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quinta-feira, dezembro 09, 2021

José Rodrigues Miguéis nasceu há cento e vinte anos...!

    
José Claudino Rodrigues Miguéis
(Lisboa, 9 de dezembro de 1901 - Nova Iorque, 27 de outubro de 1980) foi um escritor português.
Nascido no número 13 da Rua da Saudade, no bairro típico de Alfama, passou a sua infância e juventude em Lisboa, recordações que marcarão a sua futura obra. Ainda em Lisboa viria a formar-se em Direito em 1924. Todavia, nunca exerceria de forma sistemática profissão nesta área, tendo consagrado a sua vida à Literatura e à Pedagogia. Neste último campo viria a licenciar-se em 1933 em Ciências Pedagógicas na Universidade de Bruxelas, tendo posteriormente dirigido, com Raul Brandão, um conjunto inacabado de Leituras Primárias, obra que nunca viria a ser aprovada pelo governo.
Herdando do pai, um imigrante galego, as ideias republicanas e progressistas, cedo entrou em conflito com o Estado Novo, o que acabaria por o levar ao exílio para os Estados Unidos da América a partir de 1935. Desde essa altura até à sua morte apenas voltaria pontualmente a Portugal, não passando no seu país natal períodos superiores a dois anos. Em 1942 viria a adquirir a nacionalidade americana. Um ano antes do seu falecimento foi agraciado com a Ordem Militar de Santiago da Espada, no Grau de Grande Oficial. Mário Neves publicou uma biografia sua em 1990.
José Rodrigues Miguéis pertenceu ao chamado grupo Seara Nova, ao lado de grandes autores como Jaime Cortesão, António Sérgio, José Gomes Ferreira, Irene Lisboa ou Raul Proença. Colaborou em diversos jornais como O Diabo, Diário Popular, Diário de Lisboa e República. Foi, juntamente com Bento de Jesus Caraça, director de O Globo, semanário que viria a ser proibido pela censura em 1933. Nos Estados Unidos viria a trabalhar como tradutor e redator das Seleções do Reader's Digest. Segundo os linguistas Óscar Lopes e António José Saraiva, a sua obra pode ser considerada como realismo ético, sendo claras as influências de autores como Dostoiévsky ou o seu amigo Raul Brandão. De resto, parecem claras nas suas primeiras obras as influências estéticas da Presença, podendo ler-se nas entrelinhas das suas obras simpatias com as temáticas neo-realistas portuguesas (há mesmo quem afirme que José Rodrigues Migueis tenha aderido ao partido comunista). Tem obras traduzidas em inglês, italiano, alemão, russo, checo, francês e polaco.
Em 1961 foi eleito membro da Hispanic Society of América e, em 1976, tornou-se membro da Academia das Ciências de Lisboa. Em 1979 foi agraciado com a Ordem Militar de Santiago da Espada, com o grau de Grande Oficial.
  

segunda-feira, novembro 29, 2021

O escritor neo-realista Alves Redol morreu há 52 anos

(imagem daqui)
   
António Alves Redol (Vila Franca de Xira, 29 de dezembro de 1911Lisboa, 29 de novembro de 1969), foi um escritor, considerado como um dos expoentes máximos do neo-realismo português.

Redol tem sua origem nos espaços rurais (infância marcada pela pobreza, já que seu pai era um comerciante de pequeno porte). Em função disso, começou desde cedo a trabalhar. Presencia, desde essa altura, as péssimas condições de vida do homem rural, o que, mais tarde, vai se refletir, preponderantemente, em sua escrita.
Inicialmente, almejava ser médico, mas, por influência do seu avô, bem como do contacto e da admiração pelos jornalistas e escritores, passa a aspirar ao ingresso no âmbito da escrita. Inicia-se nessa esfera aos 12 anos. Quando completa 14 anos, inicia a sua colaboração na redação de textos para semanários e jornais. Trabalha, inicialmente, como vendedor de mercearias.
Quando completa 16 anos, em 1928, vai para África (Angola e Luanda), onde exerce, primeiramente, a função de operário e, após isso, trabalha numa fazenda, objetivando conseguir novas/melhores perspectivas de progresso futuro. Contudo, depara, nessa região, com uma intensa situação de miséria e pobreza.
Quando regressa a Portugal, passa a trabalhar como vendedor de camiões, carros, pneus e óleos. Também lecionou Língua Portuguesa. Adere aos ideais do Partido Comunista Português e do Movimento de Unidade Democrática, contrapondo-se, veemente, à conjuntura política da época, trazendo à tona diversas questões “esquecidas”.
Em virtude de sua convivência com as péssimas condições de vida das camadas rurais e de vivenciar duplamente essas condições (na infância e na juventude), volta seu olhar para a dimensão social, mais especificamente, para as questões de reivindicação de mudança social. A essa altura, reafirma a sua vocação para a escrita. Cria a Secção “De sol a sol”, no jornal O Diabo, em que passa a publicar textos voltados para as tensões sociais, contrapondo-se, assim, aos ideais de exploração dos regimes totalitários.
Tendo como pano de fundo esse contexto, surge o Neorrealismo, uma literatura de cunho político, que se opõe, veemente, à opressão dos regimes totalitários. Eclode, assim, um novo conceito de arte em uma perspectiva de conscientização, acompanhada de novo papel social para o artista enquanto defensor da sociedade que busca melhorias a partir da ampliação da visão de mundo.
Em vista disso, Redol sofre repressão da ditadura militar (perseguição política), chegando até a ser preso e torturado. Ao lançar mão dessa postura de preocupação social, ele toma como base alguns ideais do marxismo e do socialismo, empregando-os em sua escrita os pressupostos de autores revolucionários clássicos tais como: Marx, Engels, Lenine, Lefebvre, Bukiharini e Friedman E, à luz desses escritores adeptos do Marxismo e do Socialismo, Redol passa a abordar as condições de vida dos trabalhadores que viviam à margem da sociedade por conta de uma exploração desumana. Para tanto, ele retrata os diversos profissionais rurais e urbanos (destacando seus inúmeros grupos), suas práticas corriqueiras do dia a dia e, sobretudo, suas péssimas condições de vida em decorrência do capitalismo.
Inúmeros aspectos expostos na obra de Redol refletirem suas vivências particulares. Partindo desse pressuposto, ele não só apresentava as mazelas a que era submetido esse povo, mas, sobretudo, evidenciava sua natureza. Com isso, as personagens do romancista, em geral, são apresentadas, de forma que suas individualidades sejam expostas. Contudo, refletem um todo na mesma condição. Isso, de certa forma, evidencia uma dicotomia (individual vs. coletivo). Em alguns casos, ele até estabelece comparações entre o animal e o homem, em vista das péssimas condições de vida deste último. Porém, ao apresentar essa faceta, lança mão de uma crítica e de um discurso velado, em função da repressão política. Isto é, pelo fato de a literatura estar silenciada por conta da opressão, ele adequa sua linguagem, escrevendo de forma não explícita. Em outras palavras, ele revela a sua preocupação social, as suas ideologias subjacentes e seu não-ditos, por intermédio de uma linguagem nem sempre objetiva e direta. Destaca-se, ainda, o facto de tal autor trabalhar em constante renovação do seu estilo de escrita.
A obra de Redol é amparada por uma perspectiva social, primando pela abordagem de aspectos sócio-políticos e económicos, focalizando, em especial, personagens que refletem a diversidade dos grupos da sociedade portuguesa (rural e urbana). Apesar de suas obras serem pautadas de uma perspectiva de junção de fatores, elegendo como objeto de estudo o romance, a dramaturgia, obras voltadas para crianças e jovens, destaca-se, sobretudo, a temática da preocupação social, evidenciando a desigualdade intensa na distribuição da rendas. Daí provém sua importância enquanto escrito neorrealista. Não só por “iniciar uma nova estética literária no século XX”, mas, sobretudo, por voltar seu olhar para o sofrimento do povo [a questão da exploração a que eram submetidos as pessoas das classes baixas, condições de vida, miséria, fome, prostituição etc..].

sexta-feira, outubro 15, 2021

Manuel da Fonseca nasceu há cento e dez anos!

(imagem daqui)
  
Manuel Lopes Fonseca, mais conhecido como Manuel da Fonseca (Santiago do Cacém, 15 de outubro de 1911 - Lisboa, 11 de março de 1993) foi um escritor (poeta, contista, romancista e cronista) português.

Biografia
Após ter terminado o ensino básico, Manuel da Fonseca prosseguiu os seus estudos em Lisboa. Estudou no Colégio Vasco da Gama, Liceu Camões, Escola Lusitânia e Escola de Belas-Artes. Apesar de não ter sobressaído na área das Belas-Artes, deixou alguns registos do seu traço, sobretudo nos retratos que fazia de alguns dos seus companheiros de tertúlias lisboetas como é o caso do de José Cardoso Pires. Durante os períodos de interregno escolar, aproveitava para regressar ao seu Alentejo de origem. Daí que o espaço de eleição dos seus primeiros textos seja o Alentejo. Só mais tarde e a partir de Um Anjo no Trapézio é que o espaço das suas obras passa a ser a cidade de Lisboa.
Membro do Partido Comunista Português (PCP), Manuel da Fonseca fez parte do grupo do Novo Cancioneiro e é considerado por muitos como um dos melhores escritores do neo-realismo português. Nas suas obras, carregadas de intervenção social e política, relata como poucos a vida dura do Alentejo e dos alentejanos.
A sua vida profissional foi muito díspar tendo exercido nos mais diferentes sectores: comércio, indústria, revistas, agências publicitárias, entre outras.
Era membro da Sociedade Portuguesa de Escritores quando esta atribuiu o Grande Prémio da Novelística a José Luandino Vieira pela sua obra Luuanda, o que levou ao encerramento desta instituição e à detenção de alguns dos seus membros na prisão de Caxias, entre os quais Manuel da Fonseca.
Em sua homenagem, a Escola Secundária de Santiago do Cacém denomina-se Escola Secundária Manuel da Fonseca e cada uma das bibliotecas municipais de Castro Verde e Santiago do Cacém se chama Biblioteca Municipal Manuel da Fonseca.
  

 

Estradas

Não era noite nem dia.
Eram campos campos campos
abertos num sonho quieto.
Eram cabeços redondos
de estevas adormecidas.
E barrancos entre encostas
cheias de azul e silêncio.
Silêncio que se derrama
pela terra escalavrada
e chega no horizonte
suando nuvens de sangue.
Era hora do poente.
Quase noite e quase dia.

E nos campos campos campos
abertos num sonho quieto
sequer os passos de Nena
na branca estrada se ouviam.
Passavam árvores serenas,
nem as ramagens mexiam,
e Nena, pra lá do morro,
na curva desaparecia.

Já de noite que avançava
os longes escureciam.
Já estranhos rumores de folhas
entre as esteveiras andavam,
quando, saindo um atalho,
veio à estrada um vulto esguio.
Tremeram os seios de Nena
sob o corpete justinho.
E uma oliveira amarela
debruçou-se da encosta
com os cabelos caídos!
Não era ladrão de estradas,
nem caminheiro pedinte,
nem nenhum maltês errante.
Era António Valmorim
que estava na sua frente.

— Ó nena de Montes Velhos,
se te quisessem matar
quem te haverá de acudir?

Sob este corpete justinho
uniram-se os seios de Nena.

— Vai te António Valmorim.
Não tenho medo da morte,
só tenho medo de ti.

Mas já noite fechava
a saída dos caminhos.
Já do corpete bordado
os seios de Nena saíam
— como duas flores abertas
por escuras mãos amparadas!
Aí que perfume se eleva
do campo de rosmaninho!
Aí como a boca de Nena
se entreabre fria fria!
Caiu-lhe da mão o saco
junto ao atalho das silvas
e sobre a sua cabeça
o céu de estrelas se abriu!

Ao longe subiu a lua
como um sol inda menino
passeando na charneca…
Caminhos iluminados
eram fios correndo cerros.
Era um grito agudo e alto
que uma estrela cintilou.
Eram cabeços redondos
de estevas surpreendidas.
Eram campos campos campos
abertos de espanto e sonho…

terça-feira, agosto 10, 2021

Carlos de Oliveira nasceu há um século!

(imagem daqui)
   

Carlos de Oliveira (Belém do Pará, 10 de agosto de 1921 - Lisboa, 1 de julho de 1981) foi um escritor português.
Nascido no Brasil, filho de imigrantes portugueses, veio aos dois anos para Portugal. A família fixa-se em Cantanhede, mais precisamente na vila de Febres, onde o pai exercia medicina. Em 1933 muda-se para Coimbra, onde permanece durante quinze anos, a fim de prosseguir os estudos. Em 1941 ingressa na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, onde estabelece amizade com Joaquim Namorado, João Cochofel e Fernando Namora. Em 1947 licencia-se em Ciências Histórico-Filosóficas, instalando-se definitivamente em Lisboa, no ano seguinte. Periodicamente volta a Coimbra e à Gândara. Em 1949 casa-se com Ângela, jovem madeirense que conhecera nos bancos da Faculdade, sua companheira e futura colaboradora permanente.
Data de 1942 o seu primeiro livro de poemas, intitulado "Turismo", com ilustrações de Fernando Namora e integrado na colecção poética de 10 volumes do "Novo Cancioneiro", iniciativa colectiva que, em Coimbra, assinalava o advento do movimento neo-realista. Porém, em 1937, já publicara em conjunto com Fernando Namora e Artur Varela, amigos de juventude, um pequeno livro de contos "Cabeças de Barro". Em 1943 publica o seu primeiro romance, "Casa na Duna", segundo volume da colecção dos Novos Prosadores (1943), editado pela Coimbra Editora. No ano de1944 surge o romance "Alcateia", que viria a ser apreendido pelo regime. No entanto é desse mesmo ano a segunda edição de "Casa na Duna".
Em 1945 publica um novo livro de poesias, "Mãe Pobre". Os anos seguintes serão, para Carlos de Oliveira, bem profícuos quanto à integração e afirmação no grupo que veicula e auspera por um novo humanismo, com a participação nas revistas Seara Nova e Vértice, além da colaboração no livro de Fernando Lopes Graça "Marchas, Danças e Canções", uma antologia de vários poetas, musicadas pelo maestro.
Em 1953 publica "Uma Abelha na Chuva", o seu quarto romance e, unanimemente reconhecido, uma das mais importantes obras da literatura portuguesa do século XX, tendo sido integrado no programa da disciplina de português no ensino secundário.
Em 1957 organiza, com José Gomes Ferreira, os Contos Tradicionais Portugueses, alguns deles posteriormente adaptados ao cinema por João César Monteiro.
Em 1968 publica dois novos livros de poesia, "Sobre o Lado Esquerdo" e "Micropaisagem", e colabora com Fernando Lopes na adaptação de "Uma Abelha na Chuva". Em 1971 sai "O Aprendiz de Feiticeiro", colectânea de crónicas e artigos, e "Entre Duas Memórias", livro de poemas, que lhe vale o Prémio da Casa da Imprensa.
Em 1976 reúne toda a sua poesia em dois volumes, sob o título de "Trabalho Poético", juntando aos seus poemas anteriores, os inéditos reunidos em "Pastoral", publicado autonomamente no ano seguinte.
O seu último romance, "Finisterra", sai em 1978, tendo como fundo a paisagem gandaresa. A obra proporciona-lhe o Prémio Cidade de Lisboa, no ano seguinte.
Morre na sua casa em Lisboa, com 60 anos incompletos.
   

  

Acusam-me de Mágoa e Desalento

Acusam-me de mágoa e desalento,
como se toda a pena dos meus versos
não fosse carne vossa, homens dispersos,
e a minha dor a tua, pensamento.

Hei-de cantar-vos a beleza um dia,
quando a luz que não nego abrir o escuro
da noite que nos cerca como um muro,
e chegares a teus reinos, alegria.

Entretanto, deixai que me não cale:
até que o muro fenda, a treva estale,
seja a tristeza o vinho da vingança.

A minha voz de morte é a voz da luta:
se quem confia a própria dor perscruta,
maior glória tem em ter esperança.

 

in Mãe Pobre - Carlos de Oliveira

sábado, agosto 07, 2021

Políbio Gomes dos Santos nasceu há cento e dez anos

(imagem daqui)
     
Políbio Gomes dos Santos (Ansião, 7 de agosto de 1911 - Ansião, 3 de agosto de 1939, foi um poeta português.
Políbio, frequentou o Instituto Militar dos Pupilos do Exército em Lisboa e terminou os seus estudos liceais em Coimbra, tendo aí ingressado na Faculdade de Letras.
Devido a ter adoecido, em setembro de 1938, com tuberculose, esteve internado no Sanatório da Guarda.
Foi um dos colaboradores dos Cadernos da Juventude, da Presença, do Sol Nascente e do O Diabo, assim como fez parte do grupo Novo Cancioneiro, de tendência neo-realista.
Actualmente, existe o Prémio Literário Políbio Gomes dos Santos, em homenagem ao poeta.
  
   
Poema da Voz que Escuta

Chamam-me lá em baixo.
São as coisas que não puderam decorar-me:
As que ficaram a mirar-me longamente
E não acreditaram;
As que sem coração, no relâmpago do grito,
Não puderam colher-me.
Chamam-me lá em baixo,
Quase ao nível do mar, quase à beira do mar,
Onde a multidão formiga
Sem saber nadar.
Chamam-me lá em baixo
Onde tudo é vigoroso e opaco pelo dia adiante
E transparente e desgraçado e vil
Quando a noite vem, criança distraída,
Que debilmente apaga os traços brancos
Deste quadro negro - a Vida.
Chamam-me lá em baixo:
Voz de coisas, voz de luta.
É uma voz que estala e mansamente cala
E me escuta.
 

 

in Voz que Escuta (1939) - Políbio Gomes dos Santos

terça-feira, agosto 03, 2021

O poeta Políbio Gomes dos Santos morreu há 82 anos

(imagem daqui)
      
Políbio Gomes dos Santos (Ansião, 7 de agosto de 1911 - Ansião, 3 de agosto de 1939, foi um poeta português.
Políbio, frequentou o Instituto Militar dos Pupilos do Exército em Lisboa e terminou os seus estudos liceais em Coimbra, tendo aí ingressado na Faculdade de Letras e Direito.
Devido a ter adoecido, em setembro de 1938, com tuberculose, esteve internado no Sanatório da Guarda.
Foi um dos colaboradores dos Cadernos da Juventude, da Presença, do Sol Nascente e do O Diabo, assim como fez parte do grupo Novo Cancioneiro de tendência neo-realista.
Actualmente ainda existe o prémio literário Políbio Gomes dos Santos, em homenagem ao poeta.
     

Testamento Aberto

Só para ver curar minhas pernas partidas
Nas dores eternas
Dos saltos gorados,
Eu amo a aparente inconsciência dos loucos,
Embora fique aos poucos nos meus saltos
Desabridos e falhados.

Apraz-me, no espelho, esta face esmagada,
À força de querer transpor o além
Da minha porta fechada...

Porém,
Seja o que for, que seja,
Se uma CERTEZA alcanço
E uma mulher me beija.

Que importa
Que eu fique molemente olhando a minha porta
Aberta,
Ou que eu parta e a morte me espreite
Num desfiladeiro?...
E quem virá chorar e quem virá,
Se a morte que vier for a de lá
Certeira e minha...
E merecida como um sono que se dorme
Após a noite perdida?...

E que piedade anda a escrever um frágil,
Na embalagem dos ossos
Que trago emprestados...
Que deixarei ficar ao sol e à chuva
E que serão limados
No entulho dos calhaus que também foram rocha?...

Para quê, se mil vezes provoco
Os tombos do chegar e do partir?!
- A minha fragilidade
Foi-me dada
Para me servir.

 

in As Três Pessoas (1938) - Políbio Gomes dos Santos

Poema alusivo à data...

(imagem daqui)

À Memória de Políbio Gomes dos Santos

O poeta que morreu entrou agora,
Não se sabe bem onde, mas entrou,
Todo coberto de demora,
No bocado de noite em que ficou.

As ervas lhe desenham
Seu espaço devido:
Depressa, venham
Lê-lo no chão os que o não tenham lido.

Que o sorriso que o veste
Já galga como um potro
As coisas tenebrosas,
E esquecido – só outro:
Este
Nem precisa de rosas.


in Eu, Comovido a Oeste (1940) - Vitorino Nemésio

sábado, julho 17, 2021

O poeta João José Cochofel nasceu há 102 anos


João José de Melo Cochofel Aires de Campos (Coimbra, 17 de julho de 1919 – Lisboa, 14 de março de 1982), foi um poeta, ensaísta e crítico literário e musical português

 

in Wikipédia

 

Não Desafies

 

Não desafies
a alegria.

Quando ela chegue
um instante só
não lhe perguntes
porquê?

Estende as mãos ávidas
para o calor
da cinza fria. 



João José Cochofel

quinta-feira, junho 03, 2021

Roberto Rossellini morreu há 44 anos


Roberto Rossellini
(Roma, 8 de maio de 1906 - Roma, 3 de junho de 1977) foi um diretor de cinema italiano. Foi um dos mais importantes cineastas do neo-realismo italiano, com contribuições ao movimento, com filmes como Roma, città aperta (Roma, Cidade Aberta) e outros.
  
Vida
Nascido numa família rica, Rossellini interessou-se pelo cinema por influência do avô, proprietário de uma casa de espetáculos, e fez algumas curtas-metragens. Foi durante o fascismo que iniciou uma carreira profissional como assistente de direção. Trabalhou depois como supervisor de filmes, como L'Invasore, de Nino Giannini, e Benito Mussolini, de Pasquale Prunas.
Fez-se notar no fim da Segunda Guerra Mundial com três obras-primas: Roma, città aperta (1945, Prémio de Melhor Filme do Festival de Cinema de Cannes), Paisà (1946) e Germania anno zero (1947), tornando-se um dos expoentes do neo-realismo do cinema italiano.
Teve um tumultuoso romance com a atriz Anna Magnani, de quem se separou para casar com a também atriz premiada Ingrid Bergman (de quem teve três filhos, incluindo a atriz Isabella Rossellini).
Em 1963, Rossellini escreveu o guião de Les Carabiniers, de Jean-Luc Godard. Os seus últimos trabalhos datam da década de 60, quando fez filmes educativos para televisão. Faleceu em 1977, aos 71 anos, com um ataque cardíaco. Foi sepultado no Cimitero Monumentale Comunale Campo Verano, Roma na Itália.

sábado, maio 08, 2021

Roberto Rossellini nasceu há 115 anos

 
Roberto Rossellini (Roma, 8 de maio de 1906 - Roma, 3 de junho de 1977) foi um diretor de cinema italiano, um dos mais importantes cineastas do neo-realismo italiano, com contribuições ao movimento, com filmes como Roma, città aperta (Roma, Cidade Aberta) e outros.
  
Vida
Nascido numa família rica, Rossellini interessou-se pelo cinema por influência do avô, proprietário de uma casa de espetáculos, e fez algumas curtas-metragens. Foi durante o fascismo que iniciou uma carreira profissional como assistente de direção. Trabalhou depois como supervisor de filmes, como L'Invasore, de Nino Giannini, e Benito Mussolini, de Pasquale Prunas.
Fez-se notar no fim da Segunda Guerra Mundial com três obras-primas: Roma, città aperta (1945, Prémio de Melhor Filme do Festival de Cinema de Cannes), Paisà (1946) e Germania anno zero (1947), tornando-se um dos expoentes do neo-realismo do cinema italiano.
Teve um tumultuoso romance com a atriz Anna Magnani, de quem se separou para casar com a também atriz premiada Ingrid Bergman (de quem teve três filhos, incluindo a atriz Isabella Rossellini).
Em 1963, Rossellini escreveu o guião de Les Carabiniers, de Jean-Luc Godard. Os seus últimos trabalhos datam da década de 60, quando fez filmes educativos para televisão. Faleceu em 1977, aos 71 anos, com um ataque cardíaco. Foi sepultado no Cimitero Monumentale Comunale Campo Verano, Roma na Itália.

quinta-feira, abril 15, 2021

Fernando Namora nasceu há 102 anos

 
Fernando Namora (Condeixa-a-Nova, 15 de abril de 1919 - Lisboa, 31 de janeiro de 1989) de nome completo Fernando Gonçalves Namora, médico e escritor português, autor de uma extensa obra, das mais divulgadas e traduzidas nos anos 70 e 80.
 
Licenciado em Medicina (1942) pela Universidade de Coimbra, pertenceu à geração de 40, grupo literário que reuniu personalidades marcantes como Carlos de Oliveira, Mário Dionísio, Joaquim Namorado ou João José Cochofel, moldando-o, certamente, como homem, à semelhança do exercício da profissão médica, primeiro na sua terra natal depois nas regiões da Beira Baixa e Alentejo, em locais como Tinalhas, Monsanto e Pavia, até que, em 1951, acabaria por se instalar em Lisboa - onde, curiosamente, muito jovem estudara, no Liceu Camões - como médico assistente do Instituto Português de Oncologia.
O seu volume de estreia foi Relevos (1937), livro de poesia, porventura sob a influência de Afonso Duarte e do grupo da Presença. Mas já publicara em conjunto com Carlos de Oliveira e Artur Varela, um pequeno livro de contos Cabeças de Barro. Em (1938) surge o seu primeiro romance As Sete Partidas do Mundo que viria a ser galardoado com o Prémio Almeida Garrett no mesmo ano em que recebe o Prémio Mestre António Augusto Gonçalves, de artes plásticas - na categoria de pintura. Ainda estudante e com outros companheiros de geração funda a revista Altitude e envolve-se activamente no projecto do Novo Cancioneiro (1941), colecção poética de 10 volumes que se inicia com o seu livro-poema Terra, assinalando o advento do neo-realismo, tendo esta iniciativa colectiva, nascida nas tertúlias de Coimbra, de João José Cochofel, demarcado esse ponto de viragem na literatura portuguesa. Na mesma linha estética, embora em ficção, é lançada a colecção dos Novos Prosadores (1943), pela Coimbra Editora, reunindo os romances Fogo na Noite Escura, do biografado, Casa na Duna, de Carlos de Oliveira, Onde Tudo Foi Morrendo, de Vergílio Ferreira, Nevoeiro, de Mário Braga ou O Dia Cinzento, de Mário Dionísio, entre outros.
Com uma obra literária que se desenvolve ao longo de cinco décadas é de salientar a sua precoce vocação artística, de feição naturalista e poética, tal como a importância do período de formação em Coimbra, mais as suas tertúlias e movimentos estudantis. Ao dar-se o amadurecimento estético do neo-realismo e coincidente com as vivências dos anos 50, enveredaria por novos caminhos, através de uma interpretação pessoal da narrativa, que o levaria a situar-se entre a ficção e a análise social. Os muitos textos que escreveu, nos diferentes momentos ou fases da vida literária, apresentam retratos com aspectos de picaresco, observações naturalistas e algum existencialismo. Independentemente do enquadramento, Namora foi um escritor dotado de uma profunda capacidade de análise psicológica, inseparável de uma grande sensibilidade e linguagem poética. Escreveu, para além de obras de poesia e romances, contos, memórias e impressões de viagem, com destaque para os cadernos de um escritor, que proporcionam um diálogo vivo com o leitor, a abertura a outras culturas, terras e gentes, a visão de um mundo em transformação, de uma realidade emergente, expressa em Estamos no Vento (Fevereiro de 1974).
Entre os muitos títulos que publica em prosa contam-se Fogo na Noite Escura (1943), Casa da Malta (1945), As Minas de S. Francisco (1946), (capítulo inédito publicado no nº 16 da revista Mundo literário existente entre 1946 e 1948), Retalhos da Vida de um Médico (1949 e 1963), A Noite e a Madrugada (1950), O Trigo e o Joio (1954), O Homem Disfarçado (1957), Cidade Solitária (1959), Domingo à Tarde (1961, Prémio José Lins do Rego), Os Clandestinos (1972), Resposta a Matilde (1980) e O Rio Triste (1982, Prémio Fernando Chinaglia, Prémio Fialho de Almeida e Prémio D. Dinis). Ou, as biografias romanceadas de Deuses e Demónios da Medicina (1952). Além dos títulos já referidos, publicou em poesia Mar de Sargaços (1940), Marketing (1969) e Nome para uma Casa (1984) . Toda a sua produção poética seminal foi reunida numa antologia(1959) denominada As Frias Madrugadas. Escreveu ainda sobre o mundo e a sociedade em geral, na forma de narrativas romanceadas ou de anotações de viagem e reflexões críticas, sendo disso exemplo Diálogo em Setembro (1966), Um Sino na Montanha (1968), Os Adoradores do Sol (1971), Estamos no Vento (1974), A Nave de Pedra (1975), Cavalgada Cinzenta (1977), URSS, Mal Amada, Bem Amada e Sentados na Relva, ambos de (1986). Porém, foram romances como os Retalhos da Vida de um Médico, O Trigo e o Joio, Domingo à Tarde, O Homem Disfarçado ou O Rio Triste, que vieram a ser traduzidos em diversas línguas, tendo inclusive, em 1981, sido proposto para o Prémio Nobel da Literatura, pela Academia das Ciências de Lisboa e pelo PEN Clube.
    

Profecia 

Nem me disseram ainda
para o que vim.
Se logro ou verdade,
se filho amado ou rejeitado.
Mas sei
que quando cheguei
os meus olhos viram tudo
e tontos de gula ou espanto
renegaram tudo
— e no meu sangue veias se abriram
noutro sangue...
A ele obedeço,
sempre,
a esse incitamento mudo.
Também sei
que hei-de perecer, exangue,
de excesso de desejar;
mas sinto,
sempre,
que não posso recuar.

Hei-de ir contigo
bebendo fel, sorvendo pragas,
ultrajado e temido,
abandonado aos corvos,
com o pus dos bolores
e o fogo das lavas.
Hei-de assustar os rebanhos dos montes
ser bandoleiro de estradas.
— Negro fado, feia sina,
mas não sei trocar a minha sorte!

Não venham dizer-me
com frases adocicadas
(não venham que os não oiço)
que levo caminho errado,
que tenho os caminhos cerrados
à minha febre!
Hei-de gritar,
cair, sofrer
— eu sei.
Mas não quero ter outra lei,
outro fado, outro viver.
Não importa lá chegar...
O que eu quero é ir em frente
sem loas, ópios ou afagos
dos lábios que mentem.

É esta, não é outra, a minha crença.
Raios vos partam, vós que duvidais,
raios vos partam, cegos de nascença!
 
 
in Relevos (1927) - Fernando Namora

terça-feira, abril 06, 2021

O poeta Daniel Filipe morreu há 57 anos

(imagem daqui)

 
Daniel Damásio Ascensão Filipe
(Ilha da Boavista, Cabo Verde, 11 de dezembro de 1925 - 6 de abril de 1964) foi um poeta e jornalista de Cabo Verde

 

Vida

Daniel Filipe nasceu na Ilha da Boavista, Cabo Verde, em 1925. Veio para Portugal ainda criança, onde acabaria por concluir o Curso Geral dos Liceus. Mais tarde, foi co-director dos cadernos "Notícias do Bloqueio", colaborador assíduo da revista "Távola Redonda" e do jornal Diário Ilustrado (1956-), e também realizador, na Emissora Nacional, do programa literário "Voz do Império" e revista luso-brasileira Atlântico. Combateu a ditadura salazarista, sendo perseguido e torturado pela PIDE.

Estreou-se em livro no ano de 1949 com "Missiva". A sua obra mais conhecida é porventura A invenção do Amor e Outros Poemas, publicada em 1961, após a edição de uma novela, O manuscrito na garrafa, e o Prémio Camilo Pessanha, pelo livro a Ilha e a solidão (escrito sob o pseudónimo de Raymundo Soares), no ano de 1956. Trabalhou na extinta Agência-Geral do Ultramar e na área jornalística. Grande parte da poesia de Daniel Filipe destaca-se pelo combate ideológico e pelo comprometimento social, o que lhe valeu o estigma de poeta neo-realista. Morreu novo, em 1964, mas deixou uma obra consistente marcada pelos sentimentos de solidão e exílio.

 

in Wikipédia

 

Canto e Lamentação na Cidade Ocupada: Poema 8
 
 
O que menos importa é o fato surrado
Afinal cada qual tem o seu próprio fado

Comer um vez por dia não tem importância
É até um bom preceito de elegância

Recear a prisão.....a pancada....as torturas
ora.....quem os manda meter-se em aventuras

Não chegar o dinheiro para pagar o aluguer
nem para ir ao cinema.....nem para ter mulher

Disparates....doutra forma o poder cai na rua
e....lembrem-se senhores....a revolução continua

 

 
in a invenção do amor e outros poemas, Daniel Filipe

quinta-feira, março 11, 2021

Manuel da Fonseca morreu há 28 anos

(imagem daqui)
  
Manuel Lopes Fonseca, mais conhecido como Manuel da Fonseca (Santiago do Cacém, 12 de outubro de 1911 - Lisboa, 11 de março de 1993) foi um escritor (poeta, contista, romancista e cronista) português.
  
Biografia
Após ter terminado o ensino básico, Manuel da Fonseca prosseguiu os seus estudos em Lisboa. Estudou no Colégio Vasco da Gama, Liceu Camões, Escola Lusitânia e Escola de Belas-Artes. Apesar de não ter sobressaído na área das Belas-Artes, deixou alguns registos do seu traço, sobretudo nos retratos que fazia de alguns dos seus companheiros de tertúlias lisboetas como é o caso do de José Cardoso Pires. Durante os períodos de interregno escolar, aproveitava para regressar ao seu Alentejo de origem. Daí que o espaço de eleição dos seus primeiros textos seja o Alentejo. Só mais tarde e a partir de Um Anjo no Trapézio é que o espaço das suas obras passa a ser a cidade de Lisboa.
Membro do Partido Comunista Português (PCP), Manuel da Fonseca fez parte do grupo do Novo Cancioneiro e é considerado por muitos como um dos melhores escritores do neo-realismo português. Nas suas obras, carregadas de intervenção social e política, relata como poucos a vida dura do Alentejo e dos alentejanos.
A sua vida profissional foi muito díspar tendo exercido nos mais diferentes sectores: comércio, indústria, revistas, agências publicitárias, entre outras.
Era membro da Sociedade Portuguesa de Escritores quando esta atribuiu o Grande Prémio da Novelística a José Luandino Vieira pela sua obra Luuanda, o que levou ao encerramento desta instituição e à detenção de alguns dos seus membros na prisão de Caxias, entre os quais Manuel da Fonseca.
Em sua homenagem, a Escola Secundária de Santiago do Cacém denomina-se Escola Secundária Manuel da Fonseca e as bibliotecas municipais de Castro Verde e Santiago do Cacém chamam-se Biblioteca Municipal Manuel da Fonseca.
 
 
  
Estradas

Não era noite nem dia.
Eram campos campos campos
abertos num sonho quieto.
Eram cabeços redondos
de estevas adormecidas.
E barrancos entre encostas
cheias de azul e silêncio.
Silêncio que se derrama
pela terra escalavrada
e chega no horizonte
suando nuvens de sangue.
Era hora do poente.
Quase noite e quase dia.

E nos campos campos campos
abertos num sonho quieto
sequer os passos de Nena
na branca estrada se ouviam.
Passavam árvores serenas,
nem as ramagens mexiam,
e Nena, pra lá do morro,
na curva desaparecia.

Já de noite que avançava
os longes escureciam.
Já estranhos rumores de folhas
entre as esteveiras andavam,
quando, saindo um atalho,
veio à estrada um vulto esguio.
Tremeram os seios de Nena
sob o corpete justinho.
E uma oliveira amarela
debruçou-se da encosta
com os cabelos caídos!
Não era ladrão de estradas,
nem caminheiro pedinte,
nem nenhum maltês errante.
Era António Valmorim
que estava na sua frente.

— Ó nena de Montes Velhos,
se te quisessem matar
quem te haverá de acudir?

Sob este corpete justinho
uniram-se os seios de Nena.

— Vai te António Valmorim.
Não tenho medo da morte,
só tenho medo de ti.

Mas já noite fechava
a saída dos caminhos.
Já do corpete bordado
os seios de Nena saíam
— como duas flores abertas
por escuras mãos amparadas!
Aí que perfume se eleva
do campo de rosmaninho!
Aí como a boca de Nena
se entreabre fria fria!
Caiu-lhe da mão o saco
junto ao atalho das silvas
e sobre a sua cabeça
o céu de estrelas se abriu!

Ao longe subiu a lua
como um sol inda menino
passeando na charneca…
Caminhos iluminados
eram fios correndo cerros.
Era um grito agudo e alto
que uma estrela cintilou.
Eram cabeços redondos
de estevas surpreendidas.
Eram campos campos campos
abertos de espanto e sonho…

segunda-feira, março 01, 2021

Vergílio Ferreira morreu há 25 anos

(imagem daqui)
  
Vergílio António Ferreira (Melo, 28 de janeiro de 1916 - Lisboa, 1 de março de 1996) foi um escritor português.
Embora formado como professor (veja-se a referência aos professores de Manhã Submersa e Aparição), foi como escritor que mais se distinguiu. O seu nome continua actualmente associado à literatura através da atribuição do Prémio Vergílio Ferreira. Em 1992, foi galardoado com o Prémio Camões.
A sua vasta obra, geralmente dividida em ficção (romance, conto), ensaio e diário, costuma ser agrupada em dois períodos literários: o Neo-realismo e o Existencialismo. Considera-se que Mudança é a obra que marca a transição entre os dois períodos.
  
Vergílio Ferreira nasceu em Melo, aldeia do concelho de Gouveia, na Beira Alta, a meio da tarde do dia 28 de janeiro de 1916, filho de António Augusto Ferreira e de Josefa Ferreira que, em 1927, emigraram para os Estados Unidos da América, em busca de melhores condições de vida. Então, o pequeno Vergílio é deixado mais os irmãos, ao cuidado de tias maternas. Esta dolorosa separação é descrita em Nitido Nulo. A neve - que virá a ser um dos elementos fundamentais do seu imaginário romanesco é o pano de fundo da infância e adolescência passadas na zona da Serra da Estrela. Aos dez anos, após uma peregrinação a Lourdes, entra no seminário do Fundão, que frequentará durante seis anos. Esta vivência será o tema central de Manhã Submersa.
Em 1932, deixa o seminário e acaba o Curso Liceal no Liceu da Guarda. Entra para a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, continuando a dedicar-se à poesia, nunca publicada, salvo alguns versos lembrados em Conta-Corrente e, em 1939, escreve o seu primeiro romance, O Caminho Fica Longe. Licenciou-se em Filologia Clássica em 1940. Concluiu o Estágio no Liceu D.João III (1942), em Coimbra. Começa a leccionar em Faro. Publica o ensaio "Teria Camões lido Platão?" e, durante as férias, em Melo, escreve "Onde Tudo Foi Morrendo". Em 1944, passa a leccionar no Liceu de Bragança, publica "Onde Tudo Foi Morrendo" e escreve Vagão "J" que, publicou em 1946; no mesmo ano em que se casou, com Regina Kasprzykowsky, professora polaca que se encontrava refugiada em Portugal da guerra e, com quem Vergílio ficaria até à sua morte. Após uma passagem pelo liceu de Évora (onde escreveu o mundialmente conhecido romance Manhã Submersa, corria o ano de 1953), fixa-se como docente em Lisboa, leccionando o resto da sua carreira no Liceu Camões.
Em 1980, o realizador Lauro António adapta para o cinema, o romance Manhã Submersa e, Vergílio Ferreira interpreta um dos principais papéis, o de Reitor do Seminário, contracenando assim com outros grandes vultos da cena portuguesa, tais como Eunice Muñoz, Canto e Castro, Jacinto Ramos e Carlos Wallenstein. Vergílio morreu no dia 1 de março de 1996, em sua casa, em Lisboa, na freguesia de Alvalade. O funeral foi realizado no cemitério de Melo, sua terra-natal e, a seu pedido, foi enterrado na ala do cemitério com vista para a Serra da Estrela.
    

domingo, janeiro 31, 2021

O médico e escritor Fernando Namora morreu há 32 anos

 
Fernando Namora (Condeixa-a-Nova, 15 de abril de 1919 - Lisboa, 31 de janeiro de 1989) de nome completo Fernando Gonçalves Namora, médico e escritor português, autor de uma extensa obra, das mais divulgadas e traduzidas nos anos 70 e 80.
   

 

A Mais Bela Noite do Mundo 
  
  
Hoje,
será o fim!
 
Hoje
nem este falso silêncio
dos meus gestos malogrados
debruçando-se
sobre os meus ombros nus
e esmagados!
  
Nem o luar, pano baço de cenário velho,
escutando
a minha prisão de viver
a lição que me ditavam:
- Menino! acende uma vela na tua vida,
que o sol, a luz e o ar
são perfumes de pecado.
Tem braços longos e tentadores – o dia!
  
- Menino! recolhe-te na sombra do meu regaço
que teus pés
são feitos de barro e cansaço!
  
(Era esta a voz do papão
pintado de belo
na máscara de papelão).
  
Eram inúteis e magoadas as noites da minha rua...
Noites de lua
que lembravam as grilhetas
da minha vida parada.
  
- Amanhã,
terás os mestres, as aulas, os amigos e os livros
e o espectáculo da morgue
morando durante dias
nos teus sentidos gorados.
  
Amanhã,
será o ultrapassar outra curva
no teu caminho destinado.
  
(Era esta a voz do papão
que acendia a vela, tinha regaço de sombra
e velava
as noites da minha rua e a minha vida
e pintava-se de belo
na máscara de papelão).
  
Hoje,
será o fim!
  
Hoje,
nem a sombra do que há-de vir,
nem os mestres, nem os amigos, nem os livros,
nem a fragilidade dos meus pés
feitos de barro e cansaço!
Todas as minhas revoltas domadas,
todos os meus gestos em meio
e as minhas palavras sufocadas
terão a sua hora de viver e amar!
  
Hoje,
nem o cadáver a sorrir na morgue,
nem as mãos que ficaram angustiosas,
arrepiadas
no seu medo de findar!
  
Hoje,
será a mais bela noite do mundo!
 
 
in Mar de Sargaços (1940) - Fernando Namora