que realizou, tendo já 100 anos de idade e sendo dos realizadores mais velhos do mundo.
- Em 2010 recebeu um Prémio da Igreja Católica «pelo seu "falar de Deus"».
- Em 2011 recebeu o doutoramento honoris causa pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
- Em 2013, recebeu a Medalha de Conhecimento e Mérito do Instituto Politécnico de Lisboa.
- Lista de prémios no estrangeiro (em francês), Ciné-Ressources, BIFI, Cinemateca Francesa.