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quinta-feira, novembro 30, 2023

O menino da sua Mãe...


 

 

O MENINO DA SUA MÃE

 

No plaino abandonado

Que a morna brisa aquece,

De balas traspassado

— Duas, de lado a lado —,

Jaz morto, e arrefece.

 

Raia-lhe a farda o sangue.

De braços estendidos,

Alvo, louro, exangue,

Fita com olhar langue

E cego os céus perdidos.

 

Tão jovem! que jovem era!

(Agora que idade tem?)

Filho único, a mãe lhe dera

Um nome e o mantivera:

«O menino da sua mãe».

 

Caiu-lhe da algibeira

A cigarreira breve.

Dera-lha a mãe. Está inteira

E boa a cigarreira.

Ele é que já não serve.

 

De outra algibeira, alada

Ponta a roçar o solo,

A brancura embainhada

De um lenço... Deu-lho a criada

Velha que o trouxe ao colo.

 

Lá longe, em casa, há a prece:

«Que volte cedo, e bem!»

(Malhas que o Império tece!)

Jaz morto, e apodrece,

O menino da sua mãe.

 

 

Fernando Pessoa

quarta-feira, novembro 30, 2022

O menino da sua Mãe...

   

O MENINO DA SUA MÃE

 

No plaino abandonado

Que a morna brisa aquece,

De balas traspassado

— Duas, de lado a lado —,

Jaz morto, e arrefece.

 

Raia-lhe a farda o sangue.

De braços estendidos,

Alvo, louro, exangue,

Fita com olhar langue

E cego os céus perdidos.

 

Tão jovem! que jovem era!

(Agora que idade tem?)

Filho único, a mãe lhe dera

Um nome e o mantivera:

«O menino da sua mãe».

 

Caiu-lhe da algibeira

A cigarreira breve.

Dera-lha a mãe. Está inteira

E boa a cigarreira.

Ele é que já não serve.

 

De outra algibeira, alada

Ponta a roçar o solo,

A brancura embainhada

De um lenço... Deu-lho a criada

Velha que o trouxe ao colo.

 

Lá longe, em casa, há a prece:

«Que volte cedo, e bem!»

(Malhas que o Império tece!)

Jaz morto, e apodrece,

O menino da sua mãe.

 

 

Fernando Pessoa

terça-feira, novembro 30, 2021

O menino da sua Mãe...

 

O MENINO DA SUA MÃE

 

No plaino abandonado

Que a morna brisa aquece,

De balas traspassado

— Duas, de lado a lado —,

Jaz morto, e arrefece.

 

Raia-lhe a farda o sangue.

De braços estendidos,

Alvo, louro, exangue,

Fita com olhar langue

E cego os céus perdidos.

 

Tão jovem! que jovem era!

(Agora que idade tem?)

Filho único, a mãe lhe dera

Um nome e o mantivera:

«O menino da sua mãe».

 

Caiu-lhe da algibeira

A cigarreira breve.

Dera-lha a mãe. Está inteira

E boa a cigarreira.

Ele é que já não serve.

 

De outra algibeira, alada

Ponta a roçar o solo,

A brancura embainhada

De um lenço... Deu-lho a criada

Velha que o trouxe ao colo.

 

Lá longe, em casa, há a prece:

«Que volte cedo, e bem!»

(Malhas que o Império tece!)

Jaz morto, e apodrece,

O menino da sua mãe.

 

Fernando Pessoa