Lúcia (à direita) junto a Jacinta Marto em 1917
Lúcia de Jesus dos Santos (Aljustrel, Fátima, Ourém, 28 de março de 1907 - Coimbra, 13 de fevereiro de 2005), freira da Ordem das Carmelitas Descalças, conhecida no Carmelo como Irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado e reverenciada pela maioria dos católicos portugueses simplesmente como Irmã Lúcia, foi, juntamente com os seus primos Jacinta e Francisco Marto (os chamados «Três Pastorinhos»), uma das três crianças que viram Nossa Senhora na Cova da Iria, em Fátima, durante o ano de 1917.
Biografia
Lúcia nasceu no lugar de Aljustrel, próximo de Fátima, filha de António dos Santos e de sua mulher (casados em Fátima, Ourém, a 19 de novembro de 1890) Maria Rosa (nascida a 6 de julho de 1869) e irmã mais nova de sete: Maria dos Anjos, Teresa de Jesus Rosa dos Santos, Manuel Rosa dos Santos, Glória de Jesus Rosa dos Santos, Carolina de Jesus Rosa dos Santos e Maria Rosa. Tinha dez anos e era completamente analfabeta quando alegadamente viu, pela primeira vez, Nossa Senhora na Cova da Iria, juntamente com os primos Jacinta e Francisco Marto. Lúcia foi a única dos três primos que falava com a Virgem Nossa Senhora, a sua prima Jacinta ouvia mas não falava e Francisco nem sequer ouvia as palavras de Nossa Senhora, e como tal era a portadora do Segredo de Fátima. Nos primeiros tempos, a hierarquia católica revelou-se céptica sobre as afirmações dos Três Pastorinhos e foi só a 13 de outubro de 1930 que o bispo de Leiria tornou público, oficialmente, que as aparições eram dignas de crédito. A partir daí, o Santuário de Fátima ganhou uma expressão internacional, enquanto a irmã Lúcia viveu cada vez mais isolada.
Em 17 de junho de 1921, o Bispo de Leiria, Dom José Alves Correia da Silva, proporcionou a sua entrada no colégio das Irmãs Doroteias em Vilar, Porto, alegadamente para a proteger dos peregrinos e curiosos que acorriam cada vez mais à Cova da Iria e pretendiam falar com ela. Professou como Doroteia em 1928, em Tui, Espanha, onde viveu alguns anos.
Em 1946 regressou a Portugal e, dois anos depois, entrou para a clausura do Carmelo de Santa Teresa em Coimbra, onde professou como Carmelita a 31 de maio de 1949. Foi neste convento que escreveu dois volumes com as suas Memórias e os Apelos da Mensagem de Fátima. Em 1991, quando o Papa João Paulo II visitou Fátima, convidou a irmã Lúcia a deslocar-se ali e esteve reunido com ela doze minutos. Antes, já se tinha encontrado também em Fátima com o Papa Paulo VI.
Lúcia morreu no dia 13 de fevereiro de 2005, aos 97 anos, no Convento Carmelita de Santa Teresa em Coimbra. O Papa João Paulo II, nesta ocasião, rezou por Irmã Lúcia e enviou o Cardeal Tarcisio Bertone para o representar no funeral. Em 19 de fevereiro de 2006 o seu corpo foi trasladado de Coimbra para o Santuário de Fátima onde foi sepultada junto dos seus primos.
Memórias
A 12 de setembro de 1935, os restos mortais de Jacinta Marto são trasladados para o cemitério de Fátima. Ao abrir-se a urna, verifica-se que o rosto da vidente se encontrava incorrupto. Tiram-se então algumas fotografias e o então Bispo de Leiria, D. José Alves Correia da Silva, remete algumas para Lúcia que se encontrava na altura em Pontevedra. Na carta de agradecimento, Lúcia evoca a prima com saudade referindo alguns factos sobre o carácter de Jacinta. Estas palavras levam D. José a ordenar-lhe que escrevesse tudo o que se recordava da prima. Assim nasce a Primeira Memória da Irmã Lúcia, que fica concluída em dezembro de 1935.
Volvidos dois anos sobre a revelação dos factos relatados na Primeira Memória, o Bispo de Leiria, convencido da necessidade de se estudar mais a fundo os acontecimentos de Fátima, dá ordens a Lúcia para escrever a história da sua vida e das aparições. A vidente obedece e redige, entre os dias 7 e 21 de novembro de 1937, o que fica conhecido como Segunda Memória da Irmã Lúcia. Neste texto, a vidente revela pela primeira vez os factos ocorridos com as três visões do Anjo.
Em 26 de julho de 1941, o Bispo de Leiria escreve a Lúcia anunciando-lhe o livro "Jacinta" que estava a ser preparado pelo Dr. J. Galamba de Oliveira. Pede-lhe então para recordar tudo o mais o que pudesse lembrar sobre a prima, de modo a ser incluído nesta edição. Esta ordem cai no fundo da alma da vidente como um raio de luz, dizendo-lhe que era chegado o momento de revelar as duas primeiras partes do Segredo. Manifesta então a vontade de acrescentar à edição dois capítulos: um sobre o Inferno e outro sobre o Imaculado Coração de Maria. Estas revelações são escritas e concluídas em 31 de agosto de 1941. São posteriormente publicadas e conhecidas como a "Terceira Memória da Irmã Lúcia".
Surpreendidos com os relatos da "Terceira Memória", Dom José Alves Correia da Silva e Galamba de Oliveira concluíram que Lúcia não tinha dito tudo nas narrações anteriores e que ocultaria ainda algumas coisas. A 7 de outubro de 1941, a vidente recebe ordem para escrever tudo o que soubesse sobre Francisco e completar o que faltasse sobre Jacinta e descrever, com mais pormenor, as Aparições do Anjo e de Nossa Senhora. Lúcia entrega o manuscrito a 8 de dezembro de 1941 deixando claro que nada mais tem a ocultar excepto a Terceira parte do Segredo. O texto é depois publicado como "Quarta Memória da Irmã Lúcia" e nele a vidente escreve o texto definitivo das Orações do Anjo, acrescentando também ao segredo a frase «Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé».
Memorial Irmã Lúcia
Em 31 de maio de 2007 foi inaugurado em Coimbra um museu sobre a vidente de Fátima.
Foi projectado pelo arquitecto Florindo Belo Marques para uma área onde as freiras do Carmelo de Coimbra tinham galinheiros, o museu apresenta um espólio que remete até ao tempo das "aparições de Fátima".
Processo de beatificação
Em 14 de fevereiro de 2008, na Catedral de Coimbra em Portugal, o Cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, por ocasião do aniversário da morte da "vidente de Fátima", tornou público que o papa Bento XVI, atendendo ao pedido do bispo D. Albino Mamede Cleto, de Coimbra, compartilhado com numerosos bispos e fiéis do mundo todo, autorizou, excepcionando as normas do Direito Canónico (Artigo 9 das Normae servandae), o início da fase diocesana da causa da sua beatificação, transcorridos apenas três anos da sua morte.
Eventos históricos
Apresenta-se a seguir uma cronologia de alguns eventos históricos relacionados com a vida de Lúcia:
- 28 de março de 1907 - Nasce em Aljustrel, Fátima.
- 17 de maio de 1921 - Dá entrada como aluna interna, no colégio das Irmãs Doroteias em Vilar, Porto.
- 25 de outubro de 1925 - Viaja para Espanha e é admitida como postulante de noviciado no Convento das Doroteias, em Tui, sob a protecção de Madre Maria do Carmo da Cunha Matos. Ao receber o hábito adopta o nome de Maria (Lúcia) das Dores.
- 10 de dezembro de 1925 - Nossa Senhora pede a Lúcia, numa visão em Tui, a divulgação da prática e da comunhão reparadora nos primeiros sábados.
- 15 de fevereiro de 1926 - Tem uma visão de Jesus onde Ele lhe pergunta se tem espalhado a devoção dos primeiros sábados.
- 13 de junho de 1929 - Nossa Senhora pede a Lúcia, noutra visão em Tui, a consagração da Rússia ao Seu Imaculado Coração.
- Dezembro de 1935 - Escreve o texto sobre a vida de Jacinta que fica conhecido como a "Primeira Memória da Irmã Lúcia".
- Novembro de 1937 - Escreve o texto sobre a sua vida e as aparições que fica conhecido como "Segunda Memória da Irmã Lúcia".
- 25 de janeiro de 1938 - Extraordinária aurora boreal, registada por astrónomos na noite de 25 para 26 de Janeiro. (Lúcia sempre insistiu que este seria o sinal de Deus para o começo da guerra, conforme Nossa Senhora havia comunicado aos Pastorinhos na terceira aparição.)
- 12 de março de 1938 - Tropas nazis marcham até Áustria para anexá-la à Alemanha do Terceiro Reich. Segundo o testemunho da Irmã Lúcia (carta de 8 de Novembro de 1989 para o Santo Padre), este acontecimento teria sido o verdadeiro início da Segunda Guerra Mundial, ocorrendo durante o pontificado do Papa Pio XI (1922-1939), confirmando assim a mensagem de Nossa Senhora de 13 de julho de 1917.
- 31 de agosto de 1941 - Atendendo ao pedido feito pelo Bispo de Leiria, Lúcia redige numa carta manuscrita, a Primeira e a Segunda parte do Segredo, deixando claro que existiria ainda uma Terceira parte por divulgar. Estas revelações são posteriormente publicadas e conhecidas como a "Terceira Memória da Irmã Lúcia".
- 8 de dezembro de 1941 - Escreve o que ficou conhecido como a "Quarta Memória da Irmã Lúcia". Acrescenta ao texto do segredo: « Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé».
- 3 de janeiro de 1944 - Por ordem do Bispo de Leiria, a Irmã Lúcia escreve a Terceira parte do Segredo. O envelope é selado e guardado primeiramente pelo Bispo de Leiria sendo entregue, no dia 4 de Abril de 1957, ao Arquivo Secreto do Santo Ofício. Disto mesmo, foi avisada a Irmã Lúcia pelo Bispo de Leiria.
- 20 de maio de 1946 - A vidente desloca-se a Fátima e faz a identificação dos lugares históricos das aparições.
- 25 de março de 1948 - Retorna a Portugal para ingressar no Carmelo de Santa Teresa, em Coimbra.
- 31 de maio de 1949 - Faz a sua profissão solene com o nome de Irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado.
- 12 de maio de 1982 - Numa carta dirigida ao Santo Padre, faz uma orientação para a interpretação da Terceira parte do Segredo.
- 13 de maio de 1982 - Encontro com o Papa João Paulo II quando este visita pela primeira vez o Santuário de Nossa Senhora de Fátima para agradecer à Virgem ter escapado com vida do atentado que havia sofrido um ano antes.
- 25 de março de 1984 - O Papa João Paulo II, em união com os Bispos do mundo inteiro, faz na Praça de São Pedro, no Vaticano, a Consagração do Mundo ao Imaculado Coração de Maria, diante da imagem da Virgem de Fátima, que propositadamente viajou desde a Capelinha das Aparições. Mais tarde, a Irmã Lúcia confirma, numa carta de 8 de novembro de 1989 para o Santo Padre, que este acto solene e universal de consagração, corresponderia ao que Nossa Senhora queria.
- 13 de maio de 1991 - Encontro com o Papa João Paulo II quando este visita o Santuário de Fátima pela segunda vez, no 10º aniversário do seu atentado na Praça de São Pedro.
- 27 de abril de 2000 - Cumprindo o pedido feito pelo Papa João Paulo II numa carta pessoal enviada à Irmã Lúcia em 19 de Abril de 2000, o Cardeal D. Tarcisio Bertone, Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé e o Bispo de Leiria-Fátima Dom Serafim de Sousa Ferreira e Silva encontram-se com a Irmã Lúcia no Carmelo de Santa Teresa em Coimbra para ouvir a sua interpretação da Terceira parte do Segredo.
- 13 de maio de 2000 - O Papa João Paulo II visita Fátima pela última vez para a beatificação dos pastorinhos Francisco e Jacinta Marto. Aí se encontra pela última vez com a Lúcia. O Cardeal Ângelo Sodano, no final da solene Concelebração Eucarística presidida por João Paulo II, anuncia o Terceiro Segredo de Fátima.
- 13 de fevereiro de 2005 - Morre no Carmelo de Coimbra.
- 19 de fevereiro de 2006 - Os restos mortais são trasladados para a Basílica de Fátima onde é sepultada junto dos seus primos, Francisco e Jacinta.
- 31 de maio de 2007 - É inaugurado em Coimbra um museu sobre a vidente.
- 14 de fevereiro de 2008 - O Cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, por ocasião do aniversário da morte de Lúcia, torna público em Coimbra que o Papa Bento XVI autorizou, excepcionando as normas do Direito Canónico, o início da fase diocesana da causa da sua beatificação, transcorridos apenas três anos da sua morte.
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