terça-feira, julho 22, 2008

Geologia no Verão - S. Miguel (Açores)

Foi-nos solicitado a divulgação da seguinte actividade, feita pela Associação Ecológica Amigos dos Açores, que recomendamos vivamente aos nossos leitores micaelenses e a quem visite essa maravilhosa ilha...



Só é pena que não haja mais actividades nos Açores nas outras ilhas e mesmo em S. Miguel - há que incentivar o Observatório Vulcanológico e Sismológico da Universidade dos Açores, o Observatório Vulcanológico e Geotérmico dos Açores, o Departamento de Geociências da Universidade dos Açores, Os Montanheiros - Sociedade de Exploração Espeleológica e muitos outros a mostrarem a Geologia dos Açores...!

domingo, julho 20, 2008

Notícia sobre a Mina de Sal-Gema de Loulé

Mina de sal de Loulé vai receber 400 turistas/dia
05-11-2007 7:30:00

Em fase de decréscimo na produção, o grupo CUF quer rentabilizar a mina de sal gema, inserindo-a no roteiro turístico da região. Mas também há projectos para fazer dela um gigantesco arquivo e pô-la ao serviço dos doentes asmáticos.

“Queremos receber aqui 400 turistas por dia, mas para isso temos que equipar as minas de infra-estruturas que não têm neste momento”, revelou ao Observatório do Algarve o director técnico Alexandre Andrade, do grupo CUF.

O estabelecimento de uma visita turística dentro de uma parte dos 46 quilómetros de galerias que ali têm sido abertos desde os anos 60, altura da descoberta da jazida, é um dos projectos já assentes.

Por agora, a mina de Campinas de Cima, às portas de Loulé, produz 40 mil toneladas de sal gema (em 2005 produzia 110 mil), utilizado em Portugal e no estrangeiro na produção de descongelante para o gelo das estradas e em rações para animais. Aquele sal, mais “salgado” que o utilizado nas cozinhas, não serve para alimentação humana.

Para as novas tarefas “terciárias”, terão que ser instalados no subsolo, entre 230 e 260 metros de profundidade, equipamentos como uma secção multimédia em que se explique aos visitantes o que é e para que serve a mina.

Poderá ser também construído um restaurante, zonas de vendas baseadas nas pedras de sal (da pedra de sal gema podem ser feitos candeeiros, esculturas e pisa-papéis, por exemplo), além de terem que ser abertos novos poços para instalar elevadores, que substituam as “gaiolas” por onde agora descem e sobem os trabalhadores.

Um sanatório subterrâneo para asmáticos

Responsável pela estrutura de Loulé e por uma mina congénere na zona da Figueira da Foz, o técnico tem visitado nos últimos meses outras minas europeias, onde colhe ideias para abrir as minas a actividades paralelas.

Na Polónia, por exemplo, viu uma mina de sal com balneários, piscina, discotecas e até um campo de futebol, dedicada a crianças que padeciam de doenças respiratórias.

De resto, a abertura de uma zona de tratamento daquele tipo de doenças, em que se inclui a asma, é outro dos projectos do grupo CUF. A ausência de humidade no interior da mina faz dela ideal para o tratamento daquelas doenças e em tempos houve pessoas que passavam quinzenas na mina a conselho dos médicos.

Considerada pelo grupo CUF como o maior espaço visitável em Portugal com condições de segurança, a nova utilização turística teve recentemente um balão de ensaio, com a exibição – há pouco mais de um mês – de um ciclo de cinema dedicado à claustrofobia e de uma batida fotográfica, que decorreu no passado sábado.

Ambas as iniciativas foram organizadas no terreno pela Casa da Cultura de Loulé, que no início do ano foi contactada pelo grupo CUF e constituíram um sucesso, nomeadamente o ciclo de cinema (que levou a chancela do Cineclube de Faro), com sessões sempre cheias, segundo disse ao Observatório do Algarve Élio Pelica, daquela associação cultural.

O director técnico das minas de sal do grupo CUF revelou ainda que o grupo pretende alugar algumas galerias – muitas delas fechadas com taipais – a empresas que tenham falta de espaço para arquivos mortos. “Desse ponto de vista, temos aqui o maior armazém do País”, acrescentou Alexandre Andrade.

64 metros abaixo do nível do mar

A mina de sal surgiu aquando da mutação geológica que resultou na separação entre a Europa e África, que criou o Mar Mediterrânico, há 250 milhões de anos, ainda antes da era (SIC) Jurássica.

A cobertura de uma enorme massa de água salgada pela terra num período relativamente curto resultou no enorme torrão de pelo menos um quilómetro de profundidade que hoje se estende a Leste de Loulé e não se sabe onde acaba.

Há quem diga que ramos dessa linha de sal poderão atingir as proximidades de Barcelona, onde há uma jazida semelhante.

Com início 90 metros abaixo da superfície – após uma camada de calcário (1 aos 45 metros) e outra de gesso (45 aos 90 metros) -, a mina já foi “descoberta” até aos 313 metros de profundidade, mas as enormes galerias feitas pelo homem situam-se em dois níveis, a 230 e 260 metros de profundidade. A primeira galeria situa-se 64 metros abaixo do nível do mar.

Antes realizada a poder de dinamite, picaretas e martelos pneumáticos, actualmente, a extracção de sal é feita com uma máquina de perfuração a que os trabalhadores chamam “roçadora”.

Após esse trabalho, os camiões que circulam no interior das galerias (algumas maiores do que um túnel rodoviário comum) levam o minério a uma máquina que o desfaz e leva ao poço de transporte de material, até à superfície.

Boa parte da produção é levada para fora do País, onde é usado sobretudo para o fabrico de descongelante para as estradas europeias.

A mina foi descoberta há meio século, graças a um furo realizado numa propriedade em Campinas de Cima, cujo resultado foi… água salgada.

in Observatório do Algarve, 05.11.2007 - ler notícia

NOTA: embora com algumas asneiras, publicamos esta notícia antiga e perguntamos aos nossos leitores: quando haverá actividades turísticas (isto para além das actividades da Geologia no Verão) na Mina de Campina de Cima? Recordamos ainda que podem ver imagens da Mina neste nosso post antigo.

Lua

Apollo XI - 39 anos depois


Faz hoje 39 anos que finalmente um homem andou noutro planeta. Quando o presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, em 1961, apontou como meta a Lua (levar um homem à Lua e trazê-lo de volta são e salvo, antes do decénio acabar) ninguém pensou que seria possível. Mas, como disse o Poeta, pelo sonho é que vamos... Bravos homens da Apollo XI, nunca vos esqueceremos! “Houston, Tranquility Base here - the Eagle has landed” e "That's one small step for [a] man, one giant leap for mankind" são frases inesquecíveis...

Lembremos a data com Poesia:

Poema do homem novo

Niels Armstrong pôs os pés na Lua
e a Humanidade saudou nele
o Homem Novo.
No calendário da História sublinhou-se
com espesso traço o memorável feito.

Tudo nele era novo.
Vestia quinze fatos sobrepostos.
Primeiro, sobre a pele, cobrindo-o de alto a baixo,
um colante poroso de rede tricotada
para ventilação e temperatura próprias.
Logo após, outros fatos, e outros e mais outros,
catorze, no total,
de película de nylon
e borracha sintética.
Envolvendo o conjunto, do tronco até aos pés,
na cabeça e nos braços,
confusíssima trama de canais
para circulação dos fluidos necessários,
da água e do oxigénio.

A cobrir tudo, enfim, como um balão ao vento,
um envólucro soprado de tela de alumínio.
Capacete de rosca, de especial fibra de vidro,
auscultadores e microfones,
e, nas mãos penduradas, tentáculos programados,
luvas com luz nos dedos.

Numa cama de rede, pendurada
das paredes do módulo,
na majestade augusta do silêncio,
dormia o Homem Novo a caminho da Lua.

Cá de longe, na Terra, num borborinho ansioso,
bocas de espanto e olhos de humidade,
todos se interpelavam e falava,
do Homem Novo,
do Homem Novo,
do Homem Novo.

Sobre a Lua, Armstrong pôs finalmente os pés.
caminhava hesitante e cauteloso,
pé aqui,
pé ali,
as pernas afastadas,
os braços insuflados como balões pneumáticos,
o tronco debruçado sobre o solo.

Lá vai ele.
Lá vai o Homem Novo
medindo e calculando cada passo,
puxando pelo corpo como bloco emperrado.
Mais um passo.
Mais outro.

Num sobre-humano esforço
levanta a mão sapuda e qualquer coisa nela.
com redobrado alento avança mais um passo,
e a Humanidade inteira, com o coração pequeno e ressequido
viu, com os olhos que a terra há-de comer,
o Homem Novo espetar, no chão poeirento da Lua, a bandeira da sua Pátria,
exactamente como faria o Homem Velho.

in Novos Poemas Póstumos - António Gedeão (1990)

Pelo sonho é que vamos

Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.

Chegamos? Não chegamos?

Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos,
basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

Partimos. Vamos. Somos.

in Pelo sonho é que vamos - Sebastião da Gama

NOTA: post conjunto com o Blog AstroLeiria

quinta-feira, julho 17, 2008

Maluquices - música para Geopedrados

Nestes tempos malucos, uma canção que me faz lembrar as políticas da minha entidade patronal - em duas versões, pois também ela está agora a mudar o aspecto (note-se o ensaio fotográfico recente, estilo revista masculina, de uma senhora que tinha idade para ter juízo) e a dourar a maçã com que nos quer presentear...








Crazy - Gnarls Barkley

I remember when, I remember, I remember when I lost my mind
There was something so pleasant about that phase.
Even your emotions had an echo
In so much space

And when you're out there
Without care,
Yeah, I was out of touch
But it wasn't because I didn't know enough
I just knew too much

Does that make me crazy
Does that make me crazy
Does that make me crazy
Probably

And I hope that you are having the time of your life
But think twice, that's my only advice
Come on now, who do you, who do you, who do you, who do you think you are,
Ha ha ha bless your soul
You really think you're in control

Well, I think you're crazy
I think you're crazy
I think you're crazy
Just like me

My heroes had the heart to lose their lives out on a limb
And all I remember is thinking, I want to be like them
Ever since I was little, ever since I was little it looked like fun
And it's no coincidence I've come
And I can die when I'm done

Maybe I'm crazy
Maybe you're crazy
Maybe we're crazy
Probably


Nota: canção do álbum St. Elsewhere - podem ver o vídeo oficial AQUI.

sábado, julho 12, 2008

Mestrado em Ciências da Terra - Universidade de Coimbra

Candidaturas a Mestrado

Está aberta de 2 a 20 de Julho 2008 a 2ª fase de candidatura ao 2º Ciclo de Bolonha para 2008/2009. As inscrições são feitas através do site da FCTUC


1º Ano - 1º Semestre
Actividades Práticas em Geociências *
Epistemologia das Geociências *
Geohistória de Portugal
Seminário I
Sistemas Terrestres *
Terra no Espaço *

1º Ano - 2º Semestre
Comunicação em Geociências
Geociências e Saúde *
Geodiversidade e Geoconservação *
Gestão Sustentável de Recursos *
Riscos Geológicos e Ordenamento do Território *
Seminário II

2º Ano
Dissertação

* Unidade curricular opcional


NOTA: A propina é de 1.000 €. A informação retirada do site do DCT/UC

Congresso no Geopark Naturtejo

XVIII Jornadas MINOM - Geoturismo, Desenvolvimento Local e Museologia


Mais informações em: www.geoparknaturtejo.com

Conferência em Lisboa

Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa - Departamento de Geologia


Ano Internacional do Planeta Terra - AIPT 2008

(site oficial AIPT2008 nacional em: PROGEO/AIPT2008 )



Megacidades:
o nosso futuro
global


Conferência:

Geologia de Cidade

por

António Gomes Coelho
Geólogo, consultor da COBA, Presidente da APG, Vice-presidente da SGP

16 de Julho, 17.00 horas, anfiteatro 6.2.53 (edifício C6, GeoFCUL)



Mais informações, resumo das conferências e programa das comemorações em:

quinta-feira, julho 10, 2008

quarta-feira, julho 09, 2008

Geologia no Verão - a nossa actividade!

Conforme prometido, aqui ficam os dados da nossa actividade deste ano da Geologia no Verão 2008, a única a realizar no concelho de Leiria, feita com o Doutor Jorge Dinis (Departamento de Ciências da Terra da Universidade de Coimbra):

Usar e não abusar: Geologia e recursos geológicos da região das Colmeias


DATA: 19.07.2008 (sábado)

HORÁRIO: 10.00 às 17.00 horas

ORGANIZAÇÃO: Doutor Jorge Dinis - Departamento de Ciências da Terra da Universidade de Coimbra e Fernando Martins - Blog Geopedrados

PARTIDA/CHEGADA: Piscinas Municipais de Leiria

ITINERÁRIO: Leiria - Barracão - Colmeias - Espite - Caranguejeira - Lapedo - Leiria

VAGAS: 40 lugares (transporte em Autocarro, sem custos para os inscritos)

INSCRIÇÕES: AQUI


NOTA: Colocaremos em breve mais informações e aceitaremos algumas inscrições directas...

Um passeio pelo Sol

Publicamos o seguinte post, da nossa amiga espeleóloga Sofia Reboleira, retirado do Blog GeoLeiria:

O Sol, através de um telescópio com filtro de observação solar (Foto: S. Reboleira)


No dia 27 e 28 de Junho realizaram-se as "Jornadas de Puertas Abiertas en el Observatorio del Teide".

Durante dois dias foi possível entrar, observar e compreender os telescópios do Instituto de Astrofísica das Canárias.

Perspectiva da zona interior do Observatório del Teide (Foto: S.Reboleira)


Existem actualmente, dois observatórios do espaço nas ilhas Canárias, o Observatório del Roque de los Muchachos, na Ilha de La Palma, vocacionado para a observação do céu profundo e o Observatório do Teide, na Ilha de Tenerife, centrado principalmente na observação da estrela do sistema solar.

Observatório do Roque de los Muchachos, acima das nuvens, La Palma (Foto: S.Reboleira)

O estudo da Astrofísica nas Canárias começou no início da década de 60, com a entrada em funcionamento do primeiro telescópio destinado ao estudo da luz dispersada pela matéria interplanetária.

O vulcão Teide, como pano de fundo ao observatório (Foto: S.Reboleira)

O Observatório do Teide, situado na zona de Izaña, a 2.390 metros de altitude, ocupa uma área de 50 hectares, numa crista que corresponde a um rifte formado pela elevação dos vulcões que hoje compõem as Cañadas do Teide.

Perspectiva do rifte onde está implantado o observatório del Teide (Foto: S. Reboleira)

A sua situação geográfica, associada à excelente transparência e qualidade astronómica do céu das Canárias fazem, do Observatório do Teide, um dos melhores locais europeus reservados ao estudo do Sol, contando com centenas de investigadores, que anualmente ocupam o observatório.

Interior do telescópio Carlos Sanchez (Foto: S. Reboleira)


A vasta área ocupada pelo Observatório encontra-se implantada nas cercanias do Parque Nacional das Cañadas del Teide. Este espaço natural, património da humanidade, foi classificado pelas características únicas na Terra, do estratovulcão que lhe dá o nome - o Teide. De acordo com os mais recentes critérios de classificação de montanhas (contrariando a subjectividade dada pela oscilação do nível médio das águas do mar e baseando a mediçao na superfície da placa oceânica), o Teide encontra-se entre as maiores montanhas do nosso planeta.

Parque Nacional de las Cañadas del Teide (Foto: S. Reboleira)


Estudos recentes de análise de materiais geológicos e de sondagens geofísicas, permitem afastar definitivamente a teoria da influência da fracturaçao da cadeia montanhosa do Atlas, na formação do arquipélago Canário, explicando que na sua origem se incluem apenas processos de hot spot - vulcanismo intraplaca. A variação entre o fenómeno de hot spot do arquipélago Canário e do Hawaiano encontra-se na espessura da placa oceânica na zona da pluma mantélica, que por ser de maior espessura no caso Canário, impede a subsidência das ilhas mais antigas.

Informação ao visitante (Foto: S. Reboleira)

O Observatório del Teide é composto por uma série de telescópios e instalações de acomodação, cozinha, recepção, sala de estar, garagens, estação transformadora e parque de painéis solares, com o objectivo de prestar serviço a todo o pessoal técnico e científico vinculado ao Observatório.

Sala de operações do telescópio VTT (Foto: S. Reboleira)

O Observatório conta ainda com um Centro de Visitantes, com capacidade para 40 pessoas, que ocupa uma cúpula vazia, onde se explica como funcionam os telescópios e a importância da Astronomia na história da humanidade e nos dias de hoje.

Percurso no interior do Observatório del Teide (Foto: S.Reboleira)

Miúdos e graúdos passaram um dia inesquecível, desde a história da mitologia que povoa os nossos céus, aos mais interessantes conceitos científicos associados ao maravilhoso mundo da Astrofísica.

É uma visita imperdível! Especialmente, porque o Sol é a fonte energética da Vida na Terra... Pelo menos, da Vida tal como a concebemos à luz dos conceitos do nosso tempo.

Ciência Viva no Verão 2008


Ciência Viva no Verão
Edição de 2008 (15 de Julho a 15 de Setembro)

Na praia, no campo, na cidade, de dia ou de noite, faça férias com a Ciência.

Observações astronómicas, passeios científicos, visitas a faróis e a grandes obras de engenharia são algumas das actividades propostas por universidades, centros de investigação, museus, empresas, escolas e associações científicas em todo o país.

Este ano este Blog patrocina e recomenda uma Acção (ver post seguinte...), isto para além das seguintes acções da Geologia no Verão (título com link e resumo incluído) que achamos muito interessantes:

Observar e interpretar a geologia, a geomorfologia e a paisagem na região de Penacova-Buçaco. A importância do rio Mondego na modelação das paisagens.


Num rio, a energia que transporta água e sedimentos, é gerada pelo desnível desde a nascente até ao mar. As alterações climáticas fazem variar o nível do mar e também o regime fluvial (cheias ou estiagens). Vamos conhecer a Geologia entre Penacova e Coimbra, conversando e remando num caiaque pelo Rio Mondego.


Serão apresentadas evidências baseadas na leitura de rochas carbonatadas que nos permitem entender a evolução do ambiente e vida marinha ocorridos em Portugal durante o Jurássico inferior. O registo sedimentar inclui um conjunto de argumentos que comprovam interacções entre a atmosfera e o oceano, entre as quais, um evento à escala global que terá resultado na extinção de invertebrados marinhos.


Observar, analisar e interpretar a paisagem do Parque Natural da Serra da Estrela numa perspectiva múltipla que envolva o ambiente passado e presente, a geologia, os recursos hídricos, a engenharia e a produção de electricidade nos aproveitamentos hidroeléctricos.

Com esta acção pretende-se dar a conhecer aos participantes uma série de locais representativos do património geológico e geomorfológico da Unidade Territorial de Alvaiázere, desde alguns dos maiores megalapiás do Maciço de Sicó até locais como as Fórnias da Cruz e Ucha e Fósseis da Serra da Ameixieira.

Desde a glaciação ao degelo, esta acção pretende dar a conhecer os aspectos geoclimáticos que caracterizaram a região do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, seja através da utilização de tecnologia de realidade virtual existente no Centro Ciência Viva do Alviela ou através da observação in loco. Uma viagem ao longo do tempo onde será também abordado o tema das alterações climáticas.

A riqueza da Gruta do Carvão reside, sobretudo, na grande variedade de aspectos geológicos, com estruturas e fenómenos típicos do vulcanismo que nela se podem observar. Pretende-se proporcionar uma visita guiada à referida gruta, precedida de uma explicação sobre o enquadramento geológico da mesma na ilha e sobre a sua formação, bem como a divulgação de um código de conduta para quem visita grutas.

Visitas às principais nascentes que drenam os aquíferos do Jurássico médio e Inferior do Algarve Central com o objectivo de ilustrar os factores que estão na origem da definição da sua localização. A acção pretende ainda mostrar que estas zonas estão associadas aos locais onde se estabelece conexão hidráulica entre as águas subterrâneas e as Ribeiras do Algarve.

O riquíssimo património natural da região centro litoral é visitado num dos seus locais mais emblemáticos, em que paisagens e ecossistemas do Jurássico Superior se reconstituem a partir do grande Livro da Terra. Os participantes poderão observar fósseis, estruturas sedimentares e rochas, imaginando paisagens deslumbrantes, numa viagem às profundas transformações ambientais que a Terra sofreu.

No Cabo Espichel e na Serra da Arrábida, encontramos evidências geológicas que ilustram a abertura do Oceano Atlântico. Os seres que então habitavam os locais onde se iriam formar as rochas, deixaram as suas marcas (por exemplo pegadas de dinossauro), ou tornaram-se eles próprios parte de rocha (fósseis). O visitante ficará impressionado com a informação que podemos extrair das rochas...

Uma viagem ao passado da Terra, lida num Livro de Rocha, com histórias de antigos continentes e oceanos, ilustradas por fósseis de seres extintos há milhões de anos e encadernadas por uma paisagem deslumbrante marcada por montanhas, vales, rios e...gentes!

Visita guiada ao maciço calcário de Condeixa-Sicó-Alvaiázere e Serra da Lousã, abordando temas da geomorfologia, hidrogeologia, Sedimentologia e Geomonumentos.

A acção permite observar os depósitos relacionados com um antigo litoral situado na Serra dos Candeeiros que permitem considerar a vertente ocidental como uma arriba fóssil. Nos calcários do Jurássico superior da plataforma litoral existem várias grutas no vale encaixado da Ribeira do Mogo onde também se situam as nascentes da Chiqueda que escoam as águas infiltradas na Serra dos Candeeiros.

A acção inicia-se com a visita à Fórnea. Durante o percurso, observam-se aspectos da circulação de águas subterrâneas nas regiões calcárias. De seguida visita-se a gruta da Cova da Velha. À tarde, o percurso passa pelo Polje de Alvados, Portela e visita-se a Gruta da Mouração. A acção termina com a passagem pelas nascentes cársicas do rio Lena.


Na Ribeira da Caranguejeira veja uma nascente de águas com temperatura acima da média regional, visite um vale em canhão escavado pela ribeira, onde foi encontrado o abrigo do Menino do Lapedo, considerado um híbrido entre neandertais e humanos modernos. Conheça ainda as nascentes do Rio Lis entre Reixida e Fontes e a gruta do Buraco Roto.
De manhã desce-se ao Focinho do Cabo Espichel observando-se a saída da Lapa das Pombas invadida pelo mar e, percorrendo um corrimão junto à arriba, entra-se nesta gruta e vê-se a entrada da Furna dos Segredos. Da parte da tarde, visitam-se os sumidouros das águas da depressão da cabeceira do Ribeiro das Terras do Risco e que levam a água até uma nascente litoral, a Gruta dos Morcegos.
A acção inicia-se na nascente do rio Almonda, mostrando-se a represa onde é captada água para a fábrica da Renova, as grutas associadas e os tufos calcários que se depositaram nos terraços do rio. A parte da tarde inclui um passeio pela nascente Rio do Alviela e grutas atravessadas pela ribeira de Amiais, com referência ao enquadramento geológico e aos problemas de contaminação das águas.


sábado, julho 05, 2008

Texto de MFM no Público

Opinião
Os testes de Português podiam ser substituídos por uns papeluchos como os do Totobola
04.07.2008
Maria Filomena Mónica


Hoje de manhã acordei a pensar no Ministério da Educação. Num mundo ideal, eu seria professora de Português, consistindo a minha missão em sujeitar a exame todos os membros do Gave (Gabinete de Avaliação Educacional), da DGIDC (Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular), do GEPE (Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação), da DGRHE (Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação) e da ANQ (Agência Nacional para a Qualificação) usando para o efeito uma “grelha” por mim elaborada.

Este desejo surgiu depois de ter lido os programas, os exames e os critérios de avaliação em vigor. Com filhos crescidos e netos demasiado pequenos para frequentar a escola secundária, tenho andado arredada da matéria, embora, pelo que ia ouvindo, por esquinas e ruas, suspeitasse de que a asneira tivera carta de alforria. Há três semanas, durante uma sessão de autógrafos na Feira do Livro, conversei com algumas professoras do ensino secundário. O encontro despertou o meu apetite por analisar as provas de exame de Português. Havia muito – exactamente desde 1997, quando publiquei "Os Filhos de Rousseau" – que o não fazia.

Não foi difícil obter, na Internet, o seu enunciado, ou antes, não foi difícil depois de o director deste jornal me ter enviado o devido link. Comecei pela Prova Escrita de Português do 12.º Ano de Escolaridade, a qual incluía um texto de Camões, outro de Luís Francisco Rebelo e outro de Guilherme Oliveira Martins. À cabeça, aparecia o extracto do Canto X de "Os Lusíadas", começando em “Que as Ninfas do Oceano, tão fermosas,/…” e terminando em “Que possuí-los sem os merecer”. Se a inclusão do maior poeta épico português não me admirou, o mesmo não posso dizer das perguntas sobre ele feitas.

No final da primeira parte, pedia-se ao aluno que comentasse, num texto de 80 a 120 palavras, a experiência de leitura de "Os Lusíadas". Com medo de que esta se reduzisse a nada, fornecia-se, em epígrafe, as seguintes linhas de Maria Vitalina Leal de Matos: “Mas o texto é complexo e, por vezes até, contraditório. Em certos momentos exibe uma face menos gloriosa; aquela em que emergem as críticas, as dúvidas, o sentimento de crise.” Não só o excerto era desnecessário, como podia causar perplexidade, uma vez que o esquema a preto e branco inventado pelo Gave não se coadunava com “complexidades”. Por outro lado, pareceu-me extraordinário que, a alunos de 17 e 18 anos, se tivesse de fornecer um glossário, no qual se explicava, por exemplo, o que era o Olimpo. Que andaram os meninos a aprender ao longo de dez anos de aulas de História?

Texto ideológico
Nos Grupos II e III, transcrevia-se um texto de Luís Francisco Rebelo sobre "O Memorial do Convento" de José Saramago, e outro, de Guilherme Oliveira Martins, sobre o P. António Vieira. Do ponto de vista ideológico, o segundo era inócuo, o mesmo não se podendo dizer do primeiro. Depois de um elogio rasgado ao livro, L. F. Rebelo defendia coisas tão etéreas quanto a “a história não é uma categoria imutável e fixa, mas a contínua respiração da realidade, rio cujas águas nunca param e nunca se repetem”, desembocando o seu argumento no conceito de “luta de classes”, após o que remetia para o poema de Brecht, “Perguntas de Um Operário Letrado”, o qual servia de base para defender que "O Memorial do Convento reflectia o conflito entre um “rei beato” e os “servos da gleba”.

A fim de serem facilmente classificadas, muitas questões eram de escolha múltipla, ou seja, a seguir a uma frase vinham quatro opções, o que nos leva a pensar que, segundo a ideologia vigente, há uma e apenas uma Verdade. Como se isto não fosse suficientemente arrepiante, algumas das supostas respostas certas estavam erradas: a vice-presidente da Associação de Professores de Português chamou imediatamente a atenção para a falta de acordo entre os colegas no que dizia respeito às respostas para o grupo II, 7. No último grupo, o III, era pedida ao aluno uma redacção, entre 200 e 300 palavras, sobre a “temática da dignidade humana e do respeito pelos direitos humanos no nosso tempo”. Visto tratar-se de escrever sobre o que passa no século XXI, não entendo a vantagem da inclusão do texto do actual presidente do Tribunal de Contas relativo ao século XVII. Pelos vistos, o contexto temporal desapareceu da cabeça destes pedagogos.

Vale a pena abordar a filosofia subjacente à elaboração do exame. Claro que podia parafrasear algumas passagens do programa da cadeira ou até fornecer um resumo do texto — com 76 páginas — mas isso teria a desvantagem de afastar o leitor da linguagem de quem planeia o ensino em Portugal. Antes de saltar estes parágrafos, lembre-se, por favor, que o esforço que lhe peço não é nada comparado com aquele a que os professores são diariamente sujeitos. Aqui vão alguns extractos retirados do "Programa de Português para os 10.º, 11.º e 12º anos, dos Cursos Científico-Humanísticos e Cursos Tecnológicos", coordenado por Maria da Conceição Coelho, a qual foi, para o efeito, assessorada por João Seixas, José Pascoal, Maria Joana Campos, Maria José Grosso e Maria de La Salette Loureiro.

Eis o começo: “O Português é uma disciplina da formação geral comum aos cursos científico-humanísticos e tecnológicos do ensino secundário que abrange os três anos do ciclo. Visa a aquisição de um corpo de conhecimentos e o desenvolvimento de competências que capacitem os jovens para a reflexão e o uso da língua materna. Em contexto escolar, esta surge como instrumento mas também como conteúdo ou objecto de aprendizagem, tornando-se fundamental, neste ciclo, o aprofundamento da consciência metalinguística e a adopção de uma nomenclatura gramatical adequada que sirva o universo de reflexão.” Abordando a parte 2, eis o que encontramos: “Este programa pretende ser um instrumento regulador do ensino-aprendizagem da língua portuguesa nas componentes Compreensão Oral, Expressão Oral, Expressão Escrita, Leitura e Funcionamento da Língua, instituídas como competências nucleares desta disciplina. (…) Para realizar a interacção entre as diferentes competências, seleccionaram-se vários tipos de textos em que há uma evidente articulação entre protótipos textuais (narrativo, descritivo, argumentativo, expositivo-explicativo, injuntivo-instrucional, dialogal-conversacional) e textos das relações dos domínios sociais de comunicação (relações educativas, relações profissionais, relações com os media, relações gregárias e relações transaccionais). Desta forma, a tipologia textual prevista para o ensino secundário adquire uma dimensão praxiológica, permitindo abordar textos que, cabendo numa das categorias de protótipos textuais, preparam os jovens cidadãos para uma integração na vida sociocultural e profissional.”

Máquina retórica em ritmo automático
No que diz respeito à escrita, eis o que têm a dizer: “Quanto à expressão escrita, pretende-se que seja instituída uma oficina de escrita, em que sejam trabalhadas as tipologias textuais previstas, a partir das quais se desenvolverão as competências naturalmente envolvidas neste tipo de actividade. Propõe-se que esta oficina seja entendida como um trabalho laboratorial, constituindo um espaço curricular em que a aprendizagem e a sistematização de conhecimentos sobre a língua e os seus usos se inscrevem como componentes privilegiadas.” Sobre a leitura, afirma-se: “No âmbito da leitura, promove-se o acesso a textos de várias tipologias, preferencialmente relacionados com a área de formação ou com o interesse dos alunos, bem como a textos dos domínios transaccional e educativo, que contribuem para a formação da cidadania. A leitura do texto literário deverá ser estimulada pois contribui decisivamente para o desenvolvimento de uma cultura geral mais ampla, integrando as dimensões humanista, social e artística, e permite acentuar a relevância da linguagem literária na exploração das potencialidades da língua. Nesse sentido, são seleccionados para leitura obrigatória autores/textos de reconhecido mérito literário que garantam o acesso a um capital cultural comum.” O programador acrescenta: “O convívio com os textos literários acontecerá também quando se puserem em prática contratos de leitura a estabelecer entre professores e alunos.” Que significa um “contrato de leitura” que, ainda por cima, “acontecerá”? Mistério.

Do capítulo dos objectivos, seleccionei apenas três frases, as mais representativas: “Desenvolver capacidades de compreensão e de interpretação de textos/discursos com forte dimensão simbólica, onde predominam efeitos estéticos e retóricos, nomeadamente os textos literários, mas também os do domínio da publicidade e da informação mediática; utilizar métodos e técnicas de pesquisa, registo e tratamento de informação, nomeadamente com o recurso às novas tecnologias de informação e comunicação (TIC); desenvolver práticas de relacionamento interpessoal favoráveis ao exercício da autonomia, da cidadania, do sentido de responsabilidade, cooperação e solidariedade.” Modernaço, não é?

A máquina retórica prossegue em ritmo automático: “A escola deverá promover, no âmbito da consciência linguística, o conhecimento do vocabulário, da morfologia, da sintaxe e da fonologia/ortografia; no que respeita a competência discursiva/textual, o conhecimento das convenções que subjazem à produção de textos orais ou escritos que cumpram as propriedades da textualidade; quanto à competência sociolinguística, o conhecimento das regras sociais para contextualizar e interpretar os elementos linguísticos e discursivos/ textuais; quanto à competência estratégica, o uso de mecanismos de comunicação verbais ou não verbais como meios compensatórios para manter a comunicação e produzir efeitos retóricos.”

Estão fartos? Desculpem, mas não resisto a outra citação: “A aula de Português (…) é, pela especificidade da disciplina, um espaço de transversalidade cultural e linguística, na sua condição de suporte estruturalmente integrado nos outros saberes. (…) Para que os alunos desenvolvam o hábito de ler, propõe-se a criação de um espaço dedicado à leitura recreativa de textos de reconhecido mérito literário, de autores maioritariamente contemporâneos, das literaturas nacional e universal, capazes de transformar os alunos em leitores mais assíduos, quer ao longo do percurso escolar, quer ao longo da vida.” Note-se a aberrante hierarquia: “Nesse espaço, deve ser dada importância aos gostos e interesses dos alunos, cabendo ao professor a sua orientação, sugerindo um leque diversificado de textos a ler. O professor deve constituir-se como entidade facilitadora de práticas de leitura (sublinhado meu) oferecendo aos alunos a possibilidade de encontro com textos interessantes e motivadores, procurando, contudo, suscitar respostas por parte dos leitores durante e após a leitura desses textos.” Só há duas explicações para o programa de Português: ou esta gente é doida ou pretende humilhar os professores.

Não é preciso ir longe para vermos em que fontes andaram os “especialistas” a beber. Basta olhar alguns dos títulos da bibliografia aconselhada: Lussier, D., "Évaluer les Apprentissages dans une Approche Communicative", Paris, Hachette, 1992, Tochon, F.V., "A Língua como Projecto Didáctico", Porto, Porto Editora, 1995, Gohard-Radenkovic, A., "L’Ecrit. Stratégies et Pratiques", Paris, Clé international, 1995, Broncart, J.-P., "Activité Langagière, Textes et Discours", Lausanne, Delachaux et Niestlé S.A., 1996 ou Weaver, C., "Teaching Grammar in Context", Portsmouth, Boynton/Cook Publishers, Inc, 1996 . Todo e qualquer livro, da "La Littérature en Péril" de T. Todorov a "On Looking into the Abyss" de G. Himmelfarb, que ponha em causa a ortodoxia foi banido.

Baixar o insucesso por via burocrática
Voltando ao exame, intrigou-me a ênfase nos autores contemporâneos. Um anjo da guarda explicou-me o motivo. A 4 de Outubro último, através da portaria 1322/2007, Valter Lemos determinou que, este ano, os exames de Português do 12.º ano passassem a ter como matéria, não o que fora dado ao longo do ciclo, como sucedia, mas apenas o leccionado no 12.º ano. Tal como sucedera no exame de Matemática, a mutilação foi deliberadamente planeada, no sentido de tornar mais simples os exames. Pelo meio, desapareceram autores como Eça de Queiroz e Cesário Verde – declaro, é evidente, um interesse pessoal – substituídos por Luís de Sttau Monteiro e José Saramago, cujas obras, "Felizmente Há Luar" e "O Memorial do Convento", são de leitura obrigatória (dada a fama internacional, Fernando Pessoa manteve-se). Em suma, dos clássicos, apenas Camões.

Como qualquer professor sabe, os alunos apenas estudam o que vem para exame, ficando indignados quando lhes “sai” uma coisa não estipulada. A portaria 1322/2007 deu-lhes autorização para esquecer o que eventualmente tivessem aprendido nos dois anos anteriores. Quem viu os telejornais, não pode ter deixado de notar as declarações no sentido de que o exame de Português tinha sido “canja” e que portanto o futuro iria ser risonho. Não, não vai. Porque os alunos, que hoje ostentam uma face optimista, não tardarão a chorar ao verificarem que não arranjam emprego.

A responsabilidade pelo desastre – porque é de um desastre que se trata – deve ser atribuída a quem ocupa o poder, isto é, em primeiro lugar, a Maria de Lurdes Rodrigues, uma ministra cujo objectivo passou a consistir em baixar o insucesso escolar por via burocrática. Qualquer dia até o meu neto, de seis anos, é capaz de responder satisfatoriamente às provas do final da escolaridade. Uma vez que já sabe escrever o seu nome e que responde prontamente a quem lhe pergunta quanto são dois mais dois, penso que não vale a pena matriculá-lo na 1ª classe, deixando-o no recreio até aos 15 anos, altura em que se poderá apresentar a exame como aluno externo. Nem a família terá de se dar à maçada de o levar à escola nem o Estado será forçado a gastar dinheiro com a sua educação. Aliás, foi isso que, após ter realizado o exame de Português, nos disse Felipe Hasslocher: “Não estudei; a Português ou se sabe ou não vale a pena estudar” ("Diário de Notícias", 19-06-2008). De facto, é assim: ou se aprende em casa ou não vale a pena ir às aulas.

Mas voltemos aos exames. A disciplina de Português, obrigatória para todos os alunos que frequentam o 12.º ano, não é a única que aborda temas literários. Existe uma outra cadeira, optativa, de Literatura Portuguesa, resultado da divisão entre a língua e as obras. Se não é a ler os grandes escritores que se aprende a escrever, então como é? Mas disto não querem saber as luminárias. O programa é, de novo, coordenado pela guru Maria da Conceição Coelho, assessorada, desta feita, por Maria Cristina Serôdio e Maria Joana Campos, não sendo, por conseguinte, necessário voltar a cansar o leitor com citações. Quero apenas notar que a bibliografia, além de tendenciosa, contém lacunas. Manda-se os professores lerem R. Andrews, "The Problem with Poetry", Piladelphia, Open University, 1991 e M. Bores et alia, "Estética Teatral: textos de Platão a Brecht", Lisboa, Fundação Gulbenkian, 1996, mas a "História da Literatura Portuguesa", de A. J. Saraiva e Óscar Lopes, não aparece, como não aparece um único livro de João Gaspar Simões. E, por favor, não me venham dizer que são livros datados.

A prova de Literatura Portuguesa para os 11.º e 12.º anos é melhor do que o programa, até porque os escritores escolhidos para análise são Camões e Camilo Castelo Branco. Dado os adolescentes serem particularmente sensíveis ao tema — razão menor, mas que aceito —, a inclusão do soneto que começa com “Amor é um fogo que arde sem se ver…” e de um extracto do Amor de Perdição não me pareceu má ideia. Trata-se de clássicos cujo mérito ninguém disputa. No Grupo III, pedia-se aos alunos para, baseando-se na sua experiência de leitura da lírica trovadoresca, escreverem um texto sobre o tema do sofrimento amoroso nas cantigas de amor. O exame mais bem elaborado é aquele a que um menor número de alunos se sujeitou. Se calhar, uma coisa está relacionada com a outra.

Propaganda da "nomenklatura" europeia
No final, lembrei-me de ver a prova de Língua Portuguesa do 9.º ano, um exame a que foram sujeitos dezenas de milhares de estudantes. Do programa, simplório, não reza a História. Desta feita, o escândalo é o próprio exame. O principal texto – o A – versa a União Europeia. Retirado da Internet, é um artigo de propaganda. Espero que ninguém tenha a tentação de me vir explicar, a mim, que, nos idos de 1960, queimei as pestanas a tentar perceber o que, na opinião de Althusser, era um AIE (Aparelho Ideológico do Estado), e que, na década seguinte, se deliciou a ouvir o “We don’t need no education” dos Pink Floyd, que a escola transmite valores. Mas uma coisa é estar consciente do facto, outra aceitar que nela se transmita propaganda pura e dura. Ora, é isto que acontece nesta prova.

Não só os meninos foram sujeitos à ideologia veiculada pela "nomenklatura" europeia, como o que lhes era pedido se limitava a comentários de índole escolástica. Eis o início: “A União Europeia (EU) está empenhada no desenvolvimento sustentável. Para tal é necessário um equilíbrio cuidado entre prosperidade económica, a justiça social e um ambiente saudável. De facto, quando visados em simultâneo, estes três objectivos podem reforçar-se mutuamente. As políticas que favorecem o ambiente podem ser benéficas para a inovação e competitividade. Por sua vez, estas impulsionam o crescimento económico, que é vital para atingir os objectivos sociais.”

Se eu tivesse sido sujeita a este exame, reprovaria: não porque tivesse lido mal o que lá vinha, mas por saber que algumas das frases tidas como incontroversas são mais do que duvidosas. Dou um exemplo: “Inquéritos realizados têm demonstrado invariavelmente que a vasta maioria dos cidadãos da EU espera que os responsáveis políticos prestem tanta atenção à política ambiental como à política económica e à social.” Em que países se efectuou tal sondagem? Qual a amostra escolhida? Que margem de erro tinham as respostas? Ninguém sabe. Finalmente, a classificação das respostas – com um “V”, de verdadeira, ou “F”, de falsa – revela uma mente totalitária.

Seguia-se um texto de José Saramago sobre o sorriso. Não vou falar do suposto mérito literário do “nosso” Nobel, mas desejo reiterar que me parece absurdo fomentar a leitura com base em autores contemporâneos. Nem estes são de leitura acessível nem, mais importante, sabemos se têm mérito: um grande escritor é-o quando resistiu à erosão do tempo. Na segunda metade do século XIX, a elite nacional decidiu que o maior poeta português era Tomás Ribeiro, o qual, em 1862, publicara um poema intitulado "D. Jaime". O mais conceituado crítico da época, António Feliciano de Castilho, teve o desplante de considerar a obra como mais importante para o estudo da língua portuguesa do que "Os Lusíadas", o que não suscitou arrepios. Mas alguém é hoje capaz de ler, sem se rir, as linhas com que abre o "D. Jaime": “Meu Portugal, meu berço de inocente,/ lisa estrada que andei débil infante, variado jardim do adolescente,/ meu laranjal em flor sempre odorante/…”? Quem me garante que José Saramago não é o Tomás Ribeiro do século XX?

Fim da autonomia dos docentes
Faltava-me ler, com atenção, as instruções que o Ministério enviou aos professores encarregues de corrigir os exames. Escolhi o caso do exame de Português do 12.º ano. O que vi – quadradinhos com “níveis de desempenho”, listas com os “cenários de resposta” e grelhas com a “correspondência correcta” – deixou-me estarrecida. É certo que as instruções foram transcritas pelos jornais, mas, desacompanhadas dos exames, o leitor não tinha oportunidade de se aperceber da monstruosidade do esquema.

Não contente com a interferência na vida das escolas, o poder central entendeu por bem vigiar os examinadores de forma maníaca, não os deixando desviar uma linha do que os burocratas consideram “a” resposta correcta. A fim de que não se pense que sou tendenciosa, cito a primeira pergunta, relativa a "Os Lusíadas", na qual se pedia ao aluno que expusesse, sucintamente, o conteúdo das três primeiras estâncias. Nos critérios de avaliação enviados às escolas, especificava-se existirem três níveis de desempenho, o N3, no qual se expunha o conteúdo das três primeiras estâncias – a que se deveria dar 9 pontos – o N2, no qual se expunha o conteúdo de duas estâncias – que mereceria 6 pontos – e o N1, no qual se expunha apenas o conteúdo de uma das estâncias – ao qual se deveria dar apenas 3 pontos. É isto normal?

Na pergunta seguinte, depois de se ter afirmado que a “Fama” desempenhava um papel fundamental no processo de imortalidade, pedia-se ao aluno que referisse “três dos aspectos evidenciados nesse desempenho, fundamentando a sua resposta com citações do texto”. Seguia-se uma coisa designada como “cenário de resposta”, cujo objectivo era explicar aos professores o que eles sabem ou deviam saber: “A resposta deve contemplar os seguintes aspectos: a “ilha” (incluindo as Ninfas e Tétis) é o prémio, a recompensa dada aos marinheiros; os “deleites” são os triunfos, os louros (1ª estância); os prémios concedidos pela antiguidade eram atribuídos a quem fazia o difícil percurso da virtude (2ª estância); os deuses não passam de humanos que praticaram feitos de grande valor; daí terem recebido o prémio de imortalidade (3ª estância). Seguiam-se os critérios de avaliação, N3, N2 e N1, com a usual pontuação decrescente.

Na terceira pergunta, pedia-se, entre outras coisas, ao aluno para identificar a apóstrofe presente na estância 92. Lá voltavam a aparecer os “critérios específicos de classificação”, com a respectiva pontuação. No “cenário de resposta”, especificava-se que a resposta certa era “ó vós que as famas estimais”. Se um aluno respondesse, por exemplo, “ó vós” – o que estaria certo –, a resposta teria de ser considerada errada. É isto aceitável?

Demorei-me a analisar este texto porque, de entre todos – e como viram a escolha não é fácil – foi o que mais me escandalizou. Deste novo mundo, labiríntico, burocrático, totalitário, desapareceu a autonomia dos docentes, o dever de julgar e até o estímulo para separar os alunos marrões dos criativos. Se as perguntas de escolha múltipla já me tinham irritado, mais furiosa fiquei ao ver que o método era aplicado ao que antigamente se chamava uma redacção. Em grande medida, estas loucuras derivam da filosofia de avaliação expressa na obra de Valter Lemos, "O Critério do Sucesso: Técnicas de Avaliação da Aprendizagem" (1986).

Se isto choca nas chamadas Ciências Exactas, o facto é, nas Humanidades, uma anormalidade, uma vez que analisar um texto literário não é o mesmo que resolver um problema de Química. Nos anos 1960, a crítica literária teve de se defrontar com o marxismo e, depois, e em rápida sequência, com o estruturalismo, o post-modernismo e a semiótica, correntes demasiado exotéricas para que delas possa, ou queira, falar. A partir de então, a crítica literária foi tida como uma espécie de ciência. Tudo ficou de pernas para o ar, não me devendo eu espantar que a Língua Portuguesa tenha sido separada da História da Literatura nem que a análise do texto o seja dos respectivos autores. A coroar o disparate, o ministério optou por elaborar exames cujo objectivo é escamotear o facto de estarmos a formar uma geração incapaz de pensar, de falar e de escrever.

À volta da elite burocrática sediada no Ministério da Educação, existe hoje um enxame de “especialistas” que determina o que é, ou não, “correcto”. Os exames que elaboram poderiam ser substituídos por uns papeluchos como os do Totobola, nos quais os alunos fariam ao acaso umas cruzinhas, sendo estas posteriormente contadas por uma máquina. O actual secretário de Estado da Educação e os seus anões não pertencem à tradição humanística que fez a glória da cultura ocidental, mas a uma corrente pedagógica que vê o aluno como um robot e o professor como uma máquina registadora. O Português não é a sua pátria.

in Público - retirado daqui

terça-feira, julho 01, 2008

150 de Evolucionismo - notícia no Público II

A teoria nasceu há 150 anos
01.07.2008 - Clara Barata

Vinte anos a pensar numa ideia e de repente Wallace disse eureka

A 1 de Julho de 1858, a ideia de que as espécies evoluem ao longo dos tempos através da descendência com modificações foi pela primeira vez apresentada ao público, na Sociedade Lineana de Londres. Mas nem o respeitado naturalista britânico Charles Darwin, nem o mais jovem Alfred Russel Wallace - que, com uma carta enviada da Indonésia, fez Darwin decidir-se a tornar pública a ideia em que vinha a trabalhar há 20 anos - estavam lá. Quem apresentou o artigo "Sobre a Tendência das Espécies para formar variedades; e sobre a perpetuação das variedades e espécies através da selecção" foram dois cientistas amigos de Darwin, Charles Lyell e Joseph Hooker.

Nesse dia, Darwin ficou na sua casa de Down, de luto devido à morte de um dos filhos, e Wallace estava na ilha de Ternate, na Indonésia, a muitos quilómetros de distância, onde tinha chegado a um momento de eureka enquanto sofria com febre devido a um ataque de malária. Darwin e os seus amigos moveram-se rapidamente para apresentar as ideias dos dois cientistas juntas, mas de forma a garantir a primazia de Darwin - que, afinal de contas, andava a pensar nisso há duas décadas.

Mas a leitura do artigo enviado por Wallace a Darwin, mais alguns excertos de ensaios de Darwin, não teve grande impacte, nem nesse serão nem durante os meses seguintes. De tal forma que o presidente da Sociedade Lineana, ao fazer o resumo do ano de 1858, nem sequer a mencionou: "O ano que passou não foi marcado, de facto, por alguma descoberta fantástica daquelas que revolucionam a ciência."

O que trouxe a teoria de Darwin para a ribalta (e ofuscou Wallace, que foi remetido quase para uma nota de rodapé da história), e tornou a evolução através da selecção natural tema de conversa universal, desde os cafés e salões de barbearia até aos mais bem frequentados serões culturais, foi a publicação, em Novembro de 1859, do livro Sobre a Origem das Espécies. Neste livro, o cientista expunha as conclusões de duas décadas de reflexão cuidadosa - e angustiada - sobre o tema, explicado e reexplicado para que as suas ideias fossem compreendidas por todos, e não apenas pelos homens de ciência.

Quando a discussão sobre a teoria da evolução através da selecção natural se espalhou na sociedade, alguns contemporâneos de Darwin sentiram-se mesmo ofendidos, como se ele estivesse a matar Deus. Tirava o homem do centro da natureza, tal como Copérnico, no século XVI, tinha tirado a Terra do centro do sistema solar, substituindo-a pelo Sol. Tal como o heliocentrismo de Copérnico, a teoria da evolução desencadeou uma revolução científica, ao ligar-se, anos mais tarde, com a genética.

A ideia de evolução das espécies não era propriamente nova. Já outros tinham falado nisso, notando, pela ampla observação do mundo natural, dos fósseis e da geologia, que a Terra não podia ter apenas cerca de 6000 anos, como calculou um bispo britânico, baseando-se exclusivamente nos dados relatados no Velho Testamento. Nem as espécies se mantiveram sempre imutáveis, tal como Deus as tinha criado. Havia amplas provas disso, embora faltasse dar o passo fundamental para que esta ideia tivesse pés para andar: descobrir um mecanismo que explicasse como podiam as espécies mudar.

A novidade de Darwin foi propor esse mecanismo: a selecção natural. Este mecanismo diz-nos que características que conferem vantagens aos indivíduos na adaptação ao meio em que vivem - ter músculos das pernas fortes para correr, ou uma boa visão, tanto para distinguir a presa como o predador entre a folhagem, por exemplo - aumentam o sucesso reprodutivo desses indivíduos. Trocando por miúdos: quem for mais eficaz a evitar transformar-se no jantar de outra espécie tem mais oportunidades de ter mais filhos, passando as suas características favoráveis à próxima geração. Ao longo de muitas gerações, as espécies poderiam sofrer modificações importantes, que as transmutavam noutra espécie com características bem diferentes das originais.
E talvez ainda mais importante - e com consequências mais duradouras, no que toca à aceitação da sua teoria -, Darwin não excluía destas leis naturais o próprio homem. O Homo sapiens, apesar de se considerar especial e feito à imagem de Deus, não escapava à regra da selecção natural, como uma corça ou um leão. Também o homem descendia de outras espécies - provavelmente, partilharia antepassados recentes com os grandes primatas, como os chimpanzés e os gorilas, cujas parecenças com os homens são ainda tão fortes.

Chegar a estas conclusões não foi fácil para Darwin - apesar de se basearem em muitas experiências e observações minuciosas. Era um pouco como matar Deus - e ele não era propriamente ateu, chegou a estudar para ser padre. "Estou quase convencido (bem ao contrário da opinião com que comecei) de que as espécies não são (é quase como confessar um homicídio) imutáveis", escreveu ele em 1844, numa carta ao amigo botânico Joseph Hooker.

in Público on-line - link não disponível

150 de Evolucionismo - notícia no Público

Quem tem medo de Darwin?
01.07.2008, Clara Barata

Passados 150 anos sobre a apresentação da teoria da evolução, cresce o número dos que preferem a narrativa do Génesis - e a Europa e o mundo muçulmano são áreas de expansão

O Homo sapiens, a espécie a que todos pertencemos, é produto do acaso de milhões de anos de evolução, uma longa linhagem que nos liga aos grandes primatas, aos mamíferos que começaram a conquistar a Terra depois de terem desaparecido os dinossauros, há 65 milhões de anos, e até às primeiras bactérias? Ou é uma criatura feita à imagem de Deus, e por Deus, e cujo surgimento no planeta é relatado fielmente pelo Livro do Génesis? A resposta, talvez surpreendentemente, continua a não gerar unanimidade. As estimativas são muito incertas, mas boa parte dos 6000 milhões de pessoas que hoje vivem na Terra não dá primazia à explicação encontrada por Charles Darwin.

Faz hoje 150 anos que a teoria da evolução através da selecção natural foi pela primeira apresentada publicamente, numa leitura na Sociedade Lineana de Londres. Neste século e meio que passou, a teoria de Darwin - a que o filósofo Daniel Dennet chamou "a ideia mais brilhante que alguém já teve" - vingou e floresceu, unindo-se à genética, a partir do princípio do século XX. A descoberta das leis fundamentais da biologia permitiu o desenvolvimento de maravilhas como os antibióticos (que contrariam as leis naturais ao impedir que milhões de pessoas morram com infecções que antes eram mortais). No entanto, apesar de a teoria da evolução de Darwin se ter transformado numa pedra basilar do cânone da ciência e da cultura, continua a ser contestada por uma parte importante da população.

O paleontólogo e geneticista norte-americano Stephen Jay Gould dizia que a resistência à teoria da evolução de Darwin - um movimento com ideias variadas, mas que pode ser colocado sob o chapéu da designação "criacionismo" - era "uma controvérsia localizada e distintamente americana, como o Tio Sam ou a tarte de Maçã". Mas, nos últimos anos, esse movimento transformou-se num fenómeno internacional, embora de pequena escala, diz o historiador da ciência Ronald Numbers: "O antievolucionismo transformou-se num fenómeno global, um produto tão exportável como as calças de ganga ou o hip-hop."

Criacionismo múltiplo

"O criacionismo é a rejeição da evolução (e princípios científicos relacionados), em favor da criação por uma entidade sobrenatural. A versão mais proeminente, mas não a única, é a que defende que a Terra é muito mais jovem do que dizem os cientistas: apenas umas dezenas de milhares de anos", disse ao P2 Glenn Branch, vice-director do Centro Nacional para a Educação Científica, uma organização com sede na Califórnia que se dedica a combater o criacionismo.
Há criacionistas que aceitam que a Terra será muito mais velha que os 6000 anos estimados pelo bispo inglês James Usher no século XVII, que calculou que a criação do mundo por Deus tinha acontecido a 21 de Setembro de 4004 antes de Cristo. E há um movimento mais recente, ligado ao Instituto Discovery de Seattle, que procura afastar-se das referências bíblicas, para ter um aspecto científico, que é o dos defensores da "concepção inteligente": dizem que o Universo é demasiado complexo para não ter um criador inteligente, uma entidade que obedeceu a um determinado plano. Do acaso da evolução, que agiria de forma gradual, ao longo de gerações, não poderiam ter nascido estruturas complexas como o flagelo que algumas bactérias usam para se propulsionar, como se fosse uma cauda, dizem os partidários da "concepção inteligente", que são normalmente classificados como defendendo uma versão light do criacionismo.

Os muitos rostos da resistência à teoria da evolução têm despontado em vários locais da Europa. Polónia, Holanda, Suíça, Alemanha, Sérvia e Rússia são alguns dos países onde grupos de cidadãos e por vezes ministros expressaram, desde 2000, o desejo de que ideias criacionistas sejam ensinadas lado a lado com a teoria da evolução, como uma explicação alternativa.
No Reino Unido, por exemplo, onde o retrato de Darwin está nas notas de dez libras, gerou-se um escândalo em 2002, quando se soube que uma escola gerida por um grupo religioso, mas apoiada pelo Estado, ensinava a explicação bíblica para a origem da vida, comparando-a com a teoria de Darwin. E una sondagem divulgada em 2006 dava conta de que 12 por cento dos estudantes universitários britânicos aceitavam a explicação do criacionismo, enquanto 19 por cento se sentiam próximos das ideias do movimento da concepção inteligente.

A vanguarda turca

Muitos destes estudantes britânicos andavam nas faculdades de Medicina e eram provenientes de comunidades muçulmanas - o que mostra uma tendência forte dos últimos anos, que é a do crescimento da oposição à evolução entre a população islâmica. Ao que tudo indica, esse crescimento parece ligado à força do ressurgimento religioso na Turquia e, em particular, à actividade de Adnan Oktar (que se apresenta sob o pseudónimo literário Harun Yahya) e da sua Fundação para a Investigação Científica, que produz verdadeiras enxurradas de material defendendo as ideias criacionistas. "Usa elementos do criacionismo dos protestantes americanos, adaptado ao mundo islâmico", diz Glenn Branch.

Além de um site recheado de informação (http://www.harunyahya.com) e de muitas intervenções nas escolas turcas, distribuindo livros e DVD, no ano passado Harun Yahya expandiu-se para a Europa e até para os EUA, enviando a muitas escolas e cientistas cópias do luxuoso livro Atlas da Criação: o livro espanta, pela qualidade das fotografias e da impressão, mas o conteúdo não impressiona. São sobretudo fotos de fósseis e de animais e plantas que existem hoje, e que parecem totalmente iguais (pode-se fazer download do livro a partir do site). Estas imagens servem a Harun Yahya para defender que não houve evolução alguma, que as espécies se mantêm iguais, como sempre, desde que foram criadas.

A actividade de Harun Yahya liga-se à de outro importante movimento de inspiração religiosa turco, com o nome de Fethullah Gulen - este mês, Gulen foi considerado o intelectual mais influente do mundo, numa votação aberta, promovida pelas revistas Foreign Policy e Prospect. Os responsáveis pelas duas publicações dizem que a votação foi manipulada pelos adeptos de Gulen - próximo do partido no poder, o AKP, e em particular do Presidente Abdullah Gul -, que votaram em massa nele. E o site alemão International Relations and Security Network, da universidade de ciência e tecnologia ETH de Zurique (Suíça), diz que o Movimento Gulen se tem empenhado em iniciativas para promover o ensino nas escolas das ideias criacionistas. No ano passado, 600 cientistas turcos assinaram uma petição dirigida ao Ministério da Educação, alarmados com a presença cada vez mais forte das ideias criacionistas nos manuais escolares de Biologia.

Na Europa de Leste, a penetração das ideias criacionistas parece ter sido bem sucedida após a queda do Muro de Berlim, devido aos missionários evangélicos americanos que para lá se deslocaram, diz Glenn Branch, num artigo de 2007 ("Creationism is a Global Phenomenon"). Na Roménia, o Governo foi pressionado a modificar os manuais escolares, para que as crianças não encontrassem ideias contraditórias com as da Bíblia, e na Sérvia chegou a ser mesmo afastada a teoria da evolução dos currículos da escola primária, embora durante pouco tempo (a ministra responsável pela medida foi afastada). Na Rússia, uma aluna de São Petersburgo lançou um processo judicial para que o criacionismo fosse ensinado nas escolas, com o apoio do patriarca Alexius III (a autoridade máxima da Igreja Ortodoxa na Rússia), mas este foi recusado pelo tribunal.

Perigosa igualdade

Todos estes casos levaram o Conselho da Europa a emitir uma declaração, em Outubro de 2007, com um título claro: "Os Perigos do Criacionismo na Educação". "Estamos a assistir a um crescimento de modos de pensamento que desafiam o conhecimento estabelecido acerca da natureza, da evolução, das nossas origens e da nossa posição no Universo", lê-se no documento, que apela à acção para contrariar este movimento: "Há um risco real de se estarem a introduzir graves confusões na mente das nossas crianças, relativamente ao que são convicções e crenças e àquilo que é conhecimento científico. Uma atitude que considera 'todas as coisas em pé de igualdade' pode parecer tolerante e desejável, mas é na verdade perigosa."
Esta declaração é um alerta importante porque, como diz Kenneth Miller, professor de Biologia da Universidade Brown (Rhode Island, EUA) e protagonista da oposição ao avanço do criacionismo nos Estados Unidos, "as comunidades científicas na Europa ainda não começaram a encarar esta ameaça seriamente".

Mas por que está a rejeição da teoria da evolução a crescer? "As sondagens nos Estados Unidos mostram que, desde 1982, o apoio ao criacionismo se tem mantido mais ou menos constante", diz Glenn Branch. "Cerca de 50 por cento dos americanos rejeitam a teoria da evolução, e esta proporção tem-se mantido constante ao longo das décadas", diz Kenneth Miller, através de correio electrónico. "Na Europa, as ideias e tácticas do movimento da Concepção Inteligente são novas. Creio que uma porção substancial [da rejeição da teoria da evolução] se deve a um grande desconforto nas nossas sociedades quanto à ciência moderna. O antievolucionismo é uma forma de as pessoas lutarem contra uma ciência que consideram ameaçadora."

Dimensão política

Esta explicação dá uma dimensão política à rejeição da evolução - que aliás é reconhecida pela declaração do Conselho da Europa: "A guerra contra a teoria da evolução tem muitas vezes origem em várias formas de radicalismo religioso, com relações próximas a movimentos políticos de extrema-direita. O movimento criacionista tem um poder político real."
Se essa relação começa a ser reconhecida na Europa, é já bem conhecida nos EUA. "A evolução é um tema usado pelos membros mais radicais do Partido Republicano para derrotar os republicanos mais moderados nas eleições primárias", comenta, por e-mail, Jon Miller, especialista em literacia científica da Universidade do Michigan, que em 2006 foi o principal autor de um inquérito sobre a aceitação da evolução nos EUA, na Europa e na Ásia, publicado na revista Science. Os países que menos valor davam à teoria de Darwin eram a Turquia e os Estados Unidos.

Não é que as ideias criacionistas andem longe da Casa Branca. Pelo menos durante a campanha eleitoral, o Presidente Ronald Reagan apoiava que se ensinasse a palavra da Bíblia lado a lado com a evolução. E George W. Bush manifestou-se partidário de que "se ensinasse a controvérsia" - lema dos defensores da concepção inteligente, levado até às últimas consequências no julgamento de Dover, na Pensilvânia, em 2005, em que uma mãe processou o distrito escolar, que pretendia colocar adendas nos manuais de Biologia pondo em causa a validade da teoria da evolução.

O exemplo do tabaco

Na verdade, a insinuação da narrativa do Livro do Génesis nos currículos de Biologia e na mente dos cidadãos, semeando a dúvida, tem-se feito muito graças a dois factores, que têm longa história em assuntos polémicos de base científica, como os malefícios do tabaco para a saúde e o aquecimento global. Por um lado, a falta de conhecimento do público sobre ciência; por outro, o apelo ao sentimento de justiça, de dar tempo igual às duas partes de um debate.
"Esta questão tem muito a ver com a literacia científica. O problema é que muitos adultos, tanto nos EUA como a União Europeia, têm um conhecimento frágil sobre a forma como funciona a ciência. Aceitam a ideia de que a ciência se baseia em provas e que é metaforicamente semelhante a um julgamento - com dois lados a litigar, apresentando provas. Mas não sabem como se constrói o consenso científico nem distinguir temas que estão muito para além do que se pode debater de forma racional", diz Jon Miller.

"Quando o público se sente confiante sobre os seus conhecimentos numa determinada área, a estratégia de reclamar tempo igual para duas ideias em confronto não resulta. Por exemplo, ainda há pessoas que defendem que o Sol gira em torno da Terra - na verdade, há um número bastante surpreendente - e usam a mesma estratégia retórica, apelando a que se ensinem todas as visões sobre o tema. Mas a opinião pública não lhes dá crédito, porque a grande maioria sabe que este assunto já foi resolvido há muito tempo, e que há amplas provas científicas a demonstrá-lo", adianta Glenn Branch.

"É útil lembrar a mudança que ocorreu na opinião pública sobre o tabaco. Durante muitos anos, a indústria tabaqueira usou a abordagem da igualdade de oportunidades para apresentar os seus argumentos, dizendo que não eram ainda claros os efeitos do tabaco na saúde, ou que os cientistas não se entendiam entre si. Mas esse argumento foi perdendo força nos EUA e agora há muito menos americanos a fumar do que na Europa, no Japão ou na China", recorda Jon Miller.
Com a evolução, há ainda um grande desfasamento entre o que pensam os cientistas e o que pensa o cidadão comum. Esse é que é o problema, sublinha Glenn Branch. "Infelizmente, embora a validade da evolução já tenha sido resolvida há muito tempo, grande parte dos cidadãos não sabe disso, ou foram enganados, de forma a rejeitarem o consenso científico."

in Público on-line - link não disponível

150 de Evolucionismo!



Faz hoje 150 anos que, pela primeira vez, foi feita uma comunicação científica, na Sociedade Lineana de Londres, em que foi apresentada uma teoria da evolução científica.

Embora os autores não estivessem presentes (Alfred Russel Wallace estava na Indonésia e Charles Darwin estava de luto pela morte do filho mais novo, Charles), esta comunicação, feita por amigos de Darwin (Charles Lyell e Joseph Hooker) não foi muito notada e compreendida na altura - só com a publicação do famoso livro de Darwin é que os cientistas e os comuns mortais se aperceberam de todas as implicações desta teoria.

Celebremos a data, por muitos ignorada, neste momento em que uns certos parvos procuram, afanosamente, em nome de crenças religiosas anti-científicas, denegrir e destruir 150 anos de Ciência...