Cheia no concelho de Odivelas
Na noite de 25 para 26 de novembro de 1967 registou-se, na região de
Lisboa, precipitação intensa e concentrada, tendo atingido, na estação
de São Julião do Tojal, no concelho de Loures, 111 mm em apenas 5 horas
(entre as 19.00 e as 24.00 horas do dia 25). As estações da região de
Lisboa registaram, nesta data, cerca de um quinto do total da
precipitação anual.
Tal precipitação excepcional, cujo período de retorno está estimado em
de 500 anos, provocaram a ocorrência de uma cheia repentina com duração
inferior a 12 horas.
A cheia foi amplificada por vários factores, designadamente:
- na região de Lisboa as bacias hidrográficas têm áreas reduzidas e tempos de resposta muito curtos (2 horas);
- vastas zonas da região estão intensamente urbanizadas e impermeabilizadas;
- grande parte do coberto vegetal tinha sido destruído;
- ao longo do tempo tinham sido construídas estruturas transversais nos cursos de água, que dificultavam ou impediam a drenagem natural;
- os rios e ribeiras da região careciam de limpeza, havendo locais onde existia vegetação muito densa que dificultava a escorrência, e outros onde, ao longo do tempo, se tinha acumulado lixo variado, inclusivamente mobiliário velho e electrodomésticos;
- em muitos pontos a rede fluvial tinha sido canalizada, correndo, nalguns locais, de forma subterrânea (através de manilhas);
- o sistema de drenagem pluvial estava mal dimensionado com limpeza deficiente;
- a precipitação concentrada coincidiu com a preia-mar do Tejo, que ocorreu às 22.50 horas.
Acresce que os fortes caudais da escorrência superficial tinham grande
carga sólida, arrastando quantidade muito grande de detritos de
dimensões muito variadas (de micra a metros), designadamente solo
erodido, árvores, fragmentos de muros e blocos de edificações
destruídas. Nalguns pontos a corrente de cheia revelou características
de corrente de densidade. Muitas vezes os danos foram provocados pelo
impacte de detritos de grandes dimensões, que fragilizaram as
estruturas, as quais acabariam por ceder perante a força da corrente.
A situação na região de Lisboa tornou-se completamente caótica. As
cheias destrutivas causaram a morte de 462 pessoas e desalojaram ou
afectaram cerca de 1.100, submergindo centenas de casas e
infra-estruturas num rio de lamas e pedras. Todavia, permanecem muitas
dúvidas sobre a dimensão deste evento, designadamente no que se refere
ao número de vítimas mortais, pois que o regime político da altura nunca
permitiu apurar as verdadeiras consequências desta catástrofe. Algumas
estimativas apontam para prejuízos da ordem dos 3 milhões de dólares, a
preços da época.
No dia seguinte as estruturas oficiais revelaram-se incapazes de
ministrar o apoio necessário às vítimas, tendo-se, para tal, verificado
mobilização da sociedade civil. Como recorda Mariano Gago "... com as
cheias de 1967 e com a participação na movimentação dos estudantes de
Lisboa no apoio às populações (morreram centenas de pessoas na área de
Lisboa e isso era proibido dizer-se). Só as Associações de Estudantes e a
Juventude Universitária Católica é que estavam no terreno a ajudar as
pessoas a tirar a lama, a salvar-lhes os pertences, juntamente com
alguns raros corpos de bombeiros e militares. Talvez isso, tenha sido um
dos primeiros momentos de mobilização política da minha geração."
Consequências das cheias na Pontinha
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