Autorretrato, 1613-1614
Antoon van Dyck era o filho mais jovem de Frans van Dyck, um próspero comerciante de
sedas e de especiarias, e de sua segunda esposa, Maria Cuypers. Sua mãe faleceu quando ele tinha apenas oito anos.
Em
1609, aos dez anos, Anton tornou-se aprendiz do pintor de figuras
Hendrik van Balen, que só lhe deixara uma pálida impressão. Aos quinze anos, depois de pintar quadros admiráveis, ele já era um artista altamente aperfeiçoado; seu auto-retrato de
1613 e
1614 comprova isso.
Instalou-se em um estúdio próprio aos dezasseis anos, ainda na Antuérpia, tendo trabalhado com
Jan Brueghel, o jovem. Ele não poderia, entretanto, vender suas obras antes de ser oficialmente qualificado como mestre.
Em
18 de fevereiro de
1618, Van Dyck registrou-se como mestre na Guilda dos Pintores de Antuérpia.
Ambicioso, Van Dyck tornou-se discípulo de
Rubens, cujo estilo ele assimilou com uma facilidade espantosa. Rubens predominava o cenário artístico da Antuérpia, e Van Dyck, a exemplo desse, se dispôs a adotar maneiras aristocráticas e a cultivar a imagem de homem refinado. Rubens referiu-se ao jovem pintor, então com dezanove anos, como "o melhor de seus discípulos".
Aos vinte e um anos, ele foi nomeado assistente-chefe de Rubens e recebeu a tarefa de pintar o
teto (atualmente destruído) da Igreja Jesuíta de Antuérpia, passando a ser mais um auxiliar do que discípulo de Rubens.
Aparentemente, Rubens não se sentiu ameaçado por Van Dyck, embora, como se alega, ele tivesse encorajado-o a especializar-se em retratos, campo que Van Dyck demonstrava pouco interesse. Rubens elogiava-o abertamente, tendo inclusive adquirido alguns trabalhos seus.
Por volta de
1620, a reputação de Van Dyck estava firmemente estabelecida na Antuérpia. Em julho daquele ano, de passagem pela cidade à caminho da
Itália, a Condessa de Arundel posou para Rubens. Seu secretário, Francesco Vercellini, escreveu ao Conde de Arundel, em
Londres, sobre o processo da obra e uma nota a respeito de Van Dyck:
- "Van Dyck ainda está com o Senhor Rubens, e dificilmente suas obras são menos apreciadas que as de seu mestre; ele é um jovem de vinte e um anos, e seu pai, que é muito rico, vive na cidade; assim, será difícil para ele deixar este quinhão, tanto mais ao ver a boa sorte de Rubens".
Tal carta sugere que o Conde de Arundel tinha interesse em Van Dyck. Tentado pela perspectiva de visitar a
Inglaterra, o pintor chegou em Londres em novembro daquele mesmo ano, onde ficou por apenas três meses. Nessa curta temporada, Van Dyck pôde estabelecer contato com dois dos maiores colecionadores de arte ingleses: o próprio Conde de Arundel e o
Duque de Buckingham. Apesar da rivalidade entre os nobres, o pintor flamengo realizou pinturas para ambos e teve acesso às notáveis coleções deles: o Conde de Arundel possuía trinta e seis pinturas de
Ticiano e o Duque de Buckingham, uma vasta coleção de obras de
Veronese. Van Dyck admirava as obras desses velhos mestres
venezianos.
Entretanto, Van Dyck, quando veio à
Inglaterra pela primeira vez, não se saiu bem-sucedido ao ser apresentado a
Jaime I.
Tendo regressado à Antuérpia em
1621, Van Dyck, no
outono desse mesmo ano, partiu para a
Itália, instalando-se em
Génova, onde ficaria por seis anos. Era uma cidade perfeita para qualquer pintor: rica, elegante e com senhores poderosos. O biógrafo
Bellori descreveu sua chegada assim:
- "Suas maneiras eram as de um cavalheiro e não as de um homem comum, pois formara seus hábitos no estúdio de Rubens, em meio a nobres. Era também orgulhoso por natureza e ávido pela fama. Usava vestes luxuosas, trazia plumas em seu chapéu, correntes de ouro ao longo do peito e fazia-se acompanhar de servos."
Van Dyck era um viajante seletivo, pois, aparentemente já tinha decido de antemão o que queria ver de Itália. Foi em Génova que ele se definiu como retratista da
aristocracia. Sob a influência renovadora da arte italiana e tendo diante de si o exemplo dos retratos genoveses executados por Rubens, seu estilo expandiu-se intensamente.
As genovesas, mais que outras mulheres italianas, eram devotadas ao lar e à reclusão, sendo recatadas e tímidas por temperamento. Tais características Van Dyck captou e registou magistralmente em seus retratos. Nos retratos que pintara em Antuérpia, Van Dyck já estava distanciado da rígida formalidade dos tradicionais retratos flamengos.
Em
1627, depois de uma longa e bem-sucedida temporada italiana, Van Dyck resolveu retornar à Antuérpia, por causa da morte da irmã, Cornelia.
De volta à Antuérpia, Van Dyck trabalhou continuamente para a Igreja e era sempre muito solicitado como retratista. Também executou obras
mitológicas, tais como
Rinaldo e Armida, adquirida por
Carlos I em
1629. Na tela, ecoavam os mestres venezianos, causando grande entusiasmo em Londres, já que as pinturas italianas dominavam o gosto de colecionadores ingleses. Em maio de
1630, ele foi indicado como pintor da corte, tendo feito numerosos retratos da Arquiduquesa Isabella, governante
Habsburgo de
Flandres.
Em
1632,
Carlos I, encorajado pelo Conde de Arundel, convidou Van Dyck para sua corte. Carlos I, que se tornou rei em
1625, tinha a reputação de generoso patrono das artes, tendo sido descrito por Rubens como "
o maior apreciador da pintura entre os príncipes do mundo". Rubens pintou o teto de
Whitehall Banqueting House. Van Dyck, que sentia uma atração pela vida na corte, aceitou. Passou a viver em uma casa de
Blackfriars, com as despesas pagas por Carlos I, e a ter acesso a uma residência de verão em
Eltham, recebendo uma pensão anual de duzentas
libras esterlinas.
Em
5 de julho de
1632, Anthony van Dyck foi investido
cavaleiro. Bellori fornece uma rica descrição do estilo de vida que Van Dyck teve em Londres. De acordo com o biógrafo, a casa do pintor era frequentada pela mais alta nobreza da época. "
Van Dyck mantinha servos, músicos, cantores e bobos; com essas diversões entretinha os grandes homens que diariamente vinham posar para os retratos", escreveu Bellori. Na casa de Blackfriars, foi construída uma plataforma flutuante que facilitava o acesso dos visitantes nobres que vinham pelo
rio Tamisa.
Durante os nove anos em que viveu na Inglaterra, Van Dyck pintou cerca de trinta retratos em grandes dimensões para Carlos I, além de receber uma infindável sucessão de encomendas da aristocracia. Sua produção de retratos foi verdadeiramente prodigiosa.
Rei Carlos I, circa 1635 (Louvre)