De barro, como os outros
Nasceste, Jesus Cristo, entre as ovelhas
e as palhas de um curral,
mas, mal nasceste, o povo da Judeia
viu no céu um sinal.
Nasceste como o filho de um pastor
mas o Mundo, suspenso,
viu a estrela, o cortejo dos reis magos,
o ouro, a mirra, o incenso.
Nasceste como nascem os mortais
mas eras imortal,
e entre todas as noites só à tua
chamamos de Natal.
Foste preso, insultado, torturado
e pregado numa Cruz.
Mas do teu corpo não saía sangue,
saía sangue e luz.
Morreste como o bom e o mau ladrão,
cortou-te Deus a haste;
mas de todos os mortos, pelos séculos,
só tu ressuscitaste.
Ah, bem sabes, Senhor, que o barro é pouco
sem o sopro divino,
e que sem Deus só poderão salvar-se
o tonto e menino.
Por isso espero a morte sem terror,
sem temer o castigo.
Por que há-de recear-se a paz, o amor?
Receia-se o inimigo.
Bem sabes que o pecado original
nos roubou a inocência,
e que em nós e combatem Bem e Mal
ao longo da existência.
É difícil ao barro ser eterno.
Difícil, sobrehumano,
o longo drama que é o céu e o inferno
em cada ser humano.
Por isso eis-me a teus pés serena e calma.
Nem melhor, nem pior:
de barro, como os outros...corpo e alma
- mas a alma maior.
Fernanda de Castro
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