quarta-feira, agosto 07, 2024

A gastronomia neandertal alvo de estudo...

Arqueólogas portuguesas desvendam os segredos da cozinha à la Neandertal

 

 

Mariana Nabais depena uma ave com técnicas neandertais. Foi mais difícil do que parecia…

 

Três arqueólogas, incluindo as portuguesas Marina Igreja e Mariana Nabais, tentaram reproduzir os antigos métodos usados pelos Neandertais para cozinhar aves e assim compreenderem melhor a dieta destes humanos primitivos.

O que é que os Neandertais gostavam de comer? Os arqueólogos que estudam os nossos primos extintos fazem esta pergunta muitas vezes.

Mas descobrir detalhes sobre a dieta dos Neandertais é muito parecido com vasculhar os caixotes do lixo do vizinho - estudando cuidadosamente os ossos e utensílios de abate que usavam, em sítios onde se sabe que estas populações viviam.

Nos últimos anos, diferentes estudos foram apresentando resultados divergentes sobre os hábitos alimentares do Neandertais: em 2014, consumiam mais vegetais do que se pensava; eram pescadores; mas a carne fresca era a base da sua dieta; eram carnívoros, mas odiavam sangue e ossos.

Agora, uma equipa de arqueólogas, incluindo as investigadores portuguesas Marina Igreja e Mariana Nabais, do Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa, tentaram cozinhar pratos neandertais - para melhor compreender a sua dieta.

A equipa incluiu também Anna Rufà Bonache, investigadora do Centro Interdisciplinar de Arqueologia e Evolução do Comportamento Humano da Universidade do Algarve.

Os resultados do estudo foram publicados esta quarta-feira na revista Frontiers in Environmental Archaeology.

As autoras testaram métodos de preparação de alimentos que os Neandertais poderiam ter usado para verificarem que vestígios deixariam nos ossos das aves, e como se comparavam com danos causados por processos naturais ou por ação de outros animais.

Durante a experiência, a equipa confrontou-se com dificuldades imprevistas, como utilizar lascas de sílex para cortar carne. A borda das lascas era mais afiada do que as investigadoras pensavam, o que exigiu a sua manipulação com cuidado para fazer cortes precisos sem causar ferimentos nas mãos.

As arqueólogas utilizaram cinco aves selvagens que morreram de causas naturais no Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens, em Gouveia: dois corvos, duas rolas-turcas e um pombo-torcaz, espécies semelhantes às consumidas pelos Neandertais.

A equipa selecionou métodos culinários a partir de provas arqueológicas e dados etnográficos. Todas as aves foram depenadas à mão.

O corvo e uma rola-turca foram esquartejados em cru com uma lasca de sílex e as restantes aves foram assadas sobre brasas e depois desmembradas.

Posteriormente, as arqueólogas limparam e secaram os ossos e examinaram-nos ao microscópio à procura de marcas de cortes, fraturas e queimaduras, tendo analisado a lasca de pedra usada para procurar sinais de desgaste.

Os cortes feitos para extrair a carne das aves cruas não deixaram marcas nos ossos, mas os dirigidos aos tendões criaram marcas semelhantes às dos ossos de aves encontrados em sítios arqueológicos.



Ossos recuperados das aves cozinhadas “À la Neandertal”

 

Os ossos das aves assadas eram mais quebradiços e quase todos apresentavam queimaduras compatíveis com a exposição ao calor. As manchas negras no interior de alguns ossos sugerem que o conteúdo da cavidade interna também tinha sido queimado.

Segundo o estudo, estes indícios lançam luz sobre como a preparação dos alimentos dos Neandertais pode ter funcionado e quão visível pode ser essa preparação no registo arqueológico.

Embora o acesso à carne seja facilitado quando é assada, a maior fragilidade dos ossos leva a que não sejam encontrados pelos arqueólogos durante as escavações.

As autoras do trabalho ressalvam que a investigação feita deve ser aprofundada com estudos que incluam mais espécies de presas pequenas, para se compreender melhor o regime alimentar dos Neandertais.

Estes hominídeos, sobreviviam à custa da caça e da recolha de vegetais e frutos, e dominavam o fogo. Surgiram há cerca de 230 mil anos e extinguiram-se há quase 30 mil anos, por razões ainda desconhecidas - há quem diga que pelo frio, ou genocídio, ou mera má sorte.

 

in ZAP

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