Na sequência de um abaixo-assinado inicial (por nós aqui publicado - VER AQUI) e subscrito por 95 docentes do Agrupamento, foi feita uma Reunião Geral de Professores, na qual foi aprovada a seguinte Moção (que foi assinada por 99 docentes):
Estes dois documentos foram analisados pelo nosso Conselho Pedagógico, que decidiu por unanimidade unir a sua voz às dos restantes colegas e que tomou a seguinte posição:
Decidiram ainda acompanhar e justificar a sua decisão com o seguinte documento:
Somos apenas mais uma Escola que mostra a quem manda o que pensa sobre este assunto, mas enquanto houver democracia nas Escolas portuguesas, conforme está escrito na Constituição, há que contar com a voz honesta, livre e crítica dos docentes do Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus, instituição à qual me orgulho de pertencer!
MOÇÃO
Os docentes do Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus, em Leiria, reunidos em plenário no dia 4 de Novembro, decidiram unanimemente solicitar aos Órgãos competentes do Agrupamento a SUSPENSÃO IMEDIATA DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO DOS DOCENTES. Esta moção tem como ponto de partida o abaixo-assinado, cujo texto segue em anexo, e que foi subscrito por 95 docentes desta escola.
Também se destacam os seguintes pontos:
1. Este processo de avaliação acarreta muitas injustiças e não permite o normal decorrer das actividades lectivas, sendo demasiado burocrático e contendo normas que vão contra o Código de Procedimento Administrativo, a Constituição e a LBSE.
2. As RECOMENDAÇÕES do Conselho Científico para a Avaliação de Professores deverão ser tidas em conta nas fichas de Escola, aquando da sua aplicação, sublinhando-se, entre outros, o facto de a Avaliação docente depender do sucesso dos alunos.
3. Antes de se dar início ao processo de avaliação deverão ser APROVADOS o Projecto Educativo e Plano Anual de Actividades que terão de ser devidamente divulgados.
4. Os órgãos competentes SÓ DEVEM INICIAR o processo de avaliação quando estes aspectos (pontos 1, 2 e 3), forem legalmente enquadrados e clarificados.
5. O processo de avaliação deverá iniciar-se, por uma questão de justiça, em SIMULTÂNEO para todos os docentes.
6. O Agrupamento deverá saber honrar com a sua presença a lista das Escolas cuja voz se realça nas lutas dos Docentes por uma avaliação honesta, exequível, justa, simplificada, desburocratizada e útil.
Estes dois documentos foram analisados pelo nosso Conselho Pedagógico, que decidiu por unanimidade unir a sua voz às dos restantes colegas e que tomou a seguinte posição:
Tomada de Posição do Conselho Pedagógico em reunião ordinária de 19/11/08
Foi entregue ao Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus um pedido de análise do texto da Moção apresentada pelos docentes deste Agrupamento de Escolas, solicitando a suspensão do modelo de Avaliação de Desempenho Docente.
Os membros do Conselho Pedagógico analisaram o texto da Moção, considerando que as razões evocadas, entre as quais a interferência no normal funcionamento e qualidade do desempenho dos docentes, com consequências nefastas no processo de ensino-aprendizagem são justificadas e decidiram juntar a sua voz aos docentes que apresentaram e subscreveram a Moção, solicitando à Comissão Executiva que dê seguimento ao pedido de suspensão do actual modelo de Avaliação de Desempenho Docente.Os Docentes do Conselho Pedagógico
Decidiram ainda acompanhar e justificar a sua decisão com o seguinte documento:
Justificação da contestação ao actual
Modelo de Avaliação do Desempenho Docente
Face à instabilidade instalada no seio do sistema educativo do nosso país, às questões apresentadas no abaixo-assinado e na Moção, destacam-se as seguintes conclusões:
1.ª Este sistema de avaliação contende com uma lógica de exigência e rigor, promovendo o facilitismo, comprometendo uma escola pública de qualidade. Como fundamento, sublinha-se o facto de para a avaliação dos docentes se contabilizar «a melhoria dos resultados escolares dos alunos» (ponto 2, alínea a), do artigo 9.º do referido DR n.º 2/2008), nomeadamente (Despacho n.º 16872/2008, de 23 de Junho, anexo IV, parâmetro 7),
a) o progresso dos resultados escolares dos seus alunos no ano /disciplina, relativamente aos resultados atingidos no ano lectivo anterior;
b) a evolução dos resultados escolares dos seus alunos relativamente à evolução média;
- dos resultados dos alunos daquele ano de escolaridade ou daquela disciplina naquele agrupamento de escolas ou escola não agrupada;
- dos mesmos alunos no conjunto das outras disciplinas da turma no caso de alunos do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário;
c) as classificações nas provas de avaliação externa e respectiva diferença relativamente às classificações internas.
Assim, este parâmetro configura um conflito de interesses e uma situação de incompatibilidade não permitida pela lei. Efectivamente, o professor passa a ter um interesse directo nos resultados obtidos pelos seus alunos, já que eles o podem prejudicar ao longo da sua carreira. Pergunta-se se este interesse não pode ser suficiente para se considerar que, ao abrigo do artigo 44.º do Código do Procedimento Administrativo, o professor passe a estar, pelo conflito de interesses evidente, numa situação de impedimento, chocantemente criada pelo legislador.
Não se questiona que seja avaliado o processo utilizado pelo professor, por exemplo, poderá ser observado (e objecto de avaliação) como é que o professor ensina, o que é que o professor fez perante uma turma com determinados problemas de aprendizagem ou determinado insucesso. Mas deverá ser o processo a ser avaliado, e nunca o resultado que o aluno obtém, pois na construção desse resultado intervêm muitos factores, nomeadamente o próprio aluno (com determinadas capacidades cognitivas, interesse, capacidade de trabalho, situação pessoal, familiar e social, etc.). A pressão que tem sido feita nas escolas para que indiquem como objectivo, no Projecto Educativo, que os seus alunos melhorem uma determinada percentagem em relação a resultados anteriores ou obtenham determinados resultados quantificados (segundo o disposto na alínea b) do ponto 1 do artigo 8.º do referido DR 2/2008), sendo depois avaliadas se esse objectivo foi ou não atingido, é perfeitamente incompatível com o que é minimamente justo: ser-se avaliado por aquilo que se fez, e não pelo que os outros fizeram. O professor deve ser avaliado pela forma como ensinou e educou; os alunos, pelos resultados que obtiveram.
2.ª O facto de os professores serem avaliados tendo por referência «a redução do abandono escolar» (ponto 2, alínea b), do artigo 9.º do DR n.º 2/2008).
Tendo em conta o acima exposto, também se questiona que a redução do abandono escolar seja um parâmetro a avaliar no desempenho de um professor.
Poderão considerar-se as medidas desenvolvidas pelo professor, as suas intervenções, mas não a atitude que o aluno tomou, por vezes por desinteresse por currículos e programas (a que o professor é alheio), mas, sobretudo por uma opção que depende essencialmente do aluno, dos pais e, muitas vezes, dos contextos familiares e sociais.
3.ª A avaliação dos professores titulares ser feita pelos seus pares (artigo 12.º do DR n.º 2/2008).
Considerou-se que uma coisa é fazer-se uma reflexão conjunta sobre práticas de ensino, uma avaliação de tipo formativo de um trabalho conjunto em que os intervenientes participaram como pares e em que, em igualdade de circunstâncias, A aprecia o trabalho de B, e B aprecia o trabalho de A, no sentido de que essa reflexão conjunta traga melhoria ao desempenho de ambos; outra, muito diferente, e discutível – não se conhece investigação e literatura da especialidade que a sustente –, é a de uma pessoa que não é hierarquicamente superior a outra proceder à sua classificação.
Em nenhum sistema de avaliação em Portugal (em empresas, hospitais, universidades, ministérios, administração pública, por exemplo) ou noutros países, um chefe de serviços avalia e classifica outro, ou um professor catedrático avalia e classifica outro, ou um funcionário avalia e classifica outro que desempenhe as mesmas funções.
Aliás, toda esta concepção de professores a avaliar professores (que desempenham as mesmas funções) e a interferir na sua progressão na carreira – exposta nestas razões 3.ª, 4.ª e 5.ª –, na prática, parece-nos configurar um dos casos de impedimento legalmente consignado: o especificado no artigo 44.º, alíneas a) e b) do Código de Procedimento Administrativo (e ainda no 48.º do mesmo diploma), que determina que «nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo ou acto ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública» «quando nele tenha interesse». E refira-se que a melhor doutrina considera não se ter de ir ao ponto de exigir um interesse directo, bastando, para o preenchimento do requisito, que haja um interesse instrumental ou moral.
4.ª A existência de quotas («percentagens máximas» de atribuição de Excelentes e de Muito Bons) diferentes de escola para escola.
A fixação de «percentagens máximas» estipuladas diferentemente, tendo «obrigatoriamente por referência os resultados obtidos na avaliação externa» concita dúvidas, mormente no que tange à sua compatibilidade com os princípios que fundamentam o sistema.
Como ponto prévio, deverá dizer-se que os termos e resultados dessa avaliação externa têm merecido o exercício do contraditório por parte de um grande número de escolas, ou seja, as escolas muitas vezes não se revêem na apreciação efectuada pela Inspecção-Geral de Ensino (não esqueçamos que essa avaliação decorre de uma observação de apenas dois dias em cada escola). Basta, aliás, pensar que, ao quadro referencial desta avaliação externa faltam descritores dos níveis de classificação, o que permite discricionariedade na classificação atribuída e, consequentemente, a instauração ab initio de uma situação de mal-estar latente entre a escola e a IGE, entre a Escola e a tutela, dado aquela se sentir duplamente injustiçada: na avaliação externa e nas consequências dessa avaliação.
Passando às consequências, uma escola classificada com Muito Bom terá «direito» a uma quota maior de Excelentes e de Muito Bons para os seus professores, diferentemente de uma escola com pior classificação. Tal acontece independentemente do esforço, do empenho, da qualidade de um ou de alguns dos professores que aí exerçam funções. Assim, a possibilidade da obtenção de uma classificação por parte do professor fica dependente da escola em que tenha sido colocado, e não do seu próprio mérito. E tal terá interferência na possibilidade de uma melhor remuneração, ou seja, professores de escolas diferentes têm oportunidades de remuneração diferentes, apesar de a tutela ser a mesma.
Assim, poderá considerar-se que esta disposição fere o disposto no artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, pois, ao estabelecerem-se quotas diferentes de escola para escola, a mesma «qualidade» pode estar a ter oportunidades diferentes de ser reconhecida oficialmente, criando-se, assim a discriminação que fere o artigo invocado.
Ou seja, a prévia condicionalidade determinada pela fixação de quotas diferenciadas para as várias escolas impede que o resultado salarial seja determinado, exclusivamente, pela qualidade do exercício responsável da profissão.
5.ª A distribuição de quotas por «universos de docentes».
Esta disposição tem consequências nocivas previsíveis de imediato: por um lado, constituirá mais um factor de criação de um clima de mal-estar nas escolas, de rivalidade, de conflitualidade; por outro, criará situações de injustiça e, cremos, de afronta à legalidade, nomeadamente no que respeita aos elementos que fazem parte da Comissão de Coordenação da Avaliação de Desempenho que não são coordenadores de departamento curricular.
Passando às consequências relativamente ao ambiente de trabalho nas escolas, é preciso referir que as escolas têm até agora desenvolvido um ambiente de cooperação entre todos os docentes, não só por força do conteúdo dos normativos cessantes como pela natureza do trabalho a desenvolver – por exemplo, o Projecto Educativo de Escola, o Plano Anual de Actividades, a coordenação e a articulação nos departamentos curriculares e nos grupos disciplinares, a avaliação dos Conselhos de Turma, o trabalho em equipa na constituição de turmas, na organização do serviço de exames, no Conselho Pedagógico, na elaboração de horários, etc. –, mas que, agora, essas relações de colegialidade e de trabalho de equipa ficam feridas por força da inevitável arbitrariedade decorrente do respeito pelas percentagens atribuíveis a cada «universo de docentes». É que os professores, independentemente do «universo» em que se inserem, trabalham todos em conjunto em muitas das actividades da escola. Ora, se um «universo de docentes», porque mais numeroso, tem direito a um maior número de Excelentes ou de Muito Bons, isto poderá fazer com que num outro «universo» de menor dimensão não seja atribuída a mesma menção a um docente com um trabalho tão bom ou mesmo superior ao do colega, o que vai criar uma relação de mal-estar entre os profissionais.
6.ª A complexidade e burocratização do processo, com reflexos negativos para a vida nas escolas, para os professores e, naturalmente, para o ensino.
Este processo de avaliação exige, numa escola média, mais de um milhar de horas de trabalho extra, mobiliza uma diversidade enorme de intervenientes, a concepção de um grande número de documentos e sua aplicação, o bulício da observação simultânea de aulas de todos os professores (até se prevê que os professores avaliadores possam faltar às próprias aulas para poderem observar e avaliar as dos colegas, no caso de haver incompatibilidade de horários…), traduzindo-se num trabalho acrescido para os professores, um enorme trabalho, sem um resultado prático visível de eficácia ou qualidade.
7.ª A heterogeneidade de procedimentos na avaliação de escola para a escola.
Ao prever-se, no diploma, que os "instrumentos de registo normalizados de toda a informação relevante para efeitos da avaliação do desempenho" sejam "elaborados e aprovados pelo Conselho Pedagógico de cada escola" (artigo 6.º, pontos 1 e 2 do DR n.º 2/2008), está a abrir-se a porta para a desigualdade de avaliação dos professores de escola para escola. Ou seja, está a abrir-se a porta para a injustiça.
Em suma, este modelo de avaliação é, essencialmente, sentido pelos professores como propiciador de injustiças, de desigualdades e da deterioração do ambiente de trabalho, não contribuindo para a desejada melhoria do sistema de ensino.
Face ao exposto, decidimos requerer a suspensão do actual processo de avaliação e exigir um modelo de avaliação justo, exequível e transparente, respeitando os normativos constitucionais em vigor, e capaz de contribuir de forma decisiva para a qualidade do Ensino e da dignidade da Escola Pública.Os Professores do Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus
Sem comentários:
Enviar um comentário