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domingo, junho 10, 2012

Camões, recordado por Miguel Torga, há 25 anos, em Macau...

(imagem daqui)

Macau, 10 de Junho de 1987

Na Gruta de Camões


Tinhas de ser assim:
O primeiro
Encoberto
Da nação.
Tudo ser bruma em ti
E claridade.
O berço,
A vida,
O rastro
E a própria sepultura.
Presente
E ausente
Em cada conjuntura
Do teu destino.
Poeta universal
De Portugal
E homem clandestino.

in
Diário XV (1990) - Miguel Torga

Camões com música de Oulman e na voz de Amália


Erros meus, má fortuna, amor ardente - Amália Rodrigues
Poema de Luís de Camões, música de Alain Oulman

Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que pera mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa [a] que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse, que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

Camões, Luís Vaz de Camões...

O retrato de Camões, por Fernão Gomes, cujo original que se perdeu, em cópia de Luís de Resende, o mais autêntico retrato do poeta,  pintado ainda vida

Luís Vaz de Camões (Lisboa [?], circa 1524 - Lisboa, 10 de junho de 1580) foi um célebre poeta de Portugal, considerado uma das maiores figuras da literatura em língua portuguesa e um dos grandes poetas do Ocidente.
Pouco se sabe com certeza sobre a sua vida. Aparentemente nasceu em Lisboa, de uma família da pequena nobreza. Sobre a sua infância tudo é conjetura mas, ainda jovem, terá recebido uma sólida educação nos moldes clássicos, dominando o latim e conhecendo a literatura e a história antigas e modernas. Pode ter estudado na Universidade de Coimbra, mas a sua passagem pela escola não é documentada. Frequentou a corte de Dom João III, iniciou a sua carreira como poeta lírico e envolveu-se, como narra a tradição, em amores com damas da nobreza e possivelmente plebeias, além de levar uma vida boémia e turbulenta. Diz-se que, por conta de um amor frustrado, se autoexilou em África, alistado como militar, onde perdeu um olho em batalha. Voltando a Portugal, feriu um servo do Paço e foi preso. Perdoado, partiu para o Oriente. Passando lá vários anos, enfrentou uma série de adversidades, foi preso várias vezes, combateu bravamente ao lado das forças portuguesas e escreveu a sua obra mais conhecida, a epopeia nacionalista Os Lusíadas. De volta à pátria, publicou Os Lusíadas e recebeu uma pequena pensão do rei Dom Sebastião pelos serviços prestados à Coroa, mas nos seus anos finais parece ter enfrentado dificuldades para se manter.
Logo após a sua morte a sua obra lírica foi reunida na coletânea Rimas, tendo deixado também três obras de teatro cómico. Enquanto viveu queixou-se várias vezes de alegadas injustiças que sofrera, e da escassa atenção que a sua obra recebia, mas pouco depois de falecer a sua poesia começou a ser reconhecida como valiosa e de alto padrão estético por vários nomes importantes da literatura europeia, ganhando prestígio sempre crescente entre o público e os conhecedores e influenciando gerações de poetas em vários países. Camões foi um renovador da língua portuguesa e fixou-lhe um duradouro cânone; tornou-se um dos mais fortes símbolos de identidade da sua pátria e é uma referência para toda a comunidade lusófona internacional. Hoje a sua fama está solidamente estabelecida e é considerado um dos grandes vultos literários da tradição ocidental, sendo traduzido para várias línguas e tornando-se objeto de uma vasta quantidade de estudos críticos.

Túmulo do poeta no Mosteiro dos Jerónimos

Porque hoje é (ainda...) Dia de Portugal

Camões visto por Júlio Pomar - azulejos da estação de metro Alto dos Moinhos (daqui)

Camões e a tença

Irás ao paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada.
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce.

Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou ser mais que a outra gente.

E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto.

Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência.

Este país te mata lentamente.

in
Dual (1972) - Sophia de Mello Breyner Andresen

Nota: finalmente descobri a versão deste fantástico poema na voz única de José Mário Branco! Para quem não conhece aqui fica:

terça-feira, fevereiro 14, 2012

Mais um poema alusiva à data...

Endechas a Bárbara escrava

Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo,
Já não quer' que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que para meus olhos
Fosse mais formosa.


Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.


Uma graça viva,
Que neles lhe mora,
Para ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.


Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.


Presença serena,
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo
E, pois nela vivo,
É força que viva.

Luís de Camões

NOTA: veja-se esta versão musicada do poema de Camões que, apaixonado por uma escrava moçambicana, escreveu na ilha de Moçambique, enquanto vivia de amor e de amigos:

quinta-feira, novembro 10, 2011

Pablo Neruda, Portugal e Cunhal - II

A Lâmpada Marinha

(imagem daqui)

A cítara esquecida - II

Ó Portugal formoso,
cesta de frutas e flores,
emerges na prateada margem do oceano,
na espuma da Europa,
com a cítara de ouro
que te deixou Camões,
cantando com doçura,
espalhando nos confins do Atlântico
teu tempestuoso odor de vinhateiro,
de flores citinas e marinhas,
tua luminosa lua entrecortada
por nuvens e tormentas.

in
Las uvas y el viento (1954) - Pablo Neruda

Pablo Neruda, Portugal e Cunhal - III

A Lâmpada Marinha

(imagem daqui)

Os presídios - III

Mas,
português da rua,
entre nós,
que ninguém nos escuta,
sabes
onde
está Álvaro Cunhal?
Sabes a ausência,
ou alguém o sabe,
do valente
Militão?
Moça portuguesa,
passas como que bailando
pelas ruas
rosadas de Lisboa,
mas,
sabes onde caiu Bento Gonçalves,
o português mais puro,
honra de teu mar e de tua areia?
Sabes
que existe uma ilha,
a Ilha do Sal
e que nela o Tarrafal
verte sombra?
Sim, tu sabes, moça,
rapaz, sim, tu bem o sabes.
Em silêncio
a palavra
anda com lentidão mas percorre
não só Portugal mas toda Terra.
Sim, sabemos,
em remotos países,
que há trinta anos
uma lápide
espessa como túmulo ou como túnica,
de clerical morcego,
afoga Portugal, teu triste canto,
salpica tua doçura,
com gotas de martírio
e mantém as suas cúpulas de sombra.

in
Las uvas y el viento (1954) - Pablo Neruda

Pablo Neruda, Portugal e Cunhal - IV

A lâmpada marinha

(imagem daqui)

O mar e os jasmins - IV

Da tua pequena mão outrora
saíram criaturas
disseminadas
no assombro da geografia.
Assim, a ti voltou Camões
para deixar-te um ramo de jasmins
sempiterno a florescer.
A inteligência ardeu como vinha
de transparentes uvas
na tua raça.
Guerra Junqueiro, entre as ondas,
deixou cair o trovão
de liberdade bravia
que transportou o Oceano no seu cantar,
e outros multiplicaram
teu esplendor de rosais e uvas
como se de teu estreito território
saíssem grandes mãos
derramando sementes pela terra toda.

Não obstante,
o tempo soterrou-te,
o pó clerical
acumulado em Coimbra
caiu sobre teu rosto
de laranja oceânica
e cobriu o esplendor de tua cintura.

in
Las uvas y el viento (1954) - Pablo Neruda

Pablo Neruda, Portugal e Cunhal - V

A Lâmpada Marinha

(imagem daqui)

A lâmpada marinha - V

Portugal,volta ao mar, a teus navios
Portugal volta ao homem, ao marinheiro,
volve à terra tua, à tua fragrância,
à tua razão livre no vento,de novo
à luz matutina
do cravo e da espuma.
Mostra-nos teu tesouro,
teus homens, tuas mulheres,
não escondas mais teu rosto
de embarcação valente posta nas avançadas do Oceano.
Portugal, navegante,
descobridor de ilhas,
inventor de pimentas,
descobre o novo homem,
as ilhas assombradas,
descobre o arquipélago no tempo.
A súbita
aparição do pão
sobre a mesa,a aurora,
tu, descobre-a,
descobridor de auroras.

Como é isto?

Como podes negar-te
ao ciclo da luz tu que mostras-te
caminhos aos cegos?

Tu, doce e férreo e velho,
estreito e amplo pai
do horizonte, como
podes fechar a porta
às novas ideias,
ao vento com estrelas do Oriente?

Proa da Europa, procura
na correnteza
as ondas ancestrais,
a marítima barba
de Camões.
Rompe
as teias de aranha
que cobrem tua fragrante copa de verdura
e então
a nós os outros, filhos dos teus filhos,
aqueles para quem
descobriste a areia
até então escura
da geografia deslumbrante,
mostra-nos que tu podes
atravessar de novo
o novo mar obscuro
e descobrir o homem que nasceu
nas maiores ilhas da terra.
Navega, Portugal, a hora
chegou, levanta
a tua estatura de proa
e entre as ilhas e os homens torna
a ser caminho.
A esta idade agrega
tua luz, volta a ser lâmpada:

aprenderás de novo a ser estrela.

in
Las uvas y el viento (1954) - Pablo Neruda

quinta-feira, outubro 06, 2011

Com que voz ...

(imagem daqui)




Com que voz - Amália Rodrigues

Com que voz chorarei meu triste fado,
que em tão dura paixão me sepultou.
Que mor não seja a dor que me deixou
o tempo, de meu bem desenganado.

Mas chorar não estima neste estado
aonde suspirar nunca aproveitou.
Triste quero viver, pois se mudou
em tristeza a alegria do passado.

Assim a vida passo descontente,
ao som nesta prisão do grilhão duro
que lastima ao pé que a sofre e sente.

De tanto mal, a causa é amor puro,
devido a quem de mim tenho ausente,
por quem a vida e bens dele aventuro.



Letra de Luís de Camões - música de Alain Oulman

terça-feira, junho 14, 2011

Jorge Luis Borges morreu há 25 anos


Jorge Francisco Isidoro Luis Borges Acevedo (Buenos Aires, 24 de Agosto de 1899 - Genebra, 14 de Junho de 1986) foi um escritor, poeta, tradutor, crítico literário e ensaísta argentino.
Em 1914 sua família se mudou para Suíça, onde ele estudou e viajou para a Espanha. Em seu retorno à Argentina em 1921, Borges começou a publicar seus poemas e ensaios em revistas literárias surrealistas. Também trabalhou como bibliotecário e professor universitário público. Em 1955 foi nomeado director da Biblioteca Nacional da República Argentina e professor de literatura na Universidade de Buenos Aires. Em 1961, destacou-se no cenário internacional quando recebeu o primeiro prémio internacional de editores, o Prémio Formentor.
Seu trabalho foi traduzido e publicado extensamente no Estados Unidos e Europa. Borges era fluente em várias línguas. Morreu em Genebra, na Suíça, em 1986.
Sua obra abrange o "caos que governa o mundo e o carácter de irrealidade em toda a literatura". Seus livros mais famosos, Ficciones (1944) e O Aleph (1949), são colectâneas de histórias curtas interligadas por temas comuns: sonhos, labirintos, bibliotecas, escritores fictícios e livros fictícios, religião, Deus. Seus trabalhos têm contribuído significativamente para o género da literatura fantástica. Estudiosos notaram que a progressiva cegueira de Borges ajudou-o a criar novos símbolos literários através da imaginação, já que "os poetas, como os cegos, podem ver no escuro". Os poemas de seu último período dialogam com vultos culturais como Spinoza, Luís de Camões e Virgílio.
Sua fama internacional foi consolidada na década de 1960, ajudado pelo "boom latino-americano" e o sucesso de Cem Anos de Solidão de Gabriel García Márquez. O escritor e ensaísta John Maxwell Coetzee disse sobre ele: "Ele, mais do que ninguém, renovou a linguagem de ficção e, assim, abriu o caminho para uma geração notável de romancistas hispano-americanos".

A LUIS DE CAMÕENS


Sin lástima y sin ira el tiempo mella
las heroicas espadas. Pobre y triste
a tu patria nostálgica volviste,
oh capitán, para morir en ella


y con ella. En el mágico desierto
la flor de Portugal se había perdido
y el áspero español, antes vencido,
amenazaba su costado abierto.


Quiero saber si aquende la ribera
última comprendiste humildemente
que todo lo perdido, el Occidente


y el Oriente, el acero y la bandera,
perduraría (ajeno a toda humana
mutación) en tu Eneida lusitana.

sexta-feira, junho 10, 2011

Como é bom lembrar Camões


A leitura dos Lusíadas

Do moço rei, defronte, esbelto e cavaleiro
Camões recita; a corte, silenciosa,
Ante a rubra explosão do cântico guerreiro,
Admira essa Epopeia enorme e prodigiosa.

«…Ruge a eléctrica voz do Adamastor furiosa;
Nas amuradas canta o alegre marinheiro;
Do Oceano à flor cintila a esteira luminosa
Dos pesados galeões do Gama aventureiro.

Terra! Grita o gajeiro; e à praia melindana
Desce doida e febril a gente lusitana.
Desfraldam os pendões ao claro céu do Oriente…»

Da glória ante o esplendor o olhar de El-Rei fulgura;
O Câmara, no entanto, alma sombria e escura,
No rei os olhos crava, e ri finalmente.


in Nocturnos - Gonçalves Crespo

roubado daqui

Soneto de Camões para recordar o dia em que a Pátrica celebra o seu poeta maior

(imagem daqui)

Erros meus, má fortuna, amor ardente


Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que para mim bastava amor somente.


Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das coisas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.


Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa a que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.


De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse, que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

Luís de Camões

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades



ADENDA: outra versão, com o Fausto e Sérgio Godinho a acompanhar o José Mário Branco, num espectáculo fantástico que os três fizeram e gravaram:


Camões cantado por Amália

Hoje é Dia de Portugal


Luís Vaz de Camões (Lisboa [?], c. 1524 — Lisboa, 10 de Junho de 1580) foi um célebre poeta de Portugal, considerado uma das maiores figuras da literatura em língua portuguesa e um dos grandes poetas do Ocidente.


sábado, agosto 14, 2010

Poema adequado à época

 


Camões dirige-se aos seus contemporâneos

Podereis roubar-me tudo:
as ideias, as palavras, as imagens,
e também as metáforas, os temas, os motivos,
os símbolos, e a primazia
nas dores sofridas de uma língua nova,
no entendimento de outros, na coragem
de combater, julgar, de penetrar
em recessos de amor para que sois castrados.
E podereis depois não me citar,
suprimir-me, ignorar-me, aclamar até
outros ladrões mais felizes.
Não importa nada: que o castigo
será terrível. Não só quando
vossos netos não souberem já quem sois
terão de me saber melhor ainda
do que fingis que não sabeis,
como tudo, tudo o que laboriosamente pilhais,
reverterá para o meu nome. E mesmo será meu,
tido por meu, contado como meu,
até mesmo aquele pouco e miserável
que, só por vós, sem roubo, haveríeis feito.
Nada tereis, mas nada: nem os ossos,
que um vosso esqueleto há-de ser buscado,
para passar por meu. E para outros ladrões,
iguais a vós, de joelhos, porem flores no túmulo.

Jorge de Sena 

quinta-feira, junho 10, 2010

Camões - como o passado é o espelho destes tristes dias

(imagem daqui)
No mais, Musa, no mais, que a lira tenho
destemperada e a voz enrouquecida,
e não do canto, mas de ver que venho
cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
não no dá a pátria, não, que está metida
no gosto da cobiça e na rudeza
duma austera, apagada e vil tristeza.

in Os Lusíadas, Canto X, estância 145 - Luís Vaz de Camões

Poema de Gedeão para Camões


Soneto

Ao Luís Vaz, recordando o convívio da nossa mocidade.



Não pode Amor por mais que as falas mude
exprimir quanto pesa ou quanto mede.
Se acaso a comoção concede
é tão mesquinho o tom que o desilude.

Busca no rosto a cor que mais o ajude,
magoado parecer os olhos pede,
pois quando a fala a tudo o mais excede
não pode ser Amor com tal virtude.

Também eu das palavras me arredeio,
também sofro do mal sem saber onde
busque a expressão maior do meu anseio.

E acaso perde, o Amor que a fala esconde,
em verdade, em beleza, em doce enleio?
Olha bem os meus olhos, e responde.


in Colóquio Letras, nº55, Maio de 1980

Kátia Guerreiro cantando Camões


Perdigão perdeu a pena

Perdigão perdeu a pena
Não há mal que lhe não venha.

Perdigão que o pensamento
Subiu a um alto lugar,
Perde a pena do voar,
Ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
Asas com que se sustenha:
Não há mal que lhe não venha.

Quis voar a uma alta torre,
Mas achou-se desasado;
E, vendo-se depenado,
De puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
Lança no fogo mais lenha:
Não há mal que lhe não venha.

Luís de Camões