O Blog Ciência ao Natural continua ímpar - os textos do Luís Azevedo Rodrigues fazem-nos cada vez mais recordar o saudoso Stephen Jay Gould. Vejam só a delícia (também baco-gastronómica) deste post:
(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 15/11/2007)
Pela segunda vez num curto espaço de tempo, a nomenclatura zoológica ocupa este espaço, depois de “Chernes e ornitorrincos”.
Explico: num hilariante artigo de Ferreira Fernandes no DN, soube da troca de galhardetes, entre o colunista Tony Parsons, do Daily Mirror e o embaixador português em Londres. Por motivos que aqui não repetirei, o cronista britânico dirigiu-se ao representante luso nos seguintes termos: "Feche a sua estúpida boca de comedor de sardinhas." Não terá tomado muito chá este Tony Parsons.
O provérbio português afirma que “A mulher e a sardinha nem a maior nem a mais pequenina”, apoiando que o ponto médio da distribuição de tamanhos da sardinha será a melhor em termos gastronómicos. Quanto às mulheres talvez não seja tão verdade como isso. Ao jornalista inglês faltou um pouco de meio-termo, pois ansiava que o embaixador tivesse afastado a brasa da sua sardinha e, já agora se possível, sem a comer…
Peixe não puxa carroça, mas neste caso o cronista do Daily Mirror sem dúvida que a puxou …
(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 15/11/2007)
Pela segunda vez num curto espaço de tempo, a nomenclatura zoológica ocupa este espaço, depois de “Chernes e ornitorrincos”.
Explico: num hilariante artigo de Ferreira Fernandes no DN, soube da troca de galhardetes, entre o colunista Tony Parsons, do Daily Mirror e o embaixador português em Londres. Por motivos que aqui não repetirei, o cronista britânico dirigiu-se ao representante luso nos seguintes termos: "Feche a sua estúpida boca de comedor de sardinhas." Não terá tomado muito chá este Tony Parsons.
O provérbio português afirma que “A mulher e a sardinha nem a maior nem a mais pequenina”, apoiando que o ponto médio da distribuição de tamanhos da sardinha será a melhor em termos gastronómicos. Quanto às mulheres talvez não seja tão verdade como isso. Ao jornalista inglês faltou um pouco de meio-termo, pois ansiava que o embaixador tivesse afastado a brasa da sua sardinha e, já agora se possível, sem a comer…
Peixe não puxa carroça, mas neste caso o cronista do Daily Mirror sem dúvida que a puxou …
Estes mimos zoo-gastronómicos acordaram outras memórias da relação cultural dos portugueses com os peixes.
Em visita familiar ao Brasil, e para além de habitual repertório de anedotas sobre lusitanos, foi avisado de que os nossos conterrâneos eram frequentemente chamados de “papa-bacalhau” devido à nossa paixão por aquele peixe.
Há cinco anos atrás, encontrava-me a trabalhar no American Museum of Natural History, quando outra referência ao fiel-amigo e os portugueses, foi-me introduzida por uma zoóloga canadiana. Durante a nossa apresentação, fui brindado com “Ah, vocês comem muito bacalhau, não comem? É que os stocks estão quase a desaparecer por vossa causa!” Depois do aperto-de-bacalhau literal, tentei argumentar que o bacalhau era muito mais do que um mero alimento em Portugal, que o papel deste peixe na vida dos portugueses não se limitava apenas a satisfazer a gula de uma qualquer refeição. Como castigo desta argumentação, pouco tempo depois andava eu, desesperado de desejo, pelos supermercados mexicanos de Brooklyn à procura de uma mísera posta de bacalhau…
Continuando em ambiente ictiológico, sempre que num congresso ou numa revista científica um grande especialista opina, é habitual que os colegas portugueses o designem por truta. Não imagino a origem de tal designação nem o porquê de sermos um povo que apesar de venerar dois peixes de mar – o bacalhau e a sardinha – utilizarmos um peixe de rio como sinónimo de perito.
Paradoxalmente ao que se diz no ambiente académico, aprendi que “A truta e a mentira, quanto maior melhor”. Resta-me apenas continuar a aprender com os trutas da minha área…já agora, de todas as áreas.
Apesar de se poder cair na brejeirice, a alusão piscícola que mais me agrada, é a proferida pela comunidade masculina sempre que se avista uma representante do sexo feminino de bela morfologia: “Mas que faneca!”.
Concluindo só me resta concordar com o dito “O peixe deve nadar três vezes: em água, em molho e em vinho.”
Imagens:
EGEAC
Pieter Bruegel - "Les gros poissons mangent les petits" (1557)
Prato de bacalhau com grão
Cate Blanchett, actriz de "Little Fish"
Gustave Klimt - "The Blood of Fish" (1898)
Em visita familiar ao Brasil, e para além de habitual repertório de anedotas sobre lusitanos, foi avisado de que os nossos conterrâneos eram frequentemente chamados de “papa-bacalhau” devido à nossa paixão por aquele peixe.
Há cinco anos atrás, encontrava-me a trabalhar no American Museum of Natural History, quando outra referência ao fiel-amigo e os portugueses, foi-me introduzida por uma zoóloga canadiana. Durante a nossa apresentação, fui brindado com “Ah, vocês comem muito bacalhau, não comem? É que os stocks estão quase a desaparecer por vossa causa!” Depois do aperto-de-bacalhau literal, tentei argumentar que o bacalhau era muito mais do que um mero alimento em Portugal, que o papel deste peixe na vida dos portugueses não se limitava apenas a satisfazer a gula de uma qualquer refeição. Como castigo desta argumentação, pouco tempo depois andava eu, desesperado de desejo, pelos supermercados mexicanos de Brooklyn à procura de uma mísera posta de bacalhau…
Continuando em ambiente ictiológico, sempre que num congresso ou numa revista científica um grande especialista opina, é habitual que os colegas portugueses o designem por truta. Não imagino a origem de tal designação nem o porquê de sermos um povo que apesar de venerar dois peixes de mar – o bacalhau e a sardinha – utilizarmos um peixe de rio como sinónimo de perito.
Paradoxalmente ao que se diz no ambiente académico, aprendi que “A truta e a mentira, quanto maior melhor”. Resta-me apenas continuar a aprender com os trutas da minha área…já agora, de todas as áreas.
Apesar de se poder cair na brejeirice, a alusão piscícola que mais me agrada, é a proferida pela comunidade masculina sempre que se avista uma representante do sexo feminino de bela morfologia: “Mas que faneca!”.
Concluindo só me resta concordar com o dito “O peixe deve nadar três vezes: em água, em molho e em vinho.”
Imagens:
EGEAC
Pieter Bruegel - "Les gros poissons mangent les petits" (1557)
Prato de bacalhau com grão
Cate Blanchett, actriz de "Little Fish"
Gustave Klimt - "The Blood of Fish" (1898)
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