Todas as fontes bibliográficas indicam 2 de novembro de 1877 como a sua
data de nascimento. Contudo, o assento de nascimento/batismo refere,
indubitavelmente, que ele nasceu às cinco horas da tarde de 8 de
novembro de 1877, em Amarante. Segundo Luísa Borges, em O Lugar de Pascoais, Pascoais terá adotado o dia 2 de novembro como data do seu aniversário por razões puramente simbólicas, por ser o Dia dos Mortos, uma "porta" para o "Mais Além".
Nasceu no seio de uma família aristocrática de Amarante, o segundo
filho (de sete) de João Pereira Teixeira de Vasconcelos, juiz e
deputado às Cortes, e de Carlota Guedes Monteiro. Foi uma criança
solitária, introvertida e sensível, muito propenso à contemplação
nostálgica da Natureza.
Em 1883, inicia os estudos primários em Amarante, e em 1887 ingressa no
liceu da vila. Em 1895, muda-se para Coimbra onde termina os seus
estudos secundários (em Amarante não foi bom aluno, tendo até reprovado
em Português) e em 1896 inscreve-se no curso de Direito da
Universidade de Coimbra.
Ao contrário da maioria dos seus camaradas, não faz parte da boémia
coimbrã, e passa o seu tempo, monasticamente, no quarto, a ler, a
escrever e a refletir.
Licencia-se em
1901
e, renitentemente, estabelece-se como advogado, primeiro em Amarante
e, a partir de 1906, no Porto. Em 1911, é nomeado juiz substituto em
Amarante, cargo que exerce durante dois anos. Em 1913, com alívio, dá
por terminada a sua carreira judicial. Sobre esta sua penosa experiência
jurídica dirá:
"Eu era um Dr. Joaquim na boca de toda a gente.
Precisava de honrar o título. Entre o poeta natural e o bacharel à
força, ia começar um duelo que durou dez anos, tanto como o cerco de
Tróia e a formatura de João de Deus. Vivi dez anos, num escritório, a
lidar com almas deste mundo, o mais deste mundo que é possível — eu que
nascera para outras convivências."
Sendo um proprietário abastado, não tinha necessidade de exercer
nenhuma profissão para o seu sustento, e passou a residir no solar de
família em
São João do Gatão,
perto de Amarante, com a mãe e outros membros da sua família.
Dedicava-se à gestão das propriedades, à incansável contemplação da
natureza e da sua amada
Serra do Marão,
à leitura e sobretudo à escrita. Era um eremita, um místico natural e
não raras vezes foi descrito como detentor de poderes sobrenaturais.
Apesar de ser um solitário, Gatão era local de peregrinação de inúmeros
intelectuais e artistas, nacionais e estrangeiros, que o iam visitar
frequentemente. No final da vida, seria amigo dos poetas
Eugénio de Andrade e
Mário Cesariny de Vasconcelos. Este último haveria de o eleger como poeta superior a
Fernando Pessoa,
chegando a ser o organizador da reedição de alguns dos textos de
Pascoais, bem como de uma antologia poética, nos anos 70 e 80.
Pascoais morreu aos 75 anos, em Gatão, de bacilose pulmonar, alguns meses depois da morte da sua mãe, em
1952.
Obra
O Que Eu Sou
Nocturna e dúbia luz
Meu ser esboça e tudo quanto existe...
Sou, num alto de monte, negra cruz,
Onde bate o luar em noite triste...
Sou o espírito triste que murmura
Neste silencio lúgubre das Cousas...
Eu é que sou o Espectro, a Sombra escura
De falecidas formas mentirosas.
E tu, Sombra infantil do meu Amor,
És o Ser vivo, o Ser Espiritual,
A Presença radiosa...
Eu sou a Dor,
Sou a trágica Ausência glacial...
Pois tu vives, em mim, a vida nova,
E eu já não vivo em ti...
Mas quem morreu?
Foste tu que baixaste à fria cova?
Oh, não! Fui eu! Fui eu!
Horrível cataclismo e negra sorte!
Tu foste um mundo ideal que se desfez
E onde sonhei viver após a morte!
Vendo teus lindos olhos, quanta vez,
Dizia para mim: eis o lugar
Da minha espiritual, futura imagem...
E viverei à luz daquele olhar,
Divino sol de mística Paisagem.
Era minha ambição primordial
Legar-lhe a minha imagem de saudade;
Mas um vento cruel de temporal,
Vento de eternidade,
Arrebatou meu sonho! E fugitiva
Deste mundo se fez minha alegria;
Mais morta do que viva,
Partiu contigo, Amor, à luz do dia
Que doirou de tristeza o teu caixão...
Partiu contigo, ao pé de ti murmura;
É magoada voz na solidão,
Doce alvor de luar na noite escura...
E beija o teu sepulcro pequenino;
Sobre ele voa e erra,
Porque o teu Ser amado é já divino
E o teu sepulcro, abrindo-se na terra,
Penetrou-a de luz e santidade...
E para mim a terra é um grande templo
E, dentro dele, a Imagem da Saudade...
E rezo de joelhos, e contemplo
Meu triste coração, saudoso altar
Alumiado de sombra, escura luz...
Nele deitado estás como a sonhar,
Meu pequenino e místico Jesus...
Lágrimas dos meus olhos são as flores
Que a teus pés eu deponho...
Enfeitam tua Imagem minhas dores,
E alumia-te, ás noites, o meu sonho.
Todo me dou em sacrifício à tua
Imagem que eu adoro.
Sou branco incenso à triste luz da lua:
Eu sou, em névoa, as lágrimas que choro...
in Elegias (1912) - Teixeira de Pascoaes
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